Discurso durante a 100ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro do Dia Mundial de Combate à Desertificação e à Seca e preocupação com a seca que ocorre no Nordeste brasileiro.

Autor
Ciro Nogueira (PP - Progressistas/PI)
Nome completo: Ciro Nogueira Lima Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CALAMIDADE:
  • Registro do Dia Mundial de Combate à Desertificação e à Seca e preocupação com a seca que ocorre no Nordeste brasileiro.
Publicação
Publicação no DSF de 18/06/2015 - Página 243
Assunto
Outros > CALAMIDADE
Indexação
  • REGISTRO, DIA INTERNACIONAL, COMBATE, SECA, COMENTARIO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, REGIÃO NORDESTE, MOTIVO, AUSENCIA, RECURSOS HIDRICOS, REGIÃO, DEFESA, POLITICAS PUBLICAS, OBJETIVO, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, HABITANTE, REGIÃO SEMI ARIDA.

            O SR. CIRO NOGUEIRA (Bloco Apoio Governo/PP - PI. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, eu gostaria de aproveitar a passagem do "Dia Mundial de Combate à desertificação e à Seca" para lembrar que este é o quarto ano consecutivo daquela que está sendo considerada a mais grave seca que assolou o Nordeste, nos últimos 50 anos.

            Desde 2012, quando começamos a chamar atenção deste grave problema, aqui, nesta mesma tribuna, a situação só fez agravar-se.

            Conhecemos muito bem a periodicidade das secas e das estiagens que afetam o semiárido brasileiro, particularmente na região denominada Polígono das Secas. No domínio das caatingas, os cursos d'água são intermitentes, de forma que o sertanejo depende dramaticamente da regularidade das chuvas. Quando sucede período de estiagem tão prolongado como o atual, a possibilidade de sobrevivência confronta-se com os seus limites mais extremos.

            Não há, no mundo inteiro, região semiárida tão densamente povoada como a nordestina. Esta é a nossa peculiaridade. Este é, também, o nosso maior desafio.

            As lentes do fotógrafo Sebastião Salgado mostraram, recentemente, como as regiões mais remotas e menos habitadas do globo são exatamente aquelas que apresentam os maiores desafios e perigos para a sobrevivência humana.

            Pois o sertanejo, Srªs e Srs. Senadores, contrariou a regra. Os nossos sertões são densamente habitados. Criou-se, aqui, cultura secular de adaptação e sobrevivência à seca e ao ambiente rústico, moldando visão de mundo de contornos bastante específicos. No Nordeste, o sertanejo não se confunde com o brejeiro, habitante das áreas mais úmidas da zona da mata, do agreste, das serras mais férteis e das zonas de transição para o cerrado.

            Esta forma bastante peculiar de autocompreensão do mundo repercutiu em várias formas de expressão artística, da literatura ao cinema, cultivando a imagem do sertanejo que "é, antes de tudo, um forte", nas palavras consagradas por Euclides da Cunha.

            A atitude de determinação, de coragem, de força impregnou a cultura sertaneja, pois o meio físico, material, impunha enormes desafios a sobrevivência humana. Não é, definitivamente, qualquer tipo humano que sobreviveria em condições tão adversas.

            Esta atitude do sertanejo preserva relação íntima com o sofrimento. O personagem Valentim Pedreira, retirante celebrizado no romance de José Américo de Almeida, A Bagaceira, explicava como poderia sentir saudade, ao fugir da seca, daquela "terra infernal", nos seguintes termos: "E foi a seca que me deu coragem. Porque saber sofrer, moço, isso é que ter coragem".

            Haja coragem para enfrentar a seca dos tempos presentes. Estamos acostumados a enfrentar estiagens mais severas em intervalos de nove a doze anos. A seca atual é um desses picos infernais. No meu Estado do Piauí, 211 dos 224 municípios estão em estado de emergência, ou seja, mais de 90% deles.

            Os reservatórios d'água atingiram níveis alarmantes. Segundo dados do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS), para o mês de maio deste ano, o Piauí está com 36% de volume hídrico armazenado. A capacidade de armazenamento de alguns dos maiores açudes do Estado encontra-se em situação verdadeiramente crítica, a exemplo dos açudes Algodões 2, com 19%, Barreiras, com 9%, Bocaina, com 23%, Petrônio Portela, com 17% e Piaus, com 15%. O açude Cajazeiras já se encontra em volume morto. Se a situação está assim, logo depois do período das chuvas, o que esperar, Srªs e Srs. Senadores, do próximo período de estiagem?

            Atualmente, o impacto das secas no sertão nordestino não se afigura tão dramático como nos séculos XIX e XX, quando a morte assombrava as áreas afetadas e quadros pungentes do sacrifício de multidões de sertanejos eram comuns. Nos últimos tempos, políticas públicas de redistribuição de renda introduziram colchão de proteção para as populações mais humildes em situação de risco.

            Não podemos nos iludir, porém, com um quadro mais róseo dos efeitos da seca. Segundo o Atlas de Desastres Naturais, pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) em colaboração com o Ministério da Integração Nacional editada em 2013, mais de quatro milhões de pessoas foram afetadas pela seca no Piauí, no período de 1991 a 2012. Não há ocorrências de mortes, entretanto, 657 pessoas desapareceram e 8.075 adoeceram. Registra-se, ainda, mais de mil desabrigados e quase cinco mil desalojados.

            A seca continua sendo o desastre natural que mais faz sofrer a população no Estado, compondo mais de 85% dos registros oficiais dos municípios em situação de emergência. Os registros oficiais de ocorrências de secas e estiagens aumentaram 2,6 vezes na última década em relação à década passada. Nestes 11 anos, quase dois mil municípios piauienses tiveram situação de emergência decretada.

            O problema é mais severo em certas regiões do Piauí, sobretudo o Sudoeste e Centro Norte. Alguns municípios apresentaram médias alarmantes de registros no período, entre 14 e 17 ocorrências, a exemplo de Conceição do Canindé, Jaicós, Lagoa do Barro do Piauí, Paulistana, Francisco Macedo, Ipiranga do Piauí, Jacobina do Piauí, Santa Rosa do Piauí, Vila Nova do Piauí, Alagoinha do Piauí, entre outros.

            Portanto, Sr. Presidente, esta é uma data muito oportuna para refletirmos sobre a necessidade de ampliação de políticas públicas que possam amenizar o sofrimento do povo nordestino, especialmente do meu querido Piauí.

            Era o que tinha a dizer.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/06/2015 - Página 243