Discurso durante a 152ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Responsabilização do Governo Federal pelo atual quadro de endividamento dos Estados brasileiros.

Autor
Ricardo Ferraço (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Ricardo de Rezende Ferraço
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA:
  • Responsabilização do Governo Federal pelo atual quadro de endividamento dos Estados brasileiros.
Aparteantes
Lúcia Vânia.
Publicação
Publicação no DSF de 04/09/2015 - Página 55
Assunto
Outros > ECONOMIA
Indexação
  • APREENSÃO, CRISE, ECONOMIA NACIONAL, ENFASE, RIO GRANDE DO SUL (RS), CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, MOTIVO, AUSENCIA, CUMPRIMENTO, LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL, AUMENTO, EMPRESTIMO, ESTADOS, RESULTADO, DIVIDA, DEFESA, NECESSIDADE, ESTUDO, COMISSÃO DE ASSUNTOS ECONOMICOS, OBJETIVO, SOLUÇÃO, DIVIDA INTERNA.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Maioria/PMDB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, estimado Senador Dário Berger, Presidente desta sessão em que estamos compartilhando com o conjunto das Srªs e dos Srs. Senadores, aquilo que sabemos bem. Não é novidade para ninguém, em que pese estarmos concentrando, Senador Medeiros, os nossos debates e as nossas atenções em torno dos problemas e dos desafios do Governo Federal, essa não é uma crise restrita ao Governo Federal.

            É evidente que os equívocos na condução da política econômica, ao longo dos últimos anos, considerando que o Governo Federal, o Governo da Presidente Dilma, fez do nosso País experimentos que já tinham sido tentados e experimentados mundo afora e deram errado. E o Governo resolveu fazer o quê? Inventar a roda ou, como se diz no dia a dia, fazer chover de baixo para cima. Deu errado!

            Deu errado, porque se colocou de pé a chamada nova matriz econômica e essa nova matriz econômica e, evidentemente, se desse certo, o Ministro Guido Mantega e sua equipe econômica mereceriam o Prêmio Nobel de Economia, mas deu errado. Deu errado e essa é uma tragédia que foi anunciada, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, uma tragédia que tem, como coroamento, o fato inédito de o Governo Federal encaminhar ao Congresso brasileiro... Ao longo da nossa República, não se tem história, não se tem precedente de um governo, a despeito inclusive da Lei de Responsabilidade Fiscal, que determina o encaminhamento da peça orçamentária, onde receita e despesa não sejam equilibradas.

            E V. Exª, que foi prefeito da belíssima cidade de Florianópolis, sabe, e todos os prefeitos sabem e todos os governadores sabem, que, na peça orçamentária, despesas e receitas precisam ser equilibradas. E o coroamento dessa desorganização, dessa farra, dessa orgia fiscal está, na prática, exposto a partir dessa peça orçamentária, que, na entrada, sinaliza o Governo, para a sociedade brasileira, para os agentes financeiros, que aqueles compromissos que contratou não tem dinheiro para pagar, emitindo um sinal claro, como se estivesse torcendo para que o nosso País pudesse perder o grau de investimento, o selo de bom pagador, levando-nos a uma situação de caos e de colapso.

            Mas essa não é apenas a situação do Governo Federal. Os Estados federados, que todos nós representamos aqui - V. Exª representa o Estado de Santa Catarina; o experiente Senador José Agripino, o Estado do Rio Grande do Norte; o Senador Medeiros, o Estado do Mato Grosso; e assim por diante; e eu represento o Espírito Santo... Esta crise está tomando de assalto os nossos Estados. E esse é o tema sobre o qual quero fazer uma breve manifestação, porque quero levar esse estudo que nós fizemos para a Comissão de Assuntos Econômicos, considerando a Comissão de Assuntos Econômicos importante, na medida em que é ela que autoriza as operações de crédito para os Estados federados.

            A crise fiscal é explicada, por um lado, pela forte retração da atividade econômica, que tem provocado perdas estaduais, seja da arrecadação própria, seja das transferências do Governo Federal, e, por outro lado, pelo aumento do endividamento público recente e pela forte rigidez orçamentária que provocaram a tendência fiscal deficitária que nós estamos observando nos Estados federados. A crise por que passa o Rio Grande do Sul tem características muito próprias, é estruturante e antiga, mas não é uma crise particular do Rio Grande do Sul.

            Entre 2012 e 2014, Sr. Presidente, a receita corrente líquida dos Estados cresceu apenas 0,5% em termos reais, ou seja, descontada a inflação. No mesmo período, a dívida consolidada líquida subiu 5%, numa taxa de crescimento dez vezes maior. A tendência deficitária se reflete nos dados do resultado primário, que nada mais representa que a poupança utilizada para honrar os compromissos dos Estados.

            No acumulado em 12 meses, o resultado dos Governos estaduais atingiu um déficit superior a R$7 bilhões em junho de 2015, o equivalente a 0,12% do Produto Interno Bruto. No mesmo período de 2011, os Estados apresentavam uma situação completamente inversa, ou seja, de um superávit de 0,6% do PIB em 2011, nós caminhamos para um déficit de 0,12% em 2015. Essa deterioração intensa foi em parte explicada pelas autorizações de endividamento dadas pelo Governo Federal. Em seu afã de expandir a taxa de investimento da economia por meio de incentivos públicos, o Governo Federal parece ter acreditado que o maior relaxamento das restrições fiscais a Estados e Municípios ampliaria as possibilidades de investimentos desses entes em infraestrutura.

            Um dos principais sinais de que o Governo Federal deliberadamente incentivou o maior endividamento de Estados e Municípios está na política federal de concessão de garantias a empréstimos aos Estados subnacionais. O Ministério da Fazenda tem a prerrogativa de decidir se concede ou não tal garantia das operações de crédito, Senador Agripino. No plano técnico, foi definido um procedimento de avaliação das condições fiscais, com a capacidade de pagamento do Estado ou Município, sendo classificado de A a D.

            As notas A e B indicam boa capacidade de pagamento desses Estados; significa dizer que esses Estados não estão alavancados e, portanto, estão em plenas condições de fazer essa operação de crédito. Já as classificações C e D seriam categorias insuficientes para receber o aval e, portanto, a garantia do Governo Federal. É verdade que o Governo Federal dá o seu aval, deu o seu aval, tornou o que era exceção regra, mas também é verdade que a Comissão de Assuntos Econômicos desta Casa, contra o meu voto, em muitas manifestações, atendeu a essa desorganização, a essa ausência de critérios, que elevou, como eu disse aqui, o endividamento dos Estados brasileiros.

            Na prática, esse tipo de avaliação foi deixado de lado, como foram deixados de lado os princípios e os valores relacionados à boa governança, à responsabilidade fiscal e assim por diante, porque, para o Governo da Presidenta Dilma, dinheiro nasce em árvore. Dinheiro não é algo que você tem que produzir com trabalho, com disciplina, com economia, com poupança e assim por diante, não. Meteram, na verdade, o pau na máquina, como se a máquina fosse produzir solução para todos os nossos problemas.

            Uma tabela que nós tivemos o cuidado de fazer - eu estou me antecipando a esse fato, mas vou levá-lo para a Comissão de Assuntos Econômicos -, considerando as operações de crédito que foram aprovadas pelo Senado, porque operação de crédito é prerrogativa específica do Senado da República e da Comissão de Assuntos Econômicos. E o Senado vai ter que refletir se vai manter...

(Soa a campainha.)

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Maioria/PMDB - ES) - ... essa forma banalizada de não considerar critérios na aprovação das operações de crédito.

            Mas, na tabela que nós fizemos de 2011 até 2014, o Ministério da Fazenda autorizou uma concessão de garantias para 51 operações de crédito, cujos pleiteantes tinham classificação C e D, totalizando R$30 bilhões, conforme nós estamos demonstrando aqui nesta tabela. Ou seja, Senadora Lúcia Vânia que é atuante Parlamentar da Comissão de Assuntos Econômicos, 51 operações de crédito foram aprovadas num total de R$30 bilhões, mesmo considerando que esses Estados não estão classificados como A e B, e, sim, C e D. Esta banalização gerou, portanto, esse endividamento dos Estados subnacionais.

            É interessante, inclusive, observar o que consagra o Acórdão do Tribunal de Contas da União nº 3.413 a respeito dessas operações, que deixa clara a opção discricionária de política do Ministério da Fazenda em favor da expansão do endividamento dos Estados e Municípios. Diz o acórdão: “A verificação de relevância do projeto para a concessão de garantia da União, em situação de excepcionalidade, é prerrogativa do Ministro da Fazenda em cada caso específico.” Não há instrumento formal que liste tais projetos nessas condições, e o Ministro pode deferir ou indeferir o pleito mediante despacho específico.

Chamo a atenção ao fato de ter a União concedido garantia a todas as operações de crédito externo que obtiveram classificação C ou D na avaliação de capacidade de pagamentos, ou seja, o que era para ser uma excepcionalidade transformou-se em regra geral. E isso ampliou e expandiu o nível de endividamento dos Estados brasileiros. Embora o TCU tenha determinado, ainda em 2012, que o Ministério da Fazenda tomasse providências no sentido de interromper a concessão de excepcionalidades a Estados e Municípios com baixa nota de crédito, a prática continuou, Senador Agripino, sem qualquer alteração e sem qualquer critério ao longo do primeiro Governo Dilma, e a tabela que nós estamos aqui apresentando dá detalhes de cada uma dessas operações.

            É fato lembrar que um dos debates mais vivos que nós fizemos na Comissão de Assuntos Econômicos foi exatamente em 2014, quando, com autorização do Governo Federal, foi dado aval para que o Estado do Rio Grande do Sul pudesse fazer operação de crédito. E aí, houve autorização do Ministério da Fazenda; o Ministério deu autorização para que a operação fosse adiante. E, agora, o que estamos vendo é o mesmo Ministério da Fazenda bloquear as contas do Rio Grande do Sul, porque, infelizmente, por problemas conjunturais, estruturais, o Rio Grande do Sul, do nosso Governador Sartori - até porque o Sartori assumiu recentemente, e ele, na verdade, herdou uma dívida e um déficit estrutural muito antigo, está lá, enfim, procurando encontrar soluções...

            O montante de receitas e de operações de crédito dos Governos estaduais, vejam Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, passou de 0,2%, em 2011, para 0,6% do PIB, em 2014, ou seja, multiplicou por três, triplicou no período de três anos. E isso, como se nós vivêssemos uma bonança plena, como se o Brasil não estivesse cavando o seu próprio buraco, em razão dos equívocos de condução de política econômica por parte do Governo da Presidente Dilma. Trata-se, portanto, de um forte aumento em um curto espaço de tempo. Com isso, a dívida líquida dos Estados passou de 9,2% do PIB, em 2011, para 10,2% do PIB já em junho de 2015, aumentando o comprometimento dos orçamentos estaduais com encargos financeiros dessas operações de crédito.

            O estudo, Sr. Presidente, ele é muito mais longo, ele é muito mais complexo.

(Soa a campainha.)

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Maioria/PMDB - ES) - E eu quero levar, Senadora Lúcia Vânia, Senador Medeiros, Senador José Agripino, os resultados desses estudos, para que nós possamos criar uma consciência na Comissão de Assuntos Econômicos, porque ela não pode ser um cartório de modo a homologar as decisões irresponsáveis do Governo Federal. É por conta disso que nós estamos aqui apresentando uma das faces. É verdade que muitos Estados não fizeram o dever de casa, mas é verdade também que, no passado recente, o Governo Federal meio que jogou gasolina nesse fogo, para que os Estados pudessem fazer as operações de crédito e não pudessem olhar para as suas contas com austeridade, ou seja, em lugar de conviver com pressão, vamos autorizar as operações de crédito, a todo e qualquer custo.

            O resultado está aí. E esse assunto deve ser aprofundado pela Comissão de Assuntos Econômicos. Essa é a minha expectativa,...

(Soa a campainha.)

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Maioria/PMDB - ES) - ... até porque não é possível afirmar que o Senado não tem responsabilidade com isso, porque tem, já que aprovou a matéria na Comissão de Assuntos Econômicos, e, depois, o Plenário consolidou. É como se nós estivéssemos, como eu disse nesta semana em outro debate, Sr. Presidente, tentando consertar o cadeado depois que a porta foi arrombada.

            A Srª Lúcia Vânia (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Senador Ferraço, permita-me.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Maioria/PMDB - ES) - Esse é o resultado dessa política fiscal inconsequente.

            Ouço, com prazer, a minha ilustríssima Senadora Lúcia Vânia.

            A Srª Lúcia Vânia (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - Quero fazer apenas uma observação rápida, porque sei que o tempo está esgotado. Eu quero aqui testemunhar a fala de V. Exª na Comissão de Assuntos Econômicos, quando ainda não se discutia a questão do endividamento do Estado. V. Exª foi o Senador que chamou a atenção para esses empréstimos. Nós não tínhamos o comando do valor total desses empréstimos, e V. Exª colocava, naquela ocasião, que, ao invés de mexer ou de trabalhar um novo indexador da dívida,...

(Soa a campainha.)

            A Srª Lúcia Vânia (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - GO) - ... foram colocados à disposição dos Estados esses empréstimos, ocasionando esse endividamento que estamos vendo hoje. Parabenizo V. Exª por esse estudo e tenho certeza de que ele será de grande utilidade na Comissão de Assuntos Econômicos.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Maioria/PMDB - ES) - Agradeço a palavra de V. Exª, que, para mim, tem um valor extraordinário pela forma protagonista com que atua na Comissão de Assuntos Econômicos. V. Exª foi testemunha desse estresse que nós tivemos que construir na Comissão de Assuntos Econômicos, entendendo a responsabilidade da Comissão.

            Já encerrando, Sr. Presidente, o mais grave é que a folga financeira ocasional, circunstancial, como que uma miragem, fruto do endividamento, foi usada por vários entes federados para a ampliação de despesas obrigatórias, principalmente despesas com pessoal e com custeio. Hoje, o resultado é que cinco Estados já estouraram...

(Soa a campainha.)

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Maioria/PMDB - ES) - ... o limite das despesas com pessoal em 49% da receita líquida corrente, estabelecido pela Lei de Responsabilidade Fiscal, e outros dezessete já estão acima do limite prudencial, ou seja, 44,1% da receita corrente líquida.

            Eu retomo esse assunto, se Deus quiser, na próxima terça-feira, na Comissão de Assuntos Econômicos.

            Agradeço a gentileza e a condescendência de V. Exª.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/09/2015 - Página 55