Discurso durante a 127ª Sessão Especial, no Senado Federal

Sessão especial destinada a comemorar o cinquentenário das atividades da TV Globo.

Autor
José Serra (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/SP)
Nome completo: José Serra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM:
  • Sessão especial destinada a comemorar o cinquentenário das atividades da TV Globo.
Publicação
Publicação no DSF de 06/08/2015 - Página 22
Assunto
Outros > HOMENAGEM
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, EMISSORA, TELEVISÃO, ELOGIO, PROGRAMAÇÃO, MOTIVO, TRANSMISSÃO, INFORMAÇÃO, CONSOLIDAÇÃO, CULTURA, INCENTIVO, ARTISTA.

            O SR. JOSÉ SERRA (Bloco Oposição/PSDB - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Renan Calheiros, meu caro Senador Caiado, que é o autor desta iniciativa, João Roberto Marinho, Líder do PMDB Eunício, Edinho, nosso Afif, eu queria cumprimentá-los e cumprimentar todos os presentes.

            Eu não quis deixar de aqui dar uma palavra, nesta data de 50 anos, de homenagem. Eu tenho uma situação particular com relação a esse período, porque talvez quase um terço dele, quando a Globo foi criada e até o final dos anos 70, estive fora do País, exilado. Portanto, para mim, ao voltar ao Brasil, eu vi um fenômeno construído, que antes não havia, que era a Rede Globo. Isso foi muito impactante no meu caso pessoal.

            Quero dizer que, quando a TV foi criada, aí por 1965, eu tive, do exterior, um fator de simpatia pela TV Globo, porque o Roberto Marinho estava brigando com o Carlos Lacerda, que era o nosso principal adversário civil, digamos assim, antes do Golpe de 64. Portanto, para mim, já nasceu como algo simpático. Quero dizer que, hoje, não tenho nenhuma intransigência com a figura histórica do Lacerda, mas, na época, era muito importante. Portanto, vi com bons olhos, por esse motivo muito particular, muito específico, a criação, na época, a entrada, como isso era encarado, do jornal O Globo na televisão.

            Fazendo um balanço - alguns já falaram aqui nessa direção, principalmente o Senador Cristovam -, a história desses 50 anos da Globo se confunde com a história do Brasil no período.

            Primeiro, a informação. Foi a TV Globo que realmente criou a informação nacional. Para todo o País, desenvolveu essa modalidade de informação, inclusive estimulando ou se interagindo com seus próprios concorrentes. Passou a haver a notícia nacional. Pode parecer uma banalidade dizer isso hoje, mas nós nos lembramos de como era quando essa informação não havia no País, no cotidiano da nossa vida.

            Em segundo lugar, a questão das novelas. Eu sempre fui muito ligado a isso, porque, antes de me envolver em política estudantil, atuei na área de teatro. Cheguei a ser diretor do grupo teatral da Politécnica, onde eu estudava, tanto que, uma vez, eu disse a Irene Ravache: “Puxa, se não fosse a política, eu provavelmente teria sido ator.” Ela falou: “Mas veja que felicidade. O Brasil ganhou um grande político, e o teatro perdeu um grande canastrão.” (Risos.) Sempre fui muito ligado a isso.

            Na verdade, as novelas, essa instituição, eu não diria que criaram, mas elas consolidaram a dramaturgia nacional. Isso é uma coisa muito importante. Quando eu era criança, adolescente, não havia dramaturgia nacional. Os autores eram estrangeiros. Havia o Guarnieri, o próprio Dias Gomes, mas era algo limitado. Foi a TV Globo que realmente deu um impulso nessa dramaturgia, nos autores nacionais, o que naturalmente se desdobrou para o teatro, porque a interação, no caso, é muito grande.

            Por outro lado, houve um peso também, eu diria, imenso e uma interação da televisão com os nossos costumes. O Cristovam disse aqui uma coisa importante: houve inclusive a integração cultural, a integração nacional. Eu diria até que a Globo, de alguma maneira, aproximou os diferentes sotaques, homogeneizou mais o português falado no Brasil. Eu senti essa diferença, porque fiquei praticamente 15 anos fora e pude constatar a mudança que houve nessa direção. Às vezes, como é muito diluída no tempo, pequena, quem está vivendo não nota, mas quem chega de fora, de repente, depois de tanto tempo, sente essa diferença. E as novelas têm uma influência grande, refletem, mas também têm um papel importante nessa criação, digamos, ou no desenvolvimento dos nossos costumes.

            Ao mesmo tempo, há uma dimensão econômica interessante. Eu creio que foi a TV Globo o fator fundamental para se criar o mercado publicitário nacional. Isso fortaleceu, Edinho, inclusive a democracia. Por quê? Porque você passa a ter um mercado nacional. O poder local, por incrível que pareça, se enfraquece como fator determinante de orientação da mídia. Essa é uma visão heterodoxa que mesmo vocês não exploraram, João Roberto.

            Na verdade, a Globo criar um mercado publicitário nacional dilui as influências mais diretas do poder político local. Não é que deixem de existir, mas cria-se um grau de liberdade nessa direção. Esse é um fator importantíssimo a respeito do qual poderíamos, evidentemente, discorrer bastante. Mas eu queria aqui, nesta brevidade de palavras, apenas sublinhar esse aspecto, que é algo mais heterodoxo, menos notado, talvez menos enfatizado. E ela acaba tendo, de alguma maneira, cobranças como se fosse uma TV pública, pelo grau de audiência.

            Eu, quando era Prefeito e Governador de São Paulo, costumava dar aulas, toda semana, para a quarta série numa escola. Aula com começo, meio e fim. Pode parecer estranho, mas eu dava... Tinha que ter alguma aula ou algum ensinamento que pudesse ser transmitido no prazo de meia hora. Dava para os alunos como construir - um pouco de geometria - gráficos e tabelas e depois conversava. Enfim, era uma coisa muito gostosa. Ia meio de surpresa, porque avisava na véspera. Eu sempre procurava levantar coisas da vida deles, para perceber como é a vida das pessoas. Por exemplo: jornal, numa sala de 30, 35 alunos, não mais de três ou quatro conheciam. Ouviram falar, mas não havia em casa. Mas de onde vocês aprendem? De onde vocês sabem o que está acontecendo no Brasil? “Ah, é no Fantástico.” O Fantástico é confundido com o Jornal Nacional. Não sei se vocês sabiam disso. Quer dizer, de alguma maneira, eles falam Fantástico, mas é o Jornal Nacional. É por onde sabem o que está acontecendo no Brasil.

            É um peso imenso. Quem faz política fica ligadíssimo nessa história. Quer dizer, se deu no Jornal Nacional, não deu no Jornal Nacional, se deu no Fantástico, não deu no Fantástico é o termômetro para saber o peso de determinado acontecimento, o peso de cada performance na área política e tudo o mais. Isso dá uma responsabilidade grande, como se fosse uma tevê pública, inclusive de cobrança, porque é como se fosse. Tem uma obrigação comunitária. Tem obrigação de trabalhar direito.

            Essa é uma tensão enorme. Trabalhar direito, naturalmente, na ótica de cada um, de cada setor político, de cada partido e tudo o mais. Mas há, permanentemente, essa tensão, que vem exatamente do grande impacto e da importância da tevê, no caso da Globo. Por outro lado, há outro aspecto que é econômico. Essa é uma discussão que eu já tive, em alguns momentos, em palestras e que, evidentemente, não é o caso de desenvolver aqui. Mas eu não creio que, em relação à TV Globo, se dê um caso clássico de monopólio, porque é um setor que sofre concorrência.

(Soa a campainha.)

            O SR. JOSÉ SERRA (Bloco Oposição/PSDB - SP) - Quer dizer, existem várias cadeias nacionais, há concorrência. O fato de que a Globo se mantenha implica que tem que se modificar, que tem que inovar, que tem que trabalhar de maneira agressiva na sua consolidação e na sua expansão. Eu não vejo esse como um caso de monopólio, muito menos que fosse merecer a intervenção do Estado, como em certas circunstâncias se justificam casos de monopólios que acabam provocando distorções dentro do funcionamento do mercado. Ou seja, a Globo se aproveita das condições que ela própria cria. Ao caso se aplica muito bem um raciocínio feito pelo Schumpeter, que foi o economista mais culto do Século XX. Quando falava de monopólio, ele dizia: “O monopólio desfruta das condições que ele próprio cria.”.

(Soa a campainha.)

            O SR. JOSÉ SERRA (Bloco Oposição/PSDB - SP) - Eu acho duvidoso isso em relação a muitos setores. Não vou citar aqui para não parecer que estou perseguindo esse ou aquele setor econômico. Mas, no caso da televisão, muito claramente, se a Globo é hegemônica é porque cria as condições para ganhar a concorrência. E essa é uma forma saudável do ponto de vista empresarial. Portanto, eu creio que, ao completar esses 50 anos, nós só temos motivo para saudar a sua direção.

            Quero dizer que a Globo também passou por uma mudança muito importante do ponto de vista da sua direção, porque foi fundada pelo Roberto Marinho, presidida pelo Roberto Marinho nas suas primeiras décadas e muito bem conduzida pelos seus filhos...

(Soa a campainha.)

            O SR. JOSÉ SERRA (Bloco Oposição/PSDB - SP) - ...que o sucederam. E é através deles que eu quero dar os parabéns a todo o pessoal da Globo e, com muita felicidade aqui, à Laura Cardoso, ao Cuoco e à Malu, nossos amigos de tantos anos, que expressam muito bem aquele lado que eu disse, com relação à questão da dramaturgia e do teatro nacional e na influência dentro do próprio cinema. Eram essas as palavras.

            Muito obrigado.

            Presidente Renan, apenas para colocar um aspecto que eu tenho batalhado sempre, não tem nada a ver com a Globo: a temperatura agora no Senado está baixíssima. E eu me vi aqui falando e passando frio ao mesmo tempo.

            Estou aproveitando para colocar o problema publicamente, porque o Presidente sabe que eu estou a todo o tempo reclamando. Estava lá, com Tasso Jereissati, refletindo sobre isso.

            Então, eu sinto que até as minhas palavras estão tremendo. Eu estou emocionado, mas é uma emoção média. Parte, digamos, da hesitação...

(Soa a campainha.)

            O SR. JOSÉ SERRA (Bloco Oposição/PSDB - SP) - ... e da forma de falar vêm do frio que eu estou sentindo neste momento.

            Muito obrigado. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/08/2015 - Página 22