Discurso durante a 95ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Incredulidade na execução do Programa de Investimentos em Logística apresentado pelo Governo Federal.

Autor
Aloysio Nunes Ferreira (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/SP)
Nome completo: Aloysio Nunes Ferreira Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Incredulidade na execução do Programa de Investimentos em Logística apresentado pelo Governo Federal.
Publicação
Publicação no DSF de 12/06/2015 - Página 275
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • QUESTIONAMENTO, VIABILIDADE, PROGRAMA DE GOVERNO, INVESTIMENTO, LOGISTICA, REFERENCIA, CONSTRUÇÃO, FERROVIA, LIGAÇÃO, OCEANO ATLANTICO, OCEANO PACIFICO, COMENTARIO, SITUAÇÃO, CRISE, ECONOMIA NACIONAL.

O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco Oposição/PSDB - SP. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sena-

dor Caiado teria imenso prazer em ceder a vez a V. Exa, para ouvi-lo com a atenção e a admiração de sempre. Muito obrigado.

    Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, mais um Programa de Investimento em Logística (PIL). Este Gover- no é pródigo em siglas e avaro em realizações. É o segundo. Houve um, há dois anos, que não deu certo, in- felizmente. A execução do programa foi pífia, para usar um termo que é muito repetido quando se fala das realizações do atual Governo. Mas esse programa, que foi lançado em uma cerimônia, mais uma cerimônia de lançamento de programa, prevê investimentos de R$198,41 bilhões. Importância considerável! Para qualquer moeda é muito dinheiro. Acontece que apenas 35% desse recurso, ou seja, R$69 bilhões estão destinados, se tudo der certo - e espero que dê, sinceramente -, durante o Governo da Presidente Dilma.

    Apenas a título de comparação, o Governo anuncia um plano ou um programa de investimentos que implicará gasto de 69 bilhões no Governo Dilma quando, apenas no seu primeiro ano, o mesmo Governo con- tingenciou, cortou do Orçamento R$69 bilhões, ou seja, apenas no primeiro ano, o Orçamento da República foi diminuído no mesmo montante de recursos que seria aplicado nos quatro anos do Governo Dilma, a título do programa de investimento, apenas para que o Senado reflita sobre a ordem de grandeza desses números.

    Acontece que temos que caminhar, quando se trata da análise desse programa, com uma imensa torcida para que tudo dê certo, sabendo que há fatores de extrema complexidade para a sua realização. Complexida- de nos programas em si, nos projetos anunciados neles mesmos, mas complexidade agravada pela incompe- tência astronômica de um governo que procura complicar cada vez mais aquilo que já é complicado e aquilo que é simples também.

    Na verdade, Sr. Presidente, nós temos aqui um conjunto de promessas. É claro que é há um fato positivo que já foi ressaltado aqui pelo Senador Cristovam Buarque. É o fato de que o Governo, sem fazer mea-culpa, na prática faz uma autocrítica ao adotar largamente o conceito de privatização para atrair capital privado para

investimentos no setor público.

Um Governo que se vê às voltas com déficit muito grande de recursos financeiros e com déficit gerencial

maior ainda, não obstante os 39 ministérios que o compõem, evidentemente tem tudo a ganhar - e o Brasil tem tudo a ganhar - se o capital privado, em busca de lucro, essa palavra maldita para os petistas, investir em empreendimentos de interesse público.

    Acontece, Sr. Presidente, que já houve uma versão desse programa em 2012. E, em 2012, o resultado da realização foi pouco além de 20% do conjunto dos investimentos e dos projetos anunciados.

Não há desta vez, tampouco, qualquer garantia de que as coisas possam andar melhor.

    A Presidente Dilma faz também um esboço de autocrítica ao lançar o programa, dizendo que o Governo aprendeu com os erros do passado.

    Tomara que tenha aprendido. Ela, desta vez, não joga a culpa da crise que nós estamos vivendo nas cir- cunstâncias internacionais e, pela primeira vez, pronuncia uma palavra que está na boca de todos os brasileiros: crise, a crise financeira, que não é apenas financeira. É uma crise de inflação, é crise de confiança no governo, é crise de juros altos, é uma crise de falta de investimentos, de falta de competitividade. E é uma crise política, é uma crise ética, mas, enfim, a palavra crise pela primeira vez foi pronunciada pela Presidente da República.

    Dizia que não há nenhuma garantia de que esse novo programa possa ter um êxito maior do que teve em 2012, apesar da autocrítica da Presidente.

    Apenas a título de lembrança, no PIL 1, Programa de Investimento em Logística 1, foram alinhados pro- gramas que previam o aporte de recursos privados em ferrovias, portos e rodovias que acabaram não saindo do papel, e não saíram do papel por várias razões: por erro de planejamento, por problemas de licitação que acabaram por levar esses programas a enormes embaraços para o Tribunal de Contas da União, problemas de insuficiência regulatória e a ideia de que não há segurança jurídica no País. A ideia é confirmada pela maneira desastrada, arbitrária e desastrosa que a Presidente, com o apoio da sua maioria parlamentar, promoveu inter- venção no setor elétrico, intervenção essa que, aliás, teve resultados dramáticos para os brasileiros: a redução de investimentos no setor e o aumento da conta de energia, que já ultrapassa 50% em um ano.

    Havia também uma concepção desses projetos que tendia a demonizar o lucro, como se as empresas chamadas a investir nesses empreendimentos o fizessem apenas por benemerência, sem o objetivo do lucro.

    Então se procurou, por exemplo, em rodovias, fazer a licitação pela menor tarifa. Ganhava a licitação a empresa que se oferecesse a cobrar a menor tarifa de pedágio. Não se cobrava a chamada outorga. O que é a outorga? É uma importância em dinheiro correspondente ao uso daquele patrimônio público que foi entre- gue à iniciativa privada. Simplesmente, entregou-se de graça o patrimônio público, representado por estradas que, bem ou mal, já estavam construídas, para que as empresas as explorassem mediante a cobrança de uma tarifa, supostamente, bem baratinha.

    O resultado é o seguinte: tarifa barata, sim, só que não há obra. Então, o usuário paga uma tarifa barata, mas continua andando em estradas que não são conservadas, esburacadas, que não têm sinalização, em que cresce mato no acostamento, em que as obras prometidas são sempre adiadas, como a tão esperada duplica- ção, por exemplo, meu caro Senador Caiado, de 18km apenas ali perto da minha São José do Rio Preto, obra que chegou a ser anunciada pela Presidente Dilma quatro anos atrás, e até agora não saiu do papel. Concep- ção de que o lucro é proibido.

    Há indicações de que, neste novo pacote, a Presidente tenha também avançado na sua autocrítica, na prática, e voltado ao modelo anterior, que foi o modelo aplicado com muito êxito, por exemplo, no Governo José Serra, em São Paulo. Nós cobramos a outorga fixa e, além da outorga, ganhava a licitação a empresa que oferecesse a menor tarifa, combinando-se os dois critérios: outorga e tarifa. O resultado foi que nós arrecada- mos R$8 bilhões, que foram investidos nas rodovias do Estado de São Paulo, inclusive no Rodoanel.

    Parece que o Governo se encaminha para esse entendimento. Agora, a suspeita de que há muita fumaça e pouco fogo vem quando se olha um pouco mais de perto alguns desses projetos. E eu me refiro ao projeto da ferrovia - como é que se chama mesmo?

O Sr. Ronaldo Caiado (Bloco Oposição/DEM - GO. Fora do microfone.) - Bioceânica.

    O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco Oposição/PSDB - SP) - Bioceânica, que já ganhou hoje um apelido. Eu não me lembro qual é. Peço a minha assessoria que me informe depois, por favor. Drª Ana Lobato, diga-me, por gentileza. Venha até aqui para me dizer o nome de fantasia que já recebeu essa ferrovia, que é um empreendimento, em princípio, chinês. São US$40 bilhões. Que maravilha! Quarenta bilhões de dólares para se fazer uma ferrovia que vai ligar, se não me engano, Lucas do Rio Verde até o Peru. Uma obra gigantesca. Uma obra que vai requerer um planejamento rigoroso, um exame de viabilidade muito preciso licenças ambientais, estudos ambientais complexos. Se até agora a Ferrovia Norte-Sul não conseguiu se concluir, se até agora a Trans- nordestina não foi concluída, imaginem os senhores essa ferrovia chamada TransPeru? Será muito mais difícil.

Agora, vamos verificar qual foi o ato internacional em que se baseia essa expectativa de US$40 bilhões

dos chineses. Trata-se de um memorando de entendimento. O que é um memorando de entendimento, diga- mos assim, na acepção técnica no sistema de Atos Internacionais do Ministério de Relações Exteriores, Senador Caiado, V. Exª que é um membro assíduo e valoroso da nossa Comissão de Relações Exteriores? A Presidente Dilma assinou com os chineses um memorando de entendimento. O que é um memorando de entendimen- to? É o seguinte - abro aspas:

Designação comum para atos redigidos de forma simplificada, destinados a registrar princípios ge- rais que orientarão as relações entre as partes, seja nos planos político, econômico, cultural e outros.

    Quer dizer, não há nenhum acordo fechado! É apenas uma ideia! É somente uma ideia! Uma ideia até menos palpável do que a megalomania delirante do trem-bala, porque o trem-bala pelo menos tinha um tra- çado e se dizia de onde ia sair e aonde ia chegar, mais ou menos o custo. Isso não tem nada, não é nada, rigo- rosamente, nenhum projeto e nenhum estudo, nada mais sério a embasá-lo. Portanto não é um compromisso firme. E, se fosse um compromisso firme, muita gente se pergunta, meu prezado colega Senador Blairo Maggi, se o custo do transporte da tonelada de soja por essa ferrovia TransPeru será, efetivamente, um custo com- petitivo. Será que vai custar mais barato transportar essa soja do Centro-Oeste brasileiro até o Peru e, a partir daí, exportá-la para a China? Ou será que é mais barato seguir um outro caminho? Não digo nem Santos nem Paranaguá, mas os portos do Norte do Brasil.

    Os estudos que foram feitos, Srs. Senadores, por uma associação que congrega transportadores de soja chegam à conclusão de que uma tonelada de soja embarcada em Lucas do Rio Verde, Mato Grosso, a Xangai, na China sai por US$120,43 se for embarcada pelo Porto de Santos. Agora, se sair pelo Porto de Ilo, no Peru, o frete sairá por US$166,92, ou seja, uma diferença de US$46,49 por tonelada a mais. A se supor que essa ro- dovia fosse entregue montadinha, prontinha pelos chineses, sem um tostão de gasto do Governo brasileiro, simplesmente pronta para operar, talvez até operada por chineses, ainda assim seria mais caro o transporte por essa ferrovia até a China, via Porto do Peru, do que o seu custo hoje, que já é bastante caro, se ela fosse transportada pelo Porto de Santos.

    Então, Srs. Senadores, não vejo onde está a vantagem disso, fora o paralelismo entre uma ferrovia e uma rodovia que está sendo objeto de grande investimento agora no seu Estado. Serão dois meios de transporte absolutamente paralelos. Não sei se um não brigará com o outro, mas, enfim, o Governo deve ter feito lá os seus cálculos, imagino eu.

O fato, Sr. Presidente, é que não vejo com muito otimismo o anúncio desse programa.

    Há um problema sério além de todos aqueles que apontamos: o problema da instabilidade regulatória no Brasil.

    Já me referi à intervenção desastrada da Presidente no setor elétrico, já me referi ao preconceito ideo- lógico contra a mola fundamental que move o sistema capitalista, que é o lucro. Além disso, Sr. Presidente, é preciso constatar a situação das agências reguladoras.

    As agências reguladoras foram desmanteladas, estranguladas orçamentariamente. Elas foram apropria- das por interesses privados, apropriadas por pessoas indicadas, por grupos políticos, partidos políticos, por chefes políticos, e não oferecem a maioria delas nenhuma confiabilidade nas suas decisões, que deveriam ser eminentemente técnicas, eminentemente de Estado, para velar pelo bom cumprimento dos contratos de concessões, pela satisfação dos serviços prestados aos usuários. Quantas e quantas agências continuam ainda funcionando com interinos, a começar exatamente pela Agência de Transportes Terrestres?

    Sr. Presidente, estou torcendo para que dê certo, porque a expectativa é que move o mundo. A esperan- ça move o mundo. Eu, como gato escaldado, tenho medo de água fria. Obviamente o Congresso está à dispo- sição para ajudar naquilo que for necessário, mas, basicamente, o êxito desse programa depende do Governo Federal, que precisaria crescer muito, não em tamanho, que já é muito grande, mas em competência e espírito público, para que um programa dessa natureza possa ter o resultado esperado.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/06/2015 - Página 275