Discurso durante a 163ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Crítica à influência do poder econômico no processo eleitoral; e outros assuntos.

Autor
João Capiberibe (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AP)
Nome completo: João Alberto Rodrigues Capiberibe
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA POLITICA. JUDICIARIO. SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Crítica à influência do poder econômico no processo eleitoral; e outros assuntos.
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 12/11/2014 - Página 126
Assunto
Outros > REFORMA POLITICA. JUDICIARIO. SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • CRITICA, SISTEMA ELEITORAL, ELEIÇÕES, CANDIDATO, INFLUENCIA, PODER ECONOMICO, TRANSFORMAÇÃO, TEMPO, PROPAGANDA ELEITORAL, TELEVISÃO, RADIO, MERCADORIA, DEFESA, REFORMA POLITICA, ENFASE, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, TRABALHADOR, REDUÇÃO, QUALIDADE, VIDA, SOCIEDADE, TRANSITO, TRANSPORTE COLETIVO, SEGURANÇA, AUMENTO, PREÇO, ALIMENTOS, MEDICAMENTOS, AUTORIA, ORADOR, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, FIXAÇÃO, LIMITAÇÃO, DESPESA, ASSEMBLEIA LEGISLATIVA, CAMARA LEGISLATIVA DO DISTRITO FEDERAL (CLDF), TRIBUNAL DE CONTAS, ESTADOS, DISTRITO FEDERAL (DF), AUSENCIA, CONTROLE, POPULAÇÃO, CORRUPÇÃO, MUNICIPIOS.
  • DEFESA, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, ENCERRAMENTO, SEGREDO, JUSTIÇA, INVESTIGAÇÃO, SETOR PUBLICO.
  • DEFESA, APROVAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, CRIAÇÃO, FUNDO NACIONAL, DESENVOLVIMENTO, SEGURANÇA PUBLICA.

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Apoio Governo/PSB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, telespectadores da TV Senado, ouvintes da Rádio Senado, em especial, lá do meu Estado, o Amapá, que, agora, acompanham, pela Rádio Senado, as transmissões desta Casa, a política, Sr. Presidente Paim, é a mola mestra do cotidiano das pessoas, e, quando ela se deteriora, quem paga a conta é a sociedade.

            As últimas eleições acabaram por comprovar que estamos à beira de um esgotamento. A nossa política está enferma - não é possível manter o modelo eleitoral que temos no Brasil. Esse modelo eleitoral em que o resultado das eleições está nas mãos do poder econômico tem que ser reformado. A representação na Câmara e no Senado é, majoritariamente, dos representantes do poder econômico, e isso não é admissível.

            Para se um eleger Deputado Federal, o cidadão ou a cidadã, precisa gastar uma fábula de dinheiro, e é isso o que afugenta as pessoas das disputas eleitorais. Calcula-se entre três e dez milhões de reais o custo de uma cadeira na Câmara Federal. Os eleitos por corrente de opinião estão rareando tanto no Senado quanto na Câmara.

            Essa prática eleitoral se estende por todo o País; do Oiapoque ao Chuí, o comportamento é o mesmo. Eu, nestas eleições, em 2014, não concorri, mas acompanhei de perto, tanto no primeiro quanto no segundo turno, as eleições.

            Alguns candidatos investiram somas elevadíssimas na expectativa de conquistar uma vaga na Câmara, no Senado ou na Assembleia do meu Estado. Eu conheço um caso em que o candidato à reeleição a governador recebeu um desses candidatos que tinha investido R$2,4 milhões na sua reeleição e teriam faltado 65 votos para que ele se elegesse deputado estadual, e ele procurou o candidato à reeleição para lhe propor indenização pelos R$2,4 milhões investidos.

            Isso mostra claramente que a participação nas eleições se transformou em investimentos econômicos com retorno garantido para uns.

            Outro fato que ficou evidente, claro nesse pleito, além da compra de votos, foi o mercado de venda de tempo de televisão e rádio no horário eleitoral. Como disse, nesta Casa, a minha companheira Senadora Lídice da Mata - abre aspas -: “O tempo de televisão transformou cada pequena legenda numa pedra preciosa a ser disputada” - fecha aspas -.

            E é verdade, Sr. Presidente. O resultado das eleições proporcionais é a maior prova da influência decisiva do poder econômico.

            O Congresso Nacional eleito e que tomará posse em 2015 arrecadou, segundo o Estadão, a cifra recorde de R$845 milhões. Dos R$721 milhões arrecadados pelos deputados federais eleitos, R$553 milhões vieram das arcas das empresas privadas, o que equivale a 77% do total arrecadado. É de estarrecer! Mas é a verdade nua e crua.

            Os 67 maiores doadores, dentre os 4.422 financiadores de campanhas eleitorais, doaram 50% de tudo que foi arrecadado pelos Deputados Federais e Senadores. Essa dinheirama veio dos cofres de pessoas jurídicas, ou seja, 1,5% dos doadores doou a metade do dinheiro - um pouco parecido com a distribuição das terras no Brasil, em que um grupo reduzido detém mais de 50% de todas as terras do País. Não deixa de ser um absurdo uma situação como essa.

            Precisamos, definitivamente, acordar a sociedade para a trágica situação em que se encontra a política, esse instrumento importante na transformação, capaz de promover avanço, mas também capaz de fazer a sociedade retroceder. Há fortes sinais de falência do sistema político; se, imediatamente, não encetarmos uma campanha de resgate da política e da participação política, talvez seja tarde demais.

            Como bom combatente da verdadeira política, coloco-me à disposição de quem queira cerrar fileiras para despertar o gigante adormecido. A hora é de peregrinar pelo País, convocando a sociedade, e pressionar o Congresso Nacional a mudar a regra do jogo. É hora da reforma política para qualificar a política no nosso País. E não se pode atribuir inteiramente a responsabilidade aos agentes políticos, a sociedade precisa ocupar os espaços públicos.

            Temos uma realidade no País, nos últimos anos, inegável: a vida melhorou para a maioria dos brasileiros e das brasileiras; individualmente, a vida melhorou para muita gente, os empregos se tornaram melhores, os salários aumentaram, o acesso às universidades foi ampliado, o Brasil passou a ser um ator no cenário internacional; tivemos, de fato, avanços individuais importantes, mas temos um grave problema dos espaços públicos, esses se deterioraram ao longo desses últimos anos.

            A vida coletiva no nosso País está mais pobre do que antes. Temos dificuldade em ocupar nossas ruas com liberdade, a violência está descontrolada; os trabalhadores, a classe média leva horas, perdendo tempo precioso dentro de veículos, presos nos trânsitos ou então dentro de transportes coletivos, que levam horas para chegar ao trabalho, tempo esse que poderia ser usado para desfrutar com a família.

            As nossas ruas, locais dos bairros de periferia sem água e a maioria sem esgoto, o que mostra claramente que a vida coletiva não melhorou na mesma relação em que a vida dos indivíduos no nosso País. As nossas ruas, as casas, muitas vezes... As ruas apresentam casas belíssimas, no entanto, não têm rua, não têm saneamento, não têm condições mínimas de urbanismo.

            Isso mostra que nós temos que identificar com clareza que é a política que está nos levando para um País onde os indivíduos melhoram, mas a vida coletiva piora.

            Temos que alertar a sociedade. E, lembrando o poeta alemão Bertolt Brecht, dramaturgo, que escreveu a Ópera dos Três Vinténs, que Chico Buarque transformou na Ópera do Malandro, no Brasil: ele falava da necessidade de despertar a sociedade, que ela precisa ouvir, falar e participar dos acontecimentos políticos, principalmente da elaboração dos orçamentos públicos, que são a mola propulsora da economia.

            O Brasil atinge em torno de 35% de carga tributária. Nós trabalhamos quase cinco meses para pagar impostos que a União, os Estados e as prefeituras arrecadam e que não transformam em benefícios coletivos, porque há uma apropriação dessa contribuição coletiva.

            Temos o dever de alertar a sociedade para o seguinte: o custo de vida - o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio - depende das decisões políticas.

            Não podemos mais, como políticos, deixar que uma parcela da população se orgulhe e estufe o peito dizendo que odeia a política.

            É inadmissível um País em que 81% da população desconfiam das instituições públicas do País e concordam com a afirmação de que é fácil desobedecer às leis. Esse mesmo porcentual de pessoas também tem a percepção de que, sempre que possível, os brasileiros escolhem “dar um jeitinho” no lugar de seguir as leis.

            Por isso, para começo de conversa, é necessário que convençamos essa parcela da população de que é de sua indiferença com o coletivo que nascem a prostituta, o menor abandonado e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra, corrupto e lacaio das empresas nacionais e multinacionais.

            Nesta Casa, tenho projetos para requalificar a vida política do nosso País. Aqui gostaria de falar alguns desses projetos. Apresentei a PEC nº 30, que objetiva fixar um limite máximo para as despesas das Assembleias Legislativas Estaduais, da Câmara Distrital do Distrito Federal, dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal. Fiz isso porque encomendei um estudo da Consultoria do Senado e esse estudo me apresentou uma realidade chocante. Nos últimos dez anos, os gastos com as assembleias e com os tribunais de contas cresceram 47% acima da inflação, para exercer exatamente a mesma função, de legislar e fiscalizar os Executivos. Portanto, não tem cabimento que essas instituições, com 1.057 deputados estaduais e 27 tribunais de contas, cada um com sete conselheiros, gastem, dos impostos pagos pela população, R$14,6 bilhões, mais do que o Parlamento europeu, composto por 24 países, que falam 24 línguas diferentes, com mais de 700 parlamentares, que se reúnem em três cidades diferentes. É, de fato, uma situação que precisa mudar. E essa proposta estabelece que os gastos das assembleias e dos tribunais de contas serão atualizadas a cada ano pelo IPC ou qualquer outro índice de recuperação da inflação.

            Não tem sentido que as assembleias estaduais e os tribunais de contas gastem mais do que a Câmara Federal, o Senado Federal e o Tribunal de Contas da União.

            Fiz um levantamento no meu Estado. Em 2013, a Assembleia Estadual do Amapá - e essa é uma realidade que se reproduz em outras assembleias - gastou em diárias de viagens R$17,5 milhões, Sr. Presidente - R$17,5 milhões. Comparando com o Senado Federal, na Assembleia do meu Estado, são 24 Deputados; no Senado, são 81 Senadores.

            E aqui há mais de dez mil servidores. Lá, R$17,5 milhões. O Senado Federal gastou em 2013 R$1,250 milhão em diárias de viagens, e os Senadores percorrem o mundo viajando. Há Senador neste momento, com certeza, viajando em países mais distantes: Japão, China, Europa, enfim.

            Não é possível nós não atentarmos que a corrupção é vertical: ela começa nos Municípios e termina no federal. É bem verdade que, no federal, o olhar da opinião pública, o controle, é mais bem exercido sobre as despesas públicas. Na medida em que se vai descendo na hierarquia dos Estados brasileiros, a opinião pública é menos atenta, e nos Municípios praticamente não há um acompanhamento, um controle dos gastos públicos.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco Apoio Governo/PT - SP) - V. Exª me permite um aparte, Senador João Capiberibe?

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Apoio Governo/PSB - AP) - Pois não, Senador Suplicy.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco Apoio Governo/PT - SP) - Quero cumprimentá-lo pela análise que faz de tantas distorções que hoje ocorrem na sociedade brasileira, a começar com o ponto que V. Exª enfatizou relativamente à importância da reforma política que venha coibir as contribuições de pessoas jurídicas. Acredito que esse é um dos pontos principais da reforma política, e V. Exª aqui nos traz elementos de por que isso deve acontecer. Se não for obtido pelas forças representadas no Congresso Nacional, daí a relevância de se fazer uma consulta ao povo para depois de muito bem esclarecido confirmar ou não.

(Soa a campainha.)

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco Apoio Governo/PT - SP) - Agora, V. Exª citou um dado que realmente é impressionante. Eu queria ouvir de novo. V. Exª citou que a Assembleia Legislativa do Amapá, com 24 Deputados Estaduais gastaria...

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Apoio Governo/PSB - AP) - R$17,5 milhões.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco Apoio Governo/PT - SP) - Quase 17 vezes mais. O Senado quanto?

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Apoio Governo/PSB - AP) - Um milhão e duzentos e cinquenta mil reais.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco Apoio Governo/PT - SP) - Um milhão e duzentos e cinquenta mil reais. Ou seja, a Assembleia Legislativa do Amapá, com 24, comparados a 81 Senadores, estaria gastando cerca de 15 vezes mais do que o Senado. Acredito que isso é algo que mereceria, da parte dos Deputados Estaduais do Amapá, uma reflexão, porque realmente é um dado...

(Interrupção do som.)

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco Apoio Governo/PT - SP) - ... que precisa ser analisado pelo povo do Amapá. Certamente, haverá ali, dentre os 24 deputados estaduais, alguns que venham a ficar tão impressionados com esse dado que V. Exª aqui nos revela para tomar as devidas providências de diminuir aqueles gastos. Meus cumprimentos.

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Apoio Governo/PSB - AP) - Muito obrigado, Senador Suplicy.

            Vou encerrar, Sr. Presidente, Srs. Senadores.

            Eu queria citar outro projeto de nossa autoria que está tramitando na Casa, o PLS nº 141, que, se já estivesse em vigor, não teríamos, por exemplo, esse vazamento seletivo sobre a Operação Lava-Jato, pois as investigações teriam sido feitas às claras.

            Eu acho que está na hora de dar um ponto final no segredo de justiça na hora em que se investigam agentes públicos. Isso tem que ser tornado claro porque, senão,...

(Soa a campainha.)

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Apoio Governo/PSB - AP) - ... os vazamentos se tornam seletivos, específicos para uns, escondem outros, e isso não tem como continuar.

            Nós aprovamos uma lei nesta Casa, depois confirmada pela Câmara e sancionada pelo Presidente Lula em 2009, que é a Lei da Transparência, que tem ajudado muito a controlar fraudes nas despesas públicas, mas ainda assim é insuficiente porque nós temos um problema em todas as esferas. Como é que 81% da população brasileira não confia nas suas instituições? Então, nós temos que nos voltar para dentro das nossas instituições, a começar por esta Casa, pelo Senado.

            Há uma urgência na reforma política, que precisa ser feita. Nós precisamos dar respostas, porque, senão,...

(Soa a campainha.)

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Apoio Governo/PSB - AP) - ... o povo volta para a rua como aconteceu em junho do ano que vem, e, dessa vez, vou estar na rua junto com o povo, porque não é possível que se gere expectativa, que se renove a política, mas que os costumes continuem os mesmos. Há um divórcio entre o desejo da sociedade de mais avanço e a nossa capacidade. E, aqui, eu não diria que a responsabilidade é do partido a, b ou c. A responsabilidade é do conjunto das forças políticas que estão representadas nas câmaras de vereadores, nas assembleias legislativas, na Câmara Federal e aqui no Senado Federal.

            Esses projetos de lei estão tramitando na Casa, e há mais um que me parece fundamental, a PEC nº 24, a PEC que institui o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Segurança Pública, porque, definitivamente, nós precisamos de uma política nacional de segurança pública que integre todas as instituições...

(Soa a campainha.)

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Apoio Governo/PSB - AP) - ... responsáveis pela garantia da segurança do cidadão e da cidadã brasileira.

            A União e esta Casa têm essa responsabilidade de aprovar leis que protejam o conjunto da sociedade brasileira. E a PEC nº 24 institui esse fundo que certamente vai impulsionar a construção de uma política de segurança pública definitiva para todo o País.

            Era isso, Sr. Presidente, muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/11/2014 - Página 126