Discurso durante a 103ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas à missão oficial de Senadores brasileiros à Venezuela.

Autor
Lindbergh Farias (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Luiz Lindbergh Farias Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL:
  • Críticas à missão oficial de Senadores brasileiros à Venezuela.
Publicação
Publicação no DSF de 23/06/2015 - Página 173
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL
Indexação
  • CRITICA, MISSÃO OFICIAL, MEMBROS, SENADO, COMPOSIÇÃO, SENADOR, OPOSIÇÃO, LOCAL, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, MOTIVO, AUSENCIA, ETICA, RELATORIO, CIRCUNSTANCIAS, VIAGEM, REGISTRO, GOVERNO FEDERAL, APOIO, REALIZAÇÃO, MISSÃO, DISPONIBILIDADE, AERONAVE, FORÇA AEREA BRASILEIRA (FAB), EMBAIXADA DO BRASIL.

            O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, eu assumo a tribuna, neste dia de hoje, para falar sobre a missão do Senado Federal, que foi à Venezuela, na semana passada.

            Primeiro, eu acho que houve, para ser delicado, uma falta de cuidado, uma falta de equilíbrio, desde o começo, antes da viagem, para não falar que houve algumas inverdades. Primeiro, dizia que o Governo brasileiro não ia ceder o avião da FAB para essa missão de Senadores se deslocarem até a Venezuela. Ficou claro, e o próprio Ministro Jaques Wagner ligou, diretamente, para o Presidente da Comissão de Relações Exteriores, Aloysio Nunes, colocando à disposição o avião da FAB.

            Segundo, na terça-feira da semana passada, nós acordamos com a notícia estampada em todos jornais, que a Venezuela havia negado o pouso do avião da FAB. Outra inverdade. Em momento algum, a Venezuela negou que o avião pousasse em Caracas.

            Agora, vem esta versão - falta de cuidado, novamente, dos Senadores - dizendo que o Embaixador Ruy Pereira desapareceu, não acompanhou a comitiva.

            Ora, ficou claro, porque o Itamaraty respondeu, que isso não era a verdade. O Embaixador Ruy Pereira havia comunicado a Eduardo Sabóia, que é assessor da Comissão de Relações Exteriores, que não estaria junto à comitiva. E sabe por que ele não estaria junto à comitiva? Porque não podia, porque fere todas as regras diplomáticas.

            Dentro da van em que os Senadores saíram em direção ao presídio, estavam as principais lideranças da oposição venezuelana. Estava a Maria Corina, estava a esposa de Leopoldo López. Então, o Embaixador simplesmente não poderia ir, e todos os Srs. Senadores sabiam que eles não poderiam ir, houve, inclusive, um diálogo com o Senador Aécio Neves.

            Por fim, outra inverdade: a posição do Governo brasileiro sobre a questão da Venezuela. Eu tenho enfrentado esse debate aqui e dito que a posição do Governo brasileiro é pela legalidade democrática, pela realização de eleições. E tudo o que o Governo brasileiro não quer é que a situação da Venezuela descambe para uma guerra civil. Isso é ruim para a Venezuela, é ruim para a América Latina e é ruim para o Brasil.

            Por isso, eu tenho insistido nesta tribuna que o Governo brasileiro está conversando com a situação, com o governo e com a oposição também. O que eu vi nos discursos dos Senadores foi talvez uma preocupação maior em fazer política interna aqui no Brasil, atacando a posição do Itamaraty.

            Eu trago aqui uma entrevista que é reveladora do Capriles, Henrique Capriles, que foi o candidato derrotado pelo Maduro, por uma pequena margem de votos, na última eleição. Foi candidato também contra o Chávez, e hoje é uma liderança da oposição com posicionamento moderado, mas é uma liderança da oposição venezuelana.

            Olha o que Henrique Capriles diz na entrevista à Folha de S.Paulo Henrique Capriles:

Após os protestos de 2014, todos os chanceleres da Unasul vieram a Caracas. Ao fim da reunião, o então chanceler Luiz Alberto Figueiredo disse que havia sido instruído pela presidente Dilma a conversar a sós comigo. Apresentei a situação para que ela não tenha só a versão do governo.

Na última reunião de chanceleres e oposição, em março, o governo vetou minha participação. Disseram: “Capriles não vai.” Sabe quem me pôs lá dentro? O Brasil.

            Então, está claro que em vez do que se falam os Senadores, a posição do Governo brasileiro tem sido uma posição de equilíbrio, de respeito às regras democráticas. O revelador também, nessa entrevista de Henrique Capriles, ele fala, infelizmente, Senadores brasileiros - eu já falei isso para vários deles - estão, no caso da Venezuela, fazendo uma aliança prioritária com setores sinceramente golpistas lá dentro, com os setores mais extremados da Venezuela, quando falo do Leopoldo López.

            E perguntam a Henrique Capriles:

O Senhor se vê como líder da oposição democrática. Isso significa que existe uma oposição não democrática? [Diz ele:] O governo tem seus extremistas, e a oposição, também. O certo é focar os extremos ou o centro, onde estão a maioria dos venezuelanos? [Continua ele:] A maioria quer uma mudança pacífica, eleitoral, constitucional. Eu estou do lado desta maioria e trabalho para que ela se imponha democraticamente.

            Continuam falando das divergências, quando questionado sobre muita gente tê-lo criticado pelo fato de ele ter aceitado o resultado das eleições de 2013. Diz ele:

Quem morre nestas horas? Os mais humildes. A oposição não aguenta mais andar como carrinho de bate-bate. Há um ano, diziam que era impossível ir às urnas [- isso ele está se referindo a esse setor liderado por Leopoldo López, do La Salida.] Há um ano, diziam que era impossível ir às urnas. Hoje estão em greve de fome para pedir eleições. [E depois falam que a mulher de Leopoldo López mentiu aqui no Brasil ao dizer que ele não tinha ido visitar o Leopoldo López.]

            É importante que se conheçam os detalhes dessa situação da Venezuela. Quando acabou o processo eleitoral, houve um chamado pelo Leopoldo López e pelo Capriles, no dia da eleição - um resultado tão apertado quanto de Dilma e Aécio aqui no Brasil - um chamado para o povo se manifestar nas ruas. O resultado final daquele processo foram oito chavistas mortos. A partir daí, o Henrique Capriles descolou, estava fazendo um movimento dizendo o seguinte: "Olha, manifestação sim, mas sem violência." O grupo de Leopoldo López começava a dizer que não havia saída pelo processo eleitoral e organizou um grupo chamado La Salida, que fez um anúncio em janeiro e, a partir de fevereiro, começaram a existir o que chamavam de guarimbas, as barricadas. E foram aqueles confrontos de fevereiro, que começaram em fevereiro, que resultaram na morte de 43 venezuelanos, venezuelanos oposicionistas, venezuelanos chavistas, venezuelanos que não são nem chavistas nem oposicionistas, inclusive sete membros da Guarda Nacional Bolivariana, a polícia de lá, sete policiais, três executados com tiro na cabeça.

            No dia em que os Senadores estavam lá, inclusive, estava havendo a extradição - por isso que era um dia tumultuado - de um desses que atirou em uma professora que estava grávida e a matou. E ele foi preso pela polícia colombiana e pela Interpol, não foi pela polícia da Venezuela.

            Eu estou falando isso, senhores, porque o clima era um clima terrível na Venezuela, esse clima quase de guerra civil. Eu acho que posição do Governo brasileiro está certa então, de procurar defender a legalidade democrática, a realização de eleições e o diálogo dos dois lados. Quem é que errou? A comissão do Senado, porque, vejam bem, eles podiam ir lá como Líderes partidários fazer o discurso que quisessem, mas, no momento em que virou uma comissão oficial do Senado Federal, uma comissão oficial do Senado Federal representando o Brasil, a postura tem que ser de equilíbrio, de diálogo; tem-se que agir como um bombeiro.

            A Venezuela já vive um processo muito intenso de luta política interna, e o papel dos Senadores, infelizmente, não foi esse, não foi um papel equilibrado; foi um papel incendiário, foi um papel em que o discurso foi marcado pela indução ao acirramento da crise. Faltou isenção e imparcialidade em um momento delicadíssimo que vive a Venezuela.

            Faltou cuidado também na forma. Os Senadores chegam em uma van - e, sinceramente, o clima da Venezuela é de radicalização e de tensão - e colocam dentro da sua van as principais lideranças de oposição: a María Corina e a esposa do Leopoldo López, num grau, volto a dizer, de tensão naquele país, em que eles colocaram sob risco suas próprias integridades. E podia ter acontecido, e ainda bem que não aconteceu, algo pior naquele contexto, que, volto a dizer, é de acirramento de crise.

            E o que nós estamos querendo fazer, Presidente Ivo Cassol? Nós apresentamos na semana passada o requerimento de uma nova comissão, que tivesse como objetivo, sim, representar o Senado Federal e escutar todas as partes, todos os lados. Essa comissão foi assinada pelo Senador Roberto Requião, pela Senadora Vanessa Grazziotin, Senador Randolfe, Senadora Lídice, por mim, mas a gente quer chamar Senadores da oposição para fazer parte dessa comissão.

            É uma comissão que vai viajar com calma para fazer um trabalho tranquilo, mas nós queremos conversar com o Governador Henrique Capriles, que é liderança da oposição; queremos conversar com as mulheres dos prisioneiros políticos; queremos conversar com um comitê de vítimas dessas barricadas, as guarimbas, e queremos conversar com o governo. Vamos sair na próxima quinta-feira. Volto a insistir no apelo para que Senadores da oposição participem dessa comissão, uma comissão que vai ter um foco completamente diferente. Volto a dizer, Presidente Ivo Cassol, que não vai faltar disposição de diálogo da nossa parte para conversar com todos os agentes envolvidos.

            O que nós queremos? Legalidade democrática. Não vamos aceitar alguns que tentam dar golpes neste momento, mas queremos a realização de eleições livres lá. As últimas eleições tiveram sempre o acompanhamento externo, o ex-Presidente Jimmy Carter esteve nas últimas eleições lá. Já foi marcada para o dia 6 de dezembro eleição parlamentar. Existia uma cobrança para que essas eleições fossem marcadas. Então, acho que essa é uma posição equilibrada de uma comissão do Senado Federal.

            Por fim, Sr. Presidente, não a título de provocação, mas vejo tantos convertidos na defesa dos direitos humanos recentemente, tanta gente que apoiou a ditadura militar neste País. Existe um tema que me toca muito. Quero fazer um requerimento, mas vou cobrar Senador a Senador, que é a discussão dos presos em Guantánamo. Aquilo, sim. Há prisões em Guantánamo em que não existe nem processo, prisão comandada pelo governo norte-americano de pessoas que nem respondem a processo. Seria importante que os recém-convertidos em democratas, em defensores dos direitos humanos, também se posicionassem sobre um ponto importante como esse. Estou falando isso porque tenho feito sempre discursos aqui sobre Guantánamo, no último aplaudi a posição de Pepe Mujica, que recebeu seis ex-prisioneiros de Guantánamo, que estão vivendo no Uruguai - acho que o Governo brasileiro tem que fazer o mesmo. Mas vou fazer questão especial de falar diretamente com esses Senadores da oposição, alguns que nunca tiveram a defesa da democracia como seu centro, mas que agora estão colocando esse ponto, a defesa da democracia, nos direitos humanos, para eles assinarem esse requerimento em relação a Guantánamo também.

            Sr. Presidente, muito obrigado. Espero voltar na próxima semana aqui com conclusões concretas sobre o caso da Venezuela, porque a verdadeira diplomacia parlamentar - e existe a diplomacia parlamentar - tem que ser nesse sentido.

            Nós temos que agir menos para criar factóides, para aparecer na televisão, fazendo uma viagem, na minha avaliação, apressada. Podiam ter ido no dia anterior, conversado com mais calma.

            Agora, espero trazer aqui uma posição de equilíbrio dessa comissão do Senado Federal brasileiro.

            Por isso, vamos conversar com todas as partes. O pior caminho para a Venezuela é o do enfrentamento, o do acirramento da crise, do caminho que pode levar à guerra civil. O caminho que queremos é o das eleições livres e da legalidade democrática.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/06/2015 - Página 173