Discurso durante a 26ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Denúncias contra empresa de mineração que atua no Estado do Amapá.

Autor
Randolfe Rodrigues (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/AP)
Nome completo: Randolph Frederich Rodrigues Alves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MINAS E ENERGIA:
  • Denúncias contra empresa de mineração que atua no Estado do Amapá.
Publicação
Publicação no DSF de 11/03/2015 - Página 530
Assunto
Outros > MINAS E ENERGIA
Indexação
  • COMENTARIO, HISTORIA, EXTRAÇÃO, MINERIO, AMAPA (AP), DENUNCIA, EMPRESA DE MINERAÇÃO, ATUAÇÃO, REGIÃO, MOTIVO, PARALISAÇÃO, SERVIÇO, SONEGAÇÃO, PAGAMENTO, IMPOSTOS, FECHAMENTO, EMPRESA, PREJUIZO, POPULAÇÃO, REFERENCIA, AUMENTO, DESEMPREGO, PERIGO, DESASTRE, MEIO AMBIENTE, SOLICITAÇÃO, ABERTURA, INVESTIGAÇÃO, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL, POLICIA FEDERAL, OBJETIVO, PUNIÇÃO, PESSOAS, RESPONSAVEL.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Socialismo e Democracia/PSOL - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Reguffe, pelo Distrito Federal; senhores, senhoras, todos os que nos ouvem pela TV e pela Rádio Senado, venho à tribuna para denunciar um fato grave e procedimentos recentes de uma empresa que atua no segmento de minério de ferro no Estado do Amapá.

            Antes de detalhar o que eu considero graves irregularidades, ilegalidades e crimes praticados por essa empresa, é importante mostrar a relevância histórica da extração do minério de ferro no Amapá.

            O segmento da extração mineral é o mais relevante da economia amapaense. Eu diria, Sr. Presidente, mais que isso, o Amapá tem sua origem como Território Federal e desmembramento do então Estado do Pará vinculada à exploração mineral.

            Foi em 1943 que o Sr. Mário Cruz utilizava grandes rochas brilhantes e pesadas como lastro em sua embarcação, recolhidas então no Rio Amapari. Essas pedras eram o manganês de alto teor. Logo foi descoberto seu alto valor no mercado internacional, visto que, naquele período da Guerra Fria, o conflito entre Estados Unidos e União Soviética exigia a utilização da matéria-prima de manganês para a indústria bélica e para um conjunto de outras necessidades.

            Portanto, Sr. Presidente, foi após um processo licitatório que se estabeleceu, lá no Amapá, o primeiro grande projeto mineral da Amazônia, não só do Amapá. Foi a Indústria e Comércio de Minérios (Icomi), testa de ferro da British Steel Corporation.

            Essa empresa, Sr. Presidente, construiu uma vila, no padrão norte-americano, no coração da Floresta Amazônica, a Vila de Serra do Navio. Até o ano de 1997, explorou e exportou do Amapá 50 milhões de toneladas de manganês, o que exauriu a mina do metal localizada na região do Amapari, na região onde hoje estão os Municípios de Serra do Navio e Pedra Branca.

            Ocorre, Presidente, que, no subsolo do Amapá, não havia apenas manganês. Ali está situada uma riquíssima província mineral, com a ocorrência comprovada de ouro, minério de cromo, tantalita e muitos outros.

Então, além desses minérios, temos o minério de ferro, tema central da denúncia e do pronunciamento que faço agora.

            Em 2007, a exploração mais efetiva do minério de ferro se dá no Amapá sob a responsabilidade da empresa MMX, cujo sócio majoritário é muito conhecido dos brasileiros, o Sr. Eike Batista. Além dos direitos sobre os minérios, a MMX tornou-se concessionária da Estrada de Ferro do Amapá, que interliga a mina, baseada em Serra do Navio e Pedra Branca do Amapari, ao porto na cidade de Santana, bem como assumiu o controle do porto de minérios localizado na cidade de Santana. As estruturas de logística da mina e do porto foram anteriormente construídas pela Icomi.

            Em fevereiro de 2008, Sr. Presidente, a empresa Anglo American - uma das maiores empresas do ramo da mineração do mundo, com atuação nos cinco continentes, que emprega, no Planeta todo, um exército de 150 mil empregados - adquiriu da MMX as operações minerais do Amapá, em conjunto com o Sistema Minas-Rio, pagando, por tudo isso, o valor de US$5,5 bilhões.

            Diga-se de passagem, Sr. Presidente, que a Anglo American nunca escondeu que seu maior interesse no País era o projeto no sudeste brasileiro, esse projeto situado nos Municípios mineiros e fluminenses.

            Mesmo assim, o período da Anglo American foi o mais produtivo da história da produção de ferro no Amapá, com mais de 18 milhões de toneladas exportadas e receitas superiores a US$1,5 bilhão entre os anos de 2009 e 2013.

            A partir de 2013, a empresa começou a ter desinteresse pela exploração mineral no Amapá. Em meados de 2012, a Anglo American anunciou que não mais prosseguiria com as operações no Amapá, alegando que eram muito pequenas para o porte da empresa, e colocou à venda os seus ativos no Estado. Aí começa a mais grave crise da produção ferrífera do Amapá, que é responsável por 92% da nossa pauta de exportações.

            Logo após o anúncio da venda, ao final do ano de 2012, uma empresa declarou o interesse na aquisição do espólio da Anglo American, a Zamapá, do grupo Zamin, que já operava anteriormente uma pequena mina de ferro no Município de Tartarugalzinho e tinha desativado outra mina anteriormente.

            Ocorre, Sr. Presidente, que a Zamin só fecharia o negócio se já estivesse de posse da concessão da ferrovia, fator vital para a viabilidade do empreendimento. É importante destacar que essa ferrovia foi objeto de uma operação da Polícia Federal em 2008, conhecida como Operação Toque de Midas, que envolveu a empresa MMX e que teve uma série de apreensões no escritório da MMX do Rio de Janeiro. Porém, Sr. Presidente, antes de ser sacramentado este negócio, aconteceu, em 28 de março de 2013, uma tragédia: o porto fluviante utilizado para escoamento de minérios pela, então, Anglo American afundou num acidente que vitimou a morte de seis operários.

            Ocorre que até hoje as famílias dos operários não foram devidamente indenizadas. Ocorre que até hoje as circunstâncias deste acidente não foram esclarecidas. E aí há uma clara irresponsabilidade da empresa que, então, estava, que era a Anglo American, e uma responsabilidade concedente à empresa que a sucedeu, que é a Zamin.

            Este incidente, acidente, acabou atrasando o negócio, mas, posteriormente, a Zamin do Brasil adquiriu 100% do Sistema Amapá da Anglo American, em 1º de novembro de 2013. O valor da compra informado foi de US$135 milhões, através de empréstimo junto ao banco italiano Intesa Sanpaolo. Uma operação, Sr. Presidente, que chamou atenção e causou espécie no mercado internacional.

            Mas, senhores, senhoras, essa operação tendo-se concluído, tendo-se concretizado, a empresa Zamin tendo fechado a transação por um preço justo e descontando do valor o custo da construção do porto, era sua responsabilidade a manutenção das atividades de lavra, transporte, exportação e a manutenção da exportação em andamento, além da contratação da imediata reconstrução do porto. Lamentavelmente, senhoras, senhores, não foi isso que aconteceu. Em abril de 2014, menos de cinco meses após assumir a operação, a Zamin anunciou a paralisação da exploração do minério de ferro da mina de Pedra Branca do Amapari, e o motivo alegado foi o esgotamento da capacidade de estoque, o que não permitiria prosseguir a lavra, uma vez que a velocidade de escoamento para exportação foi comprometida após o acidente do porto de minérios.

            A paralisação inicialmente anunciada por um período de 90 dias - isso ocorreu cinco meses após o início da atividade - perdura até os dias de hoje. Com isso, são 700 empregos diretos, os 1.700 empregos terceirizados e os mais de 5 mil postos de trabalho indiretos foram extintos, causando impacto fortíssimo na economia local e levando a uma crise gravíssima de desemprego nas cidades de Pedra Branca do Amapari e Serra do Navio.

            Há indícios, Sr. Presidente, de que a empresa Zamin não estava com boas intenções para o Amapá, e esses indícios podem ser confirmados com a sua postura de inadimplência contumaz. Desde os primeiros dias de sua operação, a Zamin começou a acumular dívidas junto a fornecedores e ao fisco. Há casos de faturas vencidas em janeiro de 2014, ou seja, que já completaram um ano, somente dois meses após a aquisição dos ativos, e que ainda não foram pagas. Estima-se que a soma das faturas em aberto no mercado local a fornecedores amapaenses alcance a cifra de R$190 milhões de dívidas da Zamin só no mercado local, só no Amapá.

            A empresa, então, comete calote aos fornecedores, deixa de recolher FGTS e INSS dos trabalhadores, e provoca também calote no Poder Público estadual e no Poder Público municipal, com a ausência de pagamento do ICMS e do ISSQN. A ausência do pagamento deste último provocou e agravou a penúria dos cofres já carentes do Município de Pedra Branca do Amapari, além de ter trazido - eu reitero - o gravíssimo dano social de mais de 1,7 mil empregos terceirizados e outros 700 diretos que foram abandonados.

            Além disso, Sr. Presidente, a empresa tinha assumido uma compensação financeira pela exploração dos recursos minerais. Essa compensação é de aproximadamente R$700 mil, e não foi paga até agora.

            A Zamin também não tem pagado e não tem contribuído para o Fundo de Compensação Ambiental, mecanismo criado para apoiar projetos de desenvolvimento sustentável e para minimizar os impactos da exploração mineral nos Municípios de Pedra Branca e Serra do Navio. Esse é outro calote, no valor de R$4 milhões. Então, temos a isso somado o caos proporcionado por essa empresa, Sr. Presidente: não pagamento dos salários dos fornecedores, não pagamento de tributos, não pagamento dos trabalhadores, não pagamento dos compromissos assumidos que minimizavam o impacto ambiental na região.

            Além de tudo isso, circula a informação de que aproximadamente 4,5 milhões de toneladas de minérios, já lavrados e estocados, estão vendidos, e a Zamin já teria recebido vultoso adiantamento sobre essa venda antecipada. Mesmo tendo recebido esse dinheiro, Sr. Presidente, não pagou, como deveria ter pagado à comunidade local, aos Municípios, não pagou aos trabalhadores.

            Além disso, deixa uma herança ambiental. Há um passivo ambiental, há um risco grave de acidente ambiental na área da mina, em especial na área da barragem de contenção, que, em caso de rompimento ou simples transbordamento, provocaria um desastre que comprometeria todo o ecossistema da Bacia do Amapari, do Rio Amapari. Corremos o risco, Sr. Presidente, de ter um dos maiores desastres ambientais da Amazônia, um dos maiores desastres ambientais do Brasil nos últimos anos, se essa barragem de minérios estourar e desaguar no Rio Amapari. Tudo por conta da irresponsabilidade dessa empresa! Faço questão de deixar este alerta aqui às autoridades do meu Estado e às autoridades brasileiras.

            Apesar disso, apesar da gravidade das denúncias que aqui trago, o proprietário dessa empresa, um megaempresário indiano de nome Pramod Agarwal, parece que zomba da situação em que deixou o Amapá. Recentemente, ele fez um casamento de luxo para sua filha, em Veneza, para um grupo seleto de 800 convidados, com direito a desfile de elefantes, cavalos na decoração e um show exclusivo da cantora colombiana Shakira. Por outro lado, o povo amapaense fica com a miséria e com as dívidas herdadas por essa empresa.

            Portanto, Sr. Presidente, senhoras e senhores, essa empresa, que tem uma atuação parasita em nosso Estado, deve explicações ao povo do Amapá e deve explicações às autoridades brasileiras. Por isso, representei ao Ministério Público Federal contra essa empresa.

            Essa semana, há duas semanas, perdão, mais uma desgraça ocorre. A Estrada de Ferro do Amapá, a única ferrovia do Estado, que foi concedida a essa empresa, teve suas atividades paralisadas, quando um grupo de agricultores vinha de Serra do Navio até o Município de Porto Grande. O trem foi simplesmente paralisado - perdão, vinha de Serra de Navio até o Município de Santana -, a atividade da Estrada de Ferro do Amapá foi paralisada, deixando os agricultores abandonados no Porto de Santana, fazendo com que eles só retornassem a seus locais de origem dois dias após. Isso sem nenhuma explicação prévia às autoridades do Amapá, às autoridades federais; sem nenhum tipo de explicação, por parte da empresa que era dona da concessão da ferrovia, que é essa funesta empresa Z Mineração, conhecida como Zamin.

            Sr. Presidente, para concluir, eu espero, a partir dessas denúncias que aqui trago, um conjunto de providências: providências do Ministério Público Federal, da Policia Federal, do Ministério Público do meu Estado, que já está investigando há algum tempo, mas providências dessas instituições, do Ministério Público Federal e da Policia Federal em especial, para investigar o possível crime de evasão de divisa cometido por essa empresa. Providência por parte do Governo do meu Estado para que não titubeie em caçar de imediato, era para ser ontem, já está atrasado, a concessão da Estrada de Ferro do Amapá, dessa empresa, e realizar um novo processo licitatório para que outra assuma a concessão da Estrada de Ferro do Amapá. Não é aceitável a posse e o poder concedente do Estado ainda deixar a concessão da Estrada de Ferro nas mãos de uma empresa que tem cometido tantos crimes contra o povo amapaense.

            E, por fim, que essa empresa seja responsabilizada por todas as autoridades. Em especial, que seja impedido que a mina de minério, que ainda não foi explorada em Serra do Navio, seja explorada, e que esse minério seja bloqueado em Serra do Navio, para termos um mínimo de bens dessa empresa, um mínimo possível de bens dessa empresa, para sanar os crimes e as dívidas que ela tem com o povo amapaense.

Espero, Sr. Presidente, essas providências mínimas, porque não é aceitável o povo amapaense, a população de Pedra Branca, Serra do Navio e Santana estar na miséria absoluta, estar endividada, e esta empresa não ser responsabilizada por nenhum dos seus crimes.

            Obrigado, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/03/2015 - Página 530