Discurso durante a 163ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa da realização de uma ampla reforma no sistema político-eleitoral vigente.

Autor
Gleisi Hoffmann (PT - Partido dos Trabalhadores/PR)
Nome completo: Gleisi Helena Hoffmann
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA POLITICA, FEMINISMO.:
  • Defesa da realização de uma ampla reforma no sistema político-eleitoral vigente.
Aparteantes
Anibal Diniz.
Publicação
Publicação no DSF de 12/11/2014 - Página 123
Assunto
Outros > REFORMA POLITICA, FEMINISMO.
Indexação
  • DEFESA, REFORMA POLITICA, ENFASE, REDUÇÃO, NUMERO, PARTIDO POLITICO, SISTEMA, FINANCIAMENTO, CAMPANHA ELEITORAL, PEDIDO, APOIO, CONGRESSO NACIONAL, APROVAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, LIMITAÇÃO, REELEIÇÃO, SENADO, IMPORTANCIA, AUMENTO, PARTICIPAÇÃO, MULHER, POLITICA.

            A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, quem nos acompanha pela TV Senado, pela Rádio Senado, os delegados e servidores da Polícia Federal que estão neste plenário, o que me traz hoje aqui nesta tribuna é exatamente o tema que V. Exª, Sr. Presidente, estava colocando da tribuna um pouco antes, a respeito da participação das mulheres no processo eleitoral. Na realidade, o que me traz também é discutir esse tema dentro de um maior, que é responsabilidade desta Casa, que é a reforma política. Passado o processo eleitoral, mais uma vez o tema da reforma política aparece como consenso nacional e prioridade na pauta legislativa do próximo Congresso Nacional.

            As evidências sobre a urgência de uma reforma em nosso sistema político eleitoral são contundentes. Primeiro, teremos na próxima legislatura, na Câmara dos Deputados, a presença de 28 partidos, o que, embora legítimo, não parece razoável na democracia representativa em que vivemos. Imaginem, senhoras e senhores que nos ouvem e assistem no Sistema de Comunicação do Senado, se todos estes partidos resolvessem lançar candidatos à Presidência em 2018. Teríamos um debate presidencial com quase três dezenas de participantes e seguramente com várias horas de duração.

            Outra questão premente corresponde ao atual sistema de financiamento das campanhas eleitorais. Afinal, os principais escândalos ocorridos nas duas últimas décadas envolvendo políticos de praticamente todos os partidos têm alguma relação com o financiamento de campanhas. Em abril passado, o Supremo Tribunal Federal já havia formado uma maioria de votos de 6 a 1 a favor de uma Adin impetrada pela Ordem dos Advogados do Brasil, cujo objetivo é proibir as doações de empresas privadas para campanhas eleitorais. Porém, o julgamento acabou interrompido pelo pedido de vista do Ministro Gilmar Mendes e somente seguirá, quando ele proferir seu voto - já há campanha nas redes sociais, para que ele devolva seu relatório.

            Nesse período, o Senado Federal acompanhou a maioria do STF e aprovou projeto de lei cujo objetivo é o mesmo proposto pelo Senador Roberto Requião.

            Particularmente, defendo o financiamento público de campanha, com limitação de despesa por tipo de candidatura. Porém, independentemente do modelo adotado, é fundamental que, a partir de fevereiro próximo, este e outros temas da reforma política, como a proibição de coligações em eleições proporcionais, a questão das listas abertas ou fechadas, a suplência de Senadores, a coincidência das eleições, entre outros, sejam temas de deliberação prioritária no Congresso Nacional.

            Mais especificamente sobre o Senado Federal, gostaria de chamar atenção e pedir o apoio das duas Casas para a proposição que apresentei, a PEC 12, de 2011, que limita a possibilidade de reeleições consecutivas para o mandato de Senador, além de determinar a desincompatibilização do cargo para ocupantes de Chefe do Poder Executivo e de Senador para concorrer às eleições.

            A matéria foi distribuída para relatoria do Senador Requião, e eu espero, o quanto antes, possamos estar deliberando sobre ela na CCJ do Senado.

            E, por fim, Srªs e Srs. Senadores, um tema que julgo essencial em qualquer discussão de aprimoramento do nosso sistema político eleitoral, que deve chamar a atenção de toda a sociedade brasileira por conta do desequilíbrio representativo existente, refere-se à participação da mulher na política nacional.

            Afinal, já vão mais de oito décadas desde que a mulher brasileira conquistou o direito de votar e ser votada em território nacional.

            Em 1929, Alzira Soriano foi eleita a primeira prefeita do Brasil. De lá para cá, importantes avanços foram conquistados, e a mulher já alcançou o mais alto cargo da República com a eleição e agora a reeleição da Presidenta Dilma Rousseff.

            Porém, apesar das conquistas, a luta por igualdade de gêneros ainda caminha a passos lentos, e as bancadas femininas continuam sendo minoria em todas as esferas do poder.

            Mais uma vez, nesse último pleito, a participação ou o resultado das mulheres ficou aquém das expectativas, considerando a necessidade de equilibrar os espaços preenchidos por homens e mulheres na política. E o pior: divulgado o resultado das urnas, ao fazer as contas, é possível perceber que a presença das mulheres até diminuiu.

            Na Câmara dos Deputados, atualmente, 46 mulheres exercem mandato. Em 2014 foram eleitas 51 Deputadas. Há um pequeno crescimento, porém, ainda não chegamos a 10% da composição daquela Casa.

            Aqui, no Senado, somos dez Senadoras na Casa, de um total de 81. No ano que vem, termina o mandato de quatro Senadoras, sendo que apenas duas se reelegeram: Kátia Abreu, do Tocantins, e Maria do Carmo, de Sergipe. Ivonete Dantas, do Rio Grande do Norte, e minha companheira de Bancada, Ana Rita, do Espírito Santo, deixam a Casa. Três mulheres conquistaram mandatos de Senadora: Rose de Freitas, do Espírito Santo; Simone Tebet, do Mato Grosso do Sul; e Fátima Bezerra, do Rio Grande do Norte.

            Com isso, o Senado passará a ter 11 Senadoras, Senador Aníbal Diniz; 11 mulheres que, a partir de fevereiro do ano que vem, estarão atuando no plenário desta Casa. Acréscimo de um nome, porém a manutenção de uma representatividade bem abaixo dos 14% da Casa, bem abaixo dos 27 nomes propostos por V. Exª.

            O número de Deputadas estaduais e distritais diminuiu quase 15%, ao se comparar as representantes eleitas este ano e as atuais Bancadas. Em 5 de outubro, foram eleitas 120 mulheres, contra as 141 de hoje, nas 26 Assembleias Estaduais e na Câmara Legislativa do Distrito Federal. O número de eleitas representa apenas 11,33% do universo total de Deputados estaduais e distritais; a Bancada atual representa 13,31%.

            Nos governos estaduais, a participação feminina encolheu. Em 2010, duas mulheres foram eleitas governadoras: Roseana Sarney, no Maranhão, e Rosalba Ciarlini, no Rio Grande do Norte. E agora apenas Suely Campos, de Roraima, conquistou uma vaga no governo Estadual. Ou seja, em quatro anos, passamos de 7,4% para 3,7% dos chefes do Poder Executivo estadual.

            O fato é que os números estão longe de alcançar a cota de pelo menos 30% de candidaturas de mulheres a cargos eletivos e muito mais distante ainda dos mais de 50% de mulheres que compõem a totalidade da população brasileira.

            Para piorar, além de não conseguirem se eleger em número significativo, as mulheres que o têm conseguido raramente ficam entre as mais votadas. Em 12 Estados, não há mulheres entre os dez campeões de voto nestas eleições. Elas conseguiram se destacar em apenas seis.

            Recentemente, pesquisa do DataSenado apontou algumas percepções dos brasileiros acerca da dificuldade que as mulheres enfrentam para concorrer. A falta de interesse por política e a falta de apoio dos partidos políticos foram apontados pela maioria dos entrevistados como os principais motivos da pequena participação da mulher na política.

            O quadro, entretanto, é mais complexo do que parece à primeira vista. A mesma pesquisa revela que 12% das mulheres entrevistadas já pensaram em se candidatar, mas não se candidataram; e 87% nunca pensaram em se candidatar, o que projeta um cenário de pouquíssima motivação da mulher brasileira em participação na política nacional, que continua sendo um mundo eminentemente masculino.

            É bem verdade que a campanha da Justiça Eleitoral incentivando a participação feminina na política, juntamente com a legislação que determina a cota mínima de 30% de candidaturas femininas por partidos, ajudou nessas eleições a aumentar em 46,5% o número de candidatas: foram quase 7.500 contra as 5.056 nas eleições de 2010.

            Mas é de se registrar aqui, como disse o Senador Paim, que muitas dessas candidaturas são colocadas apenas para cumprir a legislação, e a maior parte das mulheres não tem competitividade eleitoral. Aliás, as que a têm também são pouco estimuladas. E o resultado das candidaturas vitoriosas, então, fica muito aquém ainda das candidaturas com competitividade política que são apresentadas pelos partidos.

            Para reverter esse quadro, é fundamental que medidas efetivas sejam tomadas no âmbito de uma reforma política, e desde já merecem destaque pelo menos duas delas: primeiramente no âmbito das discussões entre listas abertas ou fechadas, mas especificamente no caso das listas fechadas, é importante estabelecer a alternância de nomes entre homens e mulheres, se for a lista a preferência que este Parlamento discutir e votar na reforma política. E, mesmo no caso das listas abertas, é importante discutirmos uma participação mínima de mulheres eleitas em cada coligação do partido.

            Nesse sentido, eu radicalizei, nobres Srs. Senadores, e apresentei o Projeto de Lei nº 295, ainda de 2011, cujo objetivo é estabelecer um percentual mínimo de 50% das cadeiras da Câmara dos Deputados destinadas ao preenchimento por mulheres nas eleições proporcionais. Acredito que, ao discutir, mesmo com esse número elevado - o que muitos já me disseram -, nós possamos trazer a esta Casa a realidade que nós temos, de mais da metade da população brasileira ser sub-representada no Parlamento e nos cargos eletivos.

            Com o mesmo objetivo, também aparece em destaque o projeto de lei de autoria de V. Exa, Senador Anibal Diniz, que altera o Código Eleitoral para reservar, quando da renovação de dois terços do Senado Federal, uma vaga para candidaturas masculinas e outra vaga para candidaturas femininas, dando melhores condições de disputa às mulheres no pleito eleitoral. Hoje a disputa é desigual, primeiro porque o mundo da política é um mundo eminentemente masculino. Isso está no inconsciente coletivo. As pessoas projetam nas candidaturas masculinas uma maior capacidade de representação, pelo histórico, pela cultura, por uma série de elementos da nossa sociedade. Então, é importante que as mulheres tenham as mesmas condições de disputa eleitoral.

            Concedo um aparte ao Senador Anibal Diniz.

            O Sr. Anibal Diniz (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Obrigado, Senadora Gleisi Hoffmann. Faço este aparte a V. Exa primeiro para dizer que o Estado do Paraná certamente deve se sentir muito bem representado pela presença de V. Exa aqui no Senado Federal, e segundo para dizer que os argumentos das pessoas que se contrapõem à ideia de uma política afirmativa são sempre argumentos - digamos assim - que buscam uma facilidade a partir do seu próprio interesse. Então, fica muito fácil para quem dirige um partido político dizer assim: quando as mulheres tiverem interesse e tiverem competência de organizar o seu exército, elas serão eleitas. Não! Na realidade, tem de haver uma política que envolva todos os partidos no sentido de preparar os seus quadros e criar as condições para que seus quadros femininos disputem em pé de igualdade. Por que eu digo isso? V. Exa é do Partido dos Trabalhadores. Eu também sou do Partido dos Trabalhadores e tenho orgulho pelo fato de termos a Presidenta Dilma, que foi a primeira mulher eleita e reeleita no Brasil à Presidência da República, mas nós temos um dado muito importante das duas últimas eleições: as duas mulheres que disputavam em 2010, Marina e Dilma, tiveram 67% dos votos; e agora, em 2014, Marina e Dilma tiveram 62% dos votos - Dilma, 42%, e Marina, 20%, no primeiro turno. Isso mostra com muita clareza que, quando existe o espaço e quando as mulheres são colocadas para apreciação da sociedade, há - digamos assim - uma resposta positiva da sociedade. O que nós precisamos é criar as condições. Exatamente por isso o meu projeto prevê, nas eleições com duas vagas para o Senado - aspecto que faço sempre questão de ressaltar, porque é a única eleição majoritária em que há a exceção de, a cada oito anos, haver duas vagas -, que nesse caso, especificamente, haja equilíbrio de gênero. Quando houver uma vaga só, vamos ter de conviver com a disputa entre homens e mulheres para a mesma vaga, mas, nesse caso em que há duas vagas específicas, vamos experimentar, ainda que por um período limitado de tempo, essa possibilidade de equilíbrio de gênero. Aí sim vamos ter uma representação feminina - digamos - mais importante aqui no Senado Federal. E isso com certeza vai influir na Câmara dos Deputados e nas Assembleias Legislativas pelo Brasil inteiro. Então, parabéns a V. Exª pela reflexão. Quero dizer também que o ótimo não pode ser inimigo do bom. A pretexto de dizer que não conseguimos fazer a reforma política, não podemos não mudar nada. Se não é possível fazer a reforma política com todas as suas dimensões, então vamos, pelo menos, selecionar alguns aspectos em que possamos intervir, para mudar, sim, e fazer com que a política seja mais inclusiva. É o caso dessa matéria de que V. Exª está tratando hoje, que é o fim do financiamento privado aos candidatos, decisão a que o Supremo tem todas as possibilidades de chegar.

(Soa a campainha.)

            O Sr. Anibal Diniz (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Nós já tomamos, inclusive, decisão, no Senado, a esse respeito, na CCJ. E, com certeza, podemos aos poucos fazer com que essa reforma política aconteça, se não por inteiro, pelo menos por parte.

            A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Bem, obrigada, Senador Anibal Diniz. Pode ter certeza de que vamos estar aqui apoiando seu projeto.

            A política afirmativa é necessária, quando há uma cultura e uma história de discriminação e, com certeza, não se oferecem as mesmas condições para todas as pessoas disputarem em condições de igualdade e poderem se colocar no mundo da política e em qualquer outra área da nossa vida social.

            Portanto, a aprovação dessas matérias, Sr. Presidente, teria a capacidade de realmente transformar a composição do Senado Federal, da Câmara dos Deputados, das Assembleias Legislativas estaduais, da Câmara Legislativa do Distrito Federal e das Câmaras Municipais em todo o território nacional, num curto prazo, de forma a tornar essas Casas muito mais equilibradas do ponto de vista da representação não só de gênero, mas da sociedade brasileira.

             Ambas as matéria tramitam na CCJ. A Relatora do projeto de lei que apresentei é a Senadora Angela Portela, e o Relator do projeto de lei que V. Exª, Senador Anibal, apresentou é o Senador Paulo Paim, que já fez aqui uma brilhante defesa da matéria.

            Nós vamos nos esforçar muito para que o Senador Vital do Rêgo coloque essas matérias em votação.

            E soube, agora, por V. Exª, que há um compromisso do Senador Vital de colocar essa matéria amanhã, em discussão, na CCJ. Vamos fazer esforço para que essa matéria esteja na pauta da CCJ. Como membro da CCJ, estarei lá e farei a defesa da matéria, porque acredito que ela resgata um período de forte injustiça contra a mulher na sociedade brasileira, e não existe democracia plena se metade da população não está representada nas instituições que representam a democracia.

            Obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/11/2014 - Página 123