Pela Liderança durante a 31ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa do fim do uso indiscriminado da flexibilização das licitações pela Petrobras.

Autor
Ricardo Ferraço (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Ricardo de Rezende Ferraço
Casa
Senado Federal
Tipo
Pela Liderança
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA:
  • Defesa do fim do uso indiscriminado da flexibilização das licitações pela Petrobras.
Aparteantes
Antonio Carlos Valadares, Walter Pinheiro.
Publicação
Publicação no DSF de 19/03/2015 - Página 370
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA
Indexação
  • DEFESA, CESSAÇÃO, UTILIZAÇÃO, DECRETO FEDERAL, ASSUNTO, FLEXIBILIDADE, CONTRATAÇÃO, EMPRESA PRIVADA, PRESTAÇÃO DE SERVIÇO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), AUSENCIA, LICITAÇÃO, MOTIVO, FALTA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, AUMENTO, CORRUPÇÃO, DESVIO, DINHEIRO.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Maioria/PMDB - ES. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, Presidente desta sessão, Senadora Ana Amélia.

            Srªs e Srs. Senadores, nos últimos dias, nas últimas semanas, até mesmo em razão da intensificação desta complexa crise que o nosso País está vivendo - complexa porque traz a combinação das variáveis da crise política com as da crise econômica e a ausência de uma liderança que possa dar um rumo seguro ao nosso País -, a impressão que fica, sinceramente, é de um governo nas cordas, sitiado, sem propor um rumo claro e firme para o País.

            É nesse ambiente e nessas circunstâncias, Senador Garibaldi, nosso Presidente da Comissão de Infraestrutura, que nós estamos aqui a refletir sobre iniciativas concretas e efetivas que o Senado da República, ou até mesmo o Congresso Nacional, pode adotar para contribuir, além da retórica, além das palavras, para a construção de um ambiente mais saudável.

            O caso que trago aqui para a tribuna do Senado é um desses muitos e muitos projetos que tramitam pela Casa e que, surpreendentemente para nós, não ganham efetividade.

            Em 1998, Senadora Ana Amélia, o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, com o melhor dos propósitos, editou o Decreto nº 2.745 com o objetivo de flexibilizar o processo de compras e contratações de serviços por parte da Petrobras - a Petrobras necessitava disso em razão da concorrência pública, da competição estabelecida, porque esse é um setor que, por suas circunstâncias, exige velocidade para tomar a medida certa, para não chegar atrasado.

            Esse decreto criou, à época, flexibilidades para que a nossa Petrobras pudesse ser mais ágil. A Petrobras ganhava o mundo, se globalizava, crescia o seu papel e a sua importância não apenas no Brasil, mas em todo o mundo, como companhia global. Foi nesse período que a Petrobras e o arranjo do petróleo e do gás deixaram de representar alguma coisa muito próxima a 2% do Produto Interno Bruto para passarem a representar 10% do Produto Interno Bruto.

            Enfim, o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, com o melhor dos propósitos, editou esse decreto.

            Os mecanismos de flexibilidade desse decreto, Senador Valadares, que deveriam ser usados em condições excepcionais, em condições em que efetivamente fosse relevante o uso desses mecanismos, terminaram se desvirtuando ao longo do tempo e passaram a ser usados de maneira indiscriminada: o que era para ser exceção virou regra. Esses mecanismos contribuíram para uma série de irregularidades e abusos cometidos pelos gestores da empresa, como a formação do chamado “clube das empreiteiras”, que está sendo, efetivamente, denunciado pela Operação Lava Jato.

            Segundo levantamento recente realizado pelo jornal O Globo, a dispensa de licitação, a inexigibilidade e o convite foram as três principais formas de contratação feitas pela Petrobras ao longo dos últimos dez anos. Juntas, essas modalidades concentram 99% dos contratos de aquisição de bens, produtos e serviços por parte da Petrobras.

            A inexigibilidade ocorre quando a empresa contrata diretamente um fornecedor, mas precisa comprovar que só ele é capaz de entregar aquele serviço ou equipamento. Utiliza-se a dispensa de licitação, normalmente, quando a contratação se dá de forma direta e por motivos da mais absoluta urgência.

            No modelo ideal, as licitações de grande valor devem ser feitas por concorrência pública, na qual é admitida a participação de qualquer interessado que reúna as condições estabelecidas pelo edital, tudo, evidentemente, de forma absolutamente transparente. Porém, o que observamos na Petrobras é o uso - como disse e repito - indiscriminado da modalidade convite, que carece minimamente de dois princípios básicos por parte da Administração Pública: a impessoalidade e a transparência.

            Na licitação da modalidade convite, a Petrobras não é obrigada a divulgar o edital nem a aceitar propostas de qualquer interessado. Ela decide, a seu critério, quem pode se candidatar para realizar aquele tipo de serviço ou adquirir aquele tipo de equipamento ou produto. Daí abre-se espaço para que criminosos infiltrados na nossa maior e mais importante empresa tirem a Petrobras da grande relevância que tem para a nossa economia e a levem para as páginas policiais.

            No intervalo de quase dez anos, quase R$220 bilhões em contratos da estatal foram disputadas apenas por um grupo restrito de fornecedores. Esse montante representa mais de 60% de todas as compras feitas pela Petrobras entre 2003 e 2012, quando ocorreram os atos de delinquência institucionalizada de que estamos tomando conhecimento, por parte da Operação Lava Jato.

            Estamos, portanto, Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, diante de um exemplo clássico de superdosagem. Aquilo que separa o remédio do veneno, o excesso e o uso na dose. A exceção virou regra e abriu espaço para a formação de um esquema bilionário de corrupção, desvios e todo o tipo de prática lesiva ao patrimônio da nossa Petrobras, da Petrobras que pertence a todos os brasileiros.

            Chamam a atenção ainda, Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os diversos acórdãos do Tribunal de Contas da União, órgão de controle que tem, a cada momento, ampliado a sua participação e o seu papel na condução do controle das contas públicas.

            O Tribunal de Contas já tomou inúmeras decisões contrárias aos processos licitatórios da Petrobras. De acordo com o órgão, o regime simplificado de licitações permite a empresa tomar uma série de atos de flexibilização desnecessários. Ou seja, há dez anos, o Tribunal de Contas emite acórdãos, conclusões, consagrando que a Petrobras deve alterar esse modelo e essa conduta...

(Soa a campainha.)

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Maioria/PMDB - ES) - ... de não se prevalecer da concorrência pública, da melhor competição para a contratação de produtos, serviços e fornecedores, e assim por diante.

            A Petrobras foi ao Supremo Tribunal Federal para que o Supremo Tribunal Federal mantivesse o direito de ela continuar atuando dessa forma.

            Por isso mesmo, Srª Presidente, é que nós adotamos a iniciativa em linha com os fundamentos e o conteúdo das ações do Tribunal de Contas da União, que apresentamos, no âmbito da Comissão de Constituição e Justiça. E fizemos isso ainda no mês de outubro de 2014, quando tomamos conhecimento desse conjunto de denúncias da Operação Lava Jato. Apresentamos, na Comissão de Constituição e Justiça, o Decreto Legislativo nº 197,...

(Soa a campainha.)

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Maioria/PMDB - ES) - ... com o objetivo de sustar os efeitos do Decreto nº 2.745, no instante em que estamos constituindo a nossa Comissão de Constituição e Justiça. Elegemos o Senador José Maranhão para nos conduzir, para coordenar nosso trabalho na Comissão. Faz-se inadiável que a Comissão de Constituição e Justiça, como primeiro passo, realize esse debate. É o que pleitearemos ao Presidente da Comissão, o Senador José Maranhão: que, na primeira reunião, possamos deliberar e debater acerca da oportunidade e da tempestividade desse decreto legislativo, a fim de dar um freio de arrumação e de colocar um ponto final no uso dessas alternativas, que eram para ser exceções e se transformaram em regra.

(Soa a campainha.)

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Maioria/PMDB - ES) - No momento em que vamos iniciar os trabalhos na Comissão de Constituição e Justiça, revelo minha expectativa e minha confiança de que a Comissão de Constituição e Justiça dará o primeiro passo para que possamos deliberar sobre isso. E, em segundo lugar, que possamos, aqui no plenário, deliberar sobre a necessidade desse decreto legislativo, que é uma prerrogativa, Srª Presidente, constitucional do Senado da República, para sustar os efeitos desse decreto que está na origem, no núcleo das delinquências que observamos nos últimos meses, que são de conhecimento público, considerando as investigações que estão sendo conduzidas de maneira adequada pela Procuradoria-Geral da República, pela Polícia Federal e pelos órgãos de controle.

(Soa a campainha.)

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Maioria/PMDB - ES) - Considero absolutamente inadequado responsabilizar o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, porque quando se editou esse decreto, Senador Walter Pinheiro, foi para dar condições de melhor competição à Petrobras. Mas, infelizmente, o lamentável é que o que era para ser exceção virou regra, e 90% dos contratos de serviços e produtos, para fornecedores em geral da Petrobras, não estão submetidos à regra da melhor concorrência e da melhor competição.

            Ouço, com prazer, o Senador Walter Pinheiro.

            O Sr. Walter Pinheiro (Bloco Apoio Governo/PT - BA) - Senador Ferraço, eu quero buscar contribuir. Concordo com V. Exª pelo seguinte: a tese do passado de que nós precisávamos fazer isso para introduzir a Petrobras num cenário de competitividade não se aplica mais para hoje porque essa Petrobras, pelo menos era o que havia inclusive a partir do que se avançou em inovação...

(Soa a campainha.)

            O Sr. Walter Pinheiro (Bloco Apoio Governo/PT - BA) - ... em novas ferramentas, enfim, ganhou competitividade no mundo. Portanto, esse cenário do passado não se aplica. E mais - e aí concordo plenamente com V. Exª -: o que era para ser um facilitador para a competitividade terminou sendo usado como um facilitador para caminhos tortuosos. A Petrobras já tem condições hoje de disputar mercado. Então, vamos devolver a regra rígida e dura, garantindo que a Petrobras continue tendo competitividade, mas assegurando que nós teremos transparência e, principalmente, combate à corrupção.

            O Sr. Antonio Carlos Valadares (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - SE) - Senador Ferraço.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Maioria/PMDB - ES) - Senador Valadares, ouço V. Exª com enorme prazer.

            A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Apoio Governo/PP - RS) - É claro que eu informo que o Senador Ferraço está falando pela Liderança do PMDB. A liberação para o aparte do Senador Walter Pinheiro se justifica porque ainda não demos início da Ordem do Dia.

            Senador Valadares, da mesma forma que foi concedido o aparte ao Senador, V. Exª tem a liberdade também de fazer um aparte ao Senador Ferraço porque estamos aguardando, e a situação e os temas abordados são relevantes. Penso que o Regimento deixa de ter validade nesta circunstância. Por isso, tem V. Exª toda a liberdade do aparte ao Senador Ferraço.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Maioria/PMDB - ES. Fora do microfone.) - Agradecemos a benevolência de V. Exª.

            O Sr. Antonio Carlos Valadares (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - SE) - Agradeço a V. Exª. Senador Ferraço, V. Exª fez um histórico firme, um histórico justo e equidoso sobre esse processo de licitação que foi modificado no governo de Fernando Henrique Cardoso, naturalmente agindo com a maior boa-fé, mas que não deu certo em virtude dos acontecimentos que são públicos. Inclusive ficamos admirados que um simples diretor tivesse tanta autoridade para traçar planos e também executar esses planos na construção de grandes projetos como, por exemplo, uma refinaria.

(Soa a campainha.)

            O Sr. Antonio Carlos Valadares (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - SE) - O Presidente da Petrobras tinha uma ação, a meu ver, bloqueada em razão dessa autonomia, dessa independência de diretores, que agiam de uma forma que nenhum secretário de Estado age, nenhum ministro de Estado age, isto é, sem obediência aos trâmites burocráticos que são normais em qualquer entidade de governo, de não apenas uma diretoria tomar conhecimento da profundidade dos projetos, mas toda uma estrutura do ministério, da secretaria, toda essa estrutura se envolve diretamente na realização, na elaboração e na execução desse projeto. Portanto, quero dizer que V. Exª fez um histórico importante para que o público que acompanha...

(Soa a campainha.)

            O Sr. Antonio Carlos Valadares (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - SE) - ... nossos trabalhos possa atinar sobre a evidência dos erros que foram cometidos em razão de uma simples modificação na Lei das Licitações. 

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Maioria/PMDB - ES) - Encerrando, Srª Presidente.

            Este é o fato, Senador Valadares: nos últimos dez anos, a Petrobras contratou R$220 bilhões sem passar pelo critério da concorrência pública, utilizando-se desse decreto. Não há outro caminho a não ser nos valermos das prerrogativas constitucionais e aprovarmos um decreto legislativo para sustar os efeitos desse decreto, de modo a dar uma arrumação, porque esse decreto foi feito, eu disse aqui duas ou três vezes, para ser usado em casos excepcionais. O que era exceção virou regra.

            Não há outro caminho para o Senado que não sustar os efeitos desse decreto, para que possamos dar a contribuição no processo de reconstrução da nossa Petrobras.

            Muito obrigado, Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/03/2015 - Página 370