Discurso durante a 98ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com a atuação da Frente Nacional de Luta em fazendas no Estado de Goiás e críticas ao Governo Federal por suposta omissão diante de conflitos fundiários que ocorrem no País.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Preocupação com a atuação da Frente Nacional de Luta em fazendas no Estado de Goiás e críticas ao Governo Federal por suposta omissão diante de conflitos fundiários que ocorrem no País.
Publicação
Publicação no DSF de 16/06/2015 - Página 91
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • APREENSÃO, INVASÃO, TERRA PARTICULAR, ENFASE, GOIAS (GO), CRITICA, ATUAÇÃO, GRUPO, TRABALHADOR, SEM-TERRA, AMEAÇA, EXTORSÃO, DESTRUIÇÃO, LABORATORIO, PRODUÇÃO, ROUBO, GOVERNO FEDERAL, MOTIVO, OMISSÃO, INCENTIVO, VIOLENCIA, AUSENCIA, PUNIÇÃO.

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco Oposição/PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Telmário, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, há alguns anos, tive a satisfação de presidir, no Senado Federal, a CPI da Terra, que revelou as mazelas existentes no sistema fundiário brasileiro, diante, quase sempre, da incompetência do Governo, que acaba, através da omissão, da conivência, da complacência, alimentando a violência no campo.

            As invasões de propriedades produtivas com a paciente contemplação governamental se tornaram lamentavelmente um fantasma na vida dos agricultores brasileiros. Com aquela CPI, nós revelamos uma relação promíscua do Governo com o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, que, não possuindo identidade jurídica, utilizara-se de expedientes revelados pela CPI com a organização de cooperativas, a Concrab, a Anca, o ITerra, celebrando convênios com Ministérios que repassavas recursos com desvio de finalidade.

            Recursos que deveriam ser destinados à reforma agrária, aos assentamentos, ao apoio técnico aos assentamentos, esses recursos eram desviados por essas organizações, paralelas ao MST, com o objetivo de alimentar o movimento de invasões a propriedades produtivas no País.

            Recentemente, protocolei requerimento com pedido de informações ao Ministro da Justiça sobre ações adotadas pelo Governo Federal perante a destruição de pesquisas com eucalipto geneticamente modificado, perpetrada por vândalos, supostos meliantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra; e, no dia 05 de março de 2015, milhares de plantas de eucalipto geneticamente modificado, em experimento autorizado dentro de estufas em Itapetininga, no Estado de São Paulo.

            O Governo, ao longo de mais de uma década, observa, como expectador privilegiado, a destruição de laboratórios, experimentos com soja, eucalipto, milho transgênico e até laranja. Estamos aguardando resposta a esse requerimento.

            Hoje, Sr. Presidente, venho a esta tribuna para trazer informações e alertar o Governo para fatos que ocorrem no Estado de Goiás, no campo de Goiás. Valho-me de uma ata de reunião, realizada em Brasília, na sede da Ouvidoria Agrária Nacional, no dia 11 de junho, às 10h.

            Eu poderia ler a ata com todas as informações, mas eu faço referência a alguns tópicos dessa ata, para passar a ideia do que vem ocorrendo, como ameaças às propriedades produtivas no Estado de Goiás, especialmente. Fala essa ata do que ocorre no Município de Alto Paraíso; na Fazenda Nova Era, no Município de Alto Paraíso, e nas Fazendas Pindorama, Isabel e Disbrave, localizadas no Município de São João da Aliança, e em outras fazendas, cujos nomes não foram mencionados nessa reunião.

            Por exemplo, o proprietário da Fazenda Jatobá, no Município de São João da Aliança, foi ameaçado de extorsão pelo coordenador da FNL, Hugo Zaidan, para não invadir a mencionada fazenda. Esta é uma dissidência do MST, liderada pelo Rainha: Frente Nacional de Luta, que tem como coordenador nessa região de Goiás o Sr. Hugo Zaidan.

            O Presidente do Movimento Agricultores Unidos e arrendatário da Fazenda União, Sr. Francisco José Martins Neto, esclareceu que as ocupações nas Fazendas Isabel e Cerrado, ambas no Município de São João da Aliança, pelos trabalhadores sem-terra ligados à FNL, aconteceram de maneira violenta, mediante uso de armas brancas e palavras de ordem.

            Aqui, o Presidente do movimento e arrendatário da Fazenda União também esclareceu que, atualmente, os trabalhadores sem-terra do acampamento Nelson Mandela, ligados à FNL, encontram-se concentrados na Fazenda Cerrado, no Município de São João da Aliança, salientando que ouviu dizer que há aproximadamente duas mil famílias cadastradas no local. E mais: no Município de São João Aliança ainda, nas Fazendas Isabel e Cerrado, há trabalhadores rurais sem-terra ligados a essa frente, e tem ocorrido danos nas propriedades, tais como furtos, uso de drogas ilícitas, aliciamento de empregados, ameaça de incendiar máquinas, ameaça de destruição de lavouras e extorsão para não ocupação da propriedade.

            Portanto, nós estamos verificando que há extorsão. O objetivo não é só a ocupação da propriedade. É a obtenção de vantagens com ameaça de invasão mediante extorsão. Há denúncia também do uso de drogas nessas invasões.

            O Presidente do Movimento Agricultores Unidos afirma ainda que há uma situação de ameaça de invasão na região de São João da Aliança, em Alto Paraíso, inclusive em imóveis que têm interdito proibitório, conforme processo existente.

            O Presidente afirma também que:

Trabalhadores rurais sem-terra ligados à FNL invadiram a fazenda Cerrado [...] No entanto, somente parte da referida fazenda foi desapropriada, onde, atualmente, existe o projeto de assentamento Mingau, sendo que o restante continua de propriedade de Abib Miguel.

            O que alegam os trabalhadores sem-terra é que Abib Miguel responde a um processo na Justiça do Paraná e que, como há esse processo, a propriedade não lhe pertence mais. E é evidente que, se não pertence a Abib Miguel, ela deve ser utilizada pela Justiça para uma eventual devolução de recursos que tenham sido desviados do Poder Público no Estado do Paraná

            “Fazendas de Isabel e Cerrado, invadidas pelos trabalhadores rurais sem-terra ligados à FNL, são fazendas produtivas”.

            Veja a seriedade desta denúncia:

O Comandante da 14ª Companhia Independente da Polícia Militar de Alto Paraíso [...] esclareceu que trabalhadores rurais sem-terra ligados à FNL tentaram invadir a Prefeitura de São João da Aliança, com uso de armas brancas, e quando viram que a Polícia Militar ia impedir tal ocupação, fizeram baderna na cidade, tendo sido acompanhados até a saída da cidade.

            O Comandante “esclareceu que mesmo tendo orientado os trabalhadores rurais sem-terra [...] no sentido de informar a intenção da ocupação previamente à Polícia Militar, objetivando, desse modo, que a ocupação não se desse de forma violenta, não obteve êxito”.

            O Comandante denuncia “que, há cerca de 6 meses, trabalhadores [...] agrediram um Promotor de Justiça e depredaram o seu veículo”.

            O Comandante esclareceu que os trabalhadores “ameaçaram invadir a fazenda Pindorama, localizada no Município de São João da Aliança, no vale do Paraná, inclusive mandando o proprietário retirar o gado sob pena de, não retirando, matar os animais, o que foi impedido pela Polícia Militar”.

            O Comandante da 14ª Companhia Independente esclareceu que os trabalhadores sem-terra ligados a essa Frente disseram que vão invadir outras fazendas no Município de São João.

            O Comandante disse “que teme que o conflito agrário na zona rural de Alto Paraíso e São João da Aliança seja palco de massacre como o de Eldorado dos Carajás, haja vista que teve conhecimento de que, nos dias 12, 13 e 14, vão invadir fazendas”.

            Agora, uma denúncia que tem que ser apurada - é preciso que, inclusive, o Ministro da Justiça determine a apuração desta denúncia:

O Comandante da 14ª Companhia Independente da Polícia Militar de Alto Paraíso, major Carlos Eduardo Belelli, esclareceu que recebeu informações de que o coordenador da FNL, Hugo Zaidan, possivelmente está traficando drogas no acampamento Nelson Mandela e em outros acampamentos, o que lhe foi informado por assentados no projeto Cachoeira dos Couros.

            O Ministro tem todos esses indícios e essas informações para determinar uma investigação urgente. Não é possível que o Governo, diante de uma denúncia dessa natureza, que parte de uma autoridade policial, o Comandante da 14ª Companhia Independente da Polícia Militar de Alto Paraíso, em Goiás, fique paralisado e não tome as providências necessárias para a investigação e, evidentemente, a responsabilização.

            Enfim, poderíamos continuar fazendo a leitura dos vários tópicos desta ata que revela as mazelas existentes nesse movimento que se organizou nessa região de Goiás, mas vou fazer apenas algumas considerações sobre essa reunião, que contou com mais de uma dezena de pessoas, entre elas, representantes da Defensoria Pública da União, do Ministério da Justiça e da Polícia Militar de Goiás, o Presidente do Movimento Agricultores Unidos, Sr. Francisco José Martins Neto, e diversos outros proprietários de terras, abordando a situação que está sendo vivida pelos agricultores do Município de São João d’Aliança e de Municípios vizinhos, perante as ações de invasão de terras por integrantes da Frente Nacional de Luta, organização dirigida nacionalmente pelo Sr. José Rainha.

            Na reunião, o Presidente do Movimento Agricultores Unidos fez um relato da situação - a alguns tópicos da ata já fiz aqui referência: a invasão das Fazendas Santa Isabel e Cerrado; que o proprietário da Fazenda Jatobá foi ameaçado de extorsão; que o Sr. Edilson de Souza, sócio da Agropecuária Nova Era, suspendeu o plantio que faria por insegurança; que, atualmente, esse movimento conta com 2 mil famílias.

            Na ata, chama a atenção - eu quero que, especialmente, o Ministro da Justiça considere esta informação - a advertência feita pelo Ouvidor Agrário Nacional e Presidente da Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo de que o "movimento popular visando a implementar a reforma agrária não caracteriza crime contra o patrimônio, configura direito coletivo" e que, por isso, não compete às polícias Militar, Civil e Federal impedir ocupações de imóveis rurais por trabalhadores sem-terra. Ora, Sr. Presidente, isso é muito grave! É o representante do Governo, portanto, o representante da Presidência da República - ele foi, pela Presidente Dilma Rousseff, nomeado Ouvidor Agrário Nacional. Ele acaba alimentando, motivando, estimulando as invasões às propriedades produtivas. Ele acaba, portanto, com essa afirmação, estimulando a violência no campo, o desrespeito à ordem constituída, a afronta à legislação vigente no País, especialmente à Constituição Federal!

            Ele faz referência a um voto do Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro em julgamento de habeas corpus. Na verdade, ele pinça um detalhe desse voto, mas o que está ocorrendo na região de São João d’Aliança, que se repete em outras regiões do Brasil, provoca uma trinca, uma rachadura no instituto do direito à propriedade e preocupa, sobremaneira, pelo fato de que o que ocorre ali, seguramente, é o embrião de um problema maior, que deverá se alastrar pelo noroeste goiano.

            Outras fontes informaram que, além de invadirem fazendas da região, integrantes da Frente Nacional de Luta, liderada por José Rainha, utilizam carros de som para convidar pessoas para participarem das invasões, além de arregimentarem pessoas desempregadas ou interessadas em participar do movimento.

            Quando o Ouvidor Agrário Nacional diz que a Polícia Militar, a Polícia Civil e a Polícia Federal não possuem autoridade para impedir as invasões, ele desconsidera o que decidiu o Supremo Tribunal Federal em decisão proferida no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.213, de 4 de abril de 2002, pelo extraordinário, competente e honrado Ministro Celso de Mello. Eu posso destacar os seguintes argumentos do Ministro Celso de Mello:

O esbulho possessório, mesmo tratando-se de propriedade alegadamente improdutiva, constitui ato revestido de ilicitude jurídica [...]

Revela-se contrária ao Direito, porque constitui atividade à margem da lei sem qualquer vinculação ao sistema jurídico, a conduta daqueles que - particulares, movimentos ou organizações sociais - visam, pelo emprego arbitrário da força e pela ocupação ilícita de prédios públicos e de imóveis rurais, a constranger, de modo autoritário, o Poder Público a promover ações expropriatórias para efeito de execução do programa de reforma agrária.

O processo de reforma agrária, em uma sociedade estruturada em bases democráticas, não pode ser implementado pelo uso arbitrário da força e pela prática de atos ilícitos de violação possessória...

            A atuação do Governo Federal, a orientar que as polícias não impeçam a invasão de imóveis rurais, pinçando argumentos apenas aparentemente favoráveis a esse entendimento, só faz recrudescer a violência no campo e ampliar a insegurança jurídica no campo, se é que ainda é possível esse sentimento presente no campo...

(Soa a campainha.)

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco Oposição/PSDB - PR) - ... de norte a sul do Brasil. O Governo Federal não pode mais continuar omisso perante a defesa do direito de propriedade, especialmente a propriedade rural.

            Sr. Presidente, eu poderia apresentar outros lances dessa inusitada reunião em que o Ouvidor Agrário Nacional estimula a violência no campo, a arbitrariedade, o uso de práticas ilícitas, para afrontar a lei, a Constituição do País e para subtrair direitos assegurados a aqueles que, ao longo do tempo, com o suor do rosto, o esforço diário, o trabalho incessante, construíram um patrimônio privado. Não, Sr. Presidente, não podemos admitir que um representante do Governo, nomeado pela Presidência da República, atue de forma a afrontar a lei e, sobretudo, estimular a violência, o esbulho, a prática ilícita de subtrair direitos de propriedade de agricultores do Brasil.

            Espero, Sr. Presidente, que o Governo atenda a esse apelo e adote as providências para impedir a ampliação dessa insegurança que já campeia solta nessa região de Goiás e, certamente, encontra similar em outras regiões do País.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/06/2015 - Página 91