Discurso durante a 145ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Sugestões de mudanças no sistema tributário a fim de promover a diminução das desigualdades sociais.

Autor
Lindbergh Farias (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Luiz Lindbergh Farias Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA:
  • Sugestões de mudanças no sistema tributário a fim de promover a diminução das desigualdades sociais.
Publicação
Publicação no DSF de 28/08/2015 - Página 227
Assunto
Outros > ECONOMIA
Indexação
  • DEFESA, NECESSIDADE, REFORMA TRIBUTARIA, APRESENTAÇÃO, SUGESTÃO, FORMA, MELHORIA, ARRECADAÇÃO, IMPOSTO DE RENDA, CRITICA, AUSENCIA, IGUALDADE, COBRANÇA, IMPOSTO DE CONSUMO.

     O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do

orador.) - Quero começar agradecendo as palavras desta grande Senadora, talvez a Senadora mais presente aos trabalhos do Senado Federal, de segunda-feira a sexta-feira. É impressionante como está em todas as comissões. Muito obrigado pelas palavras.

    Quero agradecer também ao Senador Dário Berger, que começou como líder estudantil. Foi um grande prefeito e, hoje, está fazendo um grande trabalho no Senado.

    Eu achei importante V. Exª falar, até para que as pessoas entendam o papel do Senador, da sua atuação no Estado. Nós trabalhamos aqui, mas se V. Exª não fizesse essa peregrinação, conversando com as cidades, com os prefeitos, com os vereadores, com a sociedade, V. Exª não teria visto o problema, não teria resolvido o problema das estradas federais lá em Santa Catarina.

    Então, o bom Parlamentar tem que equilibrar o seu trabalho parlamentar aqui, mas tem que haver a presença do outro lado, senão você se distancia concretamente da vida das pessoas.

    Eu vou, hoje, Senador Dário Berger, falar sobre o nosso sistema tributário, porque nós estamos no meio de uma discussão de um ajuste fiscal, nós sabemos dos problemas fiscais que o Brasil enfrenta, mas nós vamos falar de como esse sistema tributário brasileiro é injusto, é regressivo, penaliza centralmente trabalhadores e classe média. Os mais ricos pagam muito menos impostos do que os trabalhadores e as classes médias.

    Queremos aqui apresentar um conjunto de propostas que tem um impacto fiscal muito grande. Se o Governo luta para aumentar a arrecadação, nós podemos mostrar aqui que nós podemos aumentar muito a arrecadação fazendo justiça tributária.

    Então, começo o meu discurso, Presidente, Senador Dário Berger, dizendo que nós diminuímos a desigualdade e fazemos justiça social de duas formas, na hora em que você executa o Orçamento, que você faz políticas públicas, gastos sociais.

    Nesses últimos 13 anos, nos governos do PT, nós tivemos um grande avanço. Diminuímos a desigualdade do País muito em cima do gasto público. Só que a outra ponta ainda falta muito. A outra ponta é você diminuir a desigualdade e fazer justiça social melhorando a arrecadação, para que os que podem mais tenham uma contribuição mais significativa.

    Nesse terreno, eu vou mostrar aqui neste meu discurso que nós estamos muito atrasados. O Brasil tem um sistema tributário dos mais regressivos e injustos do mundo. Há muitos números que revelam que a classe média, os trabalhadores e os mais pobres são aqueles que pagam uma carga excessiva.

    Segundo estudo do Ipea, os 10% mais pobres destinam 32% das suas rendas para pagar impostos. Enquanto isso, os 10% mais ricos pagam somente 21%.

    Em outro estudo do Ipea, é revelado que o estrato intermediário dos declarantes de Imposto de Renda em 2013, cerca de 1,5 milhão de pessoas com rendimento entre R$162 mil e R$324 mil por ano, paga 11,5% do total da sua renda.

    A situação é muito distinta entre os muito ricos. Os muitos ricos, 71.440 pessoas com renda em torno de R$4,2 milhões, pagam apenas 6,1%. Isso ocorre porque grande parte de suas rendas não é tributável, por- que recebem lucros e dividendos de suas empresas, que são isentas de tributação quando são recebidas por pessoa física.

    A verdade, Senador Dário Berger, é a seguinte: se você é funcionário público, assalariado, ganha R$5 mil, você paga uma tabela de Imposto de Renda de 27,5%. No entanto, o sócio de uma grande empresa do País que recebe R$200 mil por mês às vezes paga nada, porque ele pode, no seu salário, que é um salário pequeno for- malmente - mas o salário vem travestido de distribuição de lucros e dividendos e que, no Brasil, infelizmente, desde 1995, não é tributado. Eu vou explicar isso aqui.

    O Brasil precisa fazer uma reforma tributária, além de socialmente justa, pois evitaria que o país tivesse problemas orçamentários governamentais. Se o ‘’andar de baixo” pagasse impostos com uma carga justa e o ‘’andar de cima”pagasse de acordo com sua capacidade, teríamos um grande incremento na nossa arrecadação.

    É preciso reformular vários aspectos do nosso sistema tributário. Desde a carga excessiva sobre o consumo até o imposto sobre grandes heranças e doações. É preciso repensar e reformular pelo menos os seguintes pontos:

    1) Zerar o imposto sobre alimentos. É preciso zerar os impostos estaduais e federais sobre todos os ali- mentos. Os impostos sobre os alimentos estão em torno de 17%. É muito alto e injusto. Por exemplo, quando uma pessoa rica ou um pobre compram frutas, ambos pagam 22% de impostos. Para as pessoas mais ricas, esse é um valor irrisório, mas, para os mais pobres, o imposto pode ser o limite entre comprar ou não comprar uma outra fruta. Na Inglaterra, não há impostos sobre alimentos. Em 34 estados americanos, também não há. Os impostos indiretos, isto é, aqueles que não incidem diretamente sobre a renda e o patrimônio, são quase

sempre injustos, porque a alíquota é a mesma para diferentes cidadãos com diferentes capacidades contributivas. A maior parte dos impostos indiretos vai para os Estados e o Distrito Federal - que podem perder muito, ou podem ficar inviabilizados, se houver uma redução drástica, embora justa, dos impostos indiretos e, especialmente, sobre os alimentos. Contudo, os Estados e o Distrito Federal deveriam ser compensados com a instituição de novos impostos, por exemplo, IPVA para jatinhos, helicópteros, iates e lanchas, ou com o aumento da alíquota de impostos sobre heranças e doações, ou ainda com parte de um imposto sobre grandes fortunas.

    Eu falei aqui de helicópteros, jatinhos e iates, porque não sei se V. Exª sabe que, no Brasil, quem compra um carro zero paga imposto, IPVA e quem compra um jatinho, quem compra um helicóptero, quem compra um iate não paga imposto.

2)     Tributar lucros e dividendos recebidos por pessoas físicas - vou tentar explicar resumidamente. A empresa paga o salário ao trabalhador e desconta imposto de renda na fonte, isto é, o trabalhador já recebe o seu salário descontado. Aqueles que ganham salários médios pagam alíquota de 27,5. A empresa também transfere lucros e dividendos aos seus donos, contudo, de acordo com a legislação, o empresário não precisa descontar nada; lucros e dividendos são transferidos das empresas para os empresários, que estão isentos de qualquer tributação.

    O lucro recebido pelo empresário deveria ser tributado, é uma renda tal como o salário, que é gerado dentro de uma fábrica, por exemplo. E não seria bitributação. Há tributação do lucro na pessoa jurídica e, de- pois, quando é transferido para pessoa física, deveria, sim, pagar imposto. Afinal, quem paga imposto não é o montante que circula na economia, da empresa para o empresário, mas, sim, a pessoa física e a jurídica. Primeiro, pagou a pessoa jurídica e, depois, deveria pagar a pessoa física. E sempre foi assim. Essa isenção, que considero absurda, teve início em 1995, durante o Governo de Fernando Henrique Cardoso, com a Lei nº 9.249. Antes disso, a alíquota era de 15% de imposto de renda retido na fonte. Se o Governo restabelecesse essa alíquota de 15%, isentando os participantes do Simples, o potencial de arrecadação estaria entre 35 e 40 bilhões por ano, um impacto fiscal enorme.

3)     Tributar remessa de lucros para o exterior. Essa isenção da retirada de lucros das empresas, aprovada durante o Governo Fernando Henrique, também vale para as grandes multinacionais. Aconteceu também no final de 1995.

    Então, por extensão, as empresas estrangeiras que têm matrizes ou outras filiais no exterior querem mandar seus lucros para fora do País. Sabem quanto pagam de imposto? Zero. Faz-se distribuição de lucros e dividendos com remessa ao exterior e não paga nada de imposto! Somente nos últimos dois anos remeteram mais de US$52,5 bilhões para os Estados Unidos, Europa, Japão e paraísos fiscais.

    Para essas empresas não basta essa enorme facilidade, fazem outros artifícios que reduzem ainda mais os impostos que pagam ao Fisco brasileiro. Por exemplo, compram matérias-primas de suas empresas no exterior a preço elevado, assim transferem recursos a mais para o exterior, num movimento dentro da própria multinacional, e aumentam suas despesas no Brasil. Assim, o lucro aqui é menor e a multinacional paga menos impostos.

    Na hora de exportar, também utilizam outro mecanismo: vendem seus produtos a preços baixos para suas filiais em paraísos fiscais que “reexportam” os produtos para o destino final. Então, o lucro no Brasil é menor e, portanto, pagam menos impostos. Em verdade, fazem apenas operações contábeis com suas filiais em paraísos fiscais, porque enviam diretamente mercadorias para o verdadeiro destino. A operação com paraísos fiscais é essencial para reduzir os lucros que auferem no Brasil e para que parte do lucro já fique depositada em um país onde a tributação inexiste.

Sr. Presidente, este é o quarto ponto que nós apresentamos como proposta:

4)     Estabelecer o pagamento anual de IPVA para helicópteros, jatinhos, iates e lanchas. Muitas das propriedades dos ricos e bilionários são isentas de impostos. Aqueles que possuem iates, lanches, jatinhos e helicópteros não pagam impostos relativos a essas propriedades, mas, o trabalhador - como eu falei há pouco

- que tem um carro popular paga IPVA todos os anos. Somente em São Paulo, há mais de 400 helicópteros e algumas das embarcações de luxo são verdadeiros apartamentos flutuantes, possuem cinco suítes e são de- coradas com requinte, porém, não pagam um centavo de impostos.

    Muitos alegam que esses veículos estão sob controle federal e já pagam taxas, por exemplo, à Capitania dos Portos e ao Ministério da Aeronáutica. Entretanto, taxas têm uma significação completamente diferente daquela referente a impostos. Taxas são pagas para fins específicos e para manutenção de controle; impostos têm finalidade arrecadatória e de promoção da justiça social. Um bem pode pagar uma taxa e um imposto. É o caso de apartamentos em muitas cidades, que pagam o IPTU e taxa de incêndio ao Corpo de Bombeiros -

V. Exª, que foi prefeito, conhece bem. O IPVA é um imposto estadual e do Distrito Federal. No passado, alguns Estados tentaram cobrar IPVA desses veículos. Em 2007, a questão foi parar no Supremo Tribunal Federal, que

decidiu que tais veículos estariam isentos de impostos assemelhados ao IPVA.

     Para superar os entraves legais e para que Estados e Distrito Federal possam cobrar o IPVA desses veículos, eu apresentei uma PEC, a PEC nº 116, de 2011, que está na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, à espera da designação do relator.

2)     Aumentar a alíquota máxima do imposto sobre grandes heranças e doações. Não estou falando aqui de pequenas heranças, de quem deixa um apartamento, de quem deixa um carro; estou falando aqui de grandes heranças. O imposto sobre grandes heranças e doações é muito baixo no Brasil. A alíquota máxima que pode ser cobrada por Estados e Distrito Federal é decidida pelo Senado Federal.

    A alíquota máxima, hoje, é de 8% - foi uma decisão de 1992. Mas, por exemplo, no Rio de Janeiro e em São Paulo, onde mora a maioria dos ricos e bilionários do Brasil, cobra-se no máximo 4%. Deveria ser estabelecida uma tabela progressiva, isentando pequenas heranças e doações e tributando, de forma justa, as grandes.

    Apenas Ceará, Santa Catarina e Bahia são exemplos de Estados que têm tabela progressiva e que praticam a alíquota máxima permitida, que é de 8%. O Estado do Maranhão também está estabelecendo uma ta- bela progressiva, já que tinha uma alíquota única para todos os valores de bens.

    Uma tabela progressiva deveria relacionar valor da doação e parentesco. Quanto maior o valor e mais distante o grau de parentesco, maior seria a alíquota. Portanto, uma tabela com essa envergadura acabaria com as distorções que hoje existem quando um filho herda um imóvel de porte médio e tem que pagar imposto sobre herança - e deveria ser isento.

    Agora, quando vamos olhar a comparação internacional, é preciso que se diga: na Inglaterra, a alíquota do imposto sobre herança é de 40%; no Chile, 35%; na França, 60%; no Japão, 55%. Não estou falando aqui de nenhum país socialista, estou falando de Inglaterra, Chile, França e Japão. Nós só cobramos 8%.

3)     Estabelecer imposto sobre grandes fortunas.

    A Constituição de 88 estabeleceu que a União pode cobrar imposto sobre grandes fortunas, mas o poder econômico, dentro e fora do Congresso, impede a sua efetivação. Esse imposto existe, por exemplo, na França, no Uruguai, na Argentina e em muitos outros países. Esse não é um imposto que atingiria a classe média, mas faria com que os ricos e bilionários pudessem ser solidários com os mais necessitados. Aliás, hoje esse imposto é chamado, na França, de imposto de solidariedade. Incidiria sobre ativos reais e financeiros passíveis de ser transmitidos por herança e doação. Não haveria bitributação. Deveria ser descontado todo o imposto já pago sobre um bem. Por exemplo, o valor do IPTU seria descontado do imposto de grandes fortunas. Não haveria fuga de fortunas para o exterior. A experiência da França, por exemplo, mostra que o número de declarantes e o valor arrecadado têm crescido ano após ano.

    O grau de concentração da riqueza deve ser o parâmetro para o estabelecimento de alíquotas. O Brasil tem dezenas de bilionários e milhares de ricos que não fazem solidariedade fiscal aos mais necessitados, simples- mente porque são aliviados pelo sistema regressivo que possuímos. Segundo a revista Forbes, os dez brasileiros mais ricos têm uma fortuna de 266 bilhões. São donos de meios de comunicação, bancos, redes de fast-food, cervejarias, empreiteiras, frigoríficos, fábricas de massa e biscoito. A mesma revista informa ainda que o Brasil...

(Soa a campainha.)

O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - ... tem 65 bilionários.

4)     Extinguir uma jabuticaba, só existe no Brasil: juros sobre o capital próprio.

    Quero fazer justiça à Senadora Gleisi Hoffmann, que é Relatora de um projeto do Governo Federal que aumenta a Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido dos bancos de 15% para 20%. Essa foi a proposta do Governo Federal que devemos aprovar no Congresso Nacional. A Senadora Gleisi Hoffmann colocou no seu projeto inicial, no seu relatório inicial a extinção desta aberração que são juros sobre capital próprio. Infelizmente, ela não conseguiu construir maioria da Comissão e foi retirado.

    A Senadora foi muito correta também quando aumentou a contribuição de 15% para 23%. Também não atingiu maioria na Comissão e teve que voltar aos 20%. Mas o esforço da Senadora Gleisi foi muitíssimo importante. Eu fico a pensar no lobby que existiu por trás dessa movimentação para que se retirasse a extinção dos juros sobre capital próprio e não se elevasse sua Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido dos bancos para 23%, porque o Brasil todo está fazendo um grande esforço fiscal, um grande ajuste e os bancos nunca ganharam tanto, Senador Dário Berger. Então estava certa a Senadora Gleisi. Nós queremos retomar essas emendas na hora de votar o projeto aqui no plenário.

    Então, juros sobre capital próprio. Vou tentar explicar essa jabuticaba que só existe aqui no Brasil. É o seguinte: os empresários recebem lucros de suas empresas e não são tributados, mas a empresa paga impostos sobre o lucro que foi apurado. Durante o Governo Fernando Henrique, foi inventada uma fórmula, Lei nº 9.249, para reduzir contabilmente os lucros das empresas, para que pagassem menos impostos. Mas o lucro verdadeiro continuaria o mesmo.

    Vamos à fórmula mágica: o dinheiro do empresário que é colocado na empresa, chamado de capital

próprio, é considerado um empréstimo do dono da sua empresa. Então a empresa tem que pagar juros ao seu dono. Logo, o dono recebe juros da sua empresa sobre o seu próprio capital. Em suma, recebe da empresa juros e lucros. E isso beneficia a pessoa jurídica, a empresa, porque suas despesas aumentaram com o pagamento de juros, o que faz seu lucro cair e, dessa forma, tem que pagar menos impostos, Imposto de Renda da Pessoa Jurídica e Contribuição Social Sobre Lucro Líquido.

    Quando a empresa toma empréstimos para iniciar um negócio é correto que possa abater do lucro as despesas de juros, porque essa é uma forma de compensar o risco que a pessoa jurídica assumiu para gerar empregos e renda. Mas quando não há risco junto a terceiros, quando o capital da empresa é o capital do seu próprio dono, a operação de redução fictícia do lucro por meio de juros pagos ao dono da empresa nada mais é do que uma forma legal de sonegar impostos. Isso é uma grande distorção, é um absurdo, é maquiar a realidade transformando o capital próprio do empresário em empréstimo a sua empresa.

    Esse pessoal é muito criativo, Senador Dário Berger. Isso é de uma criatividade incrível! E, infelizmente está na nossa legislação desde 1995. Não existe País do mundo que tenha juros sobre capital próprio.

2)     Reformar a legislação do Imposto Territorial Rural.

    Tem que ser revista a legislação sobre o ITR. Segundo a Receita Federal, o ITR representa apenas 0,04% de toda a arrecadação tributária brasileira.

    Há uma grande concentração fundiária no Brasil. Apenas 1% dos proprietários rurais detém 43% das terras, todas com mais de dez mil hectares. Existem latifúndios e latifundiários, mas não existe arrecadação correspondente.

    A atual legislação estimula que terras permaneçam improdutivas e sejam utilizadas como ativos em um jogo especulativo de valorização. Entretanto, terras deveriam ser paraísos ecológicos da sociedade e produtoras de alimentos saudáveis para o mercado interno.

    O ITR tem que sofrer uma reformulação que leve em conta o tamanho das terras e a quantidade e a qualidade de sua produção. O modelo predominante no Brasil de latifúndios com terras improdutivas ou mono- culturas voltadas para a exportação tem que ser superado.

    O ITR tem que ser um instrumento de uma política de estímulo à agroecologia familiar de produção de alimentos para o mercado interno. Esse é o caminho para a produção de alimentos saudáveis, que são produzi- dos sem agrotóxicos e sem fertilizantes químicos, e também representa uma estratégia de oferta de alimentos a preços acessíveis ao mercado consumidor interno.

Item 9, Sr. Presidente. Eu já estou perto de terminar.

3)     Repensar a estrutura do Imposto de Renda da Pessoa Física.

Justiça tributária é feita quando os impostos são cobrados sobre renda e patrimônio.

    Como vimos - esta é a grande distorção aqui no Brasil -, impostos indiretos são injustos, cobram a mesma alíquota de ricos e pobres. Mais de 50% de nossa arrecadação vêm dos impostos indiretos cobrados sobre aquisição de bens ou contratação de serviços.

    No Brasil, somente 18% da arrecadação tributária vêm do imposto cobrado sobre a renda e 4% do total vêm de arrecadação de impostos sobre o patrimônio. São 22% em arrecadação de impostos sobre renda e patrimônio. Isso é muito pouco. Nos Estados Unidos, Canadá e Inglaterra, essa soma é superior a 50%. Os impostos indiretos têm um peso muito menor. Volto a dizer que não cito aqui nenhum país socialista. Estou falando de Estados Unidos, Canadá e Inglaterra.

    É na declaração de rendimentos que está revelada a verdadeira capacidade contributiva de cada cidadão. No supermercado, somos todos iguais perante o caixa.

    Portanto, devem ser estimulados estudos e propostas de reformulação da estrutura atual do Imposto de Renda da Pessoa Física. Há pontos cruciais a serem equacionados. Trabalhadores e classe média estão sobre- carregados. Ricos e milionários estão aliviados. A arrecadação é baixa, como a proporção da arrecadação total.

    A tabela de alíquotas contém graves distorções. Por exemplo, quem ganha R$5 mil por mês paga a mesma alíquota de quem ganha R$150 mil por mês. Só que aqui há uma questão, Senador Dário Berger: é difícil alguém receber R$150 mil como salário. Ou a pessoa vira pessoa jurídica e paga 15% ou faz distribuição de lucros e dividendos e não paga nada. Então é importante entendermos essa distorção na questão das alíquotas do Imposto de Renda.

    A alíquota máxima no Brasil é de 27,5%; nos Estados Unidos, é de 39,6%, porque há alíquotas maiores para quem ganha mais; no Chile, é de 40%; na Bélgica, 50%. As evidências internacionais mostram que países menos desiguais têm mais alíquotas na tabela e a alíquota máxima que atinge os ricos é bem elevada.

    Sr. Presidente, há muita desinformação sobre a questão tributária. A sociedade precisa conhecer esse assunto, precisa ser chamada a entendê-lo e a decidir sobre o tema. Esse é um assunto que poucas pessoas conhecem com profundidade. Alguns pensam que a carga tributária é alta para todos, o que não é verdade. A carga tributária no Brasil é de aproximadamente 35% do PIB; na Alemanha, 37,1%; na Áustria, 42,1%; na Suécia, 44,5%. No Brasil, a carga tributária é alta para a classe média, para os trabalhadores e para os pobres. Outros pensam que nem pagam impostos, porque não sabem que existe imposto em cada produto ou serviço que adquirem.

(Soa a campainha.)

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Somente o entendimento pode levar à mobilização da sociedade e a mudanças no sistema tributário. Não há outro caminho.

    Além da necessidade de se fazer uma reforma tributária para que tenhamos um sistema progressivo e justo, há outros problemas graves a serem enfrentados nessa esfera. O primeiro é a sonegação e o segundo, a cobrança da dívida ativa da União.

    A sonegação no Brasil é altíssima. O Sinprofaz, Sindicado dos Procuradores da Fazenda Nacional, categoria que é responsável por cobrar impostos que são devidos à União, estima que a sonegação em 2014 foi da ordem de R$518 bilhões. Estima ainda que, em 2015, a sonegação já atingiu R$340 bilhões.

(Soa a campainha.)

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Quem sonega imposto não é o trabalhador, que já recebe o seu salário com desconto feito na fonte. Também não são os mais pobres, que gastam todos os seus rendimentos em alimentos, transportes e serviços públicos. Eles pagam imposto no ato do consumo ou da aquisição de um serviço.

    Quem sonega impostos são as grandes corporações, que movimentam volumes extraordinários de re- cursos e têm departamentos especializados em reduzir a carga de impostos que deveriam pagar.

    Dívida ativa da União é a dívida comprovada de pessoas físicas e jurídicas com órgãos do Governo Federal, mas a maior parte dessa dívida, mais que 90%, é de natureza tributária. Após processo de averiguação em que foi atestada a existência da dívida, o Governo Federal, através da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, abre processos de execução fiscal.

    Por falta de estrutura, a cobrança dessa dívida é muito lenta e ineficiente. Os procuradores trabalham sem equipamento adequado para investigação, com tecnologia ultrapassada e falta de pessoal qualificado de apoio.

    De acordo com Achilles Frias, Presidente do Sinprofaz: ‘’Se cada procurador tivesse pelo menos cinco pessoas no apoio, teríamos tempo para investigar mais, estudar estratégias e fazer um trabalho com foco em inteligência.

    Mas hoje, diz Achilles Frias: “Não temos nem sequer um único servidor de apoio para cada procurador. E já está mais do que provado que para cada R$1 investido na Procuradoria o retorno é de R$820 para os cofres públicos”.

    Os últimos números oficiais da Dívida Ativa da União, divulgados no site do Ministério da Fazenda, são de 2012. A dívida tributária é estimada em R$990 bilhões, mas somente um terço desse montante são recuperados por ano. Hoje, a dívida tributária já ultrapassa R$1,1 trilhão.

    Segundo o mesmo Achilles Frias:“Os procuradores da Fazenda nacional têm buscado sensibilizar o Governo no sentido de investir mais recursos na Procuradoria, para que possamos nos concentrar na cobrança desses grandes devedores. Se o Governo investisse na Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, o Brasil não precisa- ria fazer o ajuste fiscal, porque teríamos condições de cobrar um estoque gigantesco de mais de R$1 trilhão”.

    Esse é o ponto, Sr. Presidente, encerro agradecendo V. Exª pela tolerância. Estou aqui já há 30 minutos falando. É uma fala para ficar registrada nos Anais, eu quero depois publicar esse texto.

    Vou me dedicar muito a esse tema de uma tributação mais progressiva no País, estou fazendo parte dessa Comissão formada pelo Presidente Renan, os partidos já indicaram para discutir essa Agenda Brasil.

    E nós vamos entrar com a nossa pauta, um dos pontos centrais da nossa pauta é esse: se o Governo tiver coragem de acabar com excrescência e abuso, como juros sobre capital próprio, distribuição de lucros e dividendos para remessa no exterior, nós temos condições de incrementar muito a arrecadação no próximo ano.

    O que nós não podemos aceitar é que façam um ajuste em cima do andar de baixo, dos trabalhadores, dos mais pobres. É impressionante o peso e o lobby que existe, neste Congresso Nacional, das grandes corpo- rações, quando a gente fala em aumentar tributação.

    Senador, volto a repetir, a Senadora Gleisi quis aumentar de 15 para 23 a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido dos bancos, mas, aqui, armou-se uma grande frente contra isso. E eu acho que esse debate tem que estar claro para a sociedade, porque eu não entendo, quero que as pessoas assumam suas posições.

E nós, por isso, vamos apresentar, em relação à Contribuição Social do Lucro Líquido, uma emenda aqui

no plenário para saber quem vai votar contra esse aumento de tributação para os grandes bancos brasileiros que nunca lucraram tanto.

    Mas eu encerro dizendo o seguinte, Sr. Presidente, esse ponto que eu falei agora é muito importante sobre a cobrança dos devedores ter eficiência. A gente viu a Operação Zelotes, que surgiu aí há pouco, as maiores corporações do País envolvidas na sonegação. Então, esse é um debate que nós vamos fazer.

    Na próxima terça-feira haverá a primeira reunião da Agenda Brasil. Eu discordo de inúmeros pontos daquela proposta ali apresentada. Nós não vamos aceitar a retirada de direitos de trabalhadores, a retirada de direitos de indígenas - e isto está nesta Agenda Brasil -, não vamos aceitar propostas que, na verdade, só favorecem ao grande capital; mas vamos apresentar a nossa agenda. E a nossa agenda, eu diria, terá como centro essa tributação mais progressiva, que incida sobre os que podem pagar mais, que são os ricos e bilionários do País, que pagam, proporcionalmente, muito menos impostos. E o outro ponto, que nós vamos centrar na discussão da Agenda Brasil, são medidas concretas para a retomada do crescimento econômico.

Senador Dário Berger, eu agradeço muito a V. Exª pela generosidade e tolerância.

    O SR. PRESIDENTE (Dário Berger. Bloco Maioria/PMDB - SC) - Que é isso, V. Exª merece muito mais tempo, inclusive, porque não fez só um pronunciamento, fez uma palestra, deu uma aula de reforma tributária. Aliás, quero só acrescentar que eu acho que o modelo público precisa de uma reforma urgente, não só a reforma tributária, mas a reforma fiscal. Nós precisamos ter controles efetivos de acompanhamento da execução fiscal para não incorrermos em problemas que sistematicamente o Brasil incorreu, que não são desse Governo, mas de outros também. Mas não só a reforma fiscal, a reforma trabalhista, acho que nós precisamos aprimorar, des- de que não se suprima direitos adquiridos ao longo de anos e anos de conquistas. E eu, Senador Lindbergh, não vim para cá para subtrair direitos, vim para cá para ampliar os direitos.

O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Claro.

    O SR. PRESIDENTE (Dário Berger. Bloco Maioria/PMDB - SC) - Esse é o nosso grande objetivo. Evidente- mente que dentro de um equilíbrio que possa...

(Soa a campainha.)

O SR. PRESIDENTE (Dário Berger. Bloco Maioria/PMDB - SC) - ... se estabelecer e nós possamos avançar. Nós temos a questão do Pacto Federativo, do endividamento dos Municípios e dos Estados brasileiros.

    Então, resumindo, para não me alongar, eu acho que nós precisamos começar uma agenda nacional, em que o primeiro ponto seria a reforma do setor público, de maneira que ele pudesse ser mais eficiente, que ele pudesse atender melhor às pessoas, que nós pudéssemos ter um sistema de saúde realmente capaz de aten- der às pessoas em tempo real, porque saúde é um bem de expectativa infinita. As pessoas querem viver mais e viver melhor, e nós não temos uma estrutura capaz de fornecer esse atendimento hoje.

    A questão da educação, em que nós discutimos tudo... Quer dizer, a educação passa por uma linguagem simples, no meu entendimento. Eu fui prefeito de duas cidades grandes de Santa Catarina...

(Soa a campainha.)

    O SR. PRESIDENTE (Dário Berger. Bloco Maioria/PMDB - SC) - ... e efetivamente entendo que a maior forma de independência de uma nação e de um ser humano, individualmente falando, é aquela adquirida através da educação...

O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Claro.

    O SR. PRESIDENTE (Dário Berger. Bloco Maioria/PMDB - SC) - ... porque aí ele é um cidadão capaz de buscar as suas próprias oportunidades. E tem que se seguir uma receita simples: valorizar o professor para garantir o futuro dessa nação, o futuro dos alunos. Não é possível que um professor ganhe o que ganha hoje e seja responsável pela formação dos nossos jovens e das nossas crianças.

    Eu vejo o Senador Edison Lobão, que é o Presidente da nossa Comissão, com muita honra, e por quem tenho uma admiração. Eu queria fazer, enfim, esse comentário dizendo que nós temos um grande trabalho pela frente. Eu acho que os caminhos são praticamente infinitos e tudo o que discutimos precisamos reformar, de certa forma. Que essa reforma seja uma fonte de inspiração para que nós possamos bem representar aqui os nossos Estados e o povo brasileiro!

O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ. Fora do microfone.) - Eu só queria dizer, Senador...

O SR. PRESIDENTE (Dário Berger. Bloco Maioria/PMDB - SC) - Só um minutinho, por favor.

(Soa a campainha.)

O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Eu só queria dizer, Senador Dário Berger,

    que V. Exª, quando diz que não veio para cá para retirar direitos, veio para ampliar. Eu quero fazer o testemunho aqui, quando do debate da terceirização - porque aquele projeto que vinha para cá era um projeto que, no fundo, facilitava a redução salarial dos trabalhadores -, de que V. Exª teve um papel muitíssimo importante. Conversamos naquele período. - sabemos que é preciso haver várias reformas -, mas esse é o momento em que o trabalhador já é tão penalizado com o desemprego, com a diminuição da massa salarial. Então, eu só quero testemunhar a participação de V. Exª naquele processo em que acabamos colocando o debate das terceirizações nas comissões permanentes desta Casa.

    Muito obrigado a V. Exª.

    O SR. PRESIDENTE (Dário Berger. Bloco Maioria/PMDB - SC) - Receba a minha admiração como sempre.

O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Obrigado.

    O SR. PRESIDENTE (Dário Berger. Bloco Maioria/PMDB - SC) - V. Exª foi o meu grande líder, dos bons tempos da juventude.

    V. Exª sabe que partiu dali a grande revolução pela democracia no País...

(Soa a campainha.)

    O SR. PRESIDENTE (Dário Berger. Bloco Maioria/PMDB - SC) -...Acho que poderíamos discutir mais sobre isso, sobretudo porque muitos companheiros nossos foram verdadeiros guerreiros. Se hoje nós temos um regime democrático agradecemos também àqueles estudantes que, naquela época, deram um passo importante rumo à democracia brasileira, do qual V. Exª foi e é o grande líder.

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/08/2015 - Página 227