Discurso durante a 161ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Apelo por celeridade na responsabilização dos envolvidos na tragédia ocorrida na boate Kiss, em Santa Maria-RS .

Autor
Lasier Martins (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RS)
Nome completo: Lasier Costa Martins
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PODER JUDICIARIO:
  • Apelo por celeridade na responsabilização dos envolvidos na tragédia ocorrida na boate Kiss, em Santa Maria-RS .
Aparteantes
Paulo Paim.
Publicação
Publicação no DSF de 17/09/2015 - Página 291
Assunto
Outros > PODER JUDICIARIO
Indexação
  • CRITICA, JUDICIARIO, MOTIVO, DEMORA, AUSENCIA, INFORMAÇÕES, PROCESSO JUDICIAL, INVESTIGAÇÃO, INDICIAMENTO, RESPONSAVEL, INCENDIO, CASA NOTURNA, LOCAL, MUNICIPIO, SANTA MARIA (RS), RIO GRANDE DO SUL (RS).

            O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Jorge Viana, Senadores, telespectadores, ouvintes, em meio à diversidade de crises que atordoam o Brasil, seja no terreno econômico, político, de ordem ética, de equívocos de gestão pública, nós também vivemos impasses na consecução da justiça pelo órgão competente, o Poder Judiciário.

            Eu quero me reportar, Sr. Presidente, neste momento, àquele fatídico 27 de janeiro de 2013, conhecido, nacionalmente e até internacionalmente, como a tragédia da boate Kiss que se constituía, naquela data, em um ponto de encontro e diversão de jovens na cidade universitária de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, e que veio a se tornar o local da tragédia que matou 242 pessoas, na maioria jovens - uma das maiores tragédias da história do Brasil.

            Como se recorda, o fogo se iniciou quando um dos integrantes da banda que se apresentava acendeu, levianamente, um sinalizador, e faíscas atingiram o teto, dando início às chamas. As espumas que recobriam todo o ambiente se incineraram com facilidade, produzindo uma fumaça escura, mortal, que dificultou a visão de quem lá estava.

            Parte considerável daquelas vítimas - 242 vítimas fatais - morreu em decorrência da asfixia causada pela fumaça que tomou conta do ambiente. Outros foram pisoteados. Muitos, na busca de uma saída de emergência que não existia, acabaram por se refugiar nos banheiros, o que se revelou uma armadilha fatal.

            Além disso, aquela boate estava superlotada, com mais de 1.300 pessoas, onde caberiam, oficialmente, apenas 691.

            Para complicar, não havia portas além da entrada principal, e os seguranças da boate demoraram a perceber o que acontecia e, por consequência, a liberar a saída das pessoas.

            Sei bem de tudo aquilo de ciência própria, porque cobri aquele acontecimento como jornalista, e tenho sido constantemente procurado por familiares, inconformados com as demoras da Justiça.

            A história, como se sabe, não se encerrou ali. Na verdade, além dos falecidos, houve mais de 600 feridos, alguns com sequelas para o resto da vida. E houve também o pesar de pais que perderam os filhos, irmãos que perderam irmãos, amigos que perderam amigos. E o mais exasperante é que a boate Kiss se tornou também emblema de indignação; boate Kiss se tornou símbolo de um País em que as coisas não funcionam direito, em que o Estado é negligente com os seus cidadãos e é incapaz de averiguar com presteza se um estabelecimento comercial está apto ou não a funcionar; boate Kiss se transformou em sinônimo de risco, de perigo, razão da precariedade, da imprevidência, da negligência; boate Kiss se tornou digno também da vergonha, porque, passados quase três anos, pais, irmãos, amigos, sobreviventes temem que as punições venham a ser brandas demais, ou, pior ainda, nada acontecerá, ou que tampouco alguém será punido por 242 mortes.

            Sr. Presidente, justiça atrasada não é justiça.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Senador Lasier Martins, V. Exª me permite um aparte pela importância do tema que traz à tribuna? Mas pode ficar bem tranquilo, no momento em que entender mais adequado, no meio do seu pronunciamento.

            O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Pode ser agora, Senador Paim. Com muito prazer, quero ouvi-lo.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Senador Lasier, naquele momento em que chocou o Brasil e o mundo, eu me lembro de que os três Senadores do Rio Grande lá estiveram. E estivemos também com V. Exª, que acompanhou, como profissional, passo a passo, aquela situação - eu ia dizer desastre, mas os familiares não gostam da palavra desastre. Eles falam que foi um genocídio, pela forma que aconteceu, pelo não preparo da casa de espetáculo, permitindo aquele fato. Mas eu quero cumprimentar V. Exª pela fala; segundo, V. Exª, a Senadora Ana Amélia e eu trabalhamos muito para que o projeto de lei, fruto, infelizmente, dessa situação, fosse aprovado. Foi aprovado na Câmara dos Deputados, veio ao Senado, aqui trabalhamos os três, e ele está pronto para ser votado, agora, no Plenário. Eu cumprimento V. Exª, porque, graças a esse trabalho unificado dos três Senadores do Rio Grande, e, naturalmente, da Bancada Federal e do Senado, teremos uma lei nacional que determinará toda a segurança necessária para uma casa de espetáculos. Eu quero cumprimentar V. Exª - eu dizia aqui para um assessor seu que, a cada dia, V. Exª está crescendo mais aqui, na Casa.

            O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Bondade sua.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - É uma alegria, para mim, claro, estar trabalhando com esta safra nova de Senadores, que está trazendo uma grande contribuição para a Casa.

            O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - É o aprendizado com os mais velhos e mais experientes, Senador Paim.

            Também estou falando neste tema tão triste, porque, hoje, muitos familiares estão em Brasília, fazendo contatos. Inclusive estarão, logo mais, às 17h30, na reunião da Bancada gaúcha, aqui, em um dos plenários da Câmara dos Deputados.

            Mas eu estava dizendo que justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta. São palavras bem sabidas de Rui Barbosa, o patrono desta Casa, em sua célebre Oração aos Moços.

            E é o que também diz o Sérgio Moro, presentemente, responsável pela Operação Lava Jato: "A Justiça quando tarda muito não é uma Justiça completa". E é essa a sensação.

            Aqui me junto aos familiares e aos amigos das vítimas de Santa Maria. A demora na prestação da Justiça nos deixa não apenas tristes, mas com a amarga sensação de que aqueles jovens foram imolados em sofrimento indizível, enquanto os culpados, seja por negligência, descaso, má-fé, incúria, ou por qualquer outra razão, escapam de uma justiça que é fraca, que presta pouca atenção aos que necessitam de socorro.

            Mais ainda. A Justiça precisa atuar com agilidade, explicar com clareza, principalmente para o público leigo, o rumo dos processos judiciais. Tem havido muito segredo, muito sigilo, muita falta de informação com o processo de Santa Maria - e aí muito da angústia dos pais poderia ser mitigado se alguns dos encaminhamentos fossem mais bem explicados, se fossem comunicados com mais cuidado e clareza, inclusive em relação às discrepâncias entre o inquérito policial e os indiciamentos judiciais. Por tudo isso, existe muita revolta, muita decepção, não só em Santa Maria, mas em todo o Estado do Rio Grande do Sul e - por que não? - no Brasil. Há temor de que aconteça uma relação da boate Kiss com o que aconteceu há tantos anos com outros casos, no País. Um exemplo tem sido o naufrágio do barco Bateau Mouche, em 31 de dezembro de 1988.

(Soa a campainha.)

            O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - O caso se tornou emblemático das dificuldades de o sistema judiciário brasileiro oferecer respostas satisfatórias à sociedade. Em 2012, Frederico Vasconcelos, colunista da Folha de S.Paulo, especializado em temas jurídicos, publicava matéria em que qualificava o Bateau Mouche como o naufrágio da Justiça.

            Não queremos dizer a mesma coisa com relação à boate Kiss, nem com relação à justiça de Santa Maria. Esperamos que ela seja mais ágil, mais convincente, mais atenta às explicações que a população quer.

            Teremos outro debacle do nosso Judiciário? Os únicos julgados até o momento o foram por questões marginais ao processo principal. No caso, um bombeiro que teria fraudado a investigação...

(Interrupção do som.)

            O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) -...e outros dois por terem prestado informação falsa nos alvarás que liberaram o funcionamento daquela verdadeira arapuca que era a boate. E isso, em primeira instância, havendo a possibilidade natural de recurso.

            Existem muitas questões, Srs. Senadores, que são difíceis de serem compreendidas e exasperam os familiares das vítimas. É o caso de saber o quinhão de responsabilidade das autoridades públicas que permitiram o funcionamento da boate Kiss.

            É o caso, também, de saber em que medida os responsáveis pelo estabelecimento serão responsabilizados penal e civilmente. São questões que dizem respeito não a um juiz ou a um promotor em particular, mas ao funcionamento do sistema judicial brasileiro.

            Peço, desta tribuna do Senado, que o Judiciário gaúcho dê a especial atenção ao tema, como esse caso bem merece.

            Louvo a iniciativa do Tribunal de Justiça do Estado por ter agora designado um juiz especificamente para o caso. Foi, ao menos, um passo importante, afinal a sociedade gaúcha merece as respostas para esse caso, um dos mais graves das negligências de gestões públicas no Brasil.

            Sr. Presidente, concluindo, cada decisão judicial também tem os olhos voltados para o futuro. É pedagógica no sentido de mostrar que os malfeitos não são tolerados. Assim, todos os brasileiros olham com atenção para o caso. Esperam que a Justiça seja feita. Esperam que os responsáveis sejam punidos. Não se quer o arbítrio ou o abuso. Quer-se apenas que possamos acreditar que, no Brasil, os crimes são investigados e os criminosos, punidos.

(Soa a campainha.)

            O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Era o que tinha a dizer.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.

            O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Cumprimento V. Exª.

            Devo dizer que eu mesmo fui autor de uma matéria que, lamentavelmente, não recebeu a acolhida que eu entendia e que resolvia o problema dessas comandas em estabelecimentos fechados, o que foi um grave problema.

            Quando se faz o confinamento de pessoas, com uma porta única, é para ter o controle do dinheiro do pagamento dos clientes. Isso foi fatal...

            O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Foi.

            O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Apoio Governo/PT - AC) - ... nessa tragédia, nesse lamentável episódio da boate lá no Rio Grande do Sul, em Santa Maria.

            Não se podem confinar pessoas apenas pelo interesse de receber.

            Eu apresentei uma proposta de que não poderia haver mais confinamento e de que deveriam existir alternativas para os usuários, para os clientes. Eles fecharam todas as portas e deixaram uma única porta para poder ter o controle do pagamento das tais comandas.

            Lamentavelmente, isso ainda segue ocorrendo no País, o que é gravíssimo. O Corpo de Bombeiros faz o projeto de segurança, mas, depois, para atender a um interesse meramente de arrecadação, fecham-se, eliminam-se as saídas, o que cria um ambiente de alto risco para tragédias como essa, que não gostamos de citar, mas que V. Exª trouxe muito bem à tribuna, Senador Lasier.

            O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - As responsabilidades são muitas, no caso da Boate Kiss. E o que nós esperamos é que todos os responsáveis sejam alcançados.

            Obrigado.

 

            


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/09/2015 - Página 291