Discurso durante a 45ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Críticas à desintegração da tarifa do sistema de transporte coletivo da região metropolitana de Curitiba.

Autor
Gleisi Hoffmann (PT - Partido dos Trabalhadores/PR)
Nome completo: Gleisi Helena Hoffmann
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRANSPORTE:
  • Críticas à desintegração da tarifa do sistema de transporte coletivo da região metropolitana de Curitiba.
Publicação
Publicação no DSF de 09/04/2015 - Página 65
Assunto
Outros > TRANSPORTE
Indexação
  • CRITICA, GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DO PARANA (PR), MOTIVO, QUEBRA, INTEGRAÇÃO, PASSAGEM, TRANSPORTE COLETIVO, LIGAÇÃO, MUNICIPIO, ARAUCARIA (PR), CURITIBA (PR), COMENTARIO, PREJUIZO, POPULAÇÃO, ASSUNTO, MATERIA, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, GAZETA DO POVO.

            A SRª GLEISI HOFFMANN (Bloco Apoio Governo/PT - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, quem nos ouve pela Rádio Senado e nos assiste pela TV Senado, quem nos visita hoje nesta Casa, um bom dia.

            O que me traz à tribuna hoje, Sr. Presidente, é um tema que, julgo, merece ser registrado nos Anais desta Casa. Eu me refiro à situação penosa dos cidadãos e das cidadãs da região metropolitana de Curitiba, capital do meu Estado do Paraná, usuários do sistema de transporte coletivo, retratada em matéria na imprensa hoje.

            A matéria, com o título “Desintegração da tarifa gera efeito ‘pula-catraca’ em Araucária” - Araucária é um Município da nossa região metropolitana -, publicada no jornal Gazeta do Povo de ontem, foi produzida pela repórter Catarina Scortecci e pela fotógrafa Aniele Nascimento, que chegaram ao terminal Angélica, na cidade de Araucária, às 6h da manhã.

            Tanto o texto quanto as fotos e o vídeo mostram muito a sensibilidade com a situação dos trabalhadores e das trabalhadoras afetados pela desintegração do sistema de transporte da região metropolitana de Curitiba.

            Eu trouxe apenas uma foto para registrar no plenário desta Casa a situação a que uma mãe de família, uma trabalhadora está submetida. Ela pula a catraca porque não tem os recursos, o dinheiro para pagar as passagens de ônibus que foram desintegradas.

            E diz essa passageira:

A gente fura mesmo, não ligo. Sei que é feio, até vergonhoso, mas a gente não tem dinheiro. Eu gasto oito passagens por dia. Eu trabalho por conta. Tenho que pagar passagens para dois filhos meus. Enquanto houver esse desrespeito, a gente vai ter de passar [diz essa senhora].

            Também outra pessoa que utiliza o transporte coletivo da região metropolitana:

Eu pulo todo dia [uma diarista de 42 anos], na cara dura. Se quiserem me prender, me prendam. Mas sou trabalhadora. Tenho quatro filhos para criar. Como é que faz? Minhas patroas não querem pagar mais. Não tem mais condição. Estão massacrando os pobres aqui.

            Além do preço das tarifas, ela reclama das condições dos ônibus: “A gente vai socado!”. Usuários que pagam a tarifa também reclamam do preço: “O salário não subiu, o salário da gente é o mesmo. E daí tem que pagar quatro passagens todo dia. Acho que ficou horrível!”. A doméstica, entretanto, que fala isso afirma que não pula a catraca. Ela se diz humilhada com essa situação.

            Eu trouxe essa matéria aqui, Sr. Presidente, porque eu acho da maior relevância discutir o cotidiano da nossa população. A sensibilidade e preocupação mostradas pela reportagem, infelizmente, faltam às autoridades responsáveis pelo sistema de transporte na região da capital e, especialmente, ao Governador do meu Estado, Sr. Beto Richa, o maior responsável pela quebra da integração.

            Curitiba e região metropolitana já foram referências pela qualidade do sistema de transporte de massa. Muitas metrópoles mundo a fora importaram as soluções originalmente adotadas em Curitiba. Aliás, muitas cidades do Brasil adotaram o nosso modelo de transporte coletivo, como as canaletas exclusivas, as estações tubo, os veículos biarticulados e a organização do sistema, principalmente a integração da tarifa. Eu pago uma passagem de ônibus e posso andar através da cidade inteira ou me conectar com a região metropolitana através dos terminais sem pagar uma segunda passagem. 

            Mas o transporte de massa exige planejamento e, sobretudo, investimentos constantes, para que o sistema se atualize e se mantenha eficiente para garantir a mobilidade das multidões que saem de casa para o trabalho, para a escola, para o lazer e depois retornam para suas casas. Nos últimos anos, o planejamento na região metropolitana de Curitiba, aliás, no transporte coletivo do Estado do Paraná, foi substituído pelo improviso, e os investimentos, pela demagogia. Especialmente a partir do período em que o Governador Beto Richa foi Prefeito de Curitiba. Com medidas populistas, como a redução da tarifa sem pagamento do subsídio correspondente, preparou o desequilíbrio do sistema integrado, que permitia que uma pessoa, como eu disse, saísse de uma cidade ao sul da região metropolitana, cruzasse toda Curitiba e fosse trabalhar ao norte da capital, pagando uma passagem de ida e outra de volta.

            Em 2012, já na condição de Governador do Paraná, temendo que as dificuldades para manter o sistema integrado prejudicassem seu então candidato à reeleição, o Prefeito Luciano Ducci, Beto Richa instituiu um subsídio do Estado para reequilibrar a tarifa, cujo desequilíbrio ele mesmo havia criado, como prefeito. Passadas as eleições e o seu candidato derrotado, o Governador passou a dizer que não podia mais manter o subsídio, porque isso seria transferir para o Estado responsabilidades dos Municípios. Como no período da eleição podia e, depois de passada a eleição, com a derrota do candidato, não podia continuar?

            A situação se agravou muito nos anos seguintes, e, neste ano, o Governador Beto Richa, com as finanças do Paraná praticamente quebradas, decidiu cortar o subsídio. Como as prefeituras da região metropolitana nunca tiveram e não têm condições de subsidiar a tarifa, e mesmo a prefeitura de Curitiba não consegue bancar esses recursos, a não ser aumentando a tarifa da população de Curitiba, tivemos a desintegração do sistema, com custos diferenciados para cada Município.

            Aquilo que era um diferencial para a nossa capital paranaense e para a região metropolitana, a qualidade do transporte coletivo e a integração, passou a ser o pior exemplo de Administração Pública.

            O resultado é mostrado na reportagem de Catarina Scortecci e Aniele Nascimento: pessoas pulando a catraca em terminal que deveria ser de integração, por falta de condições para viajar com o preço atual das passagens. Cenas verdadeiramente humilhantes para rnulheres de meia-idade, trabalhadoras e mães de famílias, subindo para pular perigosamente as catracas, por não terem dinheiro para pagar as passagens.

            As providências que as autoridades adotaram no Terminal Angélica mostram a falta de sensibilidade para com o problema: instalaram catracas mais altas e mais fechadas no terminal, a ponto de pessoas maiores e mais corpulentas não conseguirem passar sem se constranger muito com a dificuldade de fazê-lo. E, repito, homens e mulheres que vão para o trabalho pulam essas catracas por falta de dinheiro para pagar passagens que praticamente dobraram de valor.

            O representante da Comec, órgão do Governo do Estado, responsável pelo sistema, declara que "a médio e longo prazo, a desintegração será um benefício para Araucária, pois isso vai melhorar a geração de empregos na cidade". O que o representante do Governador Beto Richa está dizendo é que, devido ao aumento da tarifa, fica inviável para o trabalhador se deslocar para Curitiba ou outras cidades vizinhas para trabalhar e isso beneficiará o mercado de trabalho de Araucária. Ele não disse, mas deve ter pensado, que os salários a serem pagos pelas empresas devem cair, já que haverá excedente de mão de obra na cidade. Ou seja, o representante de Beto Richa vê como benefício aquilo que prejudica o trabalhador e a trabalhadora.

            Então, Sr. Presidente, o sistema integrado de transporte coletivo que serviu aos trabalhadores com eficiência e razoável conforto, com custos adequados e que consagrou diversas administrações de Curitiba, hoje agoniza, está se desfazendo. E o maior responsável, primeiro como Prefeito de Curitiba e agora como Governador do Paraná, chama-se Beto Richa. O Paraná está quebrado do ponto de vista financeiro e isso se deve à gestão temerária que Beto Richa implementou na capital e agora no Estado. E isso, lamentavelmente, espalha-se por outras áreas da administração, inclusive ao nosso sistema de transportes de massa, levando desconforto e piorando a vida das pessoas na região de Curitiba.

            Aliás, o transporte coletivo foi uma das principais reivindicações que nós tivemos nas manifestações de julho de 2013 aqui no Brasil: que nós melhorássemos a qualidade do transporte.

            Curitiba e região metropolitana estão indo na contramão. Aquilo que nós tínhamos de positivo estamos acabando.

            Eu queria fazer aqui um apelo ao Governo do Estado, que, por favor, reconsiderasse e colocasse de novo o subsídio na passagem metropolitana na integração do transporte coletivo.

            Não é possível que a população, principalmente a população mais pobre, pague essa conta.

            Faço esse apelo também ao nosso Prefeito da capital, Gustavo Fruet, para que envide esforços, para que realmente lute para que o sistema de integração permaneça na nossa região metropolitana e possa continuar sendo um exemplo para outras cidades e capitais do nosso País.

            Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/04/2015 - Página 65