Pela Liderança durante a 49ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas ao projeto de lei que possibilita a terceirização na atividade-fim de empresas brasileiras.

Autor
Humberto Costa (PT - Partido dos Trabalhadores/PE)
Nome completo: Humberto Sérgio Costa Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Pela Liderança
Resumo por assunto
TRABALHO.:
  • Críticas ao projeto de lei que possibilita a terceirização na atividade-fim de empresas brasileiras.
Publicação
Publicação no DSF de 15/04/2015 - Página 81
Assunto
Outros > TRABALHO.
Indexação
  • CRITICA, PROJETO DE LEI, ASSUNTO, REGULAMENTAÇÃO, TERCEIRIZAÇÃO, TRABALHO, MOTIVO, AUTORIZAÇÃO, TRANSFERENCIA, EXECUÇÃO, ATIVIDADE ESPECIFICA, EMPREGADOR.

            O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Apoio Governo/PT - PE. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Srª Presidenta, Srªs e Srs. Senadores, telespectadores da TV Senado, ouvintes que nos acompanham pela Rádio Senado, a Câmara dos Deputados deve concluir, ainda nesta semana, a apreciação do Projeto de Lei nº 4.330, de 2004, que trata da terceirização do trabalho no Brasil.

            Como virou hábito naquela Casa de alguns meses para cá, propostas polêmicas têm sido pautadas de forma quase ditatorial, têm tramitado em ritmo absolutamente atropelado e têm excluído completamente a sociedade do debate. Um tema da magnitude do da terceirização, que afeta a vida de dezenas de milhões de trabalhadores brasileiros, foi violentamente imposto à população e aprovado de maneira açodada, movido por interesses que não se sabem quais.

            Aqui, no Senado, haverá um rito diferente. Como já anunciado pelo próprio Presidente Renan Calheiros, realizaremos uma audiência pública aqui, neste plenário, para discutir o tema. Nosso companheiro, o Senador Paulo Paim, ontem mesmo, já realizou uma excelente audiência na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa, que ele preside, para aprofundar o debate antes mesmo de o projeto chegar a esta Casa. De forma que não votaremos esse projeto de terceirização no Senado sem, antes de qualquer coisa, ampliarmos as discussões com a sociedade. Do jeito que está - aliás, já antecipo aqui o posicionamento da Bancada do PT -, ele contará com toda a nossa oposição e, no que depender de nós, não passará.

            A terceirização foi um conceito introduzido no Brasil numa época em que o hoje falido e ultrapassado Consenso de Washington ditava as regras do mundo, oprimindo trabalhadores com suas receitas neoliberais. Ainda na década de 90, o Tribunal Superior do Trabalho teve que intervir, por meio da Súmula n° 331, para evitar os gritantes abusos ocorridos por meio dessa prática predatória que começava a tomar conta do nosso mercado laboral, como forma de conter o seu avanço e garantir as conquistas dos trabalhadores.

            Já naquele momento, empresas que se formavam do dia para a noite assediavam empregados não muito qualificados para compor a sua atividade-fim e, com isso, pagavam salários muito abaixo daqueles da empresa contratante, sem dar aos terceirizados as mesmas vantagens que os outros recebiam. O TST, então, entrou na questão da atividade-fim, onde havia uma lacuna legal, posicionando-se pela proteção aos trabalhadores que eram recrutados para elas com salários muito aquém, sem as garantias próprias do trabalhador efetivo.

            Duas décadas depois, o Congresso Nacional parece querer suprir o vazio da lei, mas, infelizmente, legalizando aqui o que a própria Justiça do Trabalho considerou um nefasto retrocesso para os direitos trabalhistas. Isso não tem razão de ser, não faz qualquer sentido. O art. 1º da nossa Constituição Federal diz que a nossa República é fundada, entre outros princípios, nos "valores sociais do trabalho e da livre iniciativa", ou seja, quis o Constituinte originário que ambos - valores sociais do trabalho e livre iniciativa - estivessem no mesmo patamar, e um não pode ser priorizado em detrimento do outro.

            Nossa luta, então, é impedir a banalização da atividade-fim neste País, é impedir que o Brasil abra mão das especificidades das profissões para se transformar numa nação de generalistas. O Congresso Nacional tem a obrigação de assegurar a proteção do emprego direto na atividade finalística, porque é assim que a Constituição determina que o nosso Estado deva proceder com o trabalhador. O Estado brasileiro, que, desde 1934, passou a constitucionalizar os direitos fundamentais dos trabalhadores, tornou-os cláusulas pétreas pela Carta de 1988, quando os considerou direitos essenciais ao próprio regime democrático. E, ao fazer isso, a Constituição de 1988 deu a nós legisladores ordinários uma missão muito clara. Ela nos disse: melhorem a condição social do trabalhador, instituam novos direitos e incrementem os direitos atuais, porque o desejo constitucional é o de que a sociedade brasileira seja uma sociedade livre, justa e solidária.

            Ora, como é que agora pode a Câmara dos Deputados aprovar uma proposta que coloca os trabalhadores brasileiros de joelhos? Que leve o Brasil a dormir em 2015 e acordar no início da década de 40, antes da própria CLT?

            O nosso regime constitucional de proteção social do trabalhador está fundado no pilar da proteção temporal, que pretende que a relação de emprego se estenda o máximo de tempo possível, e, para isso, há uma série de direitos assegurados, como FGTS, aviso prévio proporcional, aposentadoria vinculada à contribuição por tempo de serviço; e no pilar da proteção espacial, que pretende a máxima integração do trabalhador à vida da empresa, como, por exemplo, o direito à participação nos lucros e resultados.

            Se implantarmos a terceirização no País, esses pilares serão destruídos, porque não haverá FGTS, aviso prévio, pois uma empresa de terceirização não divide lucros e resultados; ela retira suas vantagens financeiras exatamente da diferença entre o valor que cobra pelo serviço prestado e o valor que paga ao capital humano empregado no serviço, ou seja, quanto maior essa diferença, quanto mais achatar salários, maior a sua margem de lucro.

            A terceirização, então, desfigura esse regime de emprego protegido constitucionalmente. Ela institui um regime paralelo de emprego precarizado, que dispersa a organização sindical...

(Soa a campainha.)

            O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Apoio Governo/PT - PE) - ... inviabilizando acordos e convenções coletivas, e fulmina direitos fundamentais dos trabalhadores a partir do estímulo à ruptura da relação de emprego, à qual diversos benefícios, como férias proporcionais, estão vinculados.

            

Hoje, há em torno de 13 milhões de terceirizados no País, e dados do Dieese demonstram que esses trabalhadores estão sujeitos a um nível muito superior de doenças e de acidentes no trabalho do que os não terceirizados. No setor de distribuição de energia elétrica, por exemplo, 238 trabalhadores morreram vítimas de acidentes entre 2006 e 2008 no Brasil, dos quais 80% eram terceirizados. No caso da construção civil, dos 135 que morreram em construção de edifícios em 2013, 75 eram terceirizados. Em obras de acabamento, dos 20 óbitos, 18 eram de terceirizados.

(Soa a campainha.)

            O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Apoio Governo/PT - PE) - Em obras de terraplanagem, das 19 mortes no ano de 2013, 18 eram de terceirizados. Na seara do trabalho escravo, dos dez maiores resgates registrados no Brasil entre 2010 e 2013, de 3.553 resgatados, quase 3.000 eram terceirizados.

            Para um lucro maior das empresas, a terceirização propõe a lógica da opressão e do investimento menor no ambiente do trabalho e no salário dos trabalhadores. Portanto, ela promove diretamente redução de segurança e de bem-estar, bem como achatamento de remunerações dos terceirizados, que recebem em média, segundo o Dieese, 27,5% menos que o trabalhador direto.

            Não há, dessa maneira, qualquer negociação que possamos abrir relativa à terceirização...

(Soa a campainha.)

            O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Apoio Governo/PT - PE) - Vou concluir, Srª Presidenta.

            Não há, dessa maneira, qualquer negociação que possamos abrir relativa à terceirização da atividade-fim das empresas: ou ela sai do texto do projeto ou nós votaremos contra ele. Nem a terceirização da atividade-meio - uma reivindicação, como disse aqui, da década de 90 - pode ser considerada como uma pauta pacífica, uma vez que esses terceirizados seguem em situação de notória desvantagem em relação aos empregados diretos. Imaginem, então, terceirizar a atividade-fim? Isso seria ceder à absoluta precarização das relações de trabalho, à submissão total do valor do trabalho ao desejo do lucro pelo lucro e à superexploração do trabalhador como solução para o problema econômico.

            Aplicada a regra para empresas estatais, sociedades de economia mista e empresas públicas, ela também...

            (Soa a campainha.)

            O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Apoio Governo/PT - PE) - ... acabaria - vejam as senhoras e os senhores - com o regime de concurso público.

            Não podemos dar maior lucro e maior produtividade às empresas subtraindo direitos dos trabalhadores. Esta é uma fórmula que já foi aplicada e experimentada e tudo o que ele conseguiu provar foi que é eficaz apenas em disseminar miséria e ampliar a desigualdade social;

            O PT não aceitará e não admitirá esse retrocesso democrático no Brasil. Nessa luta, contamos com uma série de expressivos segmentos sociais, como os sindicatos, a OAB, a Justiça e o Ministério Público do Trabalho;

            O trabalho é uma categoria constitucional de inclusão e, dessa forma, este Congresso Nacional não pode flexibilizar leis que garantem esse sistema de proteção, e legislar para enfraquecer a nossa prática constitucional em termos de direitos fundamentais, contribuindo para um processo de marginalização dos trabalhadores.

(Soa a campainha.)

            O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Apoio Governo/PT - PE) - Estou concluindo, Srª Presidenta.

            Muitos absurdos já foram, em alguma época da história, considerados legais neste País. A escravidão já foi legal. A sonegação de direitos às mulheres já foi legal. A pena de morte já foi legal.

            A legalidade, então, é uma construção de poder. A legalidade não é uma questão de justiça.

            Cabe, então, ao Congresso Nacional o dever cívico de evitar que a aberração em que se constitui esse projeto da terceirização seja legalizado no Brasil.

            Peço desculpas a V. Exª, Srª Presidenta e agradeço pela tolerância.

            Muito obrigado a todas e a todos.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/04/2015 - Página 81