Discurso durante a 26ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários sobre a instalação da Comissão Mista de Combate à Violência Contra a Mulher; e outros assuntos.

Autor
Ângela Portela (PT - Partido dos Trabalhadores/RR)
Nome completo: Ângela Maria Gomes Portela
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS E MINORIAS:
  • Comentários sobre a instalação da Comissão Mista de Combate à Violência Contra a Mulher; e outros assuntos.
Publicação
Publicação no DSF de 11/03/2015 - Página 535
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS E MINORIAS
Indexação
  • ELOGIO, INSTALAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, COMISSÃO MISTA, COMBATE, VIOLENCIA, VITIMA, MULHER, DEFESA, IMPORTANCIA, SOCIEDADE, OBJETIVO, REDUÇÃO, DISCRIMINAÇÃO SEXUAL, VIOLENCIA DOMESTICA, COMENTARIO, HISTORIA, CRIAÇÃO, PROGRAMA DE GOVERNO, LEI FEDERAL, REFERENCIA, PROMOÇÃO, ASSISTENCIA MEDICO SOCIAL, ASSISTENCIA JURIDICA, FAVORECIMENTO, SEXO, FEMINISMO.

            A SRª ANGELA PORTELA (Bloco apoio Governo/PT - RR. Sem apanhamento taquigráfico.) - Srªs Senadoras, Srs. Senadores, mulheres brasileiras.

            O Senado Federal deu hoje (10), um passo à frente na luta pelo combate à violência doméstica e de gênero, ao instalar a Comissão Mista de Combate à Violência Contra a Mulher. Esta Comissão é um dos desdobramentos da Comissão Parlamentar de Inquérito Mista da Violência Contra a Mulher (CPMICVM) que investigou casos de agressões relacionadas à questão de gênero no Brasil, apurou denúncias de omissão do Poder Público, em relação à aplicação da lei e fez uma série de recomendações às autoridades dos três poderes instituídos.

            Evento que marcou a passagem no último domingo (08), do histórico Dia Internacional da Mulher, a solenidade de hoje contou com presença do Ministro da Saúde, Arthur Chioro, que destacou a importância desta comissão para atuar, em sintonia com o Governo Federal, na luta pelo enfrentamento à violência contra a mulher, que é também, um problema de saúde pública e que como tal, afeta a administração pública brasileira.

            Composta por 10 senadores e 27 deputados federais, a Comissão Permanente, ora instalada, terá duas missões básicas, a saber: apresentar propostas voltadas à consolidação da Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres e identificar possíveis falhas nas ações e serviços da Seguridade Social e da segurança pública bem como na área jurídica.

            A instalação desta nova comissão simboliza nossa resistência em aceitarmos as coisas como são, e marca nossa posição diante de um problema que é global e que no Brasil é determinante para a segurança da vida em sociedade.

            Impõe, desse modo, a importância da nova comissão, diante de alguns fatores, como a freqüência com que os casos estão ocorrendo; os graus de brutalidade neles aplicados e as repercussões que estão a provocar, exigindo ação concreta do Poder Público.

            O Mapa da Violência 2012 revelou que de 1980 a 2010, foram assassinadas no Brasil quase 91 mil mulheres, das quais 43,5 mil somente na última década. De 1996 a 2010 as taxas ficaram em torno de 4,5 homicídios para cada 100 mil mulheres. São dados estarrecedores.

            O meu Estado de Roraima, por exemplo, aparece no Mapa da Violência de 2012, em 13° lugar entre as unidades federativas mais violentas, no período. O estudo aponta que Roraima tem uma taxa de homicídio de mulheres, 5,0 por 100 mil, o que está acima da média nacional. Na capital, Boa Vista essa taxa sobe para 5,6 assassinatos para cada grupo de 100 mil mulheres, o que coloca aquela capital, na 18a posição entre as mais violentas do País, em homicídios de mulheres.

            Dados mais recentes, divulgados pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) indicam que entre 2009 e 2011 ocorreram mais de 5.500 mortes de mulheres no país, o que significa 472 por mês e 15 a cada dia. São estatísticas estarrecedoras.

            Produto de uma construção histórica, que se norteia por questões sociais, biológicas e culturais, a violência contra as mulheres está diretamente ligada a uma questão de poder. Ou seja: guarda ligação direta com as questões de gênero e raça/etnia, contexto em que há relações de poder. A compreensão patriarcal de que os homens exercem poder e controle sobre as mulheres propicia, na maioria das vezes, a prática dos casos de violência - doméstica, sexual, psicológica e emocional.

            Ao longo da história da humanidade, a construção da mulher, como mera procriadora, idealizada e praticada tanto por religiões, como por outros pilares, entre eles, a medicina e a política, sempre negou, a nós, mulheres, a condição de sujeito político. Esta concepção, fez com que, por séculos, prevalecesse a crença da existência de um modelo de sexo único, o masculino, com sua supremacia.

            Mas no curso história, as mulheres reagiram à condição de subalternidade e passaram a lutar pelos seus direitos e sua cidadania. Neste contexto surge a luta de combate à violência contra o sexo feminino. Tal fato se dá diante do histórico de violências contra as mulheres, que o Brasil tem, com assassinatos rodeados de mistérios e requintes de crueldade, que, via de regra, sempre foram tratados como assunto de ordem privada.

            Entre fins da década de 1970 e durante a década de 1980, mulheres e feministas passaram a lutar por medidas e políticas públicas de combate frontal à violência contra a mulher. Desde então, os avanços da luta das mulheres pelos seus direitos, estão presentes na esfera do poder público, por meio de uma série de instrumentos, ações estratégicas, medidas protetivas e infraestrutura institucional; algumas das quais já consolidadas na estrutura do Estado Brasileiro.

            Em 1985, foi implantado o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher e criada a primeira Delegacia de Defesa da Mulher (DDM); uma iniciativa pioneira que passou a ser adotada por outros países da América Latina.

            Nas últimas três décadas, com o recrudescimento da violência doméstica em nosso país, governos municipais, estaduais e federal têm adotado medidas protetivas e de enfrentamento a esta modalidade de violência.

            Na esfera federal, a criação da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República (SPM-PR), a implantação do Plano Nacional de Enfrentamento à Violência Contra a Mulher e a Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, são algumas delas.

            Destaco, por oportuno, a Lei Maria da Penha (11.340/2006), já considerada a mais importante de todas as medidas protetivas do mundo, com relação à violência contra a mulher. De forma inédita, esta lei reconhece a obrigação do Estado em garantir às mulheres a segurança, tanto no espaço público como no âmbito de sua privacidade, o lar, a moradia.

            Esta lei, como conferem os nobres colegas, a Lei Maria da Penha foi aprovada pelo Congresso Nacional, depois de um longo e rico processo de discussão, e sancionada pela Presidência da República, em 2006. Logo que entrou em vigência, esta lei elevou em cerca de 600%, o número de relatos de casos de agressões contra mulheres, conforme registros do Ligue 180.

            Nove anos depois da implantação da Lei Maria da Penha, sua efetividade mostra-se de forma ainda mais concreta em estudos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) que acaba de ser divulgado e revela que a Lei Maria da Penha reduziu em cerca de 10% a taxa de homicídio contra as mulheres praticados dentro do espaço do lar.

            Encontrados a partir de dados obtidos pelo Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, o índice do Ipea é significativo, pois mostra a efetividade da nova lei, mesmo diante do fato de que o combate à violência contra a mulher ainda enfrenta obstáculos como a desigualdade na institucionalização dos serviços protetivos às vítimas.

            Lançado pela presidenta Dilma Rousseff em 2013, e transformada em Programa de Governo, o "Mulher, Viver sem Violência" é mais um mecanismos destinados a proteger as mulheres. Este programa visa integrar e ampliar os serviços públicos existentes voltados às mulheres em situação de violência. Os atendimentos se dão por meio da ação articulada no âmbito da saúde, justiça, segurança pública, rede socioassistencial e promoção da autonomia financeira das vítimas. 

            O programa conta com a adesão dos 26 Estados e do Distrito Federal e nele consta a criação em cada unidade da federação, da Casa da Mulher Brasileira, destinado a reunir todos os serviços de atendimento à mulher Estes serviços vão desde acolhimento e triagem, até a promoção da autonomia econômica, passando pelo apoio psicossocial, alojamento e transportes.

            Em Roraima, onde a taxa de violência contra as mulheres está acima da média nacional, nossa expectativa é de que a Casa da Mulher Brasileira mude este cenário de horrores, acolhendo 'mais e melhor a população de mulheres em situação de violência. Isto, porque, senhores senadores, estas mulheres não contaram, em governos passados, com este importante apoio quando foram vítimas de espancamentos, lesões corporais, estupros e risco de morte.

            No Poder Judiciário, a criação de varas e juizados especiais para tratar especificamente desse assunto bem como de secretarias especiais ou coordenações de mulheres em alguns Estados e municípios do país, são motivo de alegria para nós, que assumimos esta luta.

            Este Congresso Nacional tem participação direta no processo de discussão, para a criação e adoção de medidas protetivas para as mulheres. Além de garantir toda a discussão que culminou com a criação e sanção da Lei Maria da Penha, o Senado tem avançado no enfrentamento a este problema social.

            A Lei do Feminicídio, sancionada ontem (09), pela Presidenta Dilma Rousseff, teve início aqui nesta Casa Política. No final de 2014, o plenário do Senado aprovou a proposta de inclusão no Código Penal, do Feminicídio como circunstância qualificadora de homicídio e o inclui no rol de crimes hediondos. O Feminicídio, que é o crime de homicídio contra a mulher em condição de violência pela simples razão de a vítima ser mulher, já está incorporado às legislações penais de vários países da América Latina e da América Central. No Brasil esta lei torna o assassinato contra as mulheres crime hediondo, por força do protagonismo da bancada feminina do Congresso nacional que assumiu o desafio de promover este debate.

            Aprovamos, também, nesta Casa outras proposituras de combate à violência a mulher, como o projeto de lei (n° 7371/2014) que cria o Fundo Nacional de Enfrentamento à Violência Contra as Mulheres, também resultante dos trabalhos da CPMI, já mencionada.

            Como podemos constatar, apesar de já termos conquistado muitos instrumentos, políticas públicas, infelizmente, constatamos que ainda teremos caminhos longos nesta empreitada. Portanto, a criação e instalação da Comissão Permanente Mista de Combate à Violência contra a Mulher é mais um tijolo neste processo, que já conta com planos, programas, políticas públicas, ações estratégicas, delegacias, varas e juizados especiais. Mas não vamos esmorecer.

            Caminhemos, pois, juntos, homens e mulheres, com o mesmo objetivo: superarmos o maior problema social, cultural, político, administrativo e de saúde pública que a violência contra a mulher e que nos atinge como pessoas privadas e públicas.

            Era o que tinha a dizer! Muito obrigada.

 

            O SR. PRESIDENTE (Reguffe. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Não havendo mais o que tratar, encerro esta sessão.

            (Levanta-se a sessão às 21 horas e 13 minutos.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/03/2015 - Página 535