Discurso durante a 108ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro de audiência pública ocorrida na CDH para debater o caso da criança Amy Galvin, cuja guarda é disputada por mãe brasileira e pai americano.

Autor
Humberto Costa (PT - Partido dos Trabalhadores/PE)
Nome completo: Humberto Sérgio Costa Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS E MINORIAS:
  • Registro de audiência pública ocorrida na CDH para debater o caso da criança Amy Galvin, cuja guarda é disputada por mãe brasileira e pai americano.
Publicação
Publicação no DSF de 30/06/2015 - Página 97
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS E MINORIAS
Indexação
  • REGISTRO, PARTICIPAÇÃO, AUDIENCIA PUBLICA, LOCAL, COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS (CDH), SENADO, OBJETIVO, DEBATE, ASSUNTO, DISPUTA, GUARDA, CRIANÇA, MÃE, NACIONALIDADE BRASILEIRA, PAI, NACIONALIDADE ESTRANGEIRA.

            O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Apoio Governo/PT - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Obrigado, Sr. Presidente.

            Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, telespectadores da TV Senado, ouvintes que nos acompanham pela Rádio Senado, nós tivemos a oportunidade de realizar, durante toda a manhã desta segunda-feira, uma audiência extremamente produtiva, na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa desta Casa, sobre o caso da criança Amy Galvin.

            Amy é filha da pernambucana Karla Janine Albuquerque e do norte-americano Patrick Joseph Galvin, que é acusado pela mãe da criança de abuso sexual contra a menina.

            Desesperada com a situação, Karla deixou a Flórida, onde residia, levando a filha para o Texas no ano passado.

            Em razão disso, foi presa pelas autoridades dos Estados Unidos e hoje responde a um processo em liberdade, mas perdeu a guarda da criança, que agora está sob a responsabilidade exclusiva do pai.

            Há um ano e meio, mãe e filha vivem esse drama, que envolve uma dura batalha judicial travada nos tribunais norte-americanos.

            Na audiência de hoje, que foi realizada por um requerimento de minha autoria, nós procuramos dar uma projeção maior ao caso para tentar chegar a um desfecho favorável para a família e, principalmente, para Amy, que é uma criança de apenas sete anos de idade.

            Trouxemos para o debate representantes do Itamaraty, do Conselho Nacional de Justiça, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e do Ministério da Justiça. Da mesma Mesa participou a Drª Kátia Albuquerque, defensora pública aposentada, que é a avó da criança.

            De fato, todos foram unânimes em reconhecer que a margem de manobra do Brasil é limitada, dada a impossibilidade de interferir nas decisões soberanas do Judiciário americano.

            Os relatos do Ministério das Relações Exteriores também não foram muito animadores. Segundo o Itamaraty, que acompanha o caso por meio do nosso Consulado-Geral em Miami, não há - ao contrário do que sustenta a família da garota - condenação na Justiça americana do Sr. Patrick Galvin, pai de Amy, por abuso sexual, ainda que outras informações coloquem uma posição diferenciada.

            Contudo, o Departamento de Aplicação da Lei do Estado da Flórida, onde ele reside atualmente, traz, em seus arquivos, o Sr. Patrick Galvin fichado como um abusador sexual de menores - com foto atualizada, aliás, de fevereiro passado - por um caso ocorrido em 1996. E, aqui, eu tenho cópia dessa página atualizada. Procuramos fazer essa pesquisa diretamente na página do Departamento, onde consta essa qualificação do pai da criança. Inclusive, causa-nos espécie o fato de que a Justiça americana não tenha dado atenção a esse registro.

            Legalmente, isso não parece ser suficiente para as autoridades americanas, que deram a guarda de Amy ao pai biológico e conferiram à mãe não mais que o direito de guarda assistida após o episódio da fuga para Texas. Ou seja, a convivência de Karla com a filha, quando ocorre, é supervisionada, todo o tempo, por agentes oficiais.

            Outra questão que causa espécie é o fato de, segundo relatos da mãe e da avó da criança, ela ter feito referência ao fato de ter sofrido um suposto abuso por parte desse pai. Na escola teria relatado situações dessa natureza. Houve, inclusive, solicitação da Justiça para que fosse feita uma investigação, uma averiguação, inclusive com a participação de psicólogos, em que a criança teria, segundo diz a mãe, confirmado esse depoimento. Mas isso não foi levado em consideração pela Justiça.

            Nós não estamos aqui pra fazer prejulgamento de quem quer que seja, mas é importante que um País que tem uma atenção, um cuidado tão especial com as crianças, com a possibilidade de assédio sexual e abuso sexual a crianças, tenha tido, por parte de um segmento da sua Justiça, talvez, um certo descaso em considerar alguns fatos que nos parecem ser relevantes - ao menos para serem afastados definitivamente.

            A assessoria jurídica do Itamaraty tem sugerido que a família brasileira, que a família da mãe de Amy reconquiste a confiança da Justiça americana para que o caso possa ter um bom termo. Mas é absolutamente compreensível que, diante da indignação provocada pelo drama familiar, seja difícil seguir à risca a frieza da estratégia jurídica.

            A família materna de Amy, segundo nos relatou a Ministra Luiza Lopes da Silva, representante do Ministério das Relações Exteriores, teria se distanciado da linha do Consulado, da assessoria jurídica local e mesmo da Defensoria Pública americana para insistir no reconhecimento do Sr. Galvin como pedófilo e, dessa forma, afastar de vez a criança da convivência com ele.

            Para o Itamaraty, o mais razoável seria conseguir, neste momento, a guarda compartilhada da criança, mas foi extremamente tocante - eu diria até angustiante - ouvir o relato emocionado da Drª Kátia Albuquerque, avó de Amy, que tem sido, junto com a filha Karla, uma guerreira na luta pela guarda da criança.

            No próximo dia 24 de julho, teremos uma nova audiência sobre o caso, em um Tribunal da Flórida, e esperamos por novos e - tomara - positivos desdobramentos.

            Tivemos também a oportunidade de ouvir de outras mães, lá presentes, situações parecidas, e ficou muito claro que o caso Amy acaba servindo para exemplificar uma série de outros dramas nascidos no seio de famílias binacionais. Quando acaba a relação do casal, muitas vezes, tem início uma terrível disputa envolvendo a guarda dos filhos existentes nesse relacionamento.

            No plenário da Comissão de Direitos Humanos mesmo, havia duas mães nessa situação, às quais franqueei a palavra para que pudessem dar os seus depoimentos. Uma delas, Jacy Raduan, não vê a filha com síndrome de Down há três anos, desde que a criança foi repatriada do Brasil para a Alemanha. Outra, a Srª Eliana März, está afastada das duas filhas, que também estão na Alemanha há mais de cinco anos. Esses, então, são casos terríveis que se repetem mais do que gostaríamos e que não podem ser vistos como a disputa entre ex-companheiros nos autos frios de um processo.

            Esses casos tratam, de fato, da vida de crianças, que precisam ter um mínimo de estabilidade física, psíquica e emocional garantida, para que possam se desenvolver de uma maneira saudável e equilibrada.

            Fomos cobrados aqui por algumas das autoridades presentes a que participássemos mais ativamente da conformação da nossa legislação a regras internacionais que deem celeridade a processos e possam defender mais ativamente o interesse das nossas crianças. Há alguns acordos e algumas convenções nesse sentido que o Executivo mandou ao Congresso para que fossem votados e que estão estacionados pelos escaninhos das Comissões, tanto na Câmara quanto aqui no Senado.

            Assumi, com a Associação das Mães de Mãos Vazias, que defende os interesses dessas mães que litigam por seus filhos com dupla nacionalidade, o compromisso de realizar uma audiência mais ampla ou, quem sabe, até um seminário para discutirmos a implementação de novos mecanismos em favor dessa causa.

            Paralelamente, tomei nota dos acordos e convenções mais significativos em tramitação neste Congresso e vou trabalhar para que seja acelerada a discussão e a votação de todos eles.

            Estou certo de que, se dotarmos a nossa legislação de instrumentos eficazes, casos como o de Amy serão cada vez mais raros, e nós poderemos garantir às nossas crianças binacionais, dessa forma, a segurança jurídica necessária de poder crescer ao lado da mãe ou do pai brasileiro.

            Obrigado, Sr. Presidente, pela sua tolerância.

            Muito obrigado a todas e a todos.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/06/2015 - Página 97