Discurso durante a 126ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa do projeto de lei, de autoria de S. Exª, que inviabiliza a utilização de recursos de origem ilícita para o pagamento das despesas de defesa judiciária, nas ações de improbidade administrativa, bem como nas ações penais por crimes contra a administração pública e o sistema financeiro nacional.

Autor
José Medeiros (PPS - CIDADANIA/MT)
Nome completo: José Antônio Medeiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PODER JUDICIARIO:
  • Defesa do projeto de lei, de autoria de S. Exª, que inviabiliza a utilização de recursos de origem ilícita para o pagamento das despesas de defesa judiciária, nas ações de improbidade administrativa, bem como nas ações penais por crimes contra a administração pública e o sistema financeiro nacional.
Aparteantes
Hélio José.
Publicação
Publicação no DSF de 05/08/2015 - Página 106
Assunto
Outros > PODER JUDICIARIO
Indexação
  • COMENTARIO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, ASSUNTO, IMPOSSIBILIDADE, UTILIZAÇÃO, VERBA, ORIGEM, ENRIQUECIMENTO ILICITO, OBJETIVO, PAGAMENTO, DESPESAS PROCESSUAIS, HONORARIOS, ADVOGADO, DEFESA, HIPOTESE, CRIME, IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA, AÇÃO PENAL, CRIME CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, CRIME DO COLARINHO BRANCO.

            O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, todos que nos acompanham aqui na Casa, que nos acompanham pelas redes sociais, pela Rádio Senado, pela TV Senado, recentemente, ainda no início do ano, ocorreu-me uma preocupação, e bem antes, cabe ressaltar, de começar esse desfecho da Lava Jato.

            E me ocorreu, justamente, uma preocupação sobre o tema corrupção. A gente sabe que, quando ocorre isso, esse dinheiro tem saído dos cofres públicos. É dinheiro de impostos, que sai do couro do trabalhador, do couro da classe brasileira, da classe operária brasileira, da classe empresarial, de todo mundo.

            Nós temos visto vultosas somas serem surrupiadas e também vemos, nos noticiários nacionais, nos jornais, os principais escritórios de advocacia do País defendendo essas pessoas. Nada contra! Esses escritórios são montados para isso, eles têm que ganhar dinheiro mesmo. Mas, pelo que tenho visto nos debates nas ruas - e as leis saem das ruas, a lei vem do costume, vem do que está sendo debatido -, ocorreu-me uma ideia e acabei apresentando, ainda no início deste mês de julho, um projeto que visa justamente a que o réu comprove a origem desse dinheiro. Isso porque nós vemos o sujeito, Senador Moka, que rouba bilhões e que vai, com certeza, ter condições de contratar os melhores advogados para defendê-lo. O que causa uma desigualdade, porque o pé-rapado, o sujeito que não tem recursos vai para a Defensoria Pública.

            Agora, o que também pasma é o seguinte: é como se o sujeito entrasse na sua casa, arrombasse o cofre, tomasse seu dinheiro e o usasse para se defender e, eventualmente, de repente, até processar você. E o Brasil vive um momento muito especial nessa luta contra a corrupção e, em especial, contra o perverso sistema de troca de favores entre agentes do governo e representantes da iniciativa privada, que muitas vezes se tem verificado ao longo da sua história.

            Portanto, é com otimismo, Senador Hélio José, que finalmente vejo aplicada ao crime de colarinho branco a mesma regra que, até então, somente vigorava para o crime miúdo. Ou seja, aplicada ao caso do pequeno criminoso, que não tem como contratar um grande escritório advocacia e, no mais das vezes, precisa se valer das Defensorias Públicas para garantir seu direito constitucional de defesa ante a Justiça.

            Em nosso País há muita desigualdade, e o desigual costuma, em geral, ser visto sobre o prisma meramente econômico - a gente sabe que isso acontece, não vamos ser hipócritas aqui.

            Até Jesus já se preocupava com a acepção de pessoas. Chega um sujeito bem vestido, com boa aparência, é tratado de uma forma, chega outro que aparenta não ter nada, é tratado de outra forma. É aquela história de ser tratado pelo “ter” e não pelo “ser”.

            Igualar o tratamento que tanto o rico quanto o pobre têm, da parte do Judiciário, já é um grande avanço na luta pela igualdade de tratamento entre os cidadãos.

            Mas é preciso avançar ainda mais, Sra Presidente, e fazer com que esse bom passo, tal como dado no âmbito da Operação Lava Jato, seja acompanhado de outros avanços institucionais.

            É preciso, por exemplo, que o fruto da corrupção retorne ao Tesouro público, de onde ela o arrancou. E, ainda, que retorne o mais integralmente possível, de modo a impedir a continuidade de seu usufruto por parte de quem ilegitimamente se favoreceu.

            Eu vejo uma preocupação muito grande, ultimamente, em divulgar algumas somas que voltaram ao Tesouro sob a pecha da delação. Eu, sinceramente, tenho a minha preocupação e fico um pouco desconfiado se está voltando tudo.

            Não podemos, decerto, permitir que o produto do crime seja injustamente utilizado para livrar o criminoso da punição a que deve se submeter, na medida da gravidade de seus atos.

            Essa, Srªs e Srs. Senadores, é uma das motivações que me levam a trazer, ante a Mesa do Senado Federal, um projeto de lei de minha autoria que tem esse preciso objetivo. Aproveito aqui para registrar que, desde o início do ano, venho trabalhando nesse Projeto e que foi apresentado aqui no Senado muito antes de começar essa discussão aí da Catta Preta.

            E quero registrar aqui porque, infelizmente, hoje tive a notícia de que só agora a Mesa veio numerar esse projeto. Eu quero deixar registrado que esse projeto foi encaminhado à Mesa bem antes e, por uma infelicidade, não sei se por conta do recesso, a Mesa só agora registrou.

            Eu quero fazer esse registro simplesmente por uma questão, Senador Hélio José: esta Casa não pode ter tratamento - e eu espero que não tenha sido isso, por parte da Mesa - desigual com relação a isso. Porque cada Senador aqui, não se trata da pessoa do Senador, trata-se da representação dos Estados, e os Estados não podem ser tratados de forma desigual. Então, eu não estou exigindo respeito aqui para o Senador Medeiros, estou exigindo respeito para o Estado de Mato Grosso.

            Eu tenho visto projetos aqui que nem passam pelas comissões, de repente chegam aqui em menos de dez dias. Esse projeto foi colocado - e espero, sinceramente, que tenha sido uma mera casualidade, devido ao atropelo pelo recesso - ainda no início de julho, quero fazer esse registro.

            Nele, proponho, Srªs e Srs. Senadores, inviabilizar a utilização de recursos de origem ilícita para o pagamento das despesas de defesa judiciária nas ações de improbidade administrativa, bem como nas ações penais por crimes contra a administração pública e contra o sistema financeiro nacional. E aqui cabe ressaltar que nós não estamos querendo entrar no sigilo profissional do advogado. Isso aqui tem a ver com o réu, tem a ver com o sujeito que meteu a mão na cumbuca, que meteu a mão no cofre da viúva.

            Hoje, muitos dos investigados, Srª Presidente, e dos réus, nas referidas ações, auferem vultosas somas de dinheiro derivadas de operações ilegais, operações diversas vezes instrumentalizadas por mecanismos de corrupção de agentes do Estado. Contudo, não obstante sua origem ilícita, são precisamente esses os recursos que viabilizam, num segundo momento, a seleção, a contratação e o pagamento dos melhores advogados atuantes no País, haja vista que a declaração de sua ilicitude somente ocorrerá ao final do processo, momento em que não haverá mais como tomar de volta os valores, àquela altura majoritariamente liquidados.

            O mecanismo preventivo que proponho adotar é simples: exigir que o réu comprove a origem lícita dos recursos utilizados no pagamento de honorários advocatícios, tanto nas ações de improbidade administrativa, quanto naquelas que apurem crimes contra a administração pública e contra o sistema financeiro nacional.

            A nossa Constituição estabelece, em seu artigo 133: "O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei." Assim, sobre ele deve prevalecer a presunção de boa-fé. Isso ninguém discute.

            Mas não se pode fechar os olhos para o fato de que qualquer pagamento de vulto pode servir para a lavagem de dinheiro, inclusive algumas das fortunas que vemos todos os dias serem pactuadas...

(Soa a campainha.)

            O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - ... a título de honorários advocatícios, nos casos de crimes do colarinho branco. E, nesses episódios, ainda pior, sob a proteção do sigilo profissional do advogado.

            Ora, se a imunidade da relação entre advogado e cliente é uma garantia fundamental, que deve, por força de lei, ser respeitada, o mesmo não ocorre em relação ao réu sobre o qual já existem indícios de prática de ato de improbidade ou de crime, tomado isoladamente.

            Sobre ele, por isso, será possível que recaia a obrigação de produzir prova da licitude da origem dos recursos que empregará em sua defesa. Essa, aliás, é uma obrigação de fácil consecução, sendo até mesmo benéfica ao acusado, na medida em que, comprovando que não se vale de valores ilícitos, já antecipará, de certa forma, prova parcial de que não tenha praticado o ato ilícito.

            Tais disposições, Srª Presidente...

(Soa a campainha.)

            O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - ... e já concluo, além de absolutamente coerentes com as exigências sistemáticas do ordenamento jurídico nacional, são profundamente oportunas e adequadas para sinalizar aprimoramentos urgentes e necessários em nossos valores, ligados ao fortalecimento e ao desenvolvimento da cidadania.

            A aprovação desse projeto de lei do Senado, de fato, levará a todos a mensagem clara de que estão por acabar os tempos em que ricos e pobres recebem tratamentos distintos no processamento dos atos de improbidade administrativa e dos crimes contra a administração pública e contra o sistema financeiro. Levará também um anúncio de que o produto dos crimes de colarinho branco não mais poderá ser imoralmente direcionado para a defesa dos acusados, desestimulando, assim, ainda mais essa prática perniciosa.

            E evitará, por fim, que a santidade do exercício da alta missão social...

(Interrupção do som.)

            O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - ... do advogado - já concluo - (Fora do microfone.) sirva de veículo para lavagem e para ocultação de recursos ilícitos, circunstância que macula simultaneamente a profissão de advogado e a lisura que deve pautar seu relacionamento profissional.

            Tendo a convicção de que, assim procedendo, estaremos todos, como membros desta elevada Casa Legislativa, cooperando para o aperfeiçoamento, não somente de nossa ordem jurídica, mas da própria democracia, que vive e caminha sobre a base de uma cidadania forte, igualitária e crescentemente mais bem estruturada, agradeço a atenção de todos e espero que esse projeto possa ser aprovado.

            O Sr. Hélio José (Bloco Maioria/PSD - DF) - Senador Medeiros, eu havia aqui pedido um aparte. V. Exª não deve ter visto, mas, antes de V. Exª se ausentar...

            O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Mil desculpas e concedo o aparte.

            O Sr. Hélio José (Bloco Maioria/PSD - DF) - Eu queria cumprimentá-lo e dizer que é com muita alegria que vejo um jovem Senador como V. Exª com esse pronunciamento tão importante...

(Soa a campainha.)

            O Sr. Hélio José (Bloco Maioria/PSD - DF) - ... e brilhante aqui, nesta Casa, onde coloca assuntos fundamentais com relação à corrupção vigente e à necessidade de apuração com clareza, com tranquilidade.

            É um paradoxo de verdade o cara pegar o dinheiro sujo e pagar para se livrar de uma acusação.

            Então, quando V. Exª deixa claro que precisa saber a origem do recurso a ser usado, não está quebrando sigilo nem fazendo nada do direito de livre defesa da pessoa, só está querendo ter certeza de que a pessoa estará pagando os honorários, para aquela liberação, com dinheiro lícito. Acho muito bacana o pronunciamento. Sinceramente, concordo que a Catta Preta não tem que ficar dizendo, ela, de onde vem, mas quem está pagando para ela tem que dizer de onde vem, se é lícito ou se não é lícito o dinheiro. Queria parabenizar a V. Exª pelo colocado.

(Interrupção de som.)

            O Sr. Hélio José (Bloco Maioria/PSD - DF) - Estamos aqui numa Casa que visa exatamente a transparência dos fatos, e o que V. Exª coloca aqui vem ao encontro dessa situação. Só tem que ser aplaudida por todos nós essa postura que V. Exª traz aqui. E, com relação ao que V. Exª coloca de alguns terem o privilégio com relação aos outros, quero crer que não aconteça, mas, se estiver acontecendo, depõe contra os nossos Estados. E, para nós, que somos novos aqui na Casa, acho que não seria procedente. Como sou um cara que acredito muito no trabalho que o Senador Renan está fazendo, não creio que isso esteja ocorrendo, mas, de qualquer forma, foi muito bom o alerta que V. Exª coloca, porque acho que somos 81 Senadores e todo mundo tem o mesmo direito, na mesma situação, ao encaminhar, de ter a presteza do encaminhamento dos seus projetos. Muito obrigado.

            O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Muito obrigado.

            Obrigado, Srª Presidente, pela tolerância.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/08/2015 - Página 106