Pronunciamento de Jorge Viana em 28/04/2015
Comunicação inadiável durante a 57ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Comentários sobre a aprovação, pela Câmara dos Deputados, do projeto de lei que trata do acesso à biodiversidade.
- Autor
- Jorge Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
- Nome completo: Jorge Ney Viana Macedo Neves
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Comunicação inadiável
- Resumo por assunto
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MEIO AMBIENTE:
- Comentários sobre a aprovação, pela Câmara dos Deputados, do projeto de lei que trata do acesso à biodiversidade.
- Publicação
- Publicação no DSF de 29/04/2015 - Página 509
- Assunto
- Outros > MEIO AMBIENTE
- Indexação
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- COMENTARIO, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, LOCAL, CAMARA DOS DEPUTADOS, ASSUNTO, ACESSO, BIODIVERSIDADE, CRITICA, REJEIÇÃO, ALTERAÇÃO, ARTIGO, REALIZAÇÃO, SENADO, ELOGIO, CLAUSULA, DIVISÃO, LUCRO, AQUISIÇÃO, PATRIMONIO INDIGENA, PATRIMONIO, GENETICA, COLABORAÇÃO, PESQUISA, EMPRESA ESTRANGEIRA, EMPRESA NACIONAL.
O SR. JORGE VIANA (Bloco Apoio Governo/PT - AC. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, caros colegas Senadores, Senadoras; queria cumprimentar a Senadora Ana Amélia, querida colega aqui nesta Casa, dizer que estavam celebrando, ainda há pouco, a volta do Paim. A Bancada do Rio Grande está completa novamente, são muito atuantes aqui.
Eu queria, Sr. Presidente, Srs. Parlamentares, de certa forma lamentando, informar que, ontem, a Câmara dos Deputados apreciou o PL nº 2/2015, que trata do acesso à biodiversidade. Eu fui Relator dessa matéria, na Comissão de Meio Ambiente, aqui no Senado, na Comissão de Constituição e Justiça, fizemos um bom debate aqui no plenário. Tivemos ajuda da maioria da Casa, acolhendo o relatório que fiz graças à ajuda que tive de técnicos, profissionais competentes do meu gabinete - a turma do gabinete se dedicou, foi vitoriosa em me ajudar a fazer um bom trabalho legislativo - e também de técnicos e profissionais de órgãos públicos, de instituições de pesquisas e representantes de entidades do Movimento Socioambiental.
Fruto das audiências públicas que fizemos, nós entendemos e concluímos que seria importante promover modificações no PL nº 2/2015, que trata do acesso à biodiversidade. Tive apoio em todas as propostas que apresentei na Comissão de Meio Ambiente, aprovei todas. Ao todo, nós fizemos 23 modificações ao projeto. Dessas, a Câmara dos Deputados aprovou 6 de mérito, 5 de redação, sem maior importância; mas a Câmara rejeitou 12 modificações que fizemos aqui no Senado, nessa matéria, e que eram questões de mérito. Óbvio que isso é parte do processo legislativo.
Esse tema vem sendo debatido no Brasil há vinte anos. Os brasileiros devem se perguntar: "Mas o Brasil é o País que tem a maior riqueza de recursos naturais do mundo, tem a maior biodiversidade do Planeta..." E alguém pode dizer: mas o que é biodiversidade? As espécies, o conjunto da vida, seja vegetal, seja animal, é o que forma essa biodiversidade. Nós temos a maior biodiversidade do Planeta, quase 20% dessa biodiversidade aqui no Brasil, e ela ocorre aqui de forma endêmica, ou seja, muitas das espécies de animais e vegetais só ocorrem no Brasil.
Toda a produção agropecuária, toda a produção de fármacos, toda a produção de cosméticos, química, não utiliza essa biodiversidade brasileira. Nós trabalhamos com espécies exóticas. As espécies florestais que usamos na silvicultura vêm da Austrália. As espécies que usamos na agropecuária também são de fora: a laranja, a soja, a cana, o café. Os equinos também são de fora. O gado nosso, a origem é de fora. Até o capim é africano. E isso tem causado um enorme prejuízo à economia brasileira. Ela perde competitividade.
Mas tem causado algo mais grave ainda: ela tem causado a destruição dos recursos naturais. Nós temos hoje muitas espécies com risco de serem extintas. E por que é que nós temos essa situação? Porque nós não valorizamos essa biodiversidade. Ora, se ela não tem valor econômico, se ela não tem valor simbólico e importância para nós, ela pode ser queimada, pode ser destruída. É essa a lógica equivocada, insustentável, errada que o Brasil tem adotado.
Agora, depois de 20 anos, tivemos a assinatura, aqui no Brasil, da Rio-92, a Convenção da Biodiversidade, em que 169 países estabeleceram um entendimento sobre biodiversidade: cada um tem autonomia sobre sua biodiversidade e cada um dos países precisa fazer uma lei de acesso à biodiversidade. Isso foi no Rio de Janeiro em 92. Só agora o Brasil está votando a sua lei de acesso à biodiversidade, ao patrimônio genético, ao conhecimento tradicional, também estabelecendo regras para a repartição de benefícios. Ou seja, quando alguém fizer uso econômico do conhecimento que os índios, que as populações tradicionais detêm e adquiriram ao longo do tempo, terá de fazer alguma compensação, algum pagamento. Quando for usar o patrimônio genético que nós temos, também terá de ser feita alguma compensação, algum pagamento em benefício da natureza.
A Senadora Marina, minha conterrânea, dedicada a essa causa, tentou fazer valer aqui os sonhos de Chico Mendes, que sempre nos apontou caminhos. Quantas vezes, andando com ele na floresta, acompanhando visitantes no Acre, conversando sobre o desmatamento, a destruição, Chico Mendes falava: “Poxa, tanta riqueza na floresta, solução dos problemas de saúde, solução até para o embelezamento. Solução para tudo: para fazer casa, desenvolver atividade de criação.” E nós nunca tínhamos feito uma lei de acesso à biodiversidade.
Para piorar essa situação que o Brasil tem, que alguns brasileiros têm, de complexo de vira-lata, qualquer um que tentava fazer pesquisa, qualquer cientista, qualquer instituto importante e sério de pesquisa que começava a querer estudar a Amazônia, diziam que era biopirataria, que eram piratas. Então as empresas, os pesquisadores, as entidades, as organizações, a comunidade científica, receosa, não acumulou conhecimentos sobre a biodiversidade brasileira ao longo desses anos.
Marina apresentou três projetos, que foram transformados, em parte, em uma medida provisória no governo do Presidente Fernando Henrique, em 2001. Ganhou eficácia de lei, por conta de uma modificação na tramitação e na edição de medidas provisórias que o Supremo adotou em 2003, e passou a ser uma lei. Uma lei que ninguém aplicava. O Governo da Presidenta Dilma, depois de longo debate, capitaneado ora pelo Ministério do Meio Ambiente, ora pelo Ministério da Agricultura, elaborou uma proposta. A proposta chegou aqui, ao Congresso, à Câmara dos Deputados, mais em função da pressão da indústria do que da necessidade, do que de uma decisão política de que o Brasil precisa ter um instrumento tão importante como uma lei de acesso à biodiversidade. Mas, tudo bem. A motivação não importa, o importante é que chegou ao Congresso a proposta.
A Câmara dos Deputados teve oito meses para trabalhar essa proposta - oito meses, Senador Ataídes. Fizeram o trabalho deles. O movimento socioambiental, os seringueiros da Amazônia, companheiros de vida toda de Chico Mendes, os povos indígenas, as organizações sociais reclamaram que, mesmo em oito meses, não foram ouvidos, não apresentaram suas propostas, não colaboraram com suas ideias e suas preocupações.
E a lei de acesso à biodiversidade tem pelos menos três grandes temas a serem tratados: primeiro, acesso ao patrimônio genético; segundo, acesso ao conhecimento das populações tradicionais; e terceiro, repartição de benefícios. Exatamente os que podem se beneficiar com a aplicação dessa lei, os que podem ser parte dela com seu conhecimento não se sentiam contemplados, não tinham sido ouvidos.
Fizemos audiências públicas na Comissão de Meio Ambiente. O Senador Otto Alencar foi fundamental, convidou-me para ser Relator; tivemos o apoio na minha Comissão de Meio Ambiente. Fui Relator também, designado pelo Senador Maranhão, na Comissão de Constituição e Justiça desta Casa; o Senador Douglas o foi em outra Comissão e o Senador Telmário Mota, em outra.
O Presidente Renan, a Mesa Diretora, estabeleceu a matéria como prioridade; os Líderes da Casa, também. O Líder Eunício e o Líder Humberto Costa a pautaram, e nós fizemos 23 modificações na lei - modificações não para diminuir a importância da Câmara dos Deputados, mas feitas com um propósito. Usando a prerrogativa do Senado Federal, que compõe o Parlamento brasileiro, apresentamos modificações, aperfeiçoando essa matéria, porque o mundo inteiro estava e está de olho em qual será a lei que o Brasil vai fazer sobre acesso à biodiversidade, em qual será a lei que o País que tem a maior biodiversidade do Planeta vai apresentar ao mundo. Muitos países vão se inspirar nessa lei que a Câmara votou ontem e que nós trabalhamos nela com muita dedicação, como uma homenagem à ideia e à memória de Chico Mendes.
Parabenizo o relator na Câmara e agradeço pela aprovação de alguns pontos, que, não tenho dúvida, são importantes. Ele acatou, por exemplo, as Emendas nºs 2 e 3, uma sugestão que apresentamos e que, depois, virou uma modificação importante na lei, porque quando veio da Câmara...
Vejam só: hoje, se qualquer cientista de qualquer universidade, seja da Fiocruz, da Embrapa ou de qualquer instituição importante, for fazer pesquisa na Amazônia, ele não consegue fazer. Se ele quiser conhecer a nossa biodiversidade, ele não consegue, ele será chamado de biopirata. Mas o Projeto de Lei já saiu direto para um estágio extremo: uma empresa privada de qualquer lugar do mundo pode vir se instalar na Amazônia, fazer sua pesquisa, transformar nossa riqueza em um produto e ganhar milhões, à revelia das empresas e da comunidade científica.
Fiz uma alteração: uma empresa internacional, uma pessoa jurídica do exterior que queira nos ajudar a conhecer mais a Amazônia, que queira nos ajudar a desenvolver produto na nossa biodiversidade - que não é só a Amazônia, são todos os biomas -, ela pode, sim, e deve vir, mas associando-se a uma empresa nacional.
Outra emenda: nós trabalhamos o final do conceito de agricultor tradicional. Ao final desse conceito, acrescentou-se a expressão “incluindo o agricultor familiar”, que também é um conceito de lei em nosso País muito importante e que atendeu o movimento dos trabalhadores da agricultura familiar.
Outra alteração que fizemos foi no art. 17, § 9º: “A União estabelecerá por decreto a lista de classificação da repartição de benefícios”. E o que é isso? O Governo mandou para a Câmara dos Deputados uma proposta...
(Soa a campainha.)
O SR. JORGE VIANA (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - ... de acesso à biodiversidade em que o Governo não chegou a um consenso. Seis Ministérios não se entendiam. Mas que substâncias vão pagar benefícios para a comunidade ou para o meio ambiente quando forem transformadas em produtos? E nós fizemos a alteração.
Em vez de discutir se teria uma lista negativa dos produtos que pagam e dos que não pagam, nós falamos que o Governo vai estabelecer por decreto. Como é que nós podemos saber o que vai pagar ou não pagar se nós não conhecemos nossa biodiversidade? Então, foi da maior importância essa solução e foi mantida pela Câmara, e eu agradeço.
Outra, a Emenda 15, que o ato do Poder Executivo disciplinará a forma de repartição de benefícios na modalidade não monetária. Tem uma modalidade em que a natureza é que tem que ganhar, e isso também foi mantido.
Já estou concluindo, Sr. Presidente.
E outra: estão incluídos, aqui, o conceito de atividades agrícolas isentas, também, da repartição de benefício e a exploração econômica de material reprodutivo de espécies utilizadas para fins não alimentares, como a cana-de-açúcar utilizada para fins energéticos e a celulose utilizada para a produção de papel.
Então, esse foi um aperfeiçoamento importante.
O último ponto que foi votado, recepcionado pela Câmara, foi o que trata de algo que é só um ajuste, de que a implantação dos tratados internacionais sobre patrimônio genético ou conhecimento tradicional associado é quando aprovados pelo Congresso Nacional e promulgados, e não fazendo referência só aos de que o Brasil é signatário.
Eu concluo, então, Sr. Presidente, dizendo que algumas modificações...
(Soa a campainha.)
O SR. JORGE VIANA (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - ... aperfeiçoamentos importantes que havíamos feito não foram recepcionados.
Devo dizer que, como é uma lei que vai ser regulamentada e como é o primeiro passo que o Brasil dá para se tornar um exemplo de país de bioeconomia, de uma economia do século XXI, sustentável, uma economia que possa passar para os brasileiros, para quem vive na Amazônia... Há 25 milhões de pessoas vivendo na Amazônia, uma parte delas passando necessidade, morando na região mais rica do Planeta. Isso não tem sentido! Quer dizer, pessoas que moram no meio de riquezas, passando necessidade.
Com essa lei, estão criadas as condições para os Estados, para muitas comunidades desenvolverem atividades econômicas verdadeiramente sustentáveis, e quanto mais desenvolvermos atividades sustentáveis usando a floresta e os recursos naturais certamente estaremos mais preocupados para que ela não seja destruída.
Então, eu estou satisfeito...
(Soa a campainha.)
O SR. JORGE VIANA (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - ... cumpri meu papel, acho que a lei que se votou ontem, na Câmara, é muito melhor do que a que chegou aqui no Senado pela primeira vez, mas acho que o Brasil ainda tem muito a fazer nesse tema e espero que o Governo da Presidenta Dilma, que a Ministra Izabella Teixeira e outros Ministros possam nos ajudar a seguir lutando junto com o movimento socioambiental para que o Brasil tenha a melhor legislação de acesso à biodiversidade, a melhor legislação de acesso ao patrimônio tradicional das populações e à repartição de benefícios.
Digo a todos os seringueiros e habitantes da Amazônia - indígenas e não indígenas - que nós fizemos aqui uma boa luta...
(Soa a campainha.)
O SR. JORGE VIANA (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - ... tivemos grandes avanços, mas agora vamos ter que fazer uso da lei, conforme ela foi aprovada, ontem, na Câmara dos Deputados.
Muito obrigado, Presidente.