Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre projeto de lei apresentado por S. Exª com vistas a aprimorar a “Lei Maria da Penha”.

Autor
Gleisi Hoffmann (PT - Partido dos Trabalhadores/PR)
Nome completo: Gleisi Helena Hoffmann
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO PENAL. POLITICA SOCIAL.:
  • Considerações sobre projeto de lei apresentado por S. Exª com vistas a aprimorar a “Lei Maria da Penha”.
Aparteantes
Omar Aziz.
Publicação
Publicação no DSF de 06/02/2015 - Página 155
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO PENAL. POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, ASSUNTO, APERFEIÇOAMENTO, LEI MARIA DA PENHA, OBJETIVO, CONVERSÃO, CRIME, DESOBEDIENCIA, ATO, DESCUMPRIMENTO, MEDIDA, PROTEÇÃO, URGENCIA.
  • ELOGIO, PROGRAMA DE GOVERNO, CASA DE SAUDE, ASSISTENCIA JURIDICA, PROMOÇÃO, AUTONOMIA FINANCEIRA, MULHER, COMENTARIO, CONTRIBUIÇÃO, PROGRAMA, REDUÇÃO, VIOLENCIA DOMESTICA.

            A SRª GLEISI HOFFMANN (PT - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Senadora Ana Amélia.

            Srs. Senadores, Srªs Senadoras, ouvintes da Rádio Senado, telespectadores da TV Senado. O que me traz a esta tribuna hoje, Senadora Ana Amélia, tem a ver com o pronunciamento da Senadora Vanessa Grazziotin e também com o que V. Exª falou aqui sobre violência contra a mulher e sobre a violência na sociedade.

            Estou apresentando um projeto a esta Casa, um projeto de lei, cujo objetivo é aprimorar, Senador Omar Aziz, a Lei Maria da Penha - uma lei importante, que foi uma conquista da sociedade brasileira.

            O objetivo da proposição é incluir mais um parágrafo no art. 22 da lei, para esclarecer que o descumprimento de medida protetiva de urgência configura crime de desobediência, previsto no Código Penal. Isso é muito importante, porque nós temos essas medidas, muitas vezes elas não são observadas e nada é feito contra o agressor que não as observa.

            Aliás, estou fazendo isso - mais à frente vou dizer - exatamente por uma decisão judicial que trocou uma responsabilidade criminal de um agressor que não observou uma medida protetiva para que esse agressor pudesse fazê-lo, ou pagando uma multa ou dando uma cesta básica. E não é esse o espírito da Lei Maria da Penha. Muito pelo contrário: o espírito da Lei Maria da Penha é exatamente criminalizar condutas que atentem à segurança, à vida das mulheres.

            A criação da Lei Maria da Penha representa um marco histórico para o Brasil, pois, a partir da sua sanção, a violência doméstica contra a mulher passou a ser crime, sendo tratada com maior atenção e com o devido respeito pela sociedade brasileira.

            O fato, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, é que, infelizmente, nossa sociedade sempre foi marcada pela dominância do homem perante a mulher, que se mantinha submissa, em geral, cuidando do lar e dos filhos.

            Aliás, há muito pouco tempo, conquistamos direitos de ser tratadas como cidadãs perante a legislação civil do País. Mas vai um tempo não longe em que a mulher saía da mão do pai para a mão do marido, quase como uma extensão da propriedade privada de ambos.

            Há muitos anos, e ainda hoje, as mulheres sofrem caladas, atormentadas e com medo de denunciar seus agressores, tanto por dependência econômica, quanto, até meados de 2006, pela ausência de legislação adequada que tratasse do assunto.

            A Lei Maria da Penha superou parte desses problemas, transformando a legislação brasileira em referência mundial no combate à violência contra a mulher.

            Denominada Lei Maria da Penha em razão da biofarmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes por justiça contra os crimes de violência praticados por seu marido contra ela - aliás, a Senadora Vanessa nos disse que ela esteve em Mato Grosso do Sul na inauguração da primeira Casa da Mulher Brasileira -, a Lei n° 11.340, de 2006, já produziu resultados concretos, especialmente ao reconhecer os direitos da mulher, porém, ainda há muito pra avançarmos antes de acabar com esta prática nefasta e covarde de maridos e companheiros agressores.

            A criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e as Medidas Protetivas de Urgência foram as principais inovações trazidas pela Lei Maria da Penha.

            E não tenho dúvidas de que a Lei inspirou muito a criação da Casa da Mulher Brasileira, onde todos os serviços de atendimento à Mulher podem ser colocados a sua disposição facilitando para aquelas mulheres que são vítimas de violência.

            No caso das Medidas Protetivas de Urgência, trata-se de buscar a eficácia da lei, assegurando seu cumprimento e, sobretudo, protegendo efetivamente as vítimas. São medidas cautelares de primordial relevância que visam garantir a segurança da mulher vítima de violência e de seus familiares após o registro da denúncia na delegacia. Elas possuem caráter preventivo e punitivo.

            As Medidas Protetivas de Urgência se dividem em duas espécies: as que obrigam o agressor; e as dirigidas à proteção da vítima e seus dependentes.

            No que se refere às medidas destinadas aos agressores, destaco: o afastamento do agressor do lar ou local de convivência com a vítima. Se ele for obrigado a se afastar, tem de se afastar, e se ele chegar próximo ao lar, tem de haver uma coerção. Não é possível que nada se faça. E muitas vezes aquela vítima que está sob uma medida protetiva acaba se tornando uma vítima fatal porque o agressor não cumpriu a determinação legal.

            A outra medida protetiva é a proibição do agressor de se aproximar da vítima, em qualquer lugar que seja, na rua, no seu trabalho, na sua escola.

            A proibição do agressor também de contatar com a vítima, seus familiares e testemunhas por qualquer meio.

            A obrigação do agressor de dar pensão alimentícia provisional ou alimentos provisórios. Ele é obrigado a fazer isso. Portanto, tem, sim, de dar a pensão alimentícia.

            A proteção do patrimônio, através de medidas como bloqueio de contas, indisposição de bens, restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor, prestação de caução provisória mediante depósito judicial por perdas e danos materiais decorrentes da prática da violência doméstica.

            Ainda sobre a Lei Maria da Penha é importante destacar: a lei proíbe a aplicação de pena pecuniária, a exemplo de multas e cestas básicas; não permite a entrega da intimação ao agressor pela mulher; determina que a mulher seja notificada de todos os atos processuais, principalmente quando o agressor for preso e quando sair da prisão; determina a possibilidade de prisão em flagrante do agressor; possibilita a prisão preventiva; aumenta em um terço a pena dos crimes de violência doméstica e familiar contra a mulher portadora de deficiência e prevê atendimento por equipe multidisciplinar composta por psicólogo, assistente social que desenvolva um trabalho de orientação, encaminhamento, prevenção e outras medidas voltadas para a vítima e seus familiares. Trata-se, portanto, de uma legislação de vanguarda na defesa das mulheres, que, repito, já apresenta alguns resultados, mas ainda muito aquém do que seria satisfatório.

            Dentre os principais desafios que ainda temos, destacaria a aplicação e a execução da lei, bem como a insuficiente infraestrutura da polícia e dos demais agentes envolvidos em atender, na sua integralidade, as vítimas.

            Por isso que deposito grande esperança nas casas da mulher brasileira que vão ser construídas em todos os Estados da Federação. Porque lá nós teremos efetivamente as delegacias de mulher, a área de assistência social, a área de saúde, os juizados, para que a mulher vítima de violência tenha onde recorrer e ser protegida.

            Os números da violência contra a mulher ainda são assustadores no Brasil. Segundo dados do Ipea, estima-se que ocorreram, em média, 5.664 mortes de mulheres por causas violentas a cada ano. Por sua vez, o estudo do DataSenado aponta que, no Brasil, mais de 13,5 milhões de mulheres já sofreram algum tipo de agressão, o equivalente a 19% da população feminina com 16 anos ou mais. Comprovou-se que 31% dessas mulheres ainda mantêm convivência com o agressor, muitas vezes porque faltam, Senador Aziz, recursos para essa mulher sobreviver. Ela tem que se submeter à violência.

            O Sr. Omar Aziz (PSD - AM) - Por isso, Senadora Gleisi, que o Estado precisa capacitar. Essa senhora casa com 16, 17 anos, tem 5, 6 filhos e fica na dependência de o marido colocar comida. Ela não tem como ter uma outra atividade e ela não teve oportunidade na vida de ter uma formação. Se o Estado qualifica essa mulher e financia para ela ter o próprio negócio, ela não vai ser tão dependente. Porque eu já tive oportunidade, como secretário de segurança, de entrar em uma delegacia de manhã, e estar a mãe e uma jovem agredida pelo marido. E eu: vocês já foram atendidas? “Não, estamos esperando.” O que aconteceu? “Meu marido me bateu.” Aí, eu mandei chamar o delegado e disse: mande buscar e prenda esse cidadão. “Não, não faça isso. Omar, conversa com ele para ele não me bater mais.” Quer dizer, a mulher, muitas vezes, chaga em uma situação pedindo que não é para terminar o relacionamento. Cada situação é uma situação, mas se o Estado entra qualificando a mulher que não teve a oportunidade devida na vida, não foi dada essa oportunidade a essa mulher... Principalmente nos Municípios onde você não tem defensor público, onde você não tem juiz, onde você não tem absolutamente nada; tem um delegado lá de polícia que, muitas vezes, é um sargento da Polícia Militar, é uma cabo da Polícia Militar, que não está qualificado para...

            A SRª GLEISI HOFFMANN (PT - PR) - Atender.

            O Sr. Omar Aziz (PSD - AM) - Atender. Isso acontece muito. Então, esses números que V. Exª levanta muitas vezes não estão na zona rural, na área rural, estão na área urbana só, porque, se nós formos para a área rural, vão aumentar e muito esses números de agressões que ainda têm mulheres que sofrem neste País. Por isso, o papel é qualificar. A punição hoje existe; muitas vezes ela não existe. Essa casa da mulher é importante porque todos os serviços de que ela vai precisar estarão num mesmo ambiente, mas ninguém, seja qual for a mulher, não se sente bem indo aonde tem um monte de gente para dizer que foi agredida. Muitas vezes, criamos lá programas com jovens, crianças cujos pai e mãe têm problema - muitas vezes a mãe usa droga, o pai usa droga -, e essa criança está na escola, mas você não pode mandar o psicólogo falar com ela dentro da escola. Nós temos que falar com ela fora da escola, para que ela não fique sendo vítima de chacota dos colegas, porque muitas vezes o bullying vem em cima disso. "Olha, tá louco, porque o psicólogo tá conversando!". Então, em relação a essas coisas todas, Ministra Gleisi, e eu sei que a Presidenta Dilma, como mulher, é sensível a isso, não tenho dúvida nenhuma de que nós podemos avançar nessas questões, mas é importante uma parceria Governo Federal, governos dos Estados, prefeituras, para que a gente não deixe a mulher dependente. A mulher independente financeiramente não aceita esse tipo de coisa, ela não volta, porque ela muitas vezes volta a contragosto, olha para a cara da pessoa com nojo, mas está ali por causa dos filhos. Porque a mãe não abandona os filhos. Você pode ver, o homem arranja uma outra namorada, larga os filhos, larga a mulher e vai embora. A mulher não faz isso, muito difícil isso acontecer; casos pequenos. Mas o homem, não: o homem se muda, vai embora, e muitas vezes ainda quer tirar a mulher com os filhos da casa, para botar outra. É por isso que nós tomamos... Existe esse negócio já no Brasil, de a propriedade ser da mulher. Quando é doada pelo Estado, ser da mulher, porque aí quem bota para fora o homem é a mulher: "Vai-te embora tu, e eu fico aqui na casa", e acabou, não há mais problema. Mas é isso. Eu acho que a qualificação das mulheres, Ministra, faz com que elas se sintam, além de valorizadas, se sintam independentes. Aí é que é o grande negócio. E nós financiarmos. Há tantas fontes para financiar um pequeno negócio: manicure, cabeleireira, fazer picolé, fazer dindim, fazer sorvete, são profissões que não precisam fazer com que você saia de casa, você pode ter na própria sala. Quanto é que custa o material, financiar, comprar o material de manicure para uma mulher, para que a gente possa qualificá-la, para que ela possa fazer esse serviço dentro da própria casa, para as vizinhas, para os amigos e tal, e ela ter o seu próprio rendimento e não depender do marido? Porque o marido chega em casa, o que acontece? Eu vou me alongar porque são experiências que eu vivi, por isso que estou passando para V. Exª. O cabra, chega sexta-feira, recebe e vai para a mesa do bar. Vai jogar sinuca, toma todas, a mulher, chateada porque o cara não chega, quando ele chega, e ela vai tomar satisfação, vem a agressão. Porque também a mulher não toma satisfação com o homem delicadamente, ela parte para cima. Mulher brava é isso, não adianta a gente aqui dizer, "olha, o homem..." E o cara já tomou todas, agride, a mulher vai e denuncia. Na hora em que a polícia chega, ela diz: "Não, não prende, não, porque já tá tudo bem." Então, isso aí é o seguinte: o homem que agride a primeira vez não tem conversa, ele vai agredir a segunda, vai agredir a terceira, sempre vai ser um agressor. Ele não vai parar de agredir a mulher. Ela pensa que ele pode mudar. Ninguém muda, não muda! A gente pode evoluir, mas o homem que agride a primeira, no dia em que ele beber de novo, e ela falar, reclamar, ele vai partir para cima dela. Isso acontece demais. Infelizmente, é uma realidade. E aí não há classe social, Senadora. Esse negócio de dizer que só é na periferia, não! Escândalo, tanto faz a pessoa ser formada em Harvard que fará o mesmo escândalo que uma pessoa que nunca teve oportunidade de estudar na vida. Eu acho que o caminho dessas casas é também incentivar. Fazer parceria com os Governos e com as Prefeituras, para qualificarmos essas mulheres, para que elas possam, realmente, ter aquela independência e dizer: “Intelectualmente, estou preparada para ter uma vida sem depender de você.”

            A SRª GLEISI HOFFMANN (PT - PR) - Agradeço o aparte, Senador Omar Aziz. A gente já teve até oportunidade de, quando V. Exª era Governador, discutir alguns programas nesse sentido. Sei que V. Exª fez, no Governo do Amazonas, esse incentivo à independência financeira das mulheres, patrocinando e incentivando vários programas.

            Eu também concordo, plenamente, que a independência financeira é fundamental para que a mulher possa ter dignidade e não depender do marido e, portanto, livrar-se do agressor. Isso foi um dos motivos pelos quais, por exemplo, o Programa Bolsa Família foi dado às mulheres. Isso ajudou muito principalmente as mulheres pobres - porque V. Exª tem razão, independe de classe social -principalmente as mais vulneráveis a enfrentar essa situação.

            Outra medida importante que a Presidenta Dilma fez - e que esta Casa aprovou - foi mandar uma medida provisória, para que as casas do Programa Minha Casa, Minha Vida, do faixa 1, fiquem com as mulheres. No caso de separação, não importa o regime de comunhão de bens, ficará com a mulher. Exatamente pelo o que V. Exª falou: as mulheres ficam com os filhos, as mulheres cuidam da família. Então, não é justo colocar as mulheres e os filhos para fora, vender a casa, gastar ou trazer outra companheira. São medidas que foram sendo tomadas ao longo do tempo.

            E a casa da mulher brasileira, quando discutimos, inclusive, o espaço físico dela, foi discutido, cuidadosamente, para separar aquelas mulheres que recorrem a casa, por serem vítimas de violência, e aquelas que recorrem, para ter uma assistência social, um encaminhamento para emprego. Porque, inclusive, isso está previsto na casa: ter encaminhamento para empregabilidade ou geração de renda. E, aí, nós temos o Pronatec, que está sendo também colocado à disposição das casas, para fazer a capacitação que V. Exª está falando, seja para a área de costura ou até outras áreas.

            As mulheres hoje estão trabalhando em construção civil, são pedreiras. Eu fui a um conjunto do Minha Casa, Minha Vida, lá em Londrina, para olhar o conjunto, inaugurarmos, e grande parte dos acabamentos foram feitos pelas mulheres: colocação de azulejos, colocação de piso. E um dos gestores da obra disse assim: “As mulheres fazem melhor que os homens, são mais caprichosas.” Então, tem que dar oportunidade.

            Eu fico muito feliz com o aparte de V. Exa, que V. Exa tenha essa sensibilidade. Tenho certeza de que vai nos ajudar muito a avançar em legislações e programas que auxiliem nesse sentido.

            Para encerrar, quero aqui reafirmar esse problema das mulheres que permanecem como alvo de agressão em nosso País, por conta dessa dependência. Seguramente por isso, o Brasil encontra-se no sétimo lugar em um ranking dos países que mais matam mulheres, composto por 84 nações. Em número de mortes na América Latina, o Brasil só perde para a Colômbia; na Europa, perde apenas para a Rússia.

            O Brasil mata mais mulheres do que todos os países árabes e africanos. Isso é impressionante, porque, pelo menos na nossa ideia, esses países são mais repressivos à mulher. Acredito que sejam mais repressivos, e talvez o comportamento delas seja muito mais submisso; aqui, até pelo fato de as mulheres se contraporem à violência, acabam sendo mais vítimas de violência.

            A Senadora Ana Amélia falou aqui de um dado estarrecedor. No Rio Grande do Sul, que é um Estado bastante desenvolvido economicamente, assim como o Paraná, infelizmente o índice é alarmante, mais do que em regiões menos desenvolvidas economicamente - infelizmente é! E aí não há classe social, todas as mulheres são vítimas.

            Finalmente, Sras e Srs. Senadores, para piorar esse quadro assustador - e é por isso que eu estou apresentando a esta Casa o PLS nº 14, de 2015 -, a 6a Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que o descumprimento de medida protetiva de urgência, prevista na Lei Maria da Penha, não configura crime de desobediência, tipificado no art. 330 do Código Penal. Ao analisar um recurso especial de um réu de Minas Gerais, o Relator, o Ministro Sebastião Reis Júnior afirmou que, se for cominada sanção pecuniária, com fulcro no art. 22, §4°, da Lei n° 11.340, para o caso de inexecução de medida protetiva de urgência, o descumprimento não enseja prática do crime de desobediência, ou seja, nós estamos tirando a criminalização de um ato que não observa uma determinação legal sobre medida protetiva. É exatamente o contrário do que preconiza a Lei Maria da Penha, que foi muito mais rigorosa nos crimes contra a mulher.

            Em sua sentença, o Ministro destacou que a previsão em lei de penalidade administrativa ou civil para a hipótese de desobediência afasta o crime previsto no art. 330 do Código Penal, salvo a ressalva expressa de cumulação. Portanto, trata-se de decisão que me parece extremamente preocupante, pois, o referido entendimento não está, como eu disse, em consonância com o espírito da Lei Maria da Penha, que busca exatamente assegurar mecanismos de combate efetivo à violência contra a mulher, devendo, assim, haver a disponibilização de todos os meios que possam inibir a ocorrência de violência, como é o caso da ameaça de configuração do crime de desobediência. Ademais, conforme entende parte dos tribunais nacionais, as medidas legais que podem ser aplicadas no caso da prática de violência doméstica e familiar, sejam as previstas na legislação processual civil, sejam as previstas na legislação processual penal, não têm caráter sancionatório, mas se trata, em verdade, de medidas de natureza cautelar. Assim, também por esse motivo, fica evidente a conveniência do esclarecimento da tipificação do crime de desobediência.

            Portanto, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, diante do entendimento do Superior Tribunal de Justiça, que tende a se tornar unânime e influenciar os demais tribunais do País, é necessário que seja tornada expressa a previsão do crime de desobediência - crime! - para as hipóteses de descumprimento das medidas protetivas de urgência pelo agressor. Encerro, solicitando o apoio de todos os meus pares para aprovação deste projeto, pois entendo que, ao prevalecer o entendimento acima destacado do STJ, estaremos promovendo um evidente e absolutamente indesejável esvaziamento da Lei Maria da Penha, que tanto tem contribuído para a redução da violência contra a mulher.

            Espero que consigamos, assim como fizemos com outros projetos importantes de proteção à mulher nesta Casa, fazer com que este projeto tenha uma tramitação rápida e possa se tornar lei, impedindo decisões como essa, do Superior Tribunal de Justiça. Muito obrigada, Srª Presidenta; muito obrigada, Srs. Senadores.

            A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Democracia Participativa/PP - RS) - Senadora Gleisi Hoffmann, conte com o meu apoio nessa matéria. V. Exª já foi autora também de uma proposta muito importante que impede que a mulher retire a denúncia contra o agressor.

            A SRª GLEISI HOFFMANN (PT - PR) - Que está na Câmara, inclusive.

            A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Democracia Participativa/PP - RS) - Eu me lembro muito bem, porque foi um trabalho realizado logo no início da Legislatura, foi uma das primeiras iniciativas, na área da proteção à mulher, tomadas por V. Exª. A minha memória está funcionando.

            A SRª GLEISI HOFFMANN (PT - PR) - E está muito boa. Obrigada, Senadora Ana Amélia.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/02/2015 - Página 155