Discurso durante a 12ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com a violência no mundo.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS.:
  • Preocupação com a violência no mundo.
Publicação
Publicação no DSF de 21/02/2015 - Página 5
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS.
Indexação
  • APREENSÃO, RELAÇÃO, EXCESSO, VIOLENCIA, MUNDO, CRITICA, UTILIZAÇÃO, INTERNET, OBJETIVO, PROPAGAÇÃO, AUSENCIA, TOLERANCIA, REFERENCIA, POLITICA, RELIGIÃO, REGISTRO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, LOCAL, ORIENTE MEDIO, PAIS ESTRANGEIRO, IRAQUE, SIRIA, MOTIVO, TERRORISMO, COMENTARIO, AUMENTO, DISCRIMINAÇÃO, PESSOA FISICA, ESTRANGEIRO, LOCALIDADE, EUROPA, DEFESA, COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS (CDH), SENADO, LUTA, GARANTIA, DIREITOS HUMANOS.

            O SR. PAULO PAIM (PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador José Medeiros, é uma satisfação falar sob a Presidência de V. Exª, um jovem Senador que veio com todo o gás, com toda a vontade política - e isso é muito bom -, representando aqui o seu Estado e, por que não dizer, uma visão da juventude brasileira, a juventude brasileira hoje tão fundamental para que a gente possa ter um País melhor para todos. Como a gente fala sempre, que o futuro seja hoje, a partir de hoje, e naturalmente no amanhã.

            Mas, Senador José Medeiros, eu falei outro dia, aqui da tribuna, sobre a violência no mundo. Como recebi muita correspondência sobre o tema, por intermédio das redes sociais, cada um dando a sua opinião - e pediram que eu voltasse novamente ao assunto, até alguns que não viram da tribuna também pediram -, era importante que, na linha da política que fiz, e travei o bom combate ao longo da minha vida, que é na linha dos direitos humanos, eu me reportasse novamente a este tema: a violência no Brasil e no mundo. Sobre o Brasil, falarei outro dia, mas a equipe do Senado e do meu gabinete, que está elaborando o eixo do pronunciamento, me deu um dado com que eu fiquei assustado. Senador José Medeiros, em 2012, no Brasil, foram assassinadas 50 mil pessoas. Num ano! Assassinadas.

            Em muitas guerras no mundo, em países em guerra, não aconteceu isso. E principalmente jovens. A maioria é jovem. E por que não dizer que é fato, é real, a maioria é negro.

            Então, essa violência, o preconceito... Fiquei impressionado. Ontem à noite, vi ali, na Inglaterra, se não me engano - falarei disso também outro dia -, a torcida de um time de futebol não deixando um senhor entrar no metrô. O que é isso? Onde nós estamos? A que ponto chegamos? Essa violência descabida, absurda, desumana. As pessoas agridem a outra por agredir. E a morte e a vida viraram uma questão banal. E é nessa linha, Sr. Presidente, que eu quero fazer este meu pronunciamento, aproveitando este espaço que é um espaço privilegiado que a gente tem aqui. Falar no Senado da República, em sessões de debates, como V. Exª está usando muito bem, na segunda e na sexta, naturalmente, sem prejuízo dos debates nas comissões e das votações às terças, quartas e quintas. Mas segunda e sexta são mais de debates.

            Eu, na Comissão de Direitos Humanos - e espero contar com V. Exª lá -, na segunda pela manhã, faço muitas audiências públicas, debatendo temas de caráter nacional e internacional na linha da defesa da vida, porque defender direitos humanos é defender a vida. É defender a ética, é defender a saúde, é defender a habitação, é defender os bons costumes, é defender o respeito ao próximo.

            Enfim, Sr. Presidente, vivemos em nossos dias uma incômoda proliferação de movimentos extremistas no mundo, fenômeno perigoso para a liberdade e para a democracia, perigoso para a estabilidade das instituições e para a própria paz social e os direitos humanos, que estão sendo covardemente agredidos.

            Até mesmo, Sr. Presidente, nos países de maior tradição humanista e cristã, pressentimos o risco da radicalização política e do aumento da xenofobia, do autoritarismo e da violação dos direitos humanos. E a esse processo degenerativo, devemos dar combate nos espaços de liberdade, como este aqui da tribuna do Senado, que as gerações precedentes nos legaram. E as gerações futuras haverão de nos cobrar.

            Entendemos, todavia, que há tempo para reverter essa tendência ao fortalecimento do discurso do ódio, que é preocupante por seu caráter inclusive antipolítico, impiedoso, messiânico e, por muitas vezes, destrutivo. Só visa destruir o outro por destruir.

            Enfim, Senador José Medeiros, a retórica de campanha adotada nas eleições brasileiras de 2014, por que não lembrar, para os cargos, principalmente, de Presidente da República e, na sequência, Governador, Senador, Deputado Federal e Estadual, em grande medida ecoou a exasperação verborrágica e estúpida que começa a ganhar corpo no debate público em nosso País e no mundo.

            Essa indesejável elevação de tom, como aquele que quer ganhar no grito, segundo nossa crença íntima, é causa e também consequência do acirramento de posições em muitos setores, em muitas esferas da sociedade.

            Nos dias que correm, por exemplo, as notícias veiculadas ao cidadão têm na rede mundial o seu canal mais importante e, na maioria dos portais de notícias na Internet, reserva-se espaço ao internauta para sua livre manifestação a respeito dos assuntos publicados.

            Até aí tudo bem. Ora, ninguém quer calar os internautas, ninguém quer calar a Imprensa. Pelo contrario, eu sou um entusiasta e por isso trabalho com todas as redes sociais, sim. Recebo milhares e milhares de correspondências e faço questão de responder. E muitas pela TV Senado, pelo Alô Senado.

            Pois bem. Valendo-se às vezes do anonimato de um nome de fantasia, ou nickname, indivíduos irresponsáveis passam também a publicar impropérios e grosserias contra tudo e contra todos, de forma irresponsável - cada um deve ser responsável pelo que diz e, por que não lembrar, cada um é responsável pelo ódio que cria, outros são responsáveis por aquilo que cativam -, criticando a todos, não importa a quem, ao Estado, a pessoas mais simples, num caminho, em meu entendimento, político e ideológico de combate à vida de cada um.

            Essa difusão reiterada de comentários rudes e acintosos contra o outro, um desconhecido a quem devemos respeito e de quem nos é lícito pedir respeito, acaba por gerar, no longo prazo - essa é a minha preocupação -, um caldo de cultura de que a violência natural tem que agredir todo mundo, sim, e antipolítico na sua essência.

            Por essa concepção tortuosa, por que não dizer eleitoreira, numa visão bem chula, a validação do discurso é compreendida a partir do seu resultado, ainda que implique a destruição do outro, sua boca calada ou a humilhação de qualquer potencial interlocutor que não comungue da visão de quem o critica.

            Sr. Presidente, sem que se queira avançar na polêmica, porque sou contra o controle de qualquer meio de comunicação, até porque não existe democracia sem liberdade de imprensa... Nós sabemos que um dos pilares da democracia é a liberdade de imprensa e nós jamais vamos abrir da liberdade, aqui frisando a liberdade de imprensa.

            Sr. Presidente, o Brasil tem sido um país democrático. Entendemos que os próprios veículos poderiam eles oferecer garantias na linha de uma reeducação, pela necessária moderação do debate, sem ser contra, nunca, ao diálogo firme, honesto transparente e até duro. Mas para ser duro, como dizia o Che, hay que ser duro sim, mas nunca perca lá... 

            O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. Bloco Democracia Participativa/PPS - MT. Fora do Microfone.) - Ternura.

            O SR. PAULO PAIM (PT - RS) - Ternura. Muito bem, meu querido Senador José Medeiros.

            Enfim o debate franco, porém civilizado e também civilizatório é positivo.

            O bom critério deve ser, exatamente, a hipótese da interação respeitosa, de caráter presencial de preferência. Se algum comentário me parece indigno de ser proferido ao meu próximo, pessoalmente, no decurso de uma conversa politizada e também polida, certamente esse conteúdo não se valida pelo anonimato que o chamado nickname garante, ao menos em tese, a alguns.

            O impropério veiculado sob o anonimato agrava a estupidez do discurso pela covardia de seu emissor, que está falando sem a presença do indivíduo, que não teria a hombridade de repeti-lo presencialmente, porque sabe, com clareza, que não é nesses termos que se argumenta na liberdade e no respeito do espaço público, em que a elevação do tom pode não lhe ser conveniente.

            Nos dias que correm, Sr. Presidente, a brutalização da sociedade tem se manifestado em diversos planos da existência. No esporte, por exemplo, ora, nós estamos assistindo no mundo - e comentava com V. Exª na abertura - à discriminação nos estádios de futebol vergonhosa, a discriminação contra judeu, contra palestino, contra negro, contra índio, contra mulheres, contra orientação sexual, e me parece que alguns pensam que isso é normal. Não é normal. Anormal é o que estão fazendo, discriminação como vi numa denúncia recentemente em relação a pessoas com deficiência.

            Sr. Presidente, a plasticidade do gesto na ginástica rítmica ou a centelha da genialidade do gol de placa nas etapas finais do Brasileirão já não saciam tanto a população, por essa onda de ódio que circula, como um rosto banhado em sangue do lutador de vale tudo. Ali esse pessoal bate palmas. E não sou contra também a luta esportiva, mas nota-se, como telespectador, que o rosto banhado em sangue de um lutador de vale tudo ou o triste espetáculo do nocaute do vencido é descartável, como batente da vez. O que importa é o sangue.

            Alguém que já tenha testemunhado a transmissão das lutas em bares, por exemplo, ou restaurantes pode se deparar com aplausos efusivos dos presentes a cada golpe duro, forte, que machuque e que gere sangue, a cada golpe recebido por algum lutador demolido cujo papel na vida se limitou a divertir a audiência com as lesões que acumula em sua cabeça e em seu corpo e que, com certeza, o minarão e trarão problemas à sua saúde no futuro. É só lembrar o grande Cassius Clay. Eu era um fã do Cassius Clay. Muhammad Ali. Sempre fui um fã.

            Enfim, nós Senadores que temos filhos ou netos em tenra idade podemos perceber quantos biombos eletrônicos e defesas seletivas nos vemos obrigados a instalar nas TVs e computadores de nossa residência para que o mundo de sonhos e aquela nossa inocência - pelo menos eu me lembro da minha infância, eu já passei dos 60 e vão lá outros, já vou para 65 - de nossas crianças não se destrua pela violência e pela barbárie da vida real que, há poucos anos, nem mesmo a ficção cinematográfica era capaz de produzir - e nós vemos hoje na vida real.

            Senador José Medeiros, todo esse deletério caldo de cultura, ao mesmo tempo em que, aos poucos, nos desumaniza, tem resultado no próprio acirramento do discurso no vale-tudo da política, fertilizando e regando o solo estéril do extremismo, da dicção desrespeitosa, da errônea vitória política que implique no aniquilamento do outro.

            Não é aquela filosofia que aprendemos quando pequenos ainda de que o importante era competir e competir bem, nem sempre era só ganhar - claro que todos gostam de ganhar, mas tem que saber respeitar inclusive o adversário que, ora, perdeu. Isso eu aprendi sempre.

            Eu sempre tive o maior carinho pelo meu adversário numa disputa, seja lá no grêmio estudantil - como participei muitas vezes -, na comissão de fábrica ou no sindicato e mesmo depois, quando entrei na vida política.

            Os Parlamentares com família constituída ou que tenham, pelo menos, irmão ou irmã, sabem que, a despeito da criação uniforme oferecida pelos pais, cada um de nós tem uma única digital e, mesmo quando imbuídos dos mesmos valores, familiares próximos constroem sua personalidade de modo completamente particular - cada um é cada um.

            Uns abraçam a causa política - é o nosso caso, estamos aqui na tribuna do Senado da República do nosso querido País, Brasil. Nós somos 81 só, por isso eu valorizo tanto esta tribuna e valorizo tanto a sua presença, Senador José Medeiros, presidindo os trabalhos neste momento. Uns, enfim, como eu dizia, abraçam a causa política, outros se tornam profissionais liberais - e que bom; uns trabalham no campo econômico, outros encontram os grandes empresários e banqueiros, tudo é legítimo; outros encontram na leitura e no acúmulo de conhecimento a razão da própria vida; alguns ficam, outros partem, e o trem continua seguindo o seu curso.

            Ora, Sr. Presidente, não há régua que nos uniformize em nossos próprios lares, por que haveríamos de forçar o conjunto da sociedade a um pensamento único. Ninguém está querendo isso. Eu quero o bom combate, o bom debate, respeitoso no alto nível, sempre dando o direito à resposta ao outro.

            Que graça haveria, claro, ademais, em partilharmos todos uma só visão de mundo? Aqui, o que estou pregando é a não violência, é direitos humanos, é paz e respeito ao próximo, sem deixar de cobrar e de exigir política no campo da ética, da moral e do bom costume, enfim, e que todos tenham o direito a viver, como eu digo, a envelhecer e a morrer com dignidade.

            Se há uma riqueza em nossa vida coletiva, certamente, é o entrechoque salutar e respeitoso das ideias, não da violência; a pluralidade de conceitos e de visões, em que a alteridade muda o meu interlocutor ao mesmo tempo em que a visão do meu interlocutor desloca, problematiza e pode mudar a minha própria visão de mundo. Isso é um aprendizado. Por isso que eu gosto daquela música, Senador, do Gonzaguinha, que diz: “Eu quero aprender sempre com a pureza das crianças.”

            Esse é o grande bem de nossa vida democrática, em que as ideias recessivas, na atualidade, podem se tornar experimentos políticos altamente exitosos no amanhã, se soubermos trabalhar com tudo isso.

            O engessamento de posições mais a brutalização do diálogo aos berros e por meio de argumentos autoritários, o ensaio prévio - será lamentável - da resposta pronta à indagação provável converte o debate salutar em um diálogo de surdos.

            Longe de nos unirmos, amorosamente, na Ágora, na praça pública e nas calçadas para o debate amistoso e construtivo de nosso futuro comum, buscamos a neutralização do nosso interlocutor, que de adversário logo passa à condição de inimigo. Eu posso ter adversários, mas não tenho nenhum inimigo.

            Há, portanto, um perigoso teor de autoritarismo extremista e de violência cega nas estratégias dialógicas que buscam oprimir, calar, desmoralizar e destruir esse interlocutor válido e respeitável, tão digno de viver e, com a sua capacidade de debate, ajudar a construir o País em que vivemos quanto nós mesmos, já que todos somos filhos da mesma terra.

            Sr. Presidente, o argumento extremista do presente, no Brasil e no mundo, nutre-se da visão turva e preconceituosa de extremismos que já aconteceram no passado, de uma triste história.

            Porém, a sociedade internacional vem testemunhando, com horror e espanto, atos de brutalidade sem paralelo, como, por exemplo, as decapitações levadas a termo pelo grupo extremista Estado Islâmico.

            Na esteira do gesto de grandeza espiritual e de amor ao próximo manifestados pelo Papa Francisco, que telefonou às famílias das vítimas de tamanha barbaridade, pedimos a todos um pensamento de graça, resignação e caridade às almas dos americanos James Foley e Steven Sotloff e do francês Hervé Pierre Gourdel e a seus familiares, bem como às almas dos milhares de vítimas anônimas do radicalismo no Iraque e na Síria.

            Sr. Presidente, a chaga aberta do extremismo no mundo nos remete a outros movimentos preocupantes, adotados por defensores do nazismo e do fascismo no Velho Continente.

            Nas eleições da Grécia, país de tão importante tradição filosófica, o partido neonazista Aurora Dourada, infelizmente, obteve três cadeiras do Parlamento Europeu.

            O mesmo fenômeno ocorreu na Alemanha, em que o Partido Nacional Democrático, xenófobo, obteve seu primeiro assento no Parlamento Europeu.

            Também no cenário europeu, o partido extremista Jobbik é a segunda maior legenda na Hungria.

            O discurso de aversão a estrangeiros faz-se presente na própria França. Jean-Marie Le Pen, líder extremista da Frente Nacional, sugeriu a solução do problema da imigração na França por meio do vírus Ebola. Veja bem, pregou que o vírus Ebola fosse aplicado nos imigrantes, e seu partido recebeu 25% do apoio dos franceses.

            Senador José Medeiros, em tempos de ultraconectividade por meio da internet, nem mesmo os brasileiros estão salvos do discurso do ódio. A esse respeito, comento aqui que a revista Carta Capital publicou na matéria “A explosão do ódio”, data 6 de julho de 2013, alguns resultados da pesquisa realizada pela antropóloga Adriana Dias, como o aumento de sites neonazistas no Brasil, bem como o aumento do número de arquivos extremistas baixados em 6% ao ano, desde 2009.

            Ao longo de sete anos, mais de 150 mil arquivos de conteúdo nazista foram baixados no Brasil. Segundo a matéria jornalística, a pesquisadora sustenta e diz, palavras dela:

Um misto de despolitização da sociedade no período pós-ditadura e a transformação da política em escândalo por boa parte [...] [daqueles que têm direito a se pronunciar] são o ovo da serpente para a expansão de manifestações crescentes de caráter nazifascista na sociedade brasileira. A omissão sistemática das autoridades às agressões perpetradas contra homossexuais, negros, judeus, nordestinos, moradores de rua e imigrantes bolivianos [e venezuelanos] nas ruas de grandes centros urbanos completa o ciclo de terror que silenciosamente avança junto a um número nada desprezível de jovens brasileiros.

            Juventude negra covardemente assassinada. Parece-nos ocioso, Sr. José Medeiros, mencionar aqui todo o gigantesco conjunto de grupos extremistas que atuam em nossos dias.

            Poderíamos falar de Al-Qaeda; do Tea Party americano; do fundamentalismo; do jihadismo, no Oriente Médio; do populismo da extrema direita na Europa; do movimento anárquico dos Black Blocs; da violência de gênero em todo o mundo; do racismo e xenofobia; da intolerância religiosa e do antissemitismo. Cada um dos temas mencionados dá azo a reflexões intermináveis a respeito do discurso do ódio e da intolerância, bem como seus modos de ação, objetivos e violência perpetrada contra os alvos eleitos.

            A pontual incapacidade de diálogo no interior da sociedade, a dificuldade do capitalismo internacional de elevar todos os seres humanos às condições dignas de existência, os obstáculos reiterados à construção de ponte entre mulheres e homens...

            Aqui mesmo, Senador José Medeiros, cuidei de um projeto, que não é de minha autoria, é do Deputado Marçal, veio lá da Câmara, que dizia que a mulher tem direito a ganhar o mesmo salário que o homem se trabalhar na mesma função e tiver o mesmo poder, digamos, de produzir, enfim, naquela atividade. Faz dois anos que relatei o projeto, foi aprovado nas Comissões por unanimidade. Quando chegou ao plenário, houve um requerimento e mandaram o projeto para a Comissão de Infraestrutura, se não me engano. O que tem a ver infraestrutura com a questão de direitos humanos e direitos iguais entre homem e mulher?

            Mas, enfim, emparedados por muros psicológicos e retóricos, haverão de ceder à progressiva humanização do ser humano.

            Se continuarmos insistindo, como vou continuar na Comissão de Direitos Humanos, querendo que projetos como esse de direitos iguais para homens e mulheres venham a ser votados aqui, no plenário.

            É o exercício da linguagem, no espaço sagrado da política - isso aqui é um templo, queiram ou não alguns, do grande debate político - e o aprofundamento da educação dos povos que haverão de nos conduzir a um futuro de paz e harmonia entre todos.

            Mais uma vez voltamos a uma tecla em que todos batemos: investir na educação, investir na educação... E, por isso, faço essa homenagem aqui ao Sistema S do Senac, na próxima segunda-feira, 11 horas, que vai discutir naturalmente o ensino técnico, o Pronatec e os problemas que estamos tendo, inclusive, nesta área, eu, que tenho a formação técnica.

            Mas, Sr. Presidente, a Segunda Guerra Mundial projetou a sombra funesta do nazifascismo sobre ciganos, repito, dissidentes políticos, intelectuais, homens que deram a vida pela liberdade, judeus e, hoje, porque não falar, até mesmo os palestinos, e, também, espraiou-se pela Europa, em que mulheres e homens de imensa grandeza intelectual foram eliminados - como aconteceu recentemente, em que 11 foram eliminados por uma bomba - ou sofreram implacáveis perseguições, como poderíamos lembrar a situação de Hannah Arendt e Karl Jaspers.

            As dezenas de milhões de mortos, no que foi um dos mais trágicos capítulos da História da humanidade, fazem-nos lembrar a centralidade da política em nossas vidas e da necessidade de mantermos em nossas interações com o próximo o diálogo fundado no respeito mútuo, na politesse, na cortesia, na grandeza, na consideração pelo próximo, e de fazer-se ouvir e também falar. Ou seja, o parlamento é falar, é ouvir, é construir, é produzir, pensando no bem comum.

            Por isso, Sr. Presidente, Senador José Medeiros, repetiremos, por muitos séculos, as palavras do adorável vagabundo, o grande Charles Chaplin, que, no discurso do filme O Grande Ditador, conclama os soldados do exército do mal à sedição, e sua companheira Hannah ao soerguimento espiritual diz:

No décimo sétimo capítulo de São Lucas é escrito que o Reino de Deus está dentro do homem - não só de um homem ou de um grupo de homens, mas dos homens todos! Está em vós. Vós, o povo, tendes o poder - o poder de criar máquinas. O poder de criar felicidade! Vós, o povo, tendes o poder de tornar esta vida livre [libertária] e bela, de fazê-la uma [grande] aventura maravilhosa.

Portanto, em nome da democracia, usemos desse poder, unamo-nos todos nós. Lutemos por um mundo novo, um mundo bom que a todos assegure o ensejo do trabalho [da liberdade], que dê futuro à mocidade e segurança à velhice.

É pela promessa de tais coisas que [infelizmente alguns] desalmados têm subido ao poder. Mas só mistificam! Não cumprem o que prometem [à humanidade, e isso é lamentável].

Jamais o cumprirão! Os ditadores liberam-se, porém, escravizam o povo.

[Portanto] lutemos agora [Sr. Presidente] para libertar o mundo, abater as fronteiras nacionais, dar fim à ganância, ao ódio, à prepotência. Lutemos por um mundo de razão, um mundo em que a ciência e o progresso conduzam à ventura de todos nós. Soldados, em nome da democracia, unamo-nos.

            E alguém disse: “Trabalhadores do mundo, unam-se!”

            Aí lembro quando disse:

Hannah, estás me ouvindo? Onde te encontres, levanta os olhos! Vês, Hannah?! O sol vai rompendo as nuvens que se dispersam! Estamos saindo da treva para a luz! Vamos entrando num mundo novo, um mundo melhor, em que os homens estarão acima da cobiça, do ódio e da brutalidade.

Ergue os olhos, Hannah! A alma do homem ganhou asas e afinal [aprendeu e] começa a voar. Voa para o arco-íris, para a luz da esperança.

Ergue os olhos, Hannah! Ergue os olhos! [Fecho aspas, porque a citação não é minha.]

            Sr. Presidente, agora termino. Ao exercermos a política no presente e para além de toda e qualquer discórdia, cabe-nos evocar o que verdadeiramente está em jogo: o bem social; a harmonia; os direitos humanos; o equilíbrio dialógico no respeito às diferenças; a paz construtiva entre todos os brasileiros e os demais seres humanos; o imperativo da manutenção de espaços de liberdade - “liberdade, liberdade, abre as asas sobre nós!" - em que a voz nos seja a todos franqueada, e a franqueza e boa-fé conduzam nossas ações de forma coletiva, em nome dos mais legítimos interesses da nossa sociedade, da democracia, da justiça e da construção de políticas de igualdade.

            Era isso, Sr. Presidente, Senador José Medeiros. Quis fazer esse discurso, que é uma reflexão sobre a violência no mundo, as minhas preocupações, no sentido de que - oxalá! - a gente consiga fazer daquele espaço da Comissão de Direitos Humanos um local de um debate na visão de buscar o bem sem olhar a quem para a humanidade, não com o olhar focado somente no Brasil, mas em uma visão internacional. Nós todos temos compromisso e repito aquela frase que falei no meio do meu discurso: nós todos temos que contribuir muito pela democracia, pela liberdade, fazer o bem sem olhar a quem e garantir que as pessoas possam viver, envelhecer e morrer com dignidade. E, claro, a defesa do meio ambiente, de que falaram aqui outro dia, é fundamental também para que tudo isso aconteça.

            Obrigado, Senador José Medeiros, pela sua paciência e tolerância, ouvindo-me nesse longo pronunciamento. E, com muito orgulho, agora, quero ir à Presidência para ouvir V. Exa.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/02/2015 - Página 5