Discurso durante a 119ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro dos 25 anos de vigência do Estatuto da Criança e do Adolescente e destaque aos desafios para aperfeiçoamento da legislação.

Autor
Donizeti Nogueira (PT - Partido dos Trabalhadores/TO)
Nome completo: Divino Donizeti Borges Nogueira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS E MINORIAS:
  • Registro dos 25 anos de vigência do Estatuto da Criança e do Adolescente e destaque aos desafios para aperfeiçoamento da legislação.
Publicação
Publicação no DSF de 14/07/2015 - Página 228
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS E MINORIAS
Indexação
  • REGISTRO, ANIVERSARIO, ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, COMENTARIO, AUMENTO, ACESSO, EDUCAÇÃO, QUANTIDADE, REGISTRO CIVIL, RESTRIÇÃO, MORTALIDADE INFANTIL, CRIAÇÃO, CONSELHO TUTELAR, ELOGIO, TRABALHO, UNIVERSIDADE, LOCAL, ESTADO DO TOCANTINS (TO), QUALIFICAÇÃO, CONSELHEIRO, TUTELA, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), CRITICA, REDUÇÃO, MAIORIDADE, IMPUTABILIDADE PENAL, NECESSIDADE, COMBATE, TRAFICO, DROGA.

            O SR. DONIZETI NOGUEIRA (Bloco Apoio Governo/PT - TO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Benedito de Lira, Senador Wellington, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, ouvintes da Rádio Senador e telespectadores da TV Senado, hoje, dia 13, comemoramos os 25 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente, uma conquista da sociedade brasileira e um advento à esperança. A implantação do Estatuto em 1990 é um marco para o Brasil. O desafio hoje para todos e todas é avançar na regulamentação para edificar efetivamente essa medida protetiva de nossas crianças na construção de uma Pátria Educadora.

            Há que se comemorar. Muito já avançamos. Muito mais há que se avançar. Parabéns ao Conanda, ao Parlamento e ao povo brasileiro. Porém, penso que o Estatuto da Criança e do Adolescente completa seus 25 anos em meio a uma turbulência, com possibilidades de passar por profundas mudanças desde que foi criado.

            No mês em que comemoramos um quarto de século desta lei, vemos a reação de uma parcela da sociedade, que é acompanhada aqui por uma parcela do Parlamento, numa visão que considero atrasada, colocando em risco todo o trabalho de uma sociedade preocupada em dar às nossas crianças e aos nossos adolescentes um futuro com mais qualidade de vida digna. A Câmara dos Deputados aprovou a redução da maioridade penal, o que considero um drástico retrocesso nas políticas para as crianças, que nos remete de volta a 1927, antes do Código de Menores. E essa não é a única proposta de modificação. Aqui, no Senado, também há uma série de propostas tramitando que apontam para o retrocesso.

            Eu penso, Sr. Presidente, que ainda não cumprimos todas as questões de proteção de nossos meninos e meninas e já entramos em contradição com as medidas protetivas, numa atitude de intolerância para com os jovens em conflito com a lei. Basta dizer que, se aprovada a redução da maioridade penal, o aumento da pena significaria cerca de 50% do tempo da adolescência. Falta muito ao Estado brasileiro, à sociedade brasileira para cumprir com as crianças e os adolescentes.

            Às vezes, Sr. Presidente, eu fico pensando. Até um determinado ponto, os pais e as mães controlam as crianças sempre dizendo “não”; eles vão para a escola recebendo muitos “nãos”; e a fase da adolescência - nós que já passamos pela adolescência sabemos - é a fase da contraposição a todos os “nãos” que os pais e a sociedade colocam para o jovem adolescente. A abordagem da nossa escola hoje com o adolescente, por exemplo, em relação às drogas coloca o “não”. Não há uma discussão transparente sobre essa questão. Precisamos ganhar as crianças e os adolescentes em relação às drogas, combatendo de forma transparente, não só colocando a questão da penalização do crime em relação às drogas, a questão do “não”. É preciso conscientizar os adolescentes de forma a envolvê-los nesse debate, sem estar numa posição de contestação à contestação, que é da fase da adolescência. Então, precisamos repensar a abordagem no ensino em relação às drogas.

            A Lei Antidrogas, por exemplo, Presidente, fez com que o número de jovens presos crescesse 136% e com que o número de mulheres presas crescesse 61%, ou seja, às vezes, nós fazemos uma lei para corrigir o problema, mas, como a sociedade e o Estado não cumpriram com as suas obrigações anteriores, essa lei não tem a eficácia que gostaríamos que tivesse para combater a questão da violência.

            Por isso, a pura e simples redução da maioridade penal não é uma solução para o problema da violência, é preciso que muitos outros fatores sejam atacados. É preciso melhorar a qualidade do ensino, é preciso ampliar os espaços de convivência para os adolescentes no lazer, na prática dos esportes, com uma escola integral e mais envolvente aos adolescentes, para tirá-los da rua e disputar o nosso jovem com o crime organizado, combatendo, sim, o crime organizado e os traficantes, mas não punindo essa dependência, nem sacrificando a juventude.

            Eu penso que muito se evoluiu com o ECA. O simples direito de brincar diminuiu em 59% o índice do trabalho infantil no País, e isso é um grande conquista. Houve o aumento considerável do acesso à educação, 93%; a queda no índice de mortalidade infantil, 60%; o aumento no direito ao registro civil, de 75% para 95%, dando mais cidadania às crianças, com o reconhecimento da paternidade; e a criação dos Conselhos Tutelares, instrumento que vem contribuindo enormemente no avanço da cidadania, no combate à exploração sexual, ao tráfico de crianças e ao trabalho infantil.

            Eu quero destacar aqui, Presidente, um trabalho que a Universidade Estadual do Tocantins vem fazendo na qualificação dos Conselhos Tutelares e de Direitos e também na qualificação dos conselheiros do SUS que trabalham com dependentes químicos, para poder prepará-los para melhorar, por parte deles, a abordagem com as pessoas em dependência química e as crianças em vulnerabilidade. Esse trabalho que a Universidade Estadual do Tocantins vem fazendo é muito importante, porque haverá atores ativos na rua mais preparados para conviver com a situação da dependência química, bem como com a situação das crianças e dos jovens em situação de vulnerabilidade.

            É claro que ainda há muito para avançar. Não atingimos, ainda, a proteção integral com as políticas públicas que garantam a satisfação total dos menores de 18 anos. A falta de políticas intersetoriais de atendimento à criança e à família acaba dificultando a aplicação integral do Estatuto. E as deficiências no setor de medidas socioeducativas, aliadas a uma falta de compreensão da mídia que leva a versões equivocadas, causam uma histeria que vem comprometendo as soluções e aumentam os índices de menores apreendidos e as superlotações das unidades prisionais.

            É bom destacar aqui também que essa sociedade consumista que estimula o consumo exacerbadamente faz com que aqueles jovens que, muitas vezes, não têm poder aquisitivo pra usar o tênis, a calça ou a camisa de marca enveredem, às vezes, pelo crime como um caminho mais fácil - e o tráfico de drogas é o que lhes parece, muitas vezes, o caminho mais fácil - para tentar estar inserido. Se ele não tiver aquela marca, aquele tênis daquela marca, ele não estará inserido. Assim, os mecanismos de estímulo ao consumo precisam adotar uma abordagem que seja educativa, de forma que não estimule a irresponsabilidade que, muitas vezes, é cometida por adolescentes e por jovens.

            Eu quero terminar, Presidente, dizendo que precisamos nos deter à luz da razão para aprofundar medidas protetivas e aperfeiçoar o Estatuto da Criança e do Adolescente, que completa seus 25 anos de aplicação, reconhecendo os avanços e corrigindo os desacertos, mas é preciso que esse debate seja feito de forma honesta, com espíritos desarmados, sem demagogia, sem hipocrisia para que possamos, sim, criar uma nova Pátria Educadora e não repressiva, um presente para um futuro melhor para os nosso jovens.

            Para terminar, eu costumo dizer, Presidente, que, muitas vezes, essa história de tratarmos o jovem como o futuro do País nos serve como uma desculpa para não apostar no jovem hoje. Nós precisamos apostar no jovem hoje para ele ser o futuro do País, porque ficam muito bem aqui aqueles versos do Renato Russo, saudoso poeta e compositor, que diz que “a gente deve amar as pessoas como se não houvesse amanhã, porque, se a gente for parar para pensar, na verdade, não há”. O jovem é o presente. Precisamos nos preocupar com o jovem hoje para que o País possa ter um futuro.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/07/2015 - Página 228