Pela Liderança durante a 169ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas à falta de transparência e à manipulação dos dados relacionados à economia brasileira; e outro assunto.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Pela Liderança
Resumo por assunto
ECONOMIA NACIONAL, ORÇAMENTO.:
  • Críticas à falta de transparência e à manipulação dos dados relacionados à economia brasileira; e outro assunto.
Publicação
Publicação no DSF de 19/11/2014 - Página 239
Assunto
Outros > ECONOMIA NACIONAL, ORÇAMENTO.
Indexação
  • CRITICA, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, AUSENCIA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, DADOS, RELAÇÃO, ECONOMIA NACIONAL, DEFESA, NECESSIDADE, MELHORAMENTO, ELABORAÇÃO, ORÇAMENTO.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Srª Presidenta, Senadora Ana Rita, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, quero voltar a falar aqui a falar sobre um tema tão fundamental que é hoje, que não tem nada a ver até mesmo com esses escândalos que estamos falando e que são tão importantes, conforme o Senador Capiberibe acabou de falar, que acho merecer toda atenção, que é a falta de transparência e manipulação dos dados relacionados à economia brasileira. Senador Capiberibe, V. Exª é um dos mais envolvidos na luta pela verdade, na campanha pela verdade, que apure tudo que aconteceu durante o regime militar. A Presidenta Dilma merece o nosso mérito, por ter criado a Comissão da Verdade, mas o que ela está fazendo, nesses últimos meses, com os dados sobre a economia é ferir a verdade.

            Esconder do povo a realidade da economia, das finanças, é uma forma de violência, não vou dizer aqui tão grande quanto a brutalidade de ditaduras e da tortura, mas com consequências nocivas para a sociedade brasileira da mais alta gravidade. Se a gente for, para quem está ouvindo, analisar o que acontece na economia, que parece uma coisa muito difícil, mas é simples, basta compararmos com a casa. Aliás, a palavra economia vem da administração doméstica, da casa.

            É assim que surgiu a palavra economia no grego antigo, a gestão da casa; depois, com o tempo, virou a gestão da nação. Em casa, cada um que está me ouvindo sabe, há uma diferença entre a receita da gente, no caso meu e da maioria dos brasileiros, o salário, e as despesas. Essa diferença entre o salário e as despesas é o que se chama superávit, se sobrar dinheiro, ou déficit, se faltar dinheiro.

            Acontece que, quando a gente deve no banco, no cartão de crédito, há duas maneiras de calcular se sobrou ou se faltou dinheiro: é considerar antes ou depois de pagar a dívida. Quando a gente vê a diferença entre a receita, o salário, e o custo, que é a despesa, se você inclui no custo o que você paga de dívida, aí é um déficit ou um superávit nominal. Se você diz: “Eu vou deixar de lado os juros e vou colocar só o custo com o aluguel da casa, o custo com as compras, o custo com a escola dos meninos, quem paga a escola privada”, aí você tem um superávit ou um déficit primário - é o que sobra ou falta antes mesmo de pagar os juros das dívidas que você tem.

            Pois bem, historicamente, no caso do Brasil, a gente gasta mais do que arrecada, quando a gente conta o que tem que pagar de juros. Mas, nos últimos anos, 20 anos pelo menos, o Brasil tem arrecadado mais do que o que gasta, mas a sobra não tem sido suficiente para pagar os juros, e a dívida vai crescendo. E você, que administra sua casa, sabe o que acontece, quando a dívida vai crescendo: quando a dívida cresce, cada vez mais, pega um pedacinho do seu salário, para pagar juros, porque a dívida cresceu.

            Durante todo esse tempo, nos últimos anos, a gente vem tendo, sim, um saldo - um superávit, portanto - primário: gasta-se menos do que se arrecada. Mas, eu volto a dizer, esse menos, Deputada Janete, é menor do que o que a gente tem que pagar de juros. Então, a dívida tem crescido, mas tem crescido pouco.

            Ao longo do Governo Fernando Henrique, do Governo Lula, por exemplo, a dívida não cresceu tanto, porque a gente tinha que pagar - para não colocar valores, que são trilhões, eu vou botar em percentagem do Produto Interno Bruto - 5,1% do Produto Interno Bruto sob a forma de juros. E sobrava, todos os anos, como superávit fiscal, ao redor de 3%. Logo, ainda ficava faltando 2% do PIB, que, para se ter uma ideia, só no ano passado, os juros que a gente tinha que pagar chegaram a R$3 trilhões.

            A gente tinha que pagar juros que não cobriam o que se tinha que pagar de juros. A dívida aumentava o equivalente a 2% do PIB. Mesmo assim, era menos, só que, agora, piorou muito a situação.

            E piorou muito por causa daquilo que cada um de nós que administra a casa sabe: gastou-se demais. E quando se gasta demais, não tenha dúvida de que a conta vem depois.

            E o Governo chegou agora, em 2013, em vez dos 3% de superávit primário, com apenas 1,59%. Olhe que o Tribunal de Contas diz que, em vez de haver esse superávit de 1,5%, na verdade nós temos um déficit de 0,9%. Ou seja, com o que a gente arrecadou menos os custos ainda ficaram faltando 0,9% do PIB para pagar só os juros, não é para pagar a dívida - porque o Tribunal de Contas diverge do Governo.

            O Tribunal de Contas diz que não se pode aceitar - e falemos com franqueza; em casa nós também faríamos isso - duas coisas que o Governo fez: colocar como receita deste ano o que ainda virá no ano seguinte; e colocar os gastos deste ano só no ano seguinte.

            Imagine você que está me ouvindo se, na hora de prestar suas contas para o Imposto de Renda, você dissesse que parte do salário que você recebeu este ano só vai receber no próximo ano; e que parte dos gastos que você faria no próximo ano você já fez neste ano. Imagine se você fizer isso! Não irá preso porque não se vai preso por dívida, salvo a de pensão alimentícia, mas você vai ficar inadimplente com todas as consequências.

            Pois bem, é isso que o Governo vem fazendo nestes últimos meses pelo menos. E, se vem fazendo isso, as consequências não serão boas para nós. A consequência disso é que os juros vão ter que aumentar, os preços terão que aumentar, e por uma razão simples: quando o preço aumenta, a receita do Governo aumenta e a dívida não aumenta, porque a dívida não é vinculada aos preços, salvo algumas. A maneira que os governos usam no mundo inteiro para pagar a sua dívida é gerar inflação, usam a inflação como instrumento para pagar dívida. E terminam jogando isso para nós. Esquecemos que no fim vem para nós.

            Está tudo mundo chocado com as propinas que são pagas. As pessoas não estão percebendo que quem paga a propina, no final das contas, somos nós, os consumidores. Quando a Petrobras, Senador Capiberibe, paga mais do que devia por uma obra, ela mete isso no preço do combustível mais dia menos dia, e é a gente que paga.

            Nós pagamos a propina - nós, os brasileiros -, você que está me ouvindo. A propina não sai do Governo, a propina sai de nós, porque a conta chega. Ao aumentarem o preço de uma obra para poderem dar mais dinheiro de propina, o combustível tem de subir de preço para pagar aquele aumento de custo e, aí, você paga.

            Pois bem, é o que vai acontecer, porque nós estamos trabalhando com improvisação - basta ver todos os pacotes que foram feitos, Senadora Ana Rita, nos últimos dois, três anos; dão exoneração para um, depois dão para outro. E estamos trabalhando com imprevidência, porque a gente toma uma decisão hoje sem levar em conta o que vai acontecer depois - sabendo, não é sem saber não; é sabendo, mas sem levar em conta -, e enganando, porque a gente diz uma coisa que é diferente da realidade, como essa de contar como receita deste ano o que vai entrar no próximo - será como o custo do próximo ano o que a gente já está gastando neste.

            Finalmente, estamos gastando mais do que deveríamos, e todos sabem o que acontece. Gastamos mais com a Copa, gastamos mais com as Olimpíadas, gastamos mais até com coisas boas, como o PAC, como a contratação grande de funcionários. Gastamos mais - coisa boa - com o aumento de salários. Gastamos mais com coisas ruins e boas, ruins como propina, boas como salários, mas com tudo isso, no fim, a conta chega.

            E a conta chegou. A conta chegou e, em vez de o Governo assumir os erros, de assumir as dificuldades e dizer que quem tem de resolver isso somos todos nós... Não é o Governo que vai resolver sozinho, o Governo não existe, o Governo apenas administra as rendas, nós é que vamos ter que resolver. Estava na hora de a Presidenta dizer: “Erramos e agora temos de consertar isso, e precisamos nos unir para consertar os erros.” Mas desde que sejam assumidos... Em vez disso, está tentando esconder. É como se a gente tivesse estourado o cartão de crédito - nós estouramos o cartão, o Brasil estourou seu cartão de crédito. É isto o que está por traz da palavra “déficit”: é o estouro do cartão de crédito. Em vez de resolver isso, o que a gente está fazendo? Mandando para cá - o Governo - uma proposta de alteração da Lei de Diretrizes Orçamentárias, que é uma manobra fiscal para esconder as dificuldades.

            E quando a gente esconde uma dificuldade, Senador Capiberibe, ela vem com muito mais violência depois. Cada dia que a gente atrasa para entender uma dificuldade e procurar uma solução, ela vem com mais violência depois.

            O que o Governo fez? Mandou um texto com o projeto que era a Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2014, que chegou no dia 11 de novembro, após o Governo admitir que, a esta altura do ano, não tem mais como cumprir a meta fiscal. O Governo reconheceu, mas não reconheceu que foi um erro: agiu como se fosse uma coisa natural, como se fosse por acaso - tinha uma pedra no caminho.

            Não foi uma pedra no caminho. Foi uma muralha que foi feita e que a gente vai precisar derrubar para voltar a crescer, para crescer sem inflação. E em vez de dizer “tem uma muralha na frente”, o Governo diz: “Vamos fazer de conta que não existe essa muralha”.

            O texto que está em vigor exige um superávit primário de, no mínimo, R$49 bilhões, já levando em conta todos os descontos em relação à meta maior, que seria de R$116 bilhões para o Governo central, a Previdência Social, o Banco Central. Na prática, essa meta está sendo abandonada, pois a alteração proposta permitirá ao Governo, se for aprovada aqui por nós - se nós fizermos parte desse jogo de esconder a verdade -, permitirá abater do valor total da meta do superávit tudo o que conseguir executar em despesas de investimento com o Programa de Aceleração de Crescimento e ainda as desonerações tributárias, o que só em outubro já passava de R$135 bilhões. Ou seja, a gente vai gastar isso, mas vai fazer de conta que não gastou.

            Imagine se você chegasse para o dono do banco junto ao qual você tem seu cartão de crédito e dissesse: “Olha, faz de conta que aquilo que eu gastei na compra de um carro novo eu não gastei”. Como é que ia ser? Gastou! E se dissesse: “Então, faz de conta que o meu saldo é maior”. É isso que está em jogo aqui. Estão querendo fazer de conta que o déficit é um saldo, que o buraco é um monte de dinheiro. Isso é esconder a verdade.

            Nessa versão atual, esses descontos são limitados a R$67 bilhões. Ou seja, dos R$135 bilhões, mais o PAC, a gente só considera R$67 bilhões. O resto, faz de conta que não foi gasto. Não tem como fazer de conta que não se gasta.

            Considerando a metodologia de apuração que o Banco Central utiliza, o Governo não apenas não conseguiu superávit - deveria ter, teria que ter, senão perde credibilidade, senão tem que aumentar juros, senão tem que aumentar a dívida - como em suas contas primárias incluiu as estatais federais, que, pela lei, poderiam compensar o resultado do governo central. O déficit foi ainda maior. Ou seja, 19,47 em vez 20,66 em apenas nove meses, porque se joga com as estatais como se jogou com a Petrobras esse tempo todo, como se está jogando com a Eletrobras, com o BNDES. E esse jogo esconde a verdade, a realidade da economia.

            Um despacho do Diário Oficial na quinta-feira, dia 13, informava que o Governo enviou ao Congresso mensagem pedindo a tramitação em regime de urgência para esse projeto que altera a Lei de Diretrizes. Com isso, o projeto teria tramitação mais rápida, não ficando submetido a prazos normais e passando a impedir votação de outras matérias a partir de sua apresentação. Ou seja, força que a mentira seja dita de uma maneira rápida.

            Felizmente, o Governo mudou a estratégia, mas não recuou: ele apenas tirou o pedido de urgência, mas fez uma artimanha para que o próprio Congresso ponha em votação de uma maneira rápida, sem uma discussão cuidadosa, com a mesma imprevidência e a mesma improvisação.

            O processo vai correr atropelando as datas. O calendário de votação da proposta seguirá uma tramitação ordinária, mas com encurtamento dos prazos - mais uma manipulação -, impossibilitando, portanto, maiores discussões entre os Parlamentares - porque mesmo uma fala como esta não está provocando nenhuma discussão, isso é que é o preocupante.

            Pelo calendário definido pela CMO, Deputados e Senadores têm até esta segunda-feira para apresentar as emendas. O relatório do Senador Jucá deve estar pronto até o dia seguinte, dia 18, para ser votado na quarta-feira, dia 19. Como é que a gente faz com que uma coisa dessas tramite em três dias? Era melhor ter mantido o pedido de votação rápida porque a gente teria 45 dias - vai ter pouco mais de 45 horas.

            Foi visando isso, Senadora Ana Rita, que eu dei entrada a diversas emendas à LDO hoje de manhã - sete emendas eu fiz. Eu não vou tomar o tempo da Casa para ler com detalhes essas emendas, mas uma delas era para não permitir a redução de meta de superávit primário que fosse previamente fixada - foi fixada, tem que trabalhar com aquela, porque é a verdade, é o necessário, não foi colocada ali por acaso.

            Há outra, que eu acho que teria um papel muito importante: é a unificação dos cadastros de obras custeadas com recursos da União. Hoje, não há um cadastro único, Senador Suplicy, os gastos são feitos de uma maneira independente, em algum lugar se soma ou não se soma.

            Há uma terceira acrescentando novo artigo à Lei de Diretrizes Orçamentárias para a adoção do planejamento estratégico pela Administração Pública e monitoramento dos riscos envolvidos nas ações necessárias para alcançar os objetivos e metas. Por incrível que pareça, no século 21, a gente faz gastos de centenas de bilhões, gastos de trilhões de reais, sem ter um planejamento estratégico previsto na Lei de Diretrizes Orçamentárias. Como é que a gente tem Diretrizes sem planejamento estratégico?

            Outra emenda é a que prevê a definição de metas, indicadores e prazos de vigência para proposições que tratem de renúncias de receitas.

            Um dos grandes problemas que estamos vivendo em relação às contas, Senador Randolfe, diz respeito às desonerações fiscais, que nos beneficiaram a todos que compramos carros. Eu não vejo nenhuma propina nisso, não tem como haver propina na desoneração. Ela nos beneficia, mas agora vamos ter que pagar, porque, ao fazer a desoneração, o Governo reduziu sua receita sem reduzir seus gastos em outras contas - e aí vem o déficit.

            A outra emenda - e estou terminando, Senadora - é a que inclui demonstrativos de desonerações tributárias no âmbito do PAC. Se a gente não fizer isso, a gente não vai saber exatamente como estão sendo os gastos.

            Há mais uma emenda: definindo prazo para que o Congresso aceite ou não as contas a serem prestadas pela Presidência da República. Não há prazo, a gente pode ficar aqui meses e meses sem receber prestação de contas. Tem que haver um prazo para que o Congresso aprecie as contas do Governo.

            Outra emenda inclui um artigo dispondo sobre o custo de obras, de tal maneira que o custo global de obras e serviços de engenharia seja obtido a partir de custos unitários de insumos ou serviços menores ou iguais à mediana de seus correspondentes no Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil.

            Se isso tivesse sido aplicado nas obras da Petrobras, não estaríamos vivendo essa crise, pelo menos não na dimensão que estamos vivendo. Foi a falta disso, a falta de vinculação dos preços a mediana do que é definido nas pesquisas de preços elaboradas pelo próprio Governo que fez, que permitiu que, através de negociações, se subisse os preços, de tal maneira que se dissesse: “Sobe; um pedacinho vai para você e um pedacinho vai para nós”.

            Essas emendas foram apresentadas hoje. Primeira notícia que tive foi de que haviam sido recusadas e, depois, foi a notícia de que haviam sido aprovadas. Independente de serem aprovadas ou não, quero dizer que fiz meu dever de casa, apresentei minhas emendas, tentei fazer com que o trabalho da elaboração do próximo orçamento...

(Soa a campainha.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - ... deste ano para o próximo ano seja feito de uma maneira diferente: com mais seriedade, com menos improvisação; com mais previdência, com menos descuido.

            Eu espero, com essa crise toda que está aí, que a Presidenta Dilma disse que faz um Brasil diferente, que faça um Brasil diferente, no mínimo, na elaboração do orçamento do próximo ano - pelo menos isso -, para evitar tragédias como as que estamos vivendo: de diretores de grandes empresas, como a Petrobras, presos; os presidentes das maiores empreiteiras do mundo - não são as maiores só do Brasil, não; essas empresas que consideramos as maiores do Brasil são as maiores do mundo, mas brasileiras - presos também. E uma vergonha nacional que está tomando conta de todos nós.

            Há tempo para resolver isso...

(Interrupção de som.)

(Soa a campainha.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Tem que identificar os cuidados, tem que acabar com a impunidade. Mas vamos, desde já, tomar um pouco mais de cuidado na elaboração do orçamento do próximo ano.

            Fiz o dever de casa, apresentei minhas propostas e estou aqui manifestando nesta fala.

            Era isso, Srª Presidenta.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/11/2014 - Página 239