Discurso durante a 179ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Posicionamento em relação ao projeto de lei que altera a meta do superávit primário.

Autor
Ana Amélia (PP - Progressistas/RS)
Nome completo: Ana Amélia de Lemos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ORÇAMENTO, POLITICA FISCAL.:
  • Posicionamento em relação ao projeto de lei que altera a meta do superávit primário.
Publicação
Publicação no DSF de 03/12/2014 - Página 90
Assunto
Outros > ORÇAMENTO, POLITICA FISCAL.
Indexação
  • MANIFESTAÇÃO, REPUDIO, RELAÇÃO, PROJETO DE LEI, ASSUNTO, ALTERAÇÃO, LEI DE DIRETRIZES ORÇAMENTARIAS (LDO), OBJETIVO, EXTINÇÃO, SUPERAVIT, ORÇAMENTO, COMENTARIO, MANIFESTO, AUTORIA, ECONOMISTA, REFERENCIA, CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, MOTIVO, AUSENCIA, CONTROLE, POLITICA FISCAL, RESULTADO, FALTA, CONFIANÇA, BRASIL, ECONOMIA INTERNACIONAL.

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Maioria/PP - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Senador Jorge Viana, nosso Presidente desta sessão, Vice-Presidente da Casa!

            Srªs e Srs. Senadores, nossos telespectadores da TV Senado, ouvintes da Rádio Senado, estava prestando atenção no pronunciamento do Senador Simon, que, com sua veemência, contundência, habilidade e competência conhecidas, abordou um tema do qual também vou falar, sob outro aspecto. Mas a ordem dos fatores não altera o produto, Senador Simon.

            Vendo a manifestação de V. Exª, animei-me ainda mais em trazer de volta o tema à tribuna porque nós estamos vendo o País - a Nação, mas o País, que tem a governança, que tem a sociedade, que tem o seu PIB - ser olhado com descrédito lá fora por essas coisas que estão acontecendo, que V. Exª descreveu há pouco.

            Estamos vendo também esta Casa, a instituição base da democracia, tanto quanto o Executivo e o Judiciário, envolvida nesse processo de enfraquecimento e de fragilização na hora em que vamos, dependendo do resultado da votação, compactuar com a alteração da Lei de Responsabilidade Fiscal, mudando a meta de superávit fiscal para 2014.

            De Gaulle, talvez, tivesse razão: não é um País sério. É preciso, então, que tenhamos em conta que o Governo Federal, agora, com o absoluto descontrole das contas, quer que o Congresso referende a sua incapacidade fiscal, aprovando o Projeto de Lei nº 36, por meio do qual prevê a diminuição da meta do superávit primário para este ano. Esse superávit está, como todos sabem, previsto na Lei de Diretrizes Orçamentárias que foi aprovada neste ano. Agora, no final do exercício, no apagar das luzes de 2014, não tendo cumprido as metas, a Presidência da República envolve o Congresso neste jogo de faz de conta, para tentar passar a ideia de que estamos diante de uma administração séria. Na realidade, está se valendo de um artifício, que é a mudança da lei, para fazer crer que não descumpriu a lei que foi escrita, tentando impor um efeito retroativo, com o objetivo de esconder o descontrole das contas públicas.

            Antevendo que não é possível fechar o ano com um resultado favorável, o Governo não assume a sua capacidade de gerir os recursos arrecadados do trabalho dos brasileiros. E vale lembrar que nós cidadãos brasileiros, pessoas físicas e jurídicas, temos uma das cargas tributárias mais altas do mundo.

            O que fazem os responsáveis pela condução dos destinos, então? Usam a criatividade para o bem, o que todos aplaudiríamos, ou para subverter regras mais explícitas de demonstração das atividades administrativas e aparentar que estamos diante de um resultado positivo das contas públicas?

            É esse cenário que querem colocar diante do cidadão, da sociedade brasileira, desafiando o Congresso a também entrar nesse processo desgastante.

            O que se quer esconder retirando da meta do superávit fiscal as desonerações dos tributos e dos gastos realizados no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento)? É possível fazê-los desaparecer assim, como num passe de mágica?

            Se existe um superávit fiscal previsto na Lei de Diretrizes Orçamentárias sancionada pela própria Presidente da República, é um objetivo a ser respeitado - a lei tem de ser respeitada -, com vistas ao saneamento das contas públicas do País. Não se pode liberar a gastança ou abrir mão de receitas importantes e, depois, por meio de artifícios muito questionáveis, tentar distorcer o resultado a ser apresentado por essas mesmas contas. Num país que se caracterize pelo respeito às leis, essa proposta, certamente, não teria êxito.

            Isso ajuda a consolidar a célebre frase atribuída, como eu disse, a De Gaulle: “Este não é um País sério!” Daí vem o descrédito perante a comunidade internacional!

            O Governo, buscando mascarar o resultado esperado para este ano, que foi, eu diria, medíocre, envia ao Legislativo este famigerado projeto, o PLN nº 36, para retirar dos cálculos da meta de superávit as desonerações de tributos. O próprio Governo abriu mão de receitas importantes e devia ter previsto seu impacto nas contas públicas!

            Aliás, lembro que o Secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, gaúcho como nós, Senador Pedro Simon, ao fazer uma avaliação dos oito anos da sua gestão, declarou à Agência Brasil, no dia 26 de novembro de 2014 - abrem-se aspas: “A redução do esforço fiscal nos últimos anos foi essencial para estimular a economia e impedir que os efeitos da crise internacional se agravassem sobre o Brasil”. Fecham-se aspas. É uma declaração textual.

            Arno Augustin também deu pouco valor ao fato de a agência de classificação de risco Standard & Poor's ter rebaixado a nota da dívida pública brasileira, afirmando que ela não representa a unanimidade da opinião dos investidores estrangeiros. Em setembro, foi a Moody's que rebaixou a perspectiva do País, ainda que não tenha mudado a nota. E a agência Fitch manteve a classificação de risco, apesar dos menores resultados fiscais.

            Srªs e Srs. Senadores, o Secretário do Tesouro Nacional só não se lembrou de mencionar que houve um manifesto assinado por 164 professores universitários de Economia, do nosso Brasil e do exterior, sobre alguns aspectos da economia brasileira e alguns argumentos usados na última campanha eleitoral. Vale destacar alguns pontos desse manifesto.

            O primeiro deles diz que países da América Latina, região muito sensível a turbulências na economia mundial, estão em franca expansão econômica. Por exemplo, a Colômbia deve crescer 4,8% neste ano, com inflação de 2,8%; o Peru crescerá 3,6%, com inflação prevista de 3,2%; e o México cresce 2,4%, com inflação estimada em 3,9%. O Brasil, por sua vez, alardeado como uma das maiores economias mundiais, terá um crescimento máximo próximo de zero, com inflação que pode chegar a 6,5%.

            Entre as 38 economias com crescimento do PIB disponível no site da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), apenas Brasil, Argentina, Islândia e Itália se encontram em recessão.

            E óbvio que a crise internacional não afeta apenas poucos países!

            Os economistas também atribuem o desempenho pífio da economia e a perspectiva de retrocesso nas conquistas sociais às políticas econômicas equivocadas do Governo. Destacam, ainda, que a utilização recorrente de truques contábeis destruiu a confiança na política fiscal. E essa é fundamental para manter todos esses ganhos sociais dos programas que defendemos, como o Bolsa Família, por exemplo.

            Portanto, as maquiagens nas demonstrações econômicas saltam aos olhos de qualquer observador, nem é necessário ser muito atento. Então, a quem o Governo pretende enganar com o Projeto de Lei nº 36, do Congresso Nacional, que tem a finalidade de alterar o resultado fiscal? A verdade é que houve uma distribuição de benefícios em detrimento da arrecadação de recursos previstos no Orçamento. O Governo não cumpre a lei, o que se afigura um péssimo exemplo para os cidadãos, e agora entende por bem mudar a lei para se justificar.

            Salienta ainda o manifesto dos economistas a ocorrência de mudanças constantes e inesperadas de regras - é a tal insegurança jurídica -, como alterações arbitrárias de alíquotas de impostos, o que aumenta a desconfiança dos empresários para o planejamento de suas atividades. Isso acontece também com as prefeituras municipais e com os Estados, já que esta Federação está fragilizada.

            Porém, o excesso de intervencionismo afeta também as empresas estatais, bastando citar o represamento artificial dos preços de energia e derivados do petróleo, minando a capacidade de investimento das empresas do setor energético.

            Mais um ponto que considero essencial entre os que constam do manifesto é o da expansão da oferta de crédito subsidiado de forma discricionária e até irresponsável.

(Soa a campainha.)

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Maioria/PP - RS) - Já vou terminar, Sr. Presidente.

            Esses economistas afirmam que “a distribuição arbitrária de crédito subsidiado produz distorções na alocação de recursos do País e contribui para o baixo crescimento econômico”. E mais: “Os subsídios envolvidos geram altos custos fiscais, que o atual Governo tenta esconder com malabarismos e truques contábeis. Estes expedientes destruíram a confiança nas estatísticas fiscais do País”. Vejam o que aconteceu com o Ipea em plena campanha eleitoral!

            Os economistas expõem no manifesto a sua opinião de que os recursos gastos na forma de subsídios injustificados poderiam ser usados para ampliar programas sociais e investimentos públicos em educação, em saúde e em infraestrutura, onde temos tantas deficiências.

            A conclusão é a de que o Brasil tem sérios desafios pela frente e a de que, para enfrentá-los, é necessário um debate transparente e honesto.

            Não vale colocar a culpa do fraco desempenho da economia brasileira...

(Interrupção do som.)

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Maioria/PP- RS) - ...na conjuntura internacional. (Fora do microfone.)

            Aliás, Sr. Presidente, não existe, no momento, uma crise internacional generalizada e, como já vimos, países da América Latina sem o mesmo potencial econômico do Brasil apresentam um desempenho muito superior ao nosso.

            A exposição de motivos que acompanha o PLN nº 36 utiliza o argumento de que “a redução do ritmo de crescimento da economia brasileira afetou as receitas orçamentárias de forma que se faz necessário garantir espaço fiscal para preservar investimentos prioritários e garantir a manutenção da competitividade da economia por meio da desoneração de tributos. As políticas de incentivos fiscais e a manutenção dos investimentos tornaram-se imprescindíveis para minimizar os impactos do cenário externo adverso [é claro] e garantir a retomada do crescimento da economia nacional”.

            É o que diz o manifesto.

            É óbvio que se trata de um argumento falacioso, facilmente contestado...

(Soa a campainha.)

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Maioria/PP- RS) - Desculpe-me! Esse foi o texto do PLN. Eu estava até atribuindo uma declaração que jamais os economistas dariam como se fosse deles. Esse é o texto do PLN nº 36.

            É óbvio que se trata de um argumento falacioso, esse da exposição de motivos do PLN nº 36, facilmente contestado pelos indicadores apresentados no manifesto dos economistas - agora, sim -, que apresentam evidências de que países com menor potencial do que o Brasil têm obtido excelentes resultados econômicos.

            O Governo faria melhor se cuidasse com mais seriedade dos recursos públicos, com maior qualidade no gasto e com uma boa governança. Para que manter uma máquina tão inchada, com quase 40 Ministérios, que se tornou um grande cabide para a colocação de aliados, numa aliança política que vai de A a Z, sem nenhuma consistência ideológica?

            O site do Sindicato Nacional dos Trabalhadores em Fundações Públicas Federais de Geografia e Estatística mostra que o Poder Executivo reúne mais de 22 mil cargos de confiança, com impacto de R$4 bilhões ao ano. Talvez, por isso, hoje, a equipe econômica do Governo já esteja sinalizando um cuidado maior exatamente com esse aspecto da gastança das contas públicas.

            Esse desrespeito à Lei Orçamentária está previsto na Lei nº 1.079, de 10 de abril de 1950, que “define os crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo de julgamento”.

Art. 4º. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentarem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra:

[...]

VI - A lei orçamentária.

            Agora, o Governo quer empurrar goela abaixo do Congresso uma proposta que é como se concedesse uma anistia para esse descuido e essa irresponsabilidade com o dinheiro público? Deveria, no meu entender, sujeitar-se às consequências legais dessa irresponsabilidade.

            O Parlamento é uma instituição que se originou, nas democracias modernas, principalmente da necessidade de aprovar e acompanhar a execução do Orçamento, de fiscalizar e de cuidar dos recursos públicos.

            Agora, a Presidente da República vem, ao final do exercício, afirmar...

(Soa a campainha.)

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco Maioria/PP - RS) - ...que aquela regra sancionada em 2013 não estava valendo? A mudança retroativa da LDO só serve para desmoralizar o Congresso Nacional, bem como o Orçamento, a Constituição e a Lei de Responsabilidade Fiscal.

            Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/12/2014 - Página 90