Pronunciamento de Regina Sousa em 13/08/2015
Discurso durante a 134ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Registros sobre a Marcha das Margaridas; e outro assunto.
- Autor
- Regina Sousa (PT - Partido dos Trabalhadores/PI)
- Nome completo: Maria Regina Sousa
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
CONGRESSO NACIONAL:
- Registros sobre a Marcha das Margaridas; e outro assunto.
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HOMENAGEM:
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MOVIMENTO SOCIAL:
- Publicação
- Publicação no DSF de 14/08/2015 - Página 173
- Assuntos
- Outros > CONGRESSO NACIONAL
- Outros > HOMENAGEM
- Outros > MOVIMENTO SOCIAL
- Indexação
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- DEFESA, NECESSIDADE, MELHORAMENTO, CRITERIOS, RECEPÇÃO, GRUPO, VISITA, CONGRESSO NACIONAL, IGUALDADE, TRATAMENTO, REDUÇÃO, DISCRIMINAÇÃO.
- HOMENAGEM POSTUMA, VOTO DE PESAR, MORTE, PARTICIPANTE, MARCHA, MULHER, TRABALHADOR RURAL.
- REGISTRO, REALIZAÇÃO, MARCHA, TRABALHADOR RURAL, MULHER, LOCAL, BRASILIA (DF), COMENTARIO, HISTORIA, CRIAÇÃO, EVENTO, DEFESA, COMBATE, VIOLENCIA DOMESTICA, MELHORAMENTO, PARIDADE, REPRESENTAÇÃO POLITICA, CONGRESSO NACIONAL.
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Apoio Governo/PT - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Srª Presidenta, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, telespectadores da TV Senado, ouvintes da Rádio Senado, venho falar ainda um pouco da Marcha das Margaridas sob outro viés.
Primeiro, eu queria tratar, pelo que vi aqui ontem, da entrada das pessoas dos movimentos sociais nesta Casa, que a gente diz que é a Casa do Povo, que, porém, tem um tratamento muito ruim. Não é a primeira vez que as categorias reclamam. Já foi assim com os índios. Eram só 15 para uma audiência pública, e houve um tumulto por causa de um maracá que um índio trazia, que não chegava a 30cm. Depois, com os petroleiros também. Só eram 15 para entrar. Há sempre uma dificuldade. E as mulheres ontem não chegaram nem a preencher todas as cadeiras aqui porque houve um tumulto que a Senadora Ana Amélia teve que mediar. Chamamos aqui de Casa do Povo. Precisamos melhorar essa questão da entrada das pessoas dos movimentos sociais para as audiências públicas ou para as sessões especiais.
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Apoio Governo/PP - RS) - Senadora, foi a Senadora Vanessa Grazziotin que comandou.
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Ah! Foi a Vanessa Grazziotin.
A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Apoio Governo/PP - RS) - Eu agradeço a V. Exª, porque me honra muito com a comparação. Mas como estou presidindo, V. Exª chamou Senadora Ana Amélia. Foi a Senadora Vanessa.
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Desculpa. Está certo.
Sentimos que há dois pesos e duas medidas, porque anteontem, aqui, não conseguíamos andar, nem na Câmara nem no Senado, de tanta gente que havia, tantos advogados, auditores. E percebemos que houve uma facilitação na entrada deles e ficamos nos perguntando: será que é porque usam terno e gravata?
Eu acho que precisamos ter um dispositivo, aqui, sobre a questão da entrada, porque sempre há um tumulto. Sempre tem que ir um Senador, uma Senadora para mediar a entrada. Isso atrasa o começo das audiências.
A outra questão é que eu coloquei hoje - não sei se está na mesa, se estiver, peço que deem como lido - um voto de pesar, porque na Marcha já faleceram duas mulheres - uma do meu Estado, inclusive. Hoje eu soube que mais uma, do Pará. Então, três companheiras da Marcha das Margaridas perderam a vida com aneurisma e infarto. Eu coloquei uma nota de pesar, que gostaria de dar como lida.
Mas quero falar também da Marcha, que aconteceu esses dois dias aqui, em Brasília. Mulheres do Brasil inteiro mostraram sua garra, sua disposição de luta, submetendo-se à viagem de mais de 48 horas dentro de um ônibus, para vir fazer ouvir a sua voz.
E vieram a esta Casa, mas infelizmente foram poucos ouvidos presentes para ouvi-las. Mas elas deixaram alguns recados: a sua pauta não é só a pauta cooperativa da trabalhadora rural. Elas deixaram a sua pauta, os seus recados contra a discriminação, contra a homofobia, contra a violência, contra o racismo e, sobretudo, em defesa da democracia.
Então, acho que esta Casa precisa ter acesso ao que disseram aqui as mulheres que discursaram ontem, para entender a luta das mulheres, que não é só das trabalhadoras rurais.
A Marcha das Margaridas é inspirada em Margarida Alves, que foi assassinada pelos senhores de engenho lá da Paraíba há 32 anos. Eu creio que ele deva ter se arrependido, porque depois da morte dela, ela virou semente e se multiplicaram muitas margaridas neste País todo, em todos os Estados.
Tanto que a Marcha acontece desde 2000 e é, a cada ano, maior.
O que chega aqui - 60, 70 mil pessoas - já é um filtro, porque a marcha acontece em todos os Estados e envolve, no final de tudo, mais de 200 mil margaridas.
As mulheres do campo e da cidade têm pauta comum. “Estamos caminhando na marcha e ainda longe do ponto de chegada”, dizem elas.
Talvez a Lei Maria da Penha tenha sido a maior expressão do avanço das nossas lutas, porque deu, pelo menos, visibilidade à violência contra a mulher. Mas temos uma pauta feminina a manter em evidência. Não basta só a lei; tem de fazer cumprir a lei. Nós temos leis aprovadas, em relação às mulheres, que não são cumpridas, como, por exemplo, a Lei do Acompanhante na maternidade. As maternidades insistem em não deixar uma pessoa acompanhando a mulher na hora do parto, alegando falta de estrutura. Não podemos mais tolerar isso. Temos de cobrar que, independente da estrutura, fique o marido, a irmã ou a mãe acompanhando a mulher na hora do parto.
Sobre a questão do registro do filho, essa também é uma lei que, principalmente as mulheres mais pobres, das comunidades mais distantes, acho que não têm nem conhecimento. É uma lei machista, porque o pai podia chegar e registrar o filho no cartório, a mulher não. Agora, ela pode, só que ela não sabe. Por isso, ainda temos um índice muito grande de crianças sem registro de nascimento.
A nossa pauta comum, hoje, nesta Casa, sobre a qual eu quero falar, inclui a cota das mulheres. Deve ser votada, na próxima semana, uma cota no Parlamento, que ainda é uma cota muito pequena, mas que tivemos de construir, para poder tentar fazer com que ela seja aprovada. Solicitamos aos nossos Senadores, homens, para que votem essa cota. Cota não é política de atraso, é instrumento de promoção de igualdade, onde há desigualdade. Então, estamos com essa PEC para ser votada, para depois travar a batalha na Câmara. Esperamos que, na próxima semana, resolveremos essa situação.
Os dados que temos em relação às mulheres refletem essa desigualdade, ainda muito grande. Pesquisa recente do Senado, por exemplo, mostrou que, em cada cinco mulheres, no Brasil, uma já foi espancada pelo marido, pelo companheiro, pelo namorado, ou pelo ex-marido, ex-companheiro ou ex-namorado. E apesar de 100% das brasileiras conhecerem a Lei Maria da Penha, que tem nove anos, elas ainda se sentem desrespeitadas.
Os motivos das agressões geralmente são ciúme e bebida. Essas são as principais causas da violência contra a mulher.
Aumentaram os registros de violência psicológica, e diminuiu a sensação de proteção que a lei deveria ter dado. Essa pesquisa foi feita pelo DataSenado, e os dados foram obtidos em julho próximo passado, com 1.102 brasileiras.
Os resultados da CPI contra a violência ainda não surtiram efeito. Apesar das recomendações aos Estados, pouca coisa é cumprida.
Nas três últimas décadas, 92 mil mulheres foram assassinadas no Brasil, o que coloca o País na sétima posição em assassinatos de mulheres no mundo.
Recentemente, realizamos na Comissão de Assuntos Sociais uma audiência pública para discutir o Pacto pela Redução da Mortalidade Materna e Neonatal. Nesse debate, descobriu-se que, no Brasil, como um todo, através das ações do Governo, até diminui bastante a mortalidade, porque caiu de 141 para 60 o número de mulheres que morrem no parto. Ainda não chegamos aos objetivos do milênio, mas estamos próximos.
Mas assustou o dado trazido pela médica Jurema Werneck, Coordenadora da ONG Criola. Primeiro, houve um aumento. Os próprios dados do Ministério da Saúde mostram o aumento da mortalidade entre as mulheres negras e índias. Quer dizer, diminuiu a mortalidade em mais de 50%, mas continua crescente entre as mulheres negras e as mulheres índias. Também mostrou que 92% das mortes poderiam ser evitadas - morte no parto e morte no nascimento.
Segundo a Drª Jurema, as causas são institucionais, associadas a leis, serviços ou políticas ineficazes; causas socioeconômicas. O principal dado é que a maioria das mulheres que ainda morrem de parto no Brasil são negras e indígenas.
Esse dado mostra que existe algo além das causas econômicas. O que se verifica é que existe um preconceito social e institucional. Os depoimentos dados na Comissão levaram a isso. Quando as negras chegam à maternidade para ter o seu bebê, já começa o mau atendimento na recepção, diferentemente da mulher branca. Então, existe esse preconceito institucional, esse racismo institucional que precisa ser combatido.
O fato é que as mulheres negras estão morrendo mais no parto, e 60% dos casos de morte materna poderiam ser evitados. É um número muito grande, a depender do atendimento nas maternidades.
Aqui, no Senado, tenho trabalhado a questão de gênero e são dados como esses que guiam para conseguir mais igualdade, um Brasil mais justo, soberano e igualitário entre homens e mulheres.
A Comissão Mista de Combate à Violência contra a Mulher apresentou um plano de trabalho a ser cumprido, no intuito de combater a violência, fazer diligência nos Estados, fazer visitas. No meu Estado mesmo, houve um caso recente de estupro de quatro meninas, mas, depois disso, outras mulheres, tanto no Piauí como em outras regiões, já morreram vítimas de violência. O que é mais grave e triste é que, normalmente, é alguém muito próximo a elas que pratica essa violência.
Estamos com essa comissão na luta, trabalhando, para que diminuam os índices de violência, e que, na questão da morte neonatal, as mulheres negras possam superar essa desigualdade.
Quero fazer uma saudação especial às margaridas, que, a esta hora, estão retornando aos seus Estados, voltando em ônibus para os seus Estados, com o dever cumprido, - receberam, ontem, a Presidenta Dilma, com muita alegria, com muito carinho -, e, em especial, as mulheres do meu Estado, que é bem longe, leva quase 40 horas para chegar lá, mas que deixaram aqui o eco dos seus gritos reivindicatórios e que esperamos sejam ouvidos por quem de direito, inclusive por esta Casa.
Saibamos nós, nesta Casa, ouvir as margaridas, porque elas merecem ser ouvidas, e margaridas não são só as mulheres lá do campo, nós todos aqui, mulheres Senadoras, também nos chamamos e nos consideramos margaridas.
Era isso. Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Nós que agradecemos a sua fala, Senadora Regina, muito bem colocada.
Eu acho que traduz bem esta Marcha das Margaridas a música de Milton Nascimento, Maria, Maria:
Maria, Maria
É um dom, uma certa magia
Uma força que nos alerta
Uma mulher que merece
Viver e amar
Como outra qualquer
Do planeta.
Maria, Maria
É o som, é a cor, é o suor,
É a dose mais forte e lenta
De uma gente que ri
Quando deve chorar
E não vive, apenas aguenta
O que a Marcha das Margaridas mostra é que as mulheres não querem mais apenas aguentar, querem viver com dignidade. As mulheres querem poder rir e não chorar. Então, penso que a música do Milton Nascimento diz isto: “Mas é preciso ter força, é preciso ter raça...
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Esse é o melhor verso.
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - ...é preciso ter gana, sempre.”
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Mas tem mais. Ele diz que, apesar de tudo, elas continuam tendo a “estranha mania de ter fé na vida”. Esse, acho o melhor verso da canção porque traduz bem a questão da força da mulher.
Muito obrigada.