Discurso durante a 141ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro da importância do agronegócio para o País.

Autor
José Medeiros (PPS - CIDADANIA/MT)
Nome completo: José Antônio Medeiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
AGRICULTURA PECUARIA E ABASTECIMENTO:
  • Registro da importância do agronegócio para o País.
Aparteantes
João Capiberibe, Telmário Mota.
Publicação
Publicação no DSF de 22/08/2015 - Página 17
Assunto
Outros > AGRICULTURA PECUARIA E ABASTECIMENTO
Indexação
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, AGRICULTURA, DESENVOLVIMENTO, ECONOMIA NACIONAL, REGISTRO, CRESCIMENTO ECONOMICO, CRESCIMENTO DEMOGRAFICO, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), MOTIVO, CRESCIMENTO, AGROINDUSTRIA, REGIÃO, DEFESA, NECESSIDADE, ELABORAÇÃO, POLITICAS PUBLICAS, OBJETIVO, MELHORIA, VIDA, AGRICULTOR, ENFASE, REDUÇÃO, BUROCRACIA, FORNECIMENTO, CREDITO AGRICOLA.

            O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Paim, na verdade somos nós que nos sentimos honrados por estar aqui, na sua companhia.

            Sr. Presidente, gostaria de cumprimentar todos que nos acompanham nesta manhã de sexta-feira pela TV Senado, pela Rádio Senado e também pelas redes sociais, porque hoje há muito mais pessoas se comunicando e recebendo informações através destes instrumentos do que propriamente dos canais tradicionais que nós conhecíamos, que eram o rádio e a TV.

            Senador Paim, o que me traz à tribuna nesta manhã de sexta-feira é um assunto que há muito se discute no Brasil. Quero falar um pouco sobre a agricultura.

            Ontem eu estava vendo as manifestações. Como V. Exª citou há pouco, toda manifestação num país democrático é legítima. Assim como houve manifestações no dia 16, ontem um grupo saiu em defesa do Governo, o que é legítimo também.

            Alguns cartazes, alguns manifestantes estavam ali, aliás boa parte, fazendo protestos contra esse ou aquele tema. Uns protestavam contra a terceirização, o que é legítimo, outros protestavam contra a corrupção, o que é legítimo, e alguns protestavam contra a agricultura. Eu fiquei pensando: “Mas, meu Deus do céu, ou eu estou ficando demente ou há muita gente que está na contramão.” Como a gente pode...

            Nós somos um país eminentemente agrícola. O Rio Grande do Sul, por exemplo, Estado do Senador Paim, é eminentemente agrícola. O Paraná é um Estado eminentemente agrícola.

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Isso é fundamental para a economia desses Estados. V. Exª tem toda a razão. Inclusive, no meu Estado, é o que está salvando a lavoura.

            O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - É o que está salvando a lavoura. V. Exª disse muito bem.

            Por ano, Senador Paim, a agricultura brasileira contribui de forma muito importante para a nossa posição econômica no cenário internacional. Aliás, existia até um cartaz antigamente que dizia: “Não fale de agricultura de boca cheia”. Era um trocadilho, evidentemente.

            O que está salvando a pátria neste momento, o que está nos dando alicerce para que não comecemos a ser especulados pelo capital internacional, pelo capital especulativo é o nosso alicerce agrícola.

            Então, fazer bandeira, tentar demonizar esse setor é um contrassenso. Isso é, eu diria, uma bandeira vazia, porque ela não tem o amparo da população.

            Nossa economia, vou falar, agora, do Estado de Mato Grosso, praticamente explodiu, Senador Paim, foi um crescimento assombroso, e as cidades... Éramos um Estado que trabalhava com a pecuária. As pessoas trabalhavam, às vezes, em grandes fazendas, criando gado e, de repente, chegou ao Estado a agricultura, que se desenvolveu de uma forma que não foi só no campo, não foi só na produção de grandes lavouras, mas também na produção de conhecimento e de tecnologia. Hoje, as máquinas que lavram os campos do Estado de Mato Grosso e do Brasil todo são moderníssimas, agregando valor à produção, já temos indústria de esmagamento de grãos e por aí vai. De forma que é até redundante falar da importância da agricultura brasileira.

            Mas, aqui, no País, ultimamente, temos tido o costume de demonizar algumas palavras e, aí, cunhou-se, por exemplo, que o agronegócio é uma palavra ruim. Olha, é bom, às vezes, esclarecermos o que é agronegócio. Agronegócio é uma cadeia da agricultura que compõe, por exemplo, a pessoa que tem uma horta no seu sítio e que leva os produtos para vender na feira. Aliás, a grande parcela do agronegócio, Senador Telmário, que alimenta as mesas do brasileiro não é do grande produtor, porque a nossa grande produção vai para a China, para outros mercados, mas do pequeno agricultor, da agricultura familiar, que faz parte da cadeia do agronegócio.

            E concedo o aparte a V. Exª.

            O Sr. Telmário Mota (Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Senador José Medeiros, quero parabenizar V. Exª por trazer hoje, a esta tribuna, um assunto fundamental. O Brasil, com certeza, ainda é o celeiro da produção do mundo, e eu falava isso ontem, no meu discurso. E o agronegócio, V. Exª classificou bem, são todas as ramificações da produção. Há o agronegócio grande, médio e o pequeno, onde se encaixa a agricultura familiar.

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, muito bem.

            O Sr. Telmário Mota (Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - E, às vezes, quando você se dirige...

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - O pessoal tem a mania, permita-me, quero só ajudar, porque acho que é um raciocínio correto e tranquilo: agronegócio é um negócio também da agricultura familiar, é um negócio dele ali. Então, não há por que criarmos dogmas, por exemplo, sou contra o agronegócio.

            O Sr. Telmário Mota (Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Como se o agronegócio fosse o grande e não fosse... O Senador José Medeiros tem toda razão, a agricultura familiar não só gera o emprego, como ela coloca alimentação, até mais barata e em maior quantidade, na mesa do brasileiro. E os grandes negócios servem para criar divisas para o País, para exportar, para atender às necessidades mundiais. Então, quero aqui...

            O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Isso é importante porque, às vezes, esse grande negócio incentiva o pequeno e até pega um pouco dessa produção.

            O Sr. Telmário Mota (Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Claro. E há um ditado, não é? “Todo mundo caminha para frente.” Então, a pessoa começa, às vezes, como um pequeno e se torna um grande. Isso é normal. Amador Aguiar era um simples operário de uma gráfica e se tornou dono do segundo maior banco da América do Sul ou da América Latina. Mas eu queria aproveitar esta fala - Sr. Presidente, e se o Senador José Medeiros nos permitir - para dizer que está aqui presente o Senador Sandro Baré, o Vereador Sandro Baré - de Senador para Vereador fica pertinho, não é?,Ele é do PDT, nos orgulha muito, e, também, além de abraçar várias causas, claro, do Município, boas sugestões, boas ideias, ele valoriza muito a cultura. E, agora, recentemente, uma quadrilha junina, a que ele dá apoio -apoia todas, mas nessa ele tem um participação maior ...

            O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Eu tomei um susto, ainda bem, uma quadrilha junina!

            O Sr. Telmário Mota (Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Junina, de cultura, de alegria, de felicidade, de diversão. Ela disputou, agora, o campeonato brasileiro, aqui em Brasília, e foi a campeã, quadrilha Eita Junino. Então, foi a campeã brasileira, foi um carro de prêmio, não é? Deixou até o Senador Pimentel aborrecido, porque a quadrilha junina do Ceará foi a segunda colocada. Então, isso demonstra que o Estado de Roraima... Quero parabenizar o Vereador, quero parabenizar todos os brincantes e os organizadores desse evento, que, realmente, foi maravilhoso. E o Vereador está aqui nos visitando, ele veio aqui para esse encontro, nessa Marcha dos Vereadores, que é também um Pacto Federativo que eles estão defendendo, ele e outros vereadores. Então, seja bem-vindo à Casa maior do povo brasileiro. Muito obrigado.

            O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Eu que agradeço o aparte. Seja bem-vindo à Casa, Vereador, e parabéns pela vitória.

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Permita-me, em nome da Presidência, também ser solidário a sua presença aqui e venha aqui à mesa. Vamos tirar uma foto aqui. Depois você passa ali e tira uma na tribuna com o nosso Senador também.

            O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Mas, Sr. Presidente, como eu dizia, o agronegócio é simplesmente uma cadeia de vários negócios. Do horticultor, do que vai à feira levar os seus produtos, do médio produtor e do grande produtor também.

            E, como eu disse, nós não podemos, se queremos ser grandes, se queremos ser protagonistas no cenário internacional, ter preconceitos. Essa história de que o grande é ruim e o pequeno é bom não existe. Existe uma cadeia que se complementa e que é importante para o crescimento econômico do País.

            O Senador Telmário Mota acabou de dizer que o grande gera divisas, e divisas são importantes. Nós termos uma balança comercial equilibrada é importante. O que é isso? São as nossas exportações, são as nossas vendas. É como se você tivesse mercado e vendesse. Quem tem um mercado quer o quê? Quer vender seus produtos. E o Brasil, como qualquer outro país, quer ter mercados, quer crescer, quer vender.

            É por isso que, nesta tribuna, eu tenho batido numa tecla de uma nota só, cobrando infraestrutura, cobrando estradas para o Estado de Mato Grosso, cobrando ferrovias. Por quê? Porque lá nós produzimos e queremos exportar. Exportar para onde? Exportar para a Europa, exportar para a China. Mas, para isso, nós precisamos ter estradas, precisamos ter menos obstáculos na frente dessa cadeia de exportação, porque os nossos concorrentes investem pesado para facilitar a negociação.

             Os Estados Unidos, por exemplo, que são o nosso principal concorrente na área agrícola, têm um emaranhado de ferrovias, têm um emaranhado de rodovias que se complementam. O sistema de transporte norte-americano é totalmente integrado. Ele é um tipo de sistema que é composto pela parte hidroviária, eles aproveitam bem a navegação nos rios, aproveitam bem o sistema de transporte terrestre, com rodovias, e o sistema ferroviário, que é uma verdadeira malha por todo o país.

            Nós ainda estamos engatinhando. Embora nossa produção seja grande, nós temos poucas rodovias, temos pouquíssimas ferrovias. Só para dar um exemplo, o Estado de Mato Grosso é dez vezes maior que Portugal, sete vezes maior que a Inglaterra, enfim, é um Estado gigantesco, mas nós temos lá três rodovias federais, nós temos lá ferrovias do pé quebrado. O que significa isso? Nós temos pedaços de ferrovias.

            Esse sistema de transporte nosso não se integra, Senador Capiberibe. Nós pegamos uma carga de milho, por exemplo, do norte de Mato Grosso, já na divisa com o Pará, e para levá-la até o Porto de Paranaguá, por exemplo, o produtor, o exportador brasileiro gasta praticamente uma outra carga de milho, só para pagar o frete. Isso nos atrasa e nos deixa em condição muito inferior aos nossos competidores, aos nossos concorrentes.

            Então eu fiz esse registro aqui, Senador Paim, justamente para desmistificar, porque senão vai criando o conceito de que a agricultura é um setor ruim, de que o agronegócio é uma coisa ruim. Não, não é ruim; é bom para o País, é ótimo. “Ah, o agricultor grande é prejudicial.” Não, não é.

            Agora, obviamente podemos ter argumentos como a questão ambiental. Mas a grande massa dos nossos produtores hoje quer estar ambientalmente correta. Sabe por quê? Porque o mercado mundial já não aceita produtos oriundos de propriedades em que haja trabalho escravo, ele não aceita produto produzido com agressão ao meio ambiente. Então todas essas empresas não querem estar numa lista suja, para não perder mercado.

            E outra: se porventura distorções houver, nós temos o Ministério Público, temos o Ibama, temos todos os órgãos para cuidar disso. Agora, não podemos rotular e dizer: “Olha, a agricultura é ruim porque é grande.” Não, esses são argumentos que não se sustentam, e temos que combater, porque precisamos.

            Mas a minha preocupação com a agricultura vai mais longe, Senador Paim. Eu hoje tenho me preocupado muito com a pequena agricultura, com o agricultor médio, e principalmente com o seu financiamento.

            O Estado do Rio Grande do Sul e o Estado do Paraná são exemplos disso, porque ali, diferentemente do Estado de Mato Grosso, nós temos muitos médios e pequenos produtores, que rendem muito, tanto quanto o grande. Simplesmente o Estado é dividido diferentemente, o que é bom, porque existem mais produtores. O Estado de Mato Grosso, por exemplo, não, é mais concentrado, são grandes propriedades, que não têm tanta dificuldade para ter acesso ao crédito, porque os próprios grandes bancos, Bank of America, enfim, o sistema financeiro internacional tem interesse de financiar essas grandes propriedades de 100 mil hectares, propriedades de 200 mil hectares. Eles têm interesse porque têm interesse em emprestar dinheiro, e há lastro garantidor para esses empréstimos, o que não ocorre com o pequeno agricultor.

            E eu tenho me preocupado porque veio uma PEC agora aqui ao Senado justamente tratando dos fundos constitucionais, que são fundos, por exemplo, como o FCO, que fomentam o desenvolvimento de regiões como o Norte do Brasil, como o Centro-Oeste do Brasil, que têm também a pequena agricultura.

            E essa PEC que veio para cá agora tira praticamente... Praticamente, não, ela tira 30% desses fundos, que já são poucos. E a gente fica com essa preocupação.

            E como eu ia, nós estávamos falando aqui, é inegável, Senador Capiberibe, que o Brasil tem uma agricultura forte.  Sempre foi assim. O percentual do PIB nacional associado às atividades da agropecuária constitui cerca de 23% desse valor, com previsão de crescimento de 2,8% em 2015, de acordo com dados da Confederação da Agricultura e Pecuária.

            Um quarto de toda a riqueza gerada no País é, portanto, proveniente do campo. A quase totalidade dos empregos gerados no interior do País, excetuando-se aquelas vagas abertas dentro das cidades interioranas, são criados e mantidos pela agropecuária. Um número expressivo de famílias - associadas em cooperativas ou autonomamente - vive da produção da terra, fornecendo os víveres necessários à mesa diversificada do povo brasileiro.

            A riqueza das nações tem por base real a agricultura. Dela dependem as outras atividades econômicas. E é por isso aqui a minha defesa, que eu estava falando, de que não faz sentido se fazer um protesto contra a agricultura, contra o agronegócio, contra uma cadeia de produção que ajuda o País a crescer.

            Esse ideário, cuja elaboração remonta à segunda metade do século XVIII, com o surgimento da revolução agrícola inglesa - e que foi teorizado pelo Fisiocratismo -, ainda possui um chamamento vivo para nós que habitamos o século XXI.

            Quem não concordaria que devemos estimular o trabalho da terra e eliminar os entraves à produção e ao comércio dos produtos agrícolas? Não deveria, pois, o Estado atuar igualmente no custeio, assim como no investimento e na industrialização da terra agrícola, sobretudo em face de um mundo extremamente competitivo? Não é outra a dicção da lei.

            Sras e Srs. Senadores, Sr. Presidente, espectadores da TV Senado, o fundamento mais importante para implementar o crescimento da agricultura em suas várias frentes é o crédito rural, conforme a Lei nº 4.829, de 1965, que instituiu o referido crédito.

            A nossa Constituição Federal é explícita ao afirmar, em seu art. 187:

Art. 187. A política agrícola será planejada e executada na forma da lei, com a participação efetiva do setor de produção, envolvendo produtores e trabalhadores rurais, bem como dos setores de comercialização, de armazenamento e de transportes, levando em conta, especialmente:

I - os instrumentos creditícios e fiscais;

II - os preços compatíveis com os custos de produção e a garantia de comercialização;

III - o incentivo à pesquisa e à tecnologia;

IV - a assistência técnica e extensão rural;

V - o seguro agrícola;

VI - o cooperativismo;

VII - a eletrificação rural e irrigação;

VIII - a habitação para o trabalhador rural.

            E vai mais. Não vou ficar lendo aqui a Constituição. Além desse elenco de possibilidades de auxílio ao produtor, sabemos que o art. 47, §2º, da Constituição Federal ainda nos diz: "A classificação de mini, pequeno e médio produtor rural será feita obedecendo-se às normas de crédito rural vigentes à época do contrato.”

            A importância do crédito rural é inquestionável e está de acordo com a política de desenvolvimento da produção rural do País e com o bem-estar da população. O crédito rural tem por objetivo suprir recursos financeiros por entidades públicas e estabelecimentos de crédito privados aos produtores rurais e às cooperativas rurais para aplicação em atividades indicadas pela legislação. Especificamente, o crédito permite o armazenamento, o beneficiamento e a industrialização dos produtos agropecuários, também favorece o custeio da produção e a comercialização dos produtos agropecuários. O fortalecimento econômico dos produtores rurais, principalmente dos mini, dos pequenos e dos médios produtores, é fruto de um crédito rural bem direcionado.

            Para atingir seus objetivos, o crédito fica condicionado a uma variedade de operações, atendendo os produtores rurais. Mas uma coisa tem acontecido: a dificuldade dos produtores em ter acesso a esse crédito. A nossa preocupação com esta fala hoje, Senador Capiberibe, é justamente no sentido de tirar os gargalos, os obstáculos que o produtor tem que enfrentar.

            É uma gama, uma coisa tão absurda de papéis, que o produtor acaba perdendo a sua atividade não para as pragas da lavoura, não para lagartas, não para as intempéries que geralmente o agricultor enfrenta, não para seca. Geralmente, ele perde a guerra, perde a batalha para o papel. É tanto papel que ele começa a apresentar as certidões e, quando termina, as primeiras certidões já venceram e, então, ele tem que começar tudo de novo.

            Quem vive na cidade, que talvez tenha mais facilidade, até consegue, mas para o homem do campo, um dia é muito importante. Quando ele chega na cidade, já se sente intimidado por toda essa parafernália, aquela porta de vidro, aquele ar-condicionado. Não é o métier dele.

            O métier dele é plantar, é fazer produzir. E, quando ele chega na cidade, dizem: “O senhor traga o documento!” “Olha, está faltando um carimbo aqui!” “Não, isso aqui não dá, já venceu!” Aquilo vai irritando, e o homem simples do campo acaba abandonando.

            O Sr. João Capiberibe (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) - Senador Medeiros.

            O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Concedo, com muita honra, um aparte a V. Exª, Senador Capiberibe.

            O Sr. João Capiberibe (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) - Muito obrigado. A burocracia é uma herança colonial. Entre tantos costumes, nós herdamos do colonizador português e reproduzimos aqui o Estado português. Vou tomar dois minutos, para contar uma história que reflete perfeitamente essa herança da qual não conseguimos nos livrar. Eu morei alguns anos fora do Brasil e, entre esses anos, passei quatro no Canadá. No Canadá, o único documento exigido é o número de Seguro Social, sem fotografia. O segundo - e o único documento que tem fotografia no Canadá é a Carteira de Motorista. Com aquele Seguro Social você utiliza dos os serviços que o Estado presta, e que são muitos, porque a saúde no Canadá é socializada, assim como a Justiça. Lá são muitos os serviços a que você pode recorrer somente com aquele número do Seguro Social. Eu trabalhei em Moçambique, e lá cheguei três anos depois da independência do País. Era como chegar ao Brasil em 1825. O Brasil teve a sua independência, só que a independência no Brasil foi proclamada por um português, por uma pessoa com ligações muito próximas com a Coroa portuguesa. Eu cheguei a Moçambique em 1978, três anos depois da independência, que aconteceu em 1975. E a burocracia de Moçambique era exatamente semelhante à do Brasil. Em uma dessas viagens que fiz de Montreal para Maputo, levei um laboratório de análise de solo. Estamos falando de agricultura, e a minha primeira atividade na vida, minha formação, foi de Zootecnia. E eu adquiri um laboratório para levar para a análise de solo em Moçambique. E, na passagem por Lisboa - a gente fazia Montreal-Lisboa ou, então, Roma-Dar es Salaam até Maputo; então, era longa a viagem -, numa dessas viagens, eu retirei a minha bagagem, e normalmente eu viajava com muita bagagem, porque faltava tudo em Moçambique e, ainda, nós estávamos no período pós-guerra colonial, já entrando numa guerra civil, e esqueci o laboratório em Lisboa, na alfândega. E fui embora, esqueci, mas levei o protocolo. Passados uns oito ou nove meses, num desses meus retornos por Lisboa, resolvi resgatar esse equipamento. E fui e me apresentei ao protocolo. Aí, disseram-me que tinha ido para a casa, lá para a central da receita deles. Aí, eu fui lá e disseram-me: “Olha, vai para leilão. Está pronto para ser leiloado.” Eles já iam leiloar. Olha a conclusão: eu passei três dias correndo atrás, para poder resgatar o laboratório. E, na última hora, já tinha tirado dez papéis, exatamente como V. Exª está relatando sobre os agricultores do Brasil. E, no final, quando eu tinha desistido, já, e o avião estava quase saindo, já estava na hora de eu tomar o meu avião, e eu não conseguia liberar, porque, na última hora, faltou um selo. E, aí, eu saí de lá esbravejando e um cidadão se dirigiu a mim e me perguntou qual era o meu problema. Eu expliquei e ele disse: “Não, pode deixar. Eu sou despachante.” Ele, em cinco minutos, resolveu o problema. Ou seja, há burocracia, para gerar dificuldades, para alguém criar facilidades. Então, no Brasil, a gente não consegue, e, ainda, não conseguiu até hoje, e olha que já houve até Ministério da Desburocratização. E a gente continua enredado nessa burocracia infernal, que atrasa e cria um custo adicional a tudo que nós produzimos. V. Exª tem razão: a agricultura brasileira é uma agricultura produtiva, hoje, com um grande espaço na economia global, mas tem esses problemas. E existem vários outros problemas, mas esse da burocracia inferniza não só a vida dos agricultores, mas a de todos nós, infelizmente. E não se toma iniciativa. Uma das iniciativas que poderia ser tomada agora, já que nós estamos vivendo uma crise, seria a profissionalização da burocracia brasileira, não é? Porque, se você há um burocrata formado, capacitado, isso facilita a vida de todo mundo. Então, o Brasil poderia tomar esta decisão neste momento: fazer, com cem anos de atraso, aquilo que os países de ponta, os países de capitalismo avançado fizeram no século XIX. Obrigado.

            O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Eu que agradeço, Senador Capiberibe. V. Exª tem uma história que talvez o País ainda não conheça, mas eu aconselho a todos a lerem o livro escrito por V. Exª, que eu comecei a ler à noite e varei a madrugada de tão interessante que era a história, realmente uma história verídica, uma história acontecida, contando a História recente do nosso País.

            Mas é uma realidade o amor e o apego que nós temos aqui pela burocracia. V. Exª tocou num ponto interessante, Senador Paim: enquanto a burocracia, às vezes, está querendo resolver o problema, na verdade está dificultando e criando dificuldade para alguém vender facilidade. E é por isso que eu digo que o pequeno é quem acaba sendo afrontado, quem acaba sendo prejudicado, porque, se eu sou um grande agricultor, eu contrato logo um despachante, eu contrato uma empresa especializada, e eles vão cuidar dessa burocracia, e eu não vou ter problema. Agora, o pequeno não: ele tem que deixar a enxada, tem que deixar o tratorzinho dele lá e tem que vir para a cidade. E aí, quando ele se depara com esse emaranhado, ele desiste.

            Então, justifica a iniciativa, Srªs e Srs. Senadores, da facilitação do crédito, pelo excesso de exigências para a concessão desse crédito. Essa é uma queixa recorrente dos produtores rurais brasileiros e encontra-se no Relatório de Avaliação de Políticas Públicas relativo ao crédito rural no Brasil, de 2014. Vejo nesse excesso um entrave e um risco para o financiamento da atividade agropecuária.

            No referido relatório, a Comissão de Agricultura desta Casa diagnostica a necessidade de maior controle no que tange ao excesso de garantias exigidas na concessão do crédito rural. Tais exigências, não raro, ultrapassam o percentual de 200% sobre o crédito concedido - olha que absurdo! -, criando um ônus que prejudica a produção agrícola como um todo e o próprio desenvolvimento do País, demonizando especialmente a agricultura familiar.

            A produção de gêneros alimentícios - sua variedade, e não apenas as commodities - é mais do que uma necessidade. Trata-se de uma questão de segurança alimentar para o Brasil e para os brasileiros. Daí ser fácil entender que os contratos creditícios devem ser elaborados com o espírito posto na função social da atividade fim, que é uma vida mais saudável para todos. Como estão sendo feito, os contratos estão punindo previamente os produtores que criam as condições de sobrevivência material para toda a população. Isso é um contrassenso até.

            Acredito que a cifra de 130% como limite máximo proposto é de bom alvitre, servirá para atender as instituições e certamente fará frente a eventualidades de não cumprimento de contrato. E eu explico, Senador Capiberibe: hoje, se V. Exª tiver uma propriedade que vale R$1 milhão, e V. Exª quiser pegar R$50 mil, toda a sua propriedade ficará sob garantia. Amanhã ou depois, se V. Exª precisar de mais um crédito - digamos, de R$30 mil -, não poderá pegar, porque sua propriedade estará dada sob garantia daquele ente financeiro.

            Ora, se o País diminuísse essa garantia, eu poderia pegar empréstimo, às vezes, até no concorrente, no outro banco que me dá uma garantia maior, porque há lastro. Às vezes, o sujeito tem uma propriedade...

            E isto vale até para os grandes também. No momento em que não estamos podendo dispor de dinheiro, Senador Paulo Paim, para injetar na agricultura, se eu diminuir a exigência dessas garantias, os bancos privados vão poder brigar entre si e injetar, eles próprios, dinheiro na agricultura. Da forma como está, hoje se exige em torno de 200% do valor que está sendo emprestado - então, são entraves que precisamos superar para melhorar a situação no campo.

            Para o produtor, tais contratos se caracterizarão como mais acessíveis e mais justos. Quero crer que o PLS n° 447, de 2015, que tramita na CRA, dá voz a todos os produtores que desejam assinar um contrato mais simétrico na área rural.

            Srªs e Srs. Senadores, quando propus esse projeto foi o sentido de tirarmos esses entraves. E já concluo, Sr. Presidente, dizendo que o mundo financeiro é um mundo de muitas entrelinhas. E, para impedir fatos como a subavaliação de bens oferecidos em garantia, propus que, em caso de execução, a parcela do produto da alienação do bem dado em garantia a ser destinada ao credor não poderá ser superior a 130% do valor original do crédito contratado, acrescida apenas da correção monetária regulamentar. Assim, a instituição de crédito não se beneficiará, caso tente burlar a lei.

            Finalizo, Senhor Presidente, dizendo que agi guiado pela boa vontade que caracteriza a Justiça, no intuito de tirar os gargalos e os obstáculos para a produção brasileira. Desejo, assim, como todos aqui nesta Casa, que mais benefícios sejam destinados ao setor produtivo rural. O resultado será uma população mais bem alimentada, com mais saúde, mais produtividade, uma vida mais feliz, com mais comida na mesa das famílias, o que é um desejo legítimo de cada um dos brasileiros e certamente nosso.

            Contratos mais justos não deveriam ser negociados quase como favores, mas como formas legítimas de crescimento para o Brasil. Hoje, quando o produtor vai a um banco, Senador Paim, é desta forma que ele se sente, numa hipossuficiência imensa, tanto é que os bancos inventam de embutir nesses contratos: "bom, já que eu lhe estou concedendo esse favor, você vai comprar de mim aqui esse seguro". E, aí, embute uma cadeia de seguros, de não sei o quê, que acaba onerando demais, e ele se sente como se estivesse recebendo um favor. O gerente do banco passa a ser praticamente uma divindade, e ele fica ali, praticamente, com a instituição financeira, numa síndrome de Estocolmo. Então, é com essa situação que nós tentamos acabar.

            Foi por isso - para finalizar - que apresentei esse projeto de lei, no sentido de diminuir essas garantias que o produtor tem que apresentar; não eliminá-las. Obviamente, quem está emprestando dinheiro tem que ter a garantia, agora, vamos devagar com o andor, menos exigência, menos gasto com papel, porque, no fim de tudo, o que nós queremos, e é disso que o País precisa, é que a produção se dê de forma tranquila e sem esse emaranhado que há hoje.

            Muito obrigado, Sr. Presidente, e agradeço pela tolerância que teve.

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, Senador José Medeiros. Eu quero cumprimentar V. Exª.

            V. Exª é um Senador independente, mas V. Exª - e eu fui também na mesma linha - comentou e não deixou de reconhecer as manifestações de domingo passado. Houve, e foi uma grande manifestação, sim. Pode ter sido menor que a outra, mas foi.

            V. Exª vem à tribuna também e, com a mesma grandeza, reconheceu as manifestações de ontem. No caso, até discordou de algumas faixas ou bandeiras colocadas, como nós também discordamos daquele boneco do Lula, por exemplo. Mas V. Exª reconhece que houve, sim, um movimento pró-Presidenta Dilma e fez um comentário na linha do bom senso e do equilíbrio, defendendo desde a agricultura familiar até o grande negócio no campo, que são importantes para a economia brasileira.

            Então, eu queria, mais uma vez, cumprimentar V. Exª. Eu tenho a mesma posição, comentei também o movimento de domingo, mas comentei também o dia de ontem, na mesma linha que V. Exª fez. É claro que podemos alguma visão diferente dessa ou de outra bandeira colocada, mas isso é democrático e é bom, porque faz com que nós nos aproximemos cada vez mais.

            Eu agradeço as suas palavras. E esse realmente é o entendimento.

            Na manifestação do dia 16, houve bandeiras extremamente afrontosas, e, ao ver o Senador Capiberibe sentado aqui na tribuna, lembro-me de algumas pessoas pedindo a ditadura de volta. Quando falam em ditadura, eu me lembro dele, porque eu sei o que ele sofreu na mão da ditadura. Então, assim, são saudáveis para o País essas manifestações.

            O Sr. João Capiberibe (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) -Senador...

            O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Concedo um aparte a V. Exª.

            O Sr. João Capiberibe (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) -Tive oportunidade de observar que, da grande massa que participou das manifestações, as viúvas da ditadura eram pouquíssimas. Hoje não há clima, não há nem clima para reivindicar um retrocesso brutal como esse. As instituições estão sólidas, e tanto estão sólidas que está aí: nada impede que o Ministério Público investigue, que a Polícia Federal desempenhe a sua função. Até mesmo o Presidente da Câmara acaba de ser denunciado ao Supremo Tribunal Federal. Os homens mais ricos deste País estão na cadeia, dentro da democracia. Então, essa minoria, esse fragmento daqueles que sonham com a violência, com a perseguição, com a tortura, que querem que volte isso são resíduos na sociedade brasileira. Essa é uma página virada, graças a Deus.

            O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Só para concluir, Senador Paim.

            Essa é a importância deste nosso momento, Senador Cabiperibe. O PPS é um partido de oposição, e nós temos feito críticas ao Governo, mas quero fazer aqui um elogio muito sincero. Em que pese estar em dificuldade, em que pese estar quase perdendo o eixo, o Governo não caiu na tentação da repressão às manifestações. A manifestação de domingo foi bacana, e foi legítima a que fizeram ontem. Porque, em países irmãos nossos aqui - tive a oportunidade de visitar a Venezuela -, eu vi que não existe isso. E aqui, não; aqui todo mundo teve condições. Pode ir para a rua criticar ou pode ir para a rua falar a favor do Governo, porque temos esse clima para fazer isso. Isso é amadurecimento da democracia, o que é bom para o País.

            Então, pessoas como o Senador Capiberibe - e como o Senador Paim, com certeza -, que viveu nesse período, sabe o que é um regime de exceção. E graças a Deus nós estamos aqui: eu da oposição posso falar, posso vir aqui falar contra o Governo; quem é da situação pode vir falar a favor; e nós convivemos nesse clima. Isso é importante.

            Nós estamos passando por uma grave crise. Esperamos e temos procurado uma saída, Senador Paim, mesmo sendo da oposição. O Senador Capiberibe também é de um partido que é independente aqui, mas é um partido que está praticamente na oposição, e ele tem sido um dos Senadores que tem feito reuniões nesta Casa, juntamente com o Senador Cristovam e outros - e de algumas eu participei -, no sentido de se procurar uma saída para o País porque não é proibido, não é só a situação.

            Eu tenho dito: a obrigação, obviamente, de achar a saída é do Governo, que ganhou, é legítimo para isso e tem seus técnicos. Mas estes Senadores, com a responsabilidade que têm e com a visão de País, têm procurado também contribuir, sem ranço, para a democracia. Agora vejo que há um movimento se articulando na Câmara no mesmo sentido também - e aí com todos os partidos de posição juntos - porque, ao final de tudo, nós somos oposição ao Governo da Presidente Dilma, não somos oposição ao Brasil. E não se pode, de repente, cair na tentação do discurso fácil de, simplesmente, embora seja uma coisa boa para o País, “se a Presidente for a favor, eu sou contra”. Não podemos ir naquela “se hay gobierno, yo soy contra”. Não; nós somos, acima de tudo, brasileiros e queremos que este País vá bem.

            Agora, é óbvio, vamos fazer as críticas aqui, e é bom que elas existam. Aliás, existe um ditado que diz que “toda unanimidade é burra”.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/08/2015 - Página 17