Discurso durante a 154ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Posicionamento contrário à redução da maioridade penal; e outro assunto.

Autor
Lídice da Mata (PSB - Partido Socialista Brasileiro/BA)
Nome completo: Lídice da Mata e Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO PENAL:
  • Posicionamento contrário à redução da maioridade penal; e outro assunto.
Publicação
Publicação no DSF de 10/09/2015 - Página 274
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO PENAL
Indexação
  • CRITICA, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, ASSUNTO, REDUÇÃO, MAIORIDADE, IMPUTABILIDADE PENAL, REGISTRO, RECEBIMENTO, VISITA, REPRESENTANTE, MOVIMENTO SOCIAL, DEFESA, DIREITOS HUMANOS, ADOLESCENCIA, ENFASE, JUSTIFICAÇÃO, COMBATE, MATERIA, REDUTOR, IDADE, RESPONSABILIDADE PENAL.

            A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu vou tratar de outro assunto; no entanto, a minha querida amiga Senadora Vanessa Grazziotin acabou a sua fala citando o nosso Governo aqui no Distrito Federal, e eu não posso deixar de registrar diferenças essenciais nisso.

            A Presidente Dilma está herdando seu próprio Governo; o Governador do Distrito Federal está herdando um Governo de outro partido, um outro Governo, que se junta à crise nacional e à queda de receita de todos os Estados e lhe dá um quadro desesperador, porque ele herda um endividamento extraordinário do Distrito Federal. Ponto final para tratar desse assunto em outra oportunidade.

            Sr. Presidente, quero me dedicar a um assunto muito caro a mim, a V. Exª, a muitos Srs. e Srªs Senadores, que é justamente uma proposta de emenda à Constituição que saiu da Câmara e veio para o Senado. Trata-se da PEC da redução da maioridade penal.

            Senador Capiberibe, na semana passada, recebi aqui no Senado dois jovens da campanha #15contra16, mobilização criada nas periferias de São Paulo, do Rio de Janeiro, da Bahia e que alcança hoje muitos Estados brasileiros. O objetivo da campanha é conscientizar os moradores da periferia sobre os perigos da aprovação da PEC 171, que tramita nesta Casa e reduz a maioridade penal.

            Pois bem, recebi dois jovens representantes desse movimento, Enderson Araújo, da minha terra, Salvador (BA), e Gabriela Vallim, de São Paulo. Eles são militantes na área dos direitos humanos para a juventude, em especial em questões que dizem respeito ao enfrentamento da violência praticada contra jovens negros. Aliás, esse tema também é da nossa CPI que investiga o assassinato de jovens no Brasil, que presido e que tem a relatoria do Senador Lindbergh Farias, Senador pelo Rio de Janeiro, com a participação de membros de diversos partidos e Estados, preocupados com o crescimento da morte, na verdade, dos assassinatos, da violência contra os jovens em todo o País.

            Esses dois jovens me entregaram uma cartilha, a #15contra16, que foi lançada recentemente durante o festival de música realizado em São Miguel Paulista, na Zona Leste de São Paulo. A cartilha trata justamente de 15 motivos, de 15 argumentos, de 15 razões contra a redução da maioridade de 18 para 16 - por isso, 15 contra 16 -, justamente marcando a posição daqueles que são as principais vítimas desse estado de violência contra os jovens em nosso País: jovens negros da periferia das grandes e médias cidades brasileiras, em todos os Estados brasileiros. No Norte, o perfil muda um pouco: do jovem negro para o jovem indígena. Portanto, o perfil permanece na dimensão da juventude mais vulnerabilizada socialmente naquela região.

            Os argumentos que eles expõem na cartilha são explicados em linguagem clara, apropriada para os jovens, para que os jovens possam entender o que está sendo votado. Também ajuda a sociedade em geral a entender, já que há uma grande quantidade de informações veiculadas hoje, principalmente nas redes sociais, que têm conteúdos limitados e, por isso, nem sempre dão conta da complexidade das questões relacionadas com o tema. Não são raros os casos de pessoas que tomam para si uma opinião sem se aprofundarem no tema, sem se informarem adequadamente. E, nesse sentido, a cartilha elaborada pelo movimento busca contribuir para qualificar o debate e informar melhor a população.

            Entre as 15 razões que o movimento explicita para ser contra a redução da maioridade penal, está, por exemplo, a de que a juventude negra é a principal vítima da violência no País. Esse argumento tem sido por nós comprovado nos diversos dados apresentados na CPI do Assassinato de Jovens: das 56 mil pessoas assassinadas em 2012, 30 mil eram jovens entre 15 e 29 anos de idade, sendo 77% - Presidente, V. Exª é Presidente da Comissão de Direitos Humanos e trata, permanentemente, dessa questão, como nós - são jovens negros.

            O racismo está claramente identificado, primeiro, pela razão de que as mortes ocorrem geograficamente na periferia das grandes cidades que é habitada por uma maioria de negros, por uma maioria de jovens negros. E, segundo, a partir daí, o perfil definido como suspeito pela polícia é justamente o de jovem negro da periferia. Esse perfil de suspeitos leva a uma abordagem diferenciada da polícia quando se trata de um território geograficamente definido. Eu não tenho dúvida. Na cidade de Salvador, em Barra, em Ondina ou num bairro de classe média, como em Brotas, por exemplo, a abordagem da polícia em confronto com um jovem branco habitante dessas regiões da cidade é uma, é de talvez caracterizá-lo imediatamente como usuário; a abordagem feita pela polícia e, portanto, pelo Estado brasileiro de um jovem negro no subúrbio, como em Coutos, em Periperi ou em qualquer outra região periférica da cidade, no miolo da nossa cidade, como na Liberdade, bairro negro, em Pau Miúdo, ou em outras regiões da nossa cidade é absolutamente diferente.

            E eu tenho certeza de que esse diagnóstico de comportamento da ação policial no meu Estado ou na minha capital é exatamente igual em Porto Alegre, no Rio de Janeiro, em São Paulo, no que diz respeito à definição clara, geográfica, de onde a violência contra os jovens ocorre.

            E nós vamos aqui ter a oportunidade de tratar de mais outras situações e de que maneira essa violência ocorre.

            Eu quero hoje apenas chamar a atenção para essa campanha que a própria juventude de periferia começa a abraçar, fazendo da sua maneira, da sua forma, colocando claramente as suas posições e as suas reivindicações e dizendo que é um erro acreditar que os jovens infratores não são punidos. Eles são punidos antes de cometer a infração, são punidos com a falta de acesso à educação, à cultura, ao lazer, à qualificação, à oportunidade de emprego, à renda que não lhes contempla, o que se constitui numa forma de o Estado punir a juventude que também nasce de uma maneira claramente... Essa juventude que não tem acesso à saúde, à educação...

(Soa a campainha.)

            A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - ... está também geograficamente definida em cada uma das grandes cidades dos nossos Estados, do nosso País.

            O movimento #15contra16 cobra mais políticas públicas que atendam às necessidades da nossa juventude. Os dados da Unicef demonstram que 1% dos homicídios registrados no Brasil é cometido por adolescentes entre 16 e 17 anos de idade - 1%. Apesar da baixa incidência dos assassinatos praticados por menores, eles têm sido usados, inclusive através dos meios de comunicação, como principal argumento para a redução da maioridade penal em nosso País.

            Durante uma das audiências públicas realizada pela CPI do Assassinato de Jovens, o representante do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase) informou que o sistema conta atualmente com 23 mil adolescentes, dos quais 80% têm mais de 16 anos, sendo 57% negros ou pardos, como se caracteriza, e a maioria com ensino fundamental incompleto.

            Outro indicador apontado pelos próprios jovens do movimento #15contra16 é o aumento da reincidência de crimes que, entre adolescentes internos, é de 20%, enquanto nas prisões dos adultos essa reincidência chega a 70%. Nossos presídios estão superlotados, e o sistema carcerário não consegue cumprir função ressocializante em nenhum dos casos.

            Sr. Presidente, quero mais uma vez pedir a V. Exª e a todos os Senadores com sensibilidade para a causa da juventude e dos adolescentes do nosso País que divulgarem a página do movimento #15contra16 no Facebook, que pode ser encontrada como Festival Musical Contra a Redução da Maioridade Penal #15contra16.

            E quero lembrar também que vamos continuar debatendo os motivos que levam à violência e ao assassinato de nossos jovens na próxima audiência da CPI de Assassinato de Jovens, marcada para esta sexta-feira, 11 de setembro, em Recife, e também na próxima semana, dia 25, em São Luís, no Maranhão.

            Em Recife, nós vamos ter a oportunidade de ouvir das autoridades locais a aplicação de uma experiência singular e importante na área de segurança pública em nosso País, que é o Pacto pela Vida, projeto desenvolvido e iniciado no governo do Governador Eduardo Campos...

(Soa a campainha.)

            A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - ... que se realiza em Pernambuco, mas também na Bahia há uma experiência que começa a apresentar os seus indicadores exitosos.

            A CPI já promoveu 11 audiências, e há ainda em outubro e novembro mais 10 programadas. Já foram ouvidas 73 pessoas pela CPI, entre especialistas e representantes de familiares de vítimas, instituições de pesquisa e organismos não governamentais.

            Nossos jovens - já vou terminar, Sr. Presidente - são o elo mais fraco nessa cadeia da violência. As pesquisas de diversas instituições ouvidas pela CPI confirmam o diagnóstico de que o maior número de assassinatos e mortes violentas no Brasil acontece justamente nessa população entre 16 e 28 anos, jovens brasileiros que não terão a oportunidade, portanto, de realizar aquilo que o nosso Governo investiu na sua infância, na sua adolescência, para que pudesse ter, agora, o retorno da inclusão desses jovens no processo produtivo em nosso País.

            Quero fechar este pronunciamento repetindo a frase que os jovens me disseram:

Precisamos ajudar, Senadora, a conscientizar a juventude da periferia e mobilizar os Senadores para que não aprovem esse projeto, essa PEC. Queremos também chamar a atenção da mídia. E que o Senado tenha em mente que os jovens querem mais escolas e menos cadeia; querem, antes, mais qualidade de vida.

            Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/09/2015 - Página 274