Discurso durante a 162ª Sessão Especial, no Senado Federal

Sessão especial destinada a homenagear Antonio Mariz, por ocasião dos 20 anos de seu falecimento, nos termos do Requerimento nº 969/2015, de autoria do Senador José Maranhão e outros Senadores.

Autor
José Maranhão (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: José Targino Maranhão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM:
  • Sessão especial destinada a homenagear Antonio Mariz, por ocasião dos 20 anos de seu falecimento, nos termos do Requerimento nº 969/2015, de autoria do Senador José Maranhão e outros Senadores.
Publicação
Publicação no DSF de 18/09/2015 - Página 7
Assunto
Outros > HOMENAGEM
Indexação
  • SESSÃO ESPECIAL, HOMENAGEM POSTUMA, ANIVERSARIO DE MORTE, EX-DEPUTADO, ESTADO DA PARAIBA (PB), ELOGIO, VIDA PUBLICA.

    O SR. JOSÉ MARANHÃO (Bloco Maioria/PMDB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente; Srªs e Srs. Senadores, 20 anos nos distanciam da morte de Antonio Marques da Silva Mariz, homem público, cuja trajetória foi marcada pela honradez, pela ética e pelo trabalho voltado aos mais carentes. Nascido em João Pessoa, no dia 5 de dezembro de 1937, Antonio Mariz, a exemplo de seus ascendentes, conservou profundos laços com a cidade de Sousa.

    Antonio Mariz iniciou sua atuação política na época de estudante, na Faculdade Nacional de Direito do Rio de Janeiro, em que militou no Centro Acadêmico Cândido de Oliveira. Estudou Ciências Políticas na Universidade de Nancy, na França, e foi Promotor de Justiça antes de se candidatar a Prefeito de Sousa, na Paraíba, pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), em 1963.

    Disputou as eleições com os candidatos da UDN, Filinto da Costa Gadelha, representante do Grupo Gadelha, dominante no Município, e do PSD, o médico Laércio Pires. Durante a campanha, adotou um discurso inovador: defendeu a anotação na carteira de trabalho, então desconhecida na prática administrativa pública; o pagamento do salário mínimo aos trabalhadores; e a necessidade da reforma agrária na linha das reformas de base do Presidente João Goulart. Assumiu o compromisso público de prestar contas de todo o dinheiro que entrasse e saísse do cofre da Prefeitura, o que era uma profunda inovação, já que não existia a preocupação tão forte com a transparência da Administração Pública, como ocorre hoje em dia, muitas vezes, uma obrigação não observada por certos gestores públicos.

    Foi eleito, inicialmente, com uma diferença de apenas dez votos. E os seus adversários pediram recontagem de votos. Então, na recontagem, essa diferença caiu para sete votos.

    Após o golpe militar de 1964, Mariz foi acusado de subversão, em virtude de sua solidariedade a João Goulart, o que era um dever de fidelidade partidária, já que o Presidente João Goulart era o Presidente do Partido a que ele e eu também pertencíamos à época, quando o PTB era uma proposta social democrática. Foi afastado do cargo, preso e submetido a um inquérito policial militar, como todos nós que professávamos o compromisso com o nacionalismo e a defesa da soberania nacional. Perante o Grupamento de Engenharia de João Pessoa, permaneceu detido por pouco tempo, logo reassumindo a Prefeitura. A transparência foi a mais forte marca de sua gestão. Por meio da Rádio Difusora do Rio do Peixe, uma emissora local, todos os dias, prestava contas das despesas e receitas públicas - todos os dias!

    Com a extinção dos partidos políticos pelo Ato Institucional nº 2 e o surgimento da Arena e do MDB - diga-se de passagem, partidos que foram criados pelo próprio governo do golpe de 1964 -, o caminho natural de Mariz seria este último, o MDB. No entanto, as contingências políticas do Estado o levaram a se filiar à Arena. Esta é uma história que os paraibanos conhecem e que Mariz, nessa decisão, foi tangido, foi forçado pelas circunstâncias da política local do Município de Sousa e de outros Municípios da Paraíba, e é algo que os paraibanos conhecem, que os paraibanos entenderam.

    Encerrado o mandato como prefeito, Mariz foi nomeado Secretário de Educação do governo de João Agripino, 1969-1970. Sua gestão foi marcada pela interiorização do ensino superior, com a criação das faculdades de Patos, Cajazeiras e Guarabira, pela ampliação da rede estadual de ensino e pela implantação de um programa de bolsas de estudo para estudantes carentes.

    Em 1970, Mariz se candidatou a Deputado Federal, ficando entre os mais votados com 59.434 votos, que, naquela época, representava um proporcional muito elevado do total dos eleitores da Paraíba, que ainda era muito baixo.

    Voltou a ser eleito para a Câmara dos Deputados em 1974, 1978 e 1986. Como Deputado Federal, defendeu a restauração da ordem democrática e da liberdade política. Comprometido com a luta pelos direitos humanos, apoiou a CPI que investigaria a prática de torturas, o desaparecimento e o assassinato de presos políticos. Prestou solidariedade a jornalistas presos e condenou o fechamento de jornais.

    Considerado um dos grandes juristas da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, saía sempre em defesa da democracia do Brasil, do Nordeste e da Paraíba. Desde seu primeiro mandato, Mariz fez parte do grupo de Parlamentares arenistas, que ficariam conhecidos na Câmara como o grupo renovador, pela postura rebelde em relação à Liderança do governo na Casa.

    Como integrante desse grupo, Mariz discordou da indicação do General João Baptista Figueiredo à sucessão do Presidente Ernesto Geisel, apoiando a candidatura oposicionista do General Euler Bentes Monteiro. Também se pronunciou contra as reformas políticas propostas pelo Presidente do Congresso, em 1978, assinalando que a cada uma das liberdades aparentemente desenvolvidas correspondiam outras normas que, de certo modo, as neutralizavam. Os que foram contemporâneos dessa época sabem perfeitamente que tudo não passava de uma farsa com a qual homens da têmpera de Mariz não poderiam jamais concordar.

    Votou a favor da emenda que extinguia o Senador indireto, mais conhecido como biônico, recusada pelo Congresso.

    Em 1978, quando os governadores foram eleitos indiretamente, dando início ao processo de abertura política, Mariz desafiou os generais e disputou a convenção da Arena com o então Secretário de Educação da Paraíba, Tarcísio de Miranda Burity, o escolhido dos militares. Contava com suporte popular e de tradicionais forças políticas do Estado. Como escreveu o historiador José Octávio de Arruda Mello: "estabeleceu-se a luta da sociedade contra o Estado, que não poupou esforços para vencer". O resultado da conversão arenista registrou 152 votos em favor de Buriti e 124 em favor de Mariz, além de 28 votos nulos e em branco, em um universo de 286 convencionais.

    Nas eleições realizadas naquele mesmo ano, para Deputado Federal e Senador, Antonio Mariz traçou o seu caminho na oposição. O Senador Humberto Lucena, do MDB, eleito com o apoio de Mariz, que liderou uma dissidência na Arena, apoiado por João Agripino, sinalizava que seria ele o candidato das oposições a governador nas eleições diretas de 1982.

    Em 1980, logo após a volta do pluripartidarismo, ao lado do Senador Tancredo Neves, do Deputado Thales Ramalho e de outros líderes de expressão nacional, Mariz participou da fundação do Partido Popular (PP), que foi incorporado ao PMDB em fevereiro de 1982.

    O SR. PRESIDENTE (Raimundo Lira. Bloco Maioria/PMDB - PB) - Caríssimo Senador José Maranhão, peço um minuto de interrupção para convidar para esta Mesa o Senador Cássio Cunha Lima, um dos componentes do PMDB de Antonio Mariz.

    Quero também destacar aqui a presença dos Deputados Federais paraibanos Veneziano Vital do Rêgo, Manoel Junior, Hugo Motta e também do Deputado José Nunes. (Palmas.)

    Quero destacar, também, a presença da senhora Beatriz Mariz Dantas, prima legítima do homenageado, Antonio Mariz.

    Senador José Maranhão, com a palavra.

    O SR. JOSÉ MARANHÃO (Bloco Maioria/PMDB - PB) - Fazendo minhas as palavras do Presidente, eu quero registrar, também, a presença ilustre dos Parlamentares que acabam de chegar a esta seção e dizer que todos os paraibanos, neste momento, estão movidos pelo mesmo sentimento de reconhecimento à memória de Antonio Mariz e, ao mesmo tempo, solidários a essa homenagem que os paraibanos lhe prestam.

    Foi pelo PMDB que, no mesmo ano, Mariz disputou o governo da Paraíba. Perdeu a eleição para o Wilson Braga, do PDS. A derrota de Mariz não foi isolada: naquele ano, o PMDB perdeu as eleições para o governo em todos os Estados do Nordeste, mesmo onde o candidato do partido era considerado favorito até o dia da eleição.

    Mariz concluiu o seu mandato de Deputado Federal em janeiro de 1983. Foi convidado, então, pelo Governador Franco Montoro para assumir a chefia do escritório do Banco de Desenvolvimento do Estado de São Paulo (Badesp) no Rio de Janeiro. Em seguida, foi indicado pelo Presidente Tancredo Neves, já na montagem da nova equipe de governo, para a Diretoria de Desenvolvimento Urbano do Banco Nacional de Habitação, cargo que assumiu em 1985.

    Em 1986, Antonio Mariz foi eleito mais uma vez para Câmara dos Deputados, com a maior votação entre todos os candidatos a Deputado Federal do Estado: 106,5 mil votos. De volta para Brasília, participou da Assembleia Nacional Constituinte, tendo sido Presidente da Subcomissão de Direitos e Garantias Individuais da Comissão de Soberania e dos Direitos e Garantias do Homem e da Mulher. Pelas suas posições, foi apontado como Constituinte nota dez - nota máxima atribuída aos Constituintes que votaram a favor dos interesses do povo brasileiro pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap).

    Na elaboração da nova Constituição, Mariz votou a favor do rompimento de relações diplomáticas com os países com política de discriminação racial, da limitação do direito de propriedade privada, do mandado de segurança coletivo, da remuneração 50% superior para o trabalho extra, da jornada semanal de 40 horas, do turno ininterrupto de seis horas, do aviso prévio proporcional, da unicidade sindical, da soberania popular, do voto aos 16 anos, da nacionalização do subsolo, da estatização do sistema financeiro, do limite de 12% ao ano para os juros reais, da proibição do comércio de sangue, da desapropriação da propriedade improdutiva e da descriminação do aborto. Votou contra a pena de morte, a pluralidade sindical, o presidencialismo e o mandato de cinco anos para o Presidente José Sarney.

    Em 1990, Mariz candidatou-se à única vaga ao Senado, em uma eleição na qual o candidato do PMDB ao governo da Paraíba foi Ronaldo Cunha Lima. Mariz e Ronaldo foram eleitos, aquele por uma maioria superior a 200 mil votos.

    O maior desafio de Mariz como Senador foi relatar o processo de impeachment do Presidente da República na Comissão Especial do Senado Federal, em 1992. O Presidente do Supremo Tribunal Federal, Sydney Sanches, a quem caberia presidir o julgamento no Senado, propôs um rito que não previa limite de tempo para a fase de instrução criminal, em que são apresentadas provas e testemunhas pela defesa e pela acusação. Dessa forma, era impossível prever quanto tempo levaria. Mariz, no entanto, sugeriu a mudança desse rito, estabelecendo prazo para a duração do processo, o que permitiu que fosse concluído em 28 de dezembro de 1992.

    Durante o processo, Mariz atuou com serenidade e respeito aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório. O parecer apresentado por ele foi aprovado quase por unanimidade na Comissão. Foram 76 votos a favor e apenas 3 contra.

    Logo após a conclusão do processo, Mariz sentiu os primeiros sintomas do câncer que o vitimaria mais tarde.

    Em 1994, Mariz foi eleito Governador da Paraíba pelo PMDB, derrotando, no segundo turno, a candidata do PDT, Lúcia Braga. Ronaldo Cunha Lima e Humberto Lucena, candidatos ao Senado na mesma chapa, também saíram vitoriosos. Já na campanha, o estado de saúde de Mariz veio se agravando, e ele governou por pouco tempo. Faleceu no dia 16 de setembro de 1995, na Granja Santana, residência oficial do Governo do Estado.

    Mesmo que em um período muito curto, imprimiu a sua marca de governar. Já no discurso de posse, deixou clara a opção preferencial pelos pobres. Para definir a sua gestão, criou o slogan Governo da Solidariedade. Estabeleceu como prioridades a otimização da rede pública de saúde e a elaboração de um arrojado plano de governo que inovava a administração pública na área da educação além da instalação de bibliotecas por todo o Estado; também priorizou os salários dos servidores públicos e centrou grande preocupação na geração de emprego e renda, por meio do fortalecimento do Projeto Meio de Vida.

    Defendeu um projeto de transposição e irrigação que foi implementado pelo meu Governo, que se seguiu ao dele, conhecido na Paraíba como o Canal da Redenção, utilizando as águas do Açude Coremas/Mãe D'água, para irrigação de uma área de cerca de 5 mil hectares de terras férteis no Município de Souza.

    Esse projeto foi, sem dúvida, muito arrojado. Importou no investimento de mais de R$250 milhões, que contou, naturalmente, com a cooperação do Governo da União, mas era um passo decisivo que a Paraíba dava para tornar economicamente útil a água do Açude Coremas/Mãe D'água, construído há 70 anos, mas que nunca, até então, passara de um espelho d'água para ornar as terras áridas do sertão. Esse canal de transposição foi a primeira experiência de transposição no Estado da Paraíba. E, sem dúvida nenhuma, é um projeto redentor para a população do Alto Sertão.

    Dentre os trabalhos publicados por Antonio Mariz, se destacam Autonomia Municipal e também Aposentadoria dos Trabalhadores Rurais, ambos em 1971. Outra publicação, outro trabalho de Mariz: Uma Política Brasileira de Proteção aos Direitos Humanos, em 1973; Nordeste, em 1977; Sistema Político Brasileiro, em 1978; e Constituinte - Compromisso Democrático, em 1988.

    O exemplo de Mariz se reveste da maior importância nos dias atuais, notadamente em face da grave crise que vivenciamos. Que a vida de retidão, de honradez, de ética, de valorização e respeito à coisa pública fique como legado para esta e as futuras gerações.

    Era o que eu tinha a dizer a respeito do homenageado. (Palmas.)

 

    


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/09/2015 - Página 7