Discurso durante a 52ª Sessão Especial, no Senado Federal

Sessão especial destinada a homenagear os povos indígenas.

Autor
Wellington Fagundes (PR - Partido Liberal/MT)
Nome completo: Wellington Antonio Fagundes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM:
  • Sessão especial destinada a homenagear os povos indígenas.
Publicação
Publicação no DSF de 17/04/2015 - Página 197
Assunto
Outros > HOMENAGEM
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA INTERNACIONAL, INDIO, COMENTARIO, IMPORTANCIA, PAPEL, COMUNIDADE INDIGENA, HISTORIA, BRASIL, APOIO, GRUPO INDIGENA, MOTIVO, LUTA, SEGURANÇA, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA.

            O SR. WELLINGTON FAGUNDES (Bloco União e Força/PR - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Senador Telmário Mota, também quero comentar aqui a presença do nosso Senador João Capiberibe, que foi o autor da indicação desta sessão solene em homenagem aos povos indígenas; do nosso Senador Randolfe, sempre aqui presente, com a sua grande competência, apesar de jovem.

            Saúdo também o Senador Raupp e o Presidente da Funai, Flávio Chiarelli, a quem cumprimento. Tivemos oportunidade de ter duas audiências, e quero aqui, de público, manifestar que fiquei muito bem impressionado. E espero que a sua juventude e a sua sabedoria possam fazer as renovações e, principalmente, a modernização que a Funai precisa alcançar. Eu quero aqui parabenizar, então, todos os funcionários da Funai, na pessoa do seu Presidente.

            Eu fiquei muito feliz de ouvir aqui, Piracumã, a sua fala, parecendo um sábio político usando esta tribuna, porque, neste momento de crise que vive o País, o que mais entendemos ser necessário é exatamente as suas palavras finais: não adianta quebrar; adianta é dialogar.

            E hoje nós vivemos uma crise. Eu, que estou aqui no Congresso Nacional há 24 anos, indo para o 25º ano - primeiro ano como Senador -, nunca vivi uma crise como a que o Brasil vive.

            Uma crise acumulada, que é uma crise econômica e também uma crise política. E nós entendemos que o caminho para que essa crise seja debelada é exatamente este, o diálogo.

            Então, mais uma vez, o índio vem aqui dar aula no Congresso Nacional. (Palmas.)

            Eu sei do sofrimento que todos vocês, ao longo do tempo, passam. Falou-se aqui da questão da saúde. Resolveu-se mudar aquilo que estava funcionando razoavelmente bem, e hoje eu sei o quanto sofre a população indígena brasileira com a saúde deficiente. E aí quero acreditar que não é por falta de recurso; é muito mais pelo gerenciamento desse recurso, pelo desperdício que às vezes acontece, administrado por nós, os brancos.

            Eu, na campanha, Piracumã, cheguei a falar em alguns momentos... E aí não quero aqui ofender a figura do presidente que está hoje como presidente. Falei até que ia estudar para apresentar aqui um projeto para que presidente da Funai tenha que ser índio, escolhido por índios, e não por brancos. (Palmas.)

            Digo isso porque entendo que quem mais vive a dificuldade e sabe os problemas que vive a população indígena são vocês que aqui estão, muitos sem camisa, mas exatamente de acordo com aquilo que mais vocês pregam, que é a preservação da natureza, a preservação do homem como ele nasceu, como ser humano, com o coração, acima de tudo, na proteção da vida.

            Quero aqui cumprimentar também o Neguinho Truká, cumprimentar o Davi, que representam aqui as várias etnias. Lá do meu Estado, quero saudar, como você saudou, o Raoni e o Megaron, que são dois grandes caciques, reverenciados pelo mundo todo.

            Eu aqui preparei um pronunciamento, mas não tenho a pretensão de lê-lo. Quero, Presidente, dá-lo como lido, para que seja também registrado nos Anais desta Casa e publicado nos nossos meios de comunicação.

            Mas quero dizer que os povos indígenas em Mato Grosso fazem parte do nosso cotidiano. Em Rondonópolis, minha cidade natal, há várias aldeias da etnia bororo. Eu, que lá na nasci, pude conviver desde criança com os índios bororos. Um povo bonito, mas também muito sofrido. Por isso, sempre procuramos atender a todos, respeitando principalmente a cultura indígena.

            Presidente Randolfe, lembro-me bem de que, há uns oito anos, na aldeia dos índios bororos, havia um índice muito alto de mortalidade infantil. Fomos lá e conversamos. E o que era o problema? Era a falta de saneamento básico. Os índios estavam tomando água dos rios contaminada pelos brancos. Conseguimos um recurso de pouco dinheiro. Furamos um poço artesiano, levamos a energia elétrica, e praticamente se resolveu o problema da mortalidade infantil. Melhorou a qualidade de vida dos índios. A escola pôde ter energia elétrica. Chegou a geladeira, chegou a televisão.

            Então, muito aqui se discute: o índio aculturado tem que ter o benefício, o conforto que os brancos têm? Com certeza, todos querem uma saúde condizente, uma educação condizente, querem atenção do Estado brasileiro.

            É por isso que aqui estamos, Sr. Presidente, para dizer que a efetiva colonização pelos portugueses e paulistas do território hoje compreendido pelo Estado de Mato Grosso iniciou-se somente 219 anos após o descobrimento do Brasil. Historiadores e cronistas do século XIX, que estudaram e registraram a evolução da questão indígena, são categóricos em afirmar que o Imperador Pedro II tratou a causa do índio brasileiro com bastante particularidade, culminando com a abolição total da escravatura, em 1888, incluindo-se, aí, negros e índios.

            Estudiosos mostram que, após a Proclamação da República, ocorreram muitos fatos dignos de nota. Porém, a questão do índio, apesar dos avanços obtidos, está longe de ter um final feliz. Há muitas lutas para a consolidação da política indígena no Brasil.

            Sr. Presidente, eu quero aqui também dizer que a nossa capital, Cuiabá, no ano passado, foi sede dos jogos dos povos indígenas. Lá estiveram presentes etnias de todos os Estados brasileiros e, inclusive, de outros países. Este ano, vai acontecer no Tocantins. Quero dizer que essa também é uma iniciativa que devemos apoiar, porque é uma forma de as etnias, a população indígena, poderem mostrar para o mundo a existência do índio, com sua cultura e sua força no Brasil.

            No ano passado, eu aloquei um recurso, Sr. Presidente da Funai, que já está empenhado, já está liberado para a Prefeitura de Canarana, no Araguaia, na região dos nossos índios xavantes e outros tantos. Um recurso de R$600 mil.

            Os índios estão pedindo mais apoio e a presença da Funai nesses jogos. Falei agora há pouco com o Presidente e gostaria que a Funai pudesse participar, pois serão os primeiros jogos indígenas do Xingu. Estão previstos para acontecer entre o dia 24 e 28 de junho, na aldeia-sede de Kuikuro, próxima a esse Município que citei.

            Os jogos terão a participação de 14 aldeias indígenas do Xingu, e cerca de 3 mil índios participarão dos cinco dias de competições.

            Quero dizer que a aldeia está se preparando há dois anos para a realização dos jogos, que terão competições masculinas e femininas. Somente o futebol será da nossa cultura, o restante dos esportes será da cultura indígena: arremesso de lança, arco e flecha, cabo de força, a corrida tora-tora, enfim, muitos outros.

            Quem está coordenando isso é o Cacique Afukaká Kuikuro, e junto com ele uma índia que trabalha aqui no Senado da República. Foi ela que me procurou através da minha assessoria, a Rayane Parcateg. E também o coordenador das aldeias, o Tabata Kuikuro.

            Eles pedem a manutenção da balsa, que foi doada pelo governo do Mato Grosso, na época do nosso Governador Blairo Maggi, que é Líder do meu Partido, o PR. E aqui estou falando também em nome dele.

            Quero registrar ainda que está presente conosco, e ele fez questão de vir, o Vereador da cidade de Peixoto de Azevedo, Gilmar Santos. Ele está atrás do fotógrafo da Funai, que está registrando o evento e é também do Mato Grosso. Ele é aquele de cabelo branco, barba branca. É um grande profissional e muito competente.

            Também quero dizer que tivemos oportunidade de abrigar índios que não eram do Mato Grosso, os índios Terena. O Estado de Mato Grosso do Sul é um Estado que não tem a mesma quantidade de etnias, mas tem uma população indígena muito grande que é pressionada exatamente pela agricultura, que foi tomando suas terras. E os índios Terena vivem lá praticamente confinados.

            Eles foram para Rondonópolis, a minha cidade, onde tivemos muitos momentos de discussão e conseguimos uma área na cidade de Peixoto, em Matupá de 50 mil hectares, liderada pelo índio Rondon. E no dia 5 de maio, vamos fazer aqui, neste plenário, uma sessão do Congresso, proposta por mim juntamente com meu companheiro da Câmara dos Deputados, Deputado Nilson Leitão, em homenagem a Rondon, o patrono das comunicações brasileiras, que era índio, nascido em Santo Antônio do Leverger, bem próximo a nossa capital. Será mais uma oportunidade que teremos. Como disse alguém, todo dia é dia de índio, mas o dia 5 de maio também é um dia especial.

            Portanto, quero aqui concluir minhas palavras, mais uma vez parabenizando o Senador João Capiberibe por propor esta sessão solene em homenagem àqueles que fizeram tudo por este Brasil, principalmente para fazer com que o Brasil continuasse integrado. Um país gigantesco como o nosso, um país continental, se não fosse o trabalho de vocês, dos índios que estiveram aqui, com o arco, com a flecha, lutando, talvez o Brasil tivesse sido dividido em muitos países.

            Então, fica aqui a minha homenagem a todos aqueles que fazem a verdadeira preservação ambiental do Brasil, que são vocês, os nossos irmãos índios. E quero, mais uma vez, aqui homenagear o ex-Deputado Federal xavante, nosso companheiro, Mário Juruna. Tive, inclusive, a oportunidade de ir ao velório dele na cidade de Barra do Garças. E, por incrível que pareça, Sr. Presidente, só havia eu de autoridade pública do Congresso Nacional. Mas fiquei com muita honra, porque pude representar o Congresso Nacional, na época, em uma cerimônia simples, mas em homenagem a um índio que marcou época aqui, com seu gravadorzinho. Ele dizia: eu tenho que gravar, porque a conversa do branco tem de ser gravada, para provar que ele falou.

            Então, ficam aqui minhas saudações, felicidades e parabéns a todos! (Palmas.)

 

SEGUE, NA ÍNTEGRA, PRONUNCIAMENTO DO SR. SENADOR WELLINGTON FAGUNDES

            O SR. WELLINGTON FAGUNDES (Bloco União e Força/PR - MT. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, não pretendo me estender muito. Mas também não poderia deixar de me manifestar nesta solenidade tão ilustrativa. Especialmente eu que sou de um Estado onde temos uma variedade muito grande de representantes nativos.

            Como em todos os estados, há também dificuldades aos povos indígenas de Mato Grosso, que vivem sob diferentes realidades. HÁ toda sorte de problemas.

            Os povos indígenas em Mato Grosso fazem parte do nosso cotidiano. Em Rondonópolis, mesmo, minha cidade, há várias aldeias da etnia Bororó, um povo bonito, mas muito sofrido também. Por isso, sempre procuramos atender a todos, respeitando principalmente a cultura indígena.

            Sr. Presidente! A efetiva colonização pelos portugueses e paulistas, do território, hoje compreendido pelo Estado de Mato Grosso, iniciou-se somente 219 anos após o descobrimento do Brasil. Historiadores e cronistas do século XIX, que estudaram e registraram a evolução da questão indígena, são categóricos em afirmar que o Imperador Pedro II tratou a causa do índio brasileiro com bastante particularidade, culminando com a abolição total da escravatura, em 1888, incluindo-se, aí, negros e índios.

            Estudiosos mostram que após a Proclamação da República ocorreram muitos fatos dignos de nota, porém a questão do índio, apesar dos avanços obtidos, está longe de ter um final feliz. Há muitas lutas para consolidação da política indígena.

            Mas hoje é um dia de comemoração e reflexão.

            Como se sabe, a determinação exata do Dia do índio remonta a 1940, ano da realização, no México, do Primeiro Congresso indigenista Interamericano, com a participação de representantes dos mais diversos países.

            Naquele contexto, e também por conta da opressão histórica que suportavam, os índios, em um primeiro momento, declinaram do convite, mas, logo depois, tiveram a grandeza de mudar de posição: acabaram decidindo participar do evento, no dia 19 de abril, razão pela qual a data passou a ser festejada, nas Américas, como o Dia do índio.

            Srªs e Srs. Senadores, imbuídos das mais elevadas aspirações de nossa sociedade, os congressistas da Assembléia Nacional Constituinte souberam elaborar um texto constitucional que, amplamente discutido, rege nossa vida coletiva desde o ano de 1988. E nossa Constituição Cidadã dedica todo um capítulo à proteção do índio brasileiro, conforme se lê no art. 231 (abro aspas):

            "São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens" (fecho aspas).

            Além de albergar em seu texto imperativo moral tão relevante - a proteção das tradições indígenas -, a Constituição também garante aos índios o meio físico para a sua reprodução física, social e cultural, mediante o reconhecimento da posse aos índios das terras por eles ocupadas, que permanecem de propriedade da União.

            Cabe-nos, contudo, transcender a mera garantia da conservação da cultura indígena: é preciso que ampliemos, em muito, nosso conhecimento a respeito da cultura indígena, pois a valorização do intercultural haverá de aprofundar o imenso respeito que todos devemos aos compatriotas indígenas.

            Srªs e Srs. Senadores, ao longo deste ano de 2015, como em qualquer outro ano, todas as efemérides haverão de ser relembradas nos espaços públicos. Em se tratando, mais especificamente, da celebração do Dia do índio, caberia a cada um de nós a pergunta: o que temos a aprender com estes nossos ancestrais comuns? O que, exatamente, podem nos ensinar as interações sociais dos índios, seus ritos religiosos e sua tão estreita relação com a Natureza?

            Sem dúvida, podemos afirmar que, em tempos de brutalização da sociedade pela banalização da violência, e do acúmulo de maus tratos ao Meio Ambiente, em um processo histórico que remonta à Revolução Industrial, os índios têm o que nos ensinar acerca do dever de cuidado que nos cabe, para com o idoso e a criança, o rio e a árvore, o ar que respiramos e a vida animal.

            Do mesmo modo, podem os índios nos inspirar no cultivo de respeito mútuo para com os demais cidadãos e com as outras sociedades humanas, no interior de nosso território ou para além de nossas fronteiras.

            Por isso, cabe-nos continuar o esforço pela demarcação e pelo respeito às terras indígenas, na certeza de que, neste processo, somos todos beneficiados, pela conservação ambiental promovida pelos próprios índios em suas terras.

            A nós nos cabe; ademais, atuar politicamente para alterar, positivamente, a difícil realidade hoje vivida por tribos como a dos guarani-kaiowá, cujos integrantes muitas vezes perdem a própria vida na luta pela conservação de suas terras, reiteradamente invadidas por ocupantes violentos.

            Naquela admirável tribo do Mato Grosso do Sul, nosso Estado vizinho, a fome e o alcoolismo ameaçam a própria existência dos índios, que também sofrem com a perda de seu espaço demarcado, e este triste estado de coisas, a ser revertido, lamentavelmente se replica em diversas outras regiões e unidades da Federação.

            Inclusive para alguns povos do meu Mato Grosso.

            Srªs e Srs. Senadores, no mês em que comemoramos o Dia do índio, cabe a nós voltar nossos pensamentos e nossa ação coletiva para a causa indígena no Brasil, inclusive para a preservação das línguas indígenas, que merecem todo o fomento do Estado brasileiro, para que sejam devidamente mantidas.

            Nossa pátria enfrenta, no presente, desafios que necessitam ser vencidos, para que um novo tempo de paz, de concórdia, de respeito mútuo e de vida civilizada e cidadã possa se instaurar, em definitivo, em nosso ambiente social.

            Começaremos muito bem o esforço conjunto com a reiteração do valor e da importância do legado indígena para a sociedade brasileira, valorização que deve resultar de políticas públicas em proteção aos índios e da contenção do agressor às suas terras e à sua existência, para que um tempo de paz e de concórdia possa se instaurar em todos os recantos do Brasil.

            Era o que eu tinha a dizer.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/04/2015 - Página 197