Discurso durante a 43ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Solicitação de apoio para a aprovação do Projeto de Lei nº 388, de 2014, de autoria de S. Exª, que suprime a participação do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) no parcelamento do solo urbano; e outros assuntos.

Autor
Acir Gurgacz (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RO)
Nome completo: Acir Marcos Gurgacz
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FUNDIARIA:
  • Solicitação de apoio para a aprovação do Projeto de Lei nº 388, de 2014, de autoria de S. Exª, que suprime a participação do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) no parcelamento do solo urbano; e outros assuntos.
Publicação
Publicação no DSF de 07/04/2015 - Página 40
Assunto
Outros > POLITICA FUNDIARIA
Indexação
  • COMENTARIO, PROGRAMA, TELEVISÃO, EMISSORA, RIO DE JANEIRO (RJ), ASSUNTO, DISCUSSÃO, DESENVOLVIMENTO, ATIVIDADE COMERCIAL, REGIÃO AMAZONICA, SOLICITAÇÃO, APOIO, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, OBJETO, SUPRESSÃO, PARTICIPAÇÃO, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), PARCELAMENTO, SOLO URBANO, TRANSFERENCIA, UNIÃO, DESTINAÇÃO, ESTADOS, MUNICIPIOS, PROPRIEDADE, TERRAS, ZONA RURAL, PROXIMIDADE, ZONA URBANA, OBJETIVO, FAVORECIMENTO, POPULAÇÃO, AGILIZAÇÃO, RECEBIMENTO, TITULO, POSSE, REGULARIZAÇÃO, PROCESSO, DEMARCAÇÃO.

O SR. ACIR GURGACZ (Bloco Apoio Governo/PDT - RO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do

orador) - Sr. Presidente, nosso sempre Ministro de Estado, nossos amigos que nos acompanham pela TV Sena- do, pela Rádio Senado, meus amigos e minhas amigas Senadoras, tenho usado esta tribuna, sistematicamen- te, para falar sobre a importância de nossa Amazônia. A Amazônia que precisamos conservar, a Amazônia que está produzindo, a Amazônia que já abriga 25 milhões de brasileiros e que quer continuar produzindo, mas sem deixar de lado a preocupação com o meio ambiente. Nós, da Amazônia, queremos nossa Amazônia cres- cendo, produzindo alimentos, mas cuidando das nossas reservas, cuidando das nossas reservas. É assim que nós fazemos, principalmente no Estado de Rondônia.

    Nesses últimos finais de semana, o programa Fantástico, da Rede Globo, está exibindo uma série de reportagens, intituladas: Amazônia, Sociedade Anônima. As matérias revelam o que sugere o título, ou seja, uma Amazônia empreendedora, que cresce e que se desenvolve com a força do trabalho dos pioneiros, dos migrantes, dos agricultores, dos trabalhadores, dos empresários que abriram essa nova fronteira agrícola no meio da floresta amazônica e, com muita garra e determinação, estão contribuindo para o crescimento e para o desenvolvimento do nosso País.

    No capítulo exibido na semana passada, a forma da Amazônia foi retratada através de uma visão sim- plista da luta do homem contra a natureza. Uma visão que criminaliza o homem pela ocupação do espaço, pela expansão da pecuária e da fronteira agrícola e pela derrubada da floresta sem a devida contextualização histórica e socioeconômica. A sociedade anônima, nesse caso, seria a sociedade que se estrutura sem a pre- sença do Estado e permanece à margem das normas legais. É a terra sem lei, uma sociedade anônima mesmo, desconhecida para o Poder Público e para o restante da Nação brasileira.

    Essa visão, graças ao trabalho dos migrantes de todos os cantos do Brasil, que implantaram a agricultura mais desenvolvida do País no Mato Grosso, em Rondônia, no Tocantins, no Pará e nos demais Estados; que es- tão colocando alimento na mesa dos brasileiros, exportando carne e soja para todos os continentes; que estão construindo formas sustentáveis de produzir e de conviver com a floresta em todos os nove Estados da Amazô-

nia Legal; que estão produzindo energia elétrica para afastar o risco de mais um apagão nacional, fornecendo

minérios para a indústria siderúrgica, matéria-prima para a indústria farmacêutica de cosméticos e de tantas outras riquezas, começa a ser modificada e substituída por uma visão de convivência mais harmônica com a natureza. Uma visão baseada num modelo de desenvolvimento sustentável, uma visão em que o homem é o grande responsável pela produção sustentável e pela conservação da floresta, pela proteção dos nossos rios e de toda a biodiversidade da Amazônia, que são as nossas maiores riquezas.

Essa visão foi destacada no capítulo deste domingo da série do Fantástico, quando os brasileiros pude- ram conhecer a força empreendedora da Amazônia e da sua gente e o seu potencial para contribuir para o desenvolvimento do nosso País. Uma Amazônia que responde por 21% da área plantada do País, onde a agro- pecuária cresceu, nos últimos dez anos, proporcionalmente mais do que duas vezes o PIB do País.

Mas a grande questão a ser resolvida na Amazônia ainda é a posse da terra e a documentação dessas áreas. Os conflitos no campo, em toda a Amazônia Legal, surgem pela indefinição de quem é o dono ou o pro- prietário daquele pedaço de chão. Esse é um problema que vem desde o princípio da ocupação do Brasil e também da Amazônia e que, mesmo em nosso Estado de Rondônia, que é fruto da reforma agrária, ainda não foi devidamente resolvido.

Em princípio, as terras da Amazônia são da União, do Exército, dos Estados, dos Municípios, das comuni- dades tradicionais, dos que foram beneficiados pela reforma agrária nos anos 60 e 70 do século passado, dos pioneiros que compraram lotes do governo, dos que compraram de boa-fé dos antigos posseiros, dos que já conseguiram o título da terra.

Essas pessoas de que estamos falando se resumem a 25 milhões de pessoas que vivem na Amazônia Legal.

Terras que também são reivindicadas por novos assentamentos da reforma agrária, pelos que estão nos acampamentos de agricultores e dos sem-terra, por fazendeiros, madeireiros e grileiros que disputam as cha- madas terras devolutas.

Não há por que tapar o sol com a peneira. Essas disputas é que alimentam os conflitos pela terra na Amazônia e que dificultam todas as atividades produtivas e a consolidação do modelo de desenvolvimento sustentável que almejamos, em que a produção agrícola e industrial, assim como a produção de energia e a exploração de minérios, possam ser feitas com respeito ao meio ambiente, cuidando-se, assim, da nossa maior riqueza, que são as nossas florestas, as nossas reservas, os nossos rios.

Esses conflitos se intensificaram justamente por conta da ausência do Estado, da ausência de políticas públicas e de ações do Governo Federal ao longo dos últimos 40 anos. Agravam-se por conta da lentidão da reforma agrária e da regularização fundiária, que até hoje não é feita com a agilidade e a eficiência que a situ- ação exige e merece. Pois bem, se a terra não tem dono, ninguém vai se preocupar em cuidar das suas flores- tas, das suas reservas, dos seus rios. Aquela terra não tem CPF, não tem dono. Se não tem dono, ninguém vai cuidar da terra. Somente através da regularização fundiária, entregando o documento para o posseiro, para a pessoa que está ali, há 20, 30, 40 anos, vamos ter a certeza, a garantia de que alguém vai cuidar da nossa maior riqueza, que é a nossa floresta e os nossos rios.

O programa Terra Legal foi criado em 2009, justamente para fazer esse trabalho, com a meta de entregar títulos de terras a cerca de 150 mil migrantes posseiros que ocupavam e ocupam terras públicas federais não destinadas na Amazônia, ou seja, as chamadas terras devolutas.

Em seis anos, pouco mais de 10 mil títulos foram entregues. Desse total, 6 mil títulos foram entregues em Rondônia, o Estado que mais avançou na regularização fundiária - se é que podemos considerar esse nú- mero um avanço.

Nesses anos em que estou aqui, no Senado, Sr. Presidente, em que participo ativamente da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária, já realizei mais de 15 audiências públicas para tratar da regularização fundiária em Rondônia e na Amazônia Legal. Continuarei abordando esse assunto, até que o último título definitivo da terra seja entregue para os agricultores e moradores do meu Estado de Rondônia.

Na semana retrasada, no dia 20 de março, tratamos desse tema no segundo seminário do Ciclo de Pa- lestras e Debates de 2015 da CRA, quando discutimos o panorama atual do CAR (Cadastro Ambiental Rural) e os reflexos na regularização fundiária.

Foi um debate profundo e produtivo sobre o Cadastro Ambiental Rural, mas a sua relação com a regu- larização fundiária foi pouco explorada pelos debatedores, de modo que sentimos a necessidade de realizar um novo ciclo de debates, ou novo seminário, desta vez com o foco exclusivo na regularização fundiária na Amazônia. Isso faremos em breve. Já aprovamos o requerimento na Comissão de Agricultura e Reforma Agrá- ria. Só falta marcarmos a data, e esperamos que possamos fazer, ainda neste mês de abril, esse debate, aqui,

na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária.

O que ficou bem claro no último seminário da CRA é que as políticas ambientais e de regularização fun-

diária podem e devem caminhar juntas. Precisamos integrar as ações para realizar a regularização fundiária, para que os agricultores, ao fazerem o Cadastro Ambiental Rural, também queimem essas etapas no processo da sua regularização fundiária e possam receber o título definitivo de propriedade da terra com mais rapidez, assim como também estar fazendo o seu Cadastro Ambiental Rural.

Duas experiências na integração dessas duas ações do Governo foram realizadas em Rondônia, em se- tembro do ano passado, na Ponta do Abunã e no distrito de União Bandeirante, em Porto Velho. Os resultados não poderiam ter sido melhores, demonstrando que a articulação das duas políticas públicas, especialmente na Amazônia, é o caminho para a regularização ambiental e também a regularização fundiária.

Além da realização de mais de 1.000 cadastros, cerca de 700 títulos do Programa Terra Legal foram en- tregues na região.

Por isso, defendo que essa experiência de integração seja adotada como prática padrão em toda Amazônia.

Os agricultores que estão recebendo esses títulos geralmente são pioneiros ou aqueles que já estão há muito tempo com a posse da terra, o que facilitou o reconhecimento cartorial e o registro dos imóveis.

Mas existe um cenário bem mais complexo para ser observado e atendido com políticas públicas de re- gularização fundiária. Só em Rondônia, existem 195 projetos de assentamento do Incra, com 37.108 famílias assentadas, para ser mais preciso, Sr. Presidente, trabalhando e produzindo, sendo assistidas pela Emater, pelo Incra, em área aproximada de seis milhões de hectares.

O Estado possui 35 acampamentos de agricultores, que ainda não são considerados assentamentos pelo Incra, mas onde vivem mais de 15 mil famílias, também trabalhando e também produzindo. A situação mais preocupante e os conflitos mais graves estão nos acampamentos. Ainda existem as invasões e ocupações ir- regulares de unidades de conservação, reservas indígenas ou terras não denominadas. Essas famílias somam mais de 200 mil pessoas e aguardam uma resposta do Estado para terem direito ao documento do seu pedaço de chão, da terra em que já estão instalados, há muitos e muitos anos.

A constatação que temos é a de que as regras do Programa Terra Legal não dão conta dessa problemáti- ca. E os procedimentos do Incra para legalizar os assentamentos e acampamentos esbarram, principalmente, no preço da terra, que está muito caro em todo o Brasil, principalmente no meu Estado de Rondônia.

Uma das soluções, que já discutimos com o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e o Incra, será facilitar a titulação dos imóveis dos assentamentos emancipados, nos moldes do Programa Terra Legal, ampliando a área a ser titulada para quatro módulos fiscais. Com isso, resolveríamos ou teríamos um avanço muito grande.

Existe, hoje, uma limitação permitindo essa titulação para até dois módulos fiscais. Tentamos promover essa alteração através da MP nº 636, de 2014, que aprovamos no plenário do Senado, no final do ano passado, mas, como seu foco era a renegociação das dívidas dos assentados e da agricultura familiar, não foi possível encaixar nessa medida provisória.

Mas estamos trabalhando para que, numa próxima, consigamos colocar essa medida dentro de uma medida provisória.

Portanto, esse é o debate que queremos trazer novamente para a Comissão de Agricultura do Senado. Essa é a discussão que queremos com o Governo Federal. Temos que encontrar outros caminhos que deem mais agilidade para os procedimentos técnicos e burocráticos, mas que equacionem também a questão do valor da terra a ser cobrado pelo indivíduo que já está ali produzindo há mais de 30 anos.

Outra demanda é a necessidade de eliminar, no caso do fracionamento mínimo em áreas rurais que possam ser consideradas urbanas, a análise e a autorização do Incra para a sua regularização também. Essa competência seria transferida para os Estados e para os Municípios, como em Rondônia, onde o governo do Estado implantou o Programa Título Já, que já emitiu mais de 20 mil títulos de propriedade da terra em três anos de existência.

Para regulamentar esse processo, apresentei o PLS nº 388, de 2014, que será apreciado amanhã na Co- missão de Desenvolvimento Regional, com parecer favorável do relator, Senador Romero Jucá.

Nossa proposta é que as terras consideradas rurais, mas que estão hoje no perímetro urbano dos Muni- cípios - ou seja, são cidades -, sejam transferidas para os Estados e para os Municípios, para que esses façam a regularização fundiária e possam dar o documento do lote para quem o está ocupando.

Entendo que essa medida, além de agilizar o processo de ordenamento e regularização do solo no pe- rímetro urbano, também agilizaria a regularização fundiária rural, uma vez que o Incra não precisaria mais se

preocupar com o ordenamento urbano, ou seja, com a regularização nas cidades.

O parcelamento de imóvel rural para fins urbanos não deve ser condicionado a qualquer atuação do Incra,

pois o planejamento e o controle do processo de urbanização é uma atribuição exclusivamente local, podendo ser realizado em qualquer imóvel situado em zona urbana, de expansão urbana ou de urbanização específica.

Nossa proposta, por meio do PLS nº 388, de 2014, busca corrigir essa impropriedade mediante a revo- gação de dispositivos do Estatuto da Terra e da Lei de Parcelamento do Solo Urbano, com base nos quais o Incra exerce sua competência para aprovar projetos de loteamentos urbanos. Além disso, altera a redação de dispositivo relativo à formação de núcleos de colonização de natureza urbana para vincular essa atividade à legislação de parcelamento do solo urbano.

Portanto, conto com o apoio dos nobres Senadores e Senadoras para que essa proposição seja apro- vada, o que certamente contribuirá para agilizar a análise de projetos regulares de parcelamento do solo ur- bano e propiciar ao Município pleno controle sobre a ocupação de seu território, contribuindo para reduzir a ocupação irregular do solo urbano, bem como para liberar o Incra para fazer o ordenamento e a regularização fundiária no meio rural.

Um exemplo de como essa norma será aplicada está no convênio que foi realizado entre a União, atra- vés da Secretaria do Patrimônio da União (SPU), o governo de Rondônia e a prefeitura de Porto Velho, para a regularização fundiária da chamada “Figura A”, que compreende oito bairros de nossa capital: os bairros Ari- golândia, Panair, Olaria, Pedrinhas, Caiari, Triângulo, Areal e Baixa da União, onde vivem cerca de 50 mil pessoas.

O levantamento topográfico já está sendo feito, inclusive com a participação do Exército e, em breve, os moradores, que já ocupam a área há mais de 50 anos, receberão o título definitivo da sua propriedade, da sua terra. Esse é um trabalho que teve a participação importante do Sindicato dos Seringueiros e Soldados da Borracha de Rondônia - que tem como vice-presidente o carioca que nos dá a honra de sua presença aqui no Senado hoje -, visto que boa parte dos moradores são seringueiros ou descendentes dos Soldados da Borra- cha que vivem hoje no nosso Estado de Rondônia.

É também um trabalho que pode servir de modelo para a regularização fundiária das terras da União já ocupadas em todo o território nacional, o que pretendemos regulamentar através do PLS nº 388, de 2014.

Esse é um tema importante, Sr. Presidente, porque não dá para nós aceitarmos que os nossos agricul- tores que estão na zona rural e os moradores das nossas cidades que estão na cidade há mais de 50 anos não tenham o documento da sua terra.

É uma política pública importante. E é neste sentido que estamos trabalhando, para ajudar o MDA, o In- cra, os governos municipais e o governo do meu Estado a fazerem essa aproximação para que possamos jun- tos trabalhar para levar esse benefício à população do nosso Estado de Rondônia e, evidentemente, de toda a Amazônia e do nosso País.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/04/2015 - Página 40