Discurso durante a 152ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Defesa de mudança no sistema tributário; e outros assuntos.

Autor
Lindbergh Farias (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Luiz Lindbergh Farias Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA:
  • Defesa de mudança no sistema tributário; e outros assuntos.
Publicação
Publicação no DSF de 04/09/2015 - Página 60
Assunto
Outros > ECONOMIA
Indexação
  • APREENSÃO, DEFICIT, ORÇAMENTO, RESULTADO, AUMENTO, JUROS, IMPLEMENTAÇÃO, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), CRITICA, CORTE, GASTOS PUBLICOS, POLITICA SOCIAL, PROGRAMA DE GOVERNO, AREA, EDUCAÇÃO, SAUDE, PEDIDO, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, ASSUNTO, CESSAÇÃO, ISENÇÃO, TRIBUTOS, DISTRIBUIÇÃO, LUCRO, DIVIDENDOS.

            O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, vou fazer aqui uma breve fala e dizer que eu iniciei o trabalho, nesta semana, no Parlamento, fazendo um discurso sobre a questão do déficit, do déficit apresentado no Orçamento do próximo ano. Eu fiz questão de fazer uma constatação de que o problema desse déficit foi a política monetária, foram os juros altos implementados pelo Banco Central.

            Mostrei com números que o Governo cortou 20 bilhões de investimentos, aprovou as medidas provisórias aqui sobre seguro-desemprego, abono salarial, que tinham impacto fiscal de 14 bi...

(Interrupção do som.)

            O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Pronto. Sr. Presidente, desculpe ter que retomar. Hoje nós fazemos discursos e os colocamos nas redes sociais. E eu dizia, no começo, que iniciei a semana falando sobre a questão do déficit, que nós olhamos o Orçamento do próximo ano e percebemos que o grande problema foram os juros, a política monetária do Banco Central.

            O Governo fez um grande esforço fiscal, cortou 20 bilhões em investimentos, de 80 para 60. Aprovou medidas provisórias aqui que tratam de seguro-desemprego, abono, com impacto fiscal de 14 bi. No entanto, a situação fiscal piorou. Nós tínhamos um déficit nominal até dezembro de 6,7%, que aumentou para 8,8. Quando você vai olhar, ponto por ponto, a grande questão é a política monetária.

            Nós pagamos 451 bilhões nos últimos 12 meses, algo em torno de 7,92% do PIB. No mesmo período do ano passado, isso era algo em torno de 5,6% do PIB. Aí está o buraco! Só para o senhor ver os números deste ano, no ano passado, até julho, nós tínhamos pagado 148 bi de juros; neste ano, até julho, nós pagamos 288 bi de juros e também com os swaps cambiais, essa política esquizofrênica feita pelo Banco Central.

            Só que eu não quero ficar na constatação do problema do déficit: eu quero avançar, porque agora começa um novo debate, e esse Parlamento vai ter que participar em conjunto com o Governo. O que fazer para resolver o problema desse déficit?

            E, aqui, há dois caminhos. Existem uns que acham que o caminho é adentrar em cortes em programas sociais, na educação, na saúde, no Pronatec, no Ciência sem Fronteiras. Então, uns acham que esse é o caminho. Eu estou convencido de que, se formos por esse caminho, nós vamos aprofundar a recessão econômica no nosso País. Os números são terríveis: existe gente falando em recessão de 2,5% a 3%; existe gente falando em recessão em cima da recessão no próximo ano.

            A grande questão, o centro da estratégia, para mim, é a retomada do crescimento econômico. Mas na discussão sobre quem vai pagar a conta sobre esse déficit, eu estou convencido: não podem ser os trabalhadores, os mais pobres, a classe média nem os programas sociais. E aqui é que eu acho que nós temos que formular alternativas em relação ao sistema tributário, porque o nosso sistema tributário é muito injusto, Sr. Presidente. Os 10% mais pobres da população brasileira gastam 32% dos seus rendimentos em tributos; os 10% mais ricos gastam 22% dos seus rendimentos em tributos; no entanto, os muito ricos, que são 0,3%, sabe quanto pagam de tributos? Apenas 6,4%. Então, o problema não está nem entre os 10% mais ricos, está na pequena parcela dos muito ricos do País.

            Por isso, eu estou apresentando, no dia de hoje, um projeto de lei - e vou apresentar também uma emenda ao Orçamento - sobre o fim da isenção tributária à distribuição de lucros e dividendos. São muitos os projetos nesta Casa sobre tributação mais progressiva: existe imposto sobre grandes fortunas; imposto sobre grandes heranças; juros sobre capital próprio, que é outra excrescência, uma jabuticaba brasileira, só existe no Brasil; existe para aumentar ITR; e existem vários pontos. Só que eu estou convencido de que acabar com a isenção tributária de lucros e dividendos é o que é mais simples de ser executado. Na época do governo Fernando Henrique Cardoso, o Brasil pagava 15% - todo mundo pagava 15% - na hora da distribuição de lucros e dividendos. Isso acabou em 1996, com uma medida provisória aprovada no final de 1995.

            Então, isso é o mais simples e o que teria maior impacto fiscal: 50 bi, pelos cálculos dos economistas Sérgio Gobetti e Rodrigo Orair, economistas do Ipea que estão trabalhando e articulando com lideranças partidárias, com lideranças dos movimentos sociais, para encamparmos essa proposta como alternativa real ao buraco que temos no Orçamento.

            Só quero, para encerrar, Sr. Presidente, ler a justificação do projeto que estou entrando no dia de hoje aqui.

O sistema tributário brasileiro é regressivo e, por essa razão, injusto. Os impostos sobre o consumo e os serviços (chamados de indiretos) têm peso muito alto. Representam mais de 50% da arrecadação, enquanto os impostos sobre a renda e a propriedade alcançam apenas 22% da carga tributária.

Um sistema tributário progressivo e justo deve arrecadar de acordo com a capacidade contributiva dos cidadãos, das instituições e das empresas. E isso é identificado nas suas declarações de rendas e propriedades. Então, por exemplo, taxar o consumo é muito injusto porque ricos e pobres diante de um caixa de supermercado não são diferenciados - e a injustiça ocorre contra os pobres porque têm que pagar a mesma alíquota que os ricos pagam.

O resultado dessa estrutura de tributação é que os mais pobres pagam mais impostos que os mais ricos. [Dado que citei anteriormente:] Os 10% mais pobres do País gastam 32,8% de seus rendimentos com impostos. Para os 10% mais ricos, a carga é de apenas 22,7% [...]. E em recente estudo dos economistas Sérgio Gobetti e Rodrigo Orair são revelados outros números da injustiça tributária brasileira e é indicada uma de suas causas, a isenção de tributos sobre o recebimentos de lucros e dividendos, vejamos [...].

            É importante dizer que esse estudo feito pelos economistas pelos economistas Sérgio Gobetti e Rodrigo Orair, que é um estudo que eu reputo como histórico, surge depois que a Receita Federal liberou dados do imposto de renda das pessoas aqui do País, depois, inclusive, da visita do celebrado economista Piketty ao Brasil, que reclamou dos dados oferecidos pela Receita Federal. A Receita disponibilizou esses dados, e os economistas Sérgio Gobetti e Rodrigo Orair fizeram esse estudo, do qual passo a ler um trecho. Dizem Sérgio Gobetti e Rodrigo Orair:

O topo da pirâmide social paga menos imposto, proporcionalmente à sua renda, do que os estratos intermediários.

Em média, o declarante do estrato extremamente rico paga 2,6% de imposto sobre sua renda total (ou 6,4% com estimativa de retenção exclusiva na fonte), enquanto o estrato intermediário com rendimentos anuais entre R$162.720 e R$325.440, ou seja, entre 20 e 40 salários mínimos, paga 10,2%. Ou seja, nossa classe média alta - principalmente a assalariada - paga mais imposto do que os muito ricos. Os mais pobres são os que pagam mais, mas, entre a classe média alta e os muito ricos tem uma grande diferença.

Essa distorção se deve principalmente a uma jabuticaba da legislação tributária brasileira: a isenção de lucros e dividendos pagos a sócios e acionistas de empresas. Dos 71.440 super-ricos, que mencionamos, 51.419 receberam dividendos em 2013 e declararam uma renda média de R$4,5 milhões, pagando um imposto de apenas 1,8% sobre toda sua renda. Isso porque a renda tributável desse grupo foi de R$387 mil em média em 2013, a renda tributável exclusivamente na fonte R$942 mil e a renda totalmente isenta R$3,1 milhões.

A justificativa para esta isenção é evitar que o lucro, já tributado ao nível da empresa, seja novamente taxado quando se converte em renda pessoal, com a distribuição de dividendos. 

            Estou lendo o trecho do artigo de Sérgio Gobetti e Rodrigo Orair.

Antes que o leitor formule sua opinião derradeira sobre essa questão, uma informação adicional: entre os 34 países da OCDE, que reúne economias desenvolvidas e algumas em desenvolvimento que aceitam os princípios da democracia representativa e da economia de livre mercado, apenas três isentavam os dividendos até 2010. México voltou atrás, retomou a taxação em 2014; República Eslováquia em 2011, por meio de uma contribuição social. Restou somente a Estônia, que, assim como o Brasil, isenta totalmente os dividendos.

Em média, a tributação total do lucro chega a 43% nos países da OCDE (sendo 64% na França, 43% na Alemanha e 57% nos Estados Unidos. No Brasil, com as isenções de dividendos e outras “jabuticabas” tributárias, como juros sobre capital próprio, que reduzem a base tributável das empresas, essa taxa cai abaixo de 30%, embora formalmente a soma das alíquotas do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica e da contribuição social do lucro líquido seja de 34%. Basta analisar alguns balanços de grandes empresas brasileiras para verificar essa realidade.

            Aí eu paro de ler o texto dos economistas do Ipea e finalizo a minha justificação: reformar o sistema tributário para, por meio de tributação, reduzir a desigualdade social e econômica, é um imperativo do desenvolvimento, mas também exigência da estabilidade democrática e harmonia social.

            Hoje o nosso sistema tributário regressivo limita os efeitos das políticas de redução de desigualdades promovidas a partir dos gastos sociais do Estado.

            Nesse sentido, é preciso reverter as reformas de caráter regressivo adotadas sob o governo Fernando Henrique Cardoso e mantidas até hoje. Uma delas, a isenção dos lucros e dividendos recebidos por pessoas físicas e jurídicas no País e no exterior, detentores de cotas ou ações de empresas.

            Antes dessa mudança introduzida pelo art. 10 da Lei nº 9.249, de 1995, a alíquota era de 15%. Hoje é 0%. Essa isenção gera distorções. Enquanto trabalhadores estão submetidos à tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física, empresários são isentos, quando recebem rendimentos, a título de lucros e dividendos. Como se vê, trata-se de um tratamento desigual, pois os trabalhadores que recebem salário podem pagar alíquotas que chegam a até 27,5%.

            Essa isenção alcança os lucros e dividendos recebidos por sócio, acionista ou titular de empresa, residente ou domiciliado, tanto no Brasil como no exterior. Essa desoneração isenta, portanto, a remessa de lucros e dividendos para o exterior, o que estimula as empresas transnacionais a transferir recursos para suas matrizes e desestimulá-las a investir aqui no Brasil, gerando emprego e renda.

            Com efeito, foram remetidos ao exterior, em 2014, US$26,5 bilhões na forma de lucros e dividendos isentos de impostos. Em 2013, foram enviados US$26 bilhões.

            O efeito desse projeto é fazer incidir o Imposto de Renda Retido na Fonte calculado à alíquota de 15% sobre a distribuição de lucros e dividendos a pessoas físicas e jurídicas, residentes ou domiciliadas no exterior - isentando os empresários cujas empresas estão inscritas no Simples. Este é um ponto importante: quem está no Simples fica fora desse tributo de que eu estou falando aqui. O potencial de arrecadação desse tributo é de R$50 bilhões por ano, ou cerca de 0,8% do PIB.

            O Imposto sobre a Renda submete-se ao princípio da anterioridade plena - anualidade -, não se sujeitando à noventena. Por essa razão, a nova tributação só será exigida sobre a distribuição a pessoas físicas e jurídicas residentes ou domiciliadas no exterior de lucros e dividendos calculados com base nos resultados apurados a partir do mês de janeiro de 2016.

            Sr. Presidente, muito obrigado pelo tempo concedido por V. Exª. Eu sei que vai haver uma reforma aqui no plenário do Senado. Eu só queria fazer a última consideração.

            Eu acho que ontem nós tivemos uma vitória histórica neste Senado. Este Senado Federal conseguiu aprovar o fim do financiamento empresarial de campanha.

            O SR. PRESIDENTE (Dário Berger. Bloco Maioria/PMDB - SC) - Com a minha ajuda.

            O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Com a sua ajuda, com o seu voto.

            V. Exª sabe que 64% da população brasileira, em recente pesquisa do DataFolha, queriam o fim do financiamento empresarial de campanha. Agora, eu acho que o mais importante que aconteceu - eu sei que esse projeto vai para a Câmara dos Deputados - é que o Ministro Gilmar Mendes, quando veio aqui na última vez, disse que estava segurando a decisão no Supremo, que já havia uma maioria no Supremo, seis votos, e disse que era inconstitucional o financiamento empresarial. A última vez em que o Ministro Gilmar Mendes veio aqui, ele disse o seguinte: "Olha, eu estou esperando, porque eu acho que quem tem que decidir é o Parlamento."

            E a Câmara aprovou um projeto que constitucionaliza o financiamento empresarial. Só que eu acho que, com a vitória de ontem, fica claro que a chance é zero de esse projeto de constitucionalização de financiamento empresarial passar aqui no Senado, porque ontem era maioria simples, nós tivemos 36 votos contra o financiamento empresarial e 31 a favor. Para passar a constitucionalização de financiamento empresarial, seriam necessários 49 votos aqui. Então, eu acho que o maior efeito da votação de ontem é mostrar ao Supremo Tribunal Federal que a chance de a constitucionalização empresarial passar no Senado Federal é zero.

            Acho que, nesse sentido, podemos ter uma mudança na posição do Ministro Gilmar e acabar com aquela votação e encerrar de vez esse capítulo na história das eleições brasileiras.

            Agora, o Senado Federal, de fato, está de parabéns com o resultado da reforma política no dia de ontem.

            Muito obrigado a V. Exª.

            O SR. PRESIDENTE (Dário Berger. Bloco Maioria/PMDB - SC) - Senador Lindbergh, quero também, só para concluir os trabalhos, me associar a V. Exª para mencionar aqui que, ontem, participamos de uma sessão histórica no Senado Federal: a tão esperada reforma política, tida como a mãe de todas as reformas, que não foi aquela dos nossos sonhos, mas na qual acho que avançamos bastante.

            Dentre as alterações, a eliminação definitivamente, a proibição do financiamento privado de campanha, através do CNPJ, através das empresas. Parece-me que isso, hoje, se institucionalizou em um grande mal para a sociedade. E, aparentemente, a população, como se demonstra na sua ampla maioria, é contrária a essa matéria. Temos que analisar, sobretudo essa ressonância da sociedade.

            Tivemos aqui ontem uma grande vitória, que pode definir os rumos da política para as próximas gerações. Com isso, Senador Lindbergh, vai-se diminuir muito o custo das campanhas eleitorais. Teremos agora de nos adaptar a uma nova realidade, na qual o candidato que tiver mais sintonia com a população terá condições de, inclusive, arrecadar mais recursos, como, diga-se de passagem, já acontece nos Estados Unidos, e deveremos implantar esse novo sistema aqui.

            Além disso, quero parabenizar V. Exª pelo seu pronunciamento, que não foi tão curto assim, como V. Exª havia mencionado. Mas, dentre as nossas atribuições que temos como Parlamentar, acho que uma não foge à regra, que é a luta incansável pela redução das diferenças e das desigualdades sociais.

            O projeto de V. Exª vem a esta Casa para ser discutido, e eu o parabenizo por essa iniciativa, porque não podemos ficar inertes, temos que apresentar sugestões, e é o que V. Exª faz nesta sessão histórica hoje também no Senado Federal.

            O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Eu que agradeço, Senador Dário. V. Exª sabe da minha admiração, mas muito pelas suas posições. V. Exª começou também no movimento estudantil e aqui tem sempre tomado posições muito progressistas em todos os momentos. Foi assim na discussão da terceirização. Foi assim naquele embate de ontem, que foi uma votação apertada.

            Então, eu quero parabenizar muito V. Exª por sua atuação aqui e também pelo voto de ontem, pela vitória que tivemos.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/09/2015 - Página 60