Discurso durante a 54ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Manifestação contrária à aprovação de aumento de recursos para o fundo partidário.

Autor
Ângela Portela (PT - Partido dos Trabalhadores/RR)
Nome completo: Ângela Maria Gomes Portela
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES E PARTIDOS POLITICOS:
  • Manifestação contrária à aprovação de aumento de recursos para o fundo partidário.
Publicação
Publicação no DSF de 24/04/2015 - Página 204
Assunto
Outros > ELEIÇÕES E PARTIDOS POLITICOS
Indexação
  • CRITICA, APROVAÇÃO, AUMENTO, RECURSOS, FUNDO PARTIDARIO, ENFASE, SITUAÇÃO, ECONOMIA NACIONAL, DEFESA, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, MODELO, FINANCIAMENTO, CAMPANHA ELEITORAL.

            A SRª ÂNGELA PORTELA (Bloco Apoio Governo/PT - RR. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, são extremamente negativas as repercussões relativas à emenda que triplica o teto do fundo partidário. As finanças do Brasil estão em situação difícil e não se justifica, de forma alguma, que se aumente o repasse de dinheiro para as direções dos partidos.

            Sejamos francos. Nosso sistema partidário é encarado com desconfiança pela opinião pública. O fato de contarmos hoje com 32 partidos políticos registrados na Justiça Eleitoral contribui para essa descrença.

            Predomina entre os eleitores a convicção, correta, de que inexiste no espectro ideológico espaço para tantas organizações partidárias. Na sua maioria, nossos partidos apresentam inconsistência doutrinária, deixando na população a suspeita de que procuram apenas beneficiar-se de recursos públicos.

            Nessas condições, triplicar o volume dos recursos do fundo partidário apenas aumenta essa desconfiança, que tende a se transformar em repulsa.

            Acresce que a proposta de reajustar nessas proporções o fundo partidário surgiu de repente, como emenda de última hora colocada no Orçamento da União pelo senador Romero Jucá. A inclusão surpreendeu os próprios parlamentares.

            Sem o veto presidencial, imaginou-se que esses recursos seriam contingenciados, dentro dos cortes orçamentários já previstos. Infelizmente, inexiste fundamento legal para que se contingenciem dotações do fundo partidário.

            De qualquer forma, não se pode aceitar uma simples elevação dos recursos destinados aos partidos. A população rejeita essa ideia.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, contamos com uma alternativa para garantir recursos ao processo político democrático, que é o financiamento público de campanhas, mudando toda a sistemática de custeio do processo eleitoral.

            O PMDB do senador Jucá se opõe ao financiamento público, preferindo que as empresas privadas continuem a dar dinheiro aos partidos, mas nós sabemos que essas empresas sempre vão querer algo em troca.

            Essa cobrança, se aceita pelos poderes instituídos, terminará por sair mais caro ao País do que o financiamento público. Pior, o PMDB apoia o financiamento privado, mas determina - como fez o senador Romero Jucá - que dinheiro público, dinheiro dos impostos, vá para os partidos do mesmo jeito. Deveríamos aproveitar essa oportunidade para regular toda essa situação.

            Reconheço que também o financiamento público de campanhas encontra dificuldades para ser exposto à população. Sempre fica a sensação de que se trata de repassar a partidos políticos - de legitimidade mal percebida, como vimos - recursos públicos que poderiam ser empregados em saúde, educação ou segurança, como é hoje justamente cobrado pelos brasileiros.

            No entanto, a eleição recente demonstrou, uma vez mais, a falência do atual sistema de financiamento das campanhas eleitorais brasileiras. Confirmou-se, em primeiro lugar, a elevação constante dos custos de campanha.

            A cada eleição, os candidatos competitivos arrecadam e gastam mais que na anterior e, certamente, menos que na próxima.

            Ficou clara, também, a concentração extrema dos recursos. Provêm de poucos doadores. Um pequeno grupo de empresas de grande porte, todas com interesses em negócios com o governo, concentradas em especial nos setores financeiro e da construção civil, respondem por mais de noventa por cento de todas as doações.

            Sejamos francos: como está, a operação da democracia brasileira é financiada hoje por essas poucas e grandes empresas. É isso que permite o elevado grau de influência do poder econômico nas campanhas e, em consequência, no resultado das eleições. É por aí que esse processo afeta a eficiência do uso dos recursos públicos no País.

            Além disso, sabe-se que as campanhas normalmente não se contentam com os recursos declarados de forma legal. Isso afeta de forma significativa a transparência do processo eleitoral. É por isso que precisamos instituir o financiamento público exclusivo de campanha.

            Foi por essa razão que apresentei projeto para determinar que todo recurso utilizado nas campanhas deverá provir de um fundo de financiamento de campanhas eleitorais, alimentado por dotações orçamentárias e eventualmente por doações de pessoas físicas e jurídicas. O projeto estabelece ainda os critérios para a distribuição desses recursos entre os partidos e, no âmbito de cada partido, entre as direções nacional, regionais e municipais, a cada eleição.

            Esse projeto proíbe a doação diretamente por parte de pessoas físicas e jurídicas e o recebimento de recursos desses doadores por parte dos candidatos e partidos, estipulando a penalidade devida no caso de descumprimento da regra. Acredito que seja essa a saída para rompermos o círculo que prende nosso sistema eleitoral a doações de grandes empresas retribuídas com favores vinculados ao caixa do governo, passando por um custoso espectro de legendas pagas com fundo partidário.

            Vivemos hoje, felizmente, um dos mais longos períodos de democracia registrados em nossa história. Não podemos deixar que se comprometa a legitimidade de nossos partidos políticos por instrumentos que só despertam desconfiança e suspeita na população.

            Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/04/2015 - Página 204