Discurso durante a 170ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro da necessidade de aprofundamento da discussão acerca do direcionamento dos investimentos em geração de energia elétrica no Brasil.

Autor
José Medeiros (PPS - CIDADANIA/MT)
Nome completo: José Antônio Medeiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MINAS E ENERGIA:
  • Registro da necessidade de aprofundamento da discussão acerca do direcionamento dos investimentos em geração de energia elétrica no Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 29/09/2015 - Página 207
Assunto
Outros > MINAS E ENERGIA
Indexação
  • DEFESA, NECESSIDADE, SOLUÇÃO, CRISE, SISTEMA ELETRICO, EDUCAÇÃO, ECONOMIA NACIONAL, REGISTRO, REUNIÃO, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PRIMEIRO-MINISTRO, PAIS ESTRANGEIRO, ALEMANHA, DIALOGO, ASSUNTO, MEIO AMBIENTE, COBRANÇA, EXTINÇÃO, DESMATAMENTO, BRASIL, INVESTIMENTO, PRODUÇÃO, FONTE ALTERNATIVA DE ENERGIA, AUSENCIA, EFICIENCIA, CUSTO, ENERGIA SOLAR, POSSIBILIDADE, PAIS, AUMENTO, USINA HIDROELETRICA, RESERVATORIO, MANUTENÇÃO, ENERGIA, PERIODO, SECA, SISTEMA DE GERAÇÃO, ENERGIA EOLICA, DEPENDENCIA, CLIMA, RELEVANCIA, DISCURSO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, ASSEMBLEIA GERAL, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU).

    O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, todos que nos acompanham pela Rádio e pela TV Senado, agradecemos a presença daqueles que nos acompanham também nas galerias e que vieram aqui nos prestigiar.

    Sejam muito bem-vindos à Casa!

    Sr. Presidente, há pouco, o Senador Cristovam fez um discurso aqui justamente falando sobre caminhos e saídas para o Brasil. Corretíssimo, porque nós não podemos ficar parados. Um gigante desta magnitude, um ator importante no cenário internacional, como o Brasil, não pode ficar estagnado. E precisamos encontrar saída. Precisamos encontrar saída no setor energético, na educação, na economia. E é justamente sobre isso que hoje vou falar aqui na tribuna.

    Sr. Presidente, no mês passado, esteve no Brasil a Chanceler alemã Angela Merkel. Ela é líder de um dos países mais ricos e organizados do mundo. Na agenda da Chanceler com a Presidente Dilma Rousseff, não faltou o tema ambiental.

    E a Primeira-Ministra alemã cobrou o cumprimento da meta do fim do desmatamento ilegal até 2030. Angela Merkel, como se sabe, foi Ministra do Meio Ambiente da Alemanha na década de 1990, razão pela qual conhece bem o tema e por ele nutre grande apreço.

    Esses fatos trazem, inevitavelmente, à baila a questão das energias renováveis, muito caras àquele país. Nos últimos anos, a Alemanha investiu muito em energia renovável, especialmente em energia solar, numa aposta que faz bastante sentido para países ricos e que não dispõem de fontes limpas mais baratas. Lamentavelmente, para os alemães e para os defensores dessa forma de geração de energia, os resultados não foram tão bons assim.

    Depois de gastar 100 bilhões de euros em subsídios, os alemães concluíram, no início dessa década, que a energia solar é a mais ineficiente das fontes renováveis de energia, segundo matéria da revista alemã Der Spiegel republicada pelo jornal O Estado de São Paulo em janeiro de 2012. As usinas hidrelétricas geram seis vezes mais energia pelo mesmo custo, e os parques eólicos produzem cinco vezes mais pelo mesmo valor que os seus congêneres solares, segundo a revista. Acresce-se a isso o fato de que as plantas solares ocupam imensas áreas de terras, inviabilizando-as para outras finalidades.

    Numa comparação ligeira, ocupando 500 quilômetros quadrados com seu tão combatido reservatório, a Usina de Belo Monte gerará 4,2 vezes mais energia por quilômetro quadrado ocupado do que o parque solar Waldpolenz na Alemanha, instalação considerada modelar.

    Para gerar a mesma quantidade de energia que Belo Monte, uma usina com a capacidade de Waldpolenz precisaria de uma área de 2,2 mil quilômetros quadrados, esterilizando-a para outros aproveitamentos. Cabe mencionar ainda os potenciais impactos negativos dos materiais utilizados na construção dos painéis solares, tais como chumbo, mercúrio e cádmio.

    Todas essas informações nos fazem, inevitavelmente, pensar no Brasil, onde a situação é completamente outra, Senador Elmano. Enquanto a Alemanha já não dispõe de fontes hídricas, a mais barata de todas as fontes limpas de geração de energia elétrica, elas ainda são abundantes por aqui.

    O Brasil ocupa o terceiro lugar entre os países que dispõem dos maiores potenciais hidrelétricos, com 10% da disponibilidade mundial, atrás apenas da China, que tem 13% do total, e da Rússia, que dispõe de 12%.

    O potencial brasileiro estimado é de quase 250 mil megawatts. Perto de 90 mil megawatts, cerca de 36% deste total, já se transformaram em usinas em operação. O potencial ainda passível de aproveitamento é calculado em mais de 100 mil megawatts, estando mais de 70% dele localizados nas Bacias do Amazonas e dos rios Araguaia e Tocantins.

    Duas das usinas hidrelétricas que ainda podem ser construídas ficam no Rio Juruena, entre o nosso Estado de Mato Grosso e o do Amazonas. São as usinas de Salto Augusto Baixo (1,4 mil megawatts) e São Simão Alto (3,5 mil megawatts), ambas ainda em fase de estudos.

    Em outras palavras, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, dispomos de uma riqueza que quase nenhum outro país do mundo possui, uma vantagem comparativa espetacular: energia limpa e barata.

    Temos, ainda, a alternativa eólica. Os preços dessa fonte energética se tornaram competitivos nos últimos anos, e os ventos são favoráveis em várias Regiões do Brasil. A geração eólica, contudo, apresenta uma dificuldade: ela é intermitente, depende, obviamente, dos ventos e serve apenas como fonte complementar.

    Daí o fato de que o sistema brasileiro é e deverá continuar sendo hidrotérmico, com as usinas termelétricas ajudando a assegurar o abastecimento nacional, funcionando como um back up para os momentos de falta de chuvas, como o que estamos vivendo agora. Contudo, a participação das térmicas tem aumentado de 2003 para cá, dada a falta de hidrelétricas com reservatórios.

    Lamentavelmente, as térmicas são mais caras que as hidrelétricas, chegando a sua geração a custar até dez vezes mais, dependendo do combustível que utilizam. Além disso, elas sujam a matriz de geração nacional com as suas emissões, mas permanecem como a única forma de garantir o abastecimento de energia elétrica do País.

    Considerada essa matriz hidrotérmica como a única capaz de assegurar o fornecimento de energia, há outro problema sério que vem solapando a robustez e o custo do abastecimento nacional, hoje, paradoxalmente, um dos mais caros do mundo. Refiro-me à construção de novas hidrelétricas sem reservatórios, por causa de pressões ambientalistas.

    Senador Elmano, a defesa do meio ambiente, ninguém tem dúvida de que é importante, necessária e não podemos dela prescindir. Agora, temos que limpar realmente essas informações e essas intenções para saber: é na defesa do meio ambiente ou na defesa de quais interesses?

    Já há vários anos as usinas hidrelétricas têm sido construídas sem reservatórios capazes de guardar água para o período seco, por causa dessas pressões.

    E faço um parêntese aqui, Senador Elmano. Na década de 70, em Mato Grosso, começou-se a falar numa usina hidrelétrica no Rio Manso. Foi pressão de todos os lados, que ia acabar com o ecossistema, que ia ser um prejuízo imenso para o Estado de Mato Grosso. Mas, mesmo assim, o Governador Frederico Campos acabou por dar início à usina. Hoje, Senador Elmano, existe lá em Mato Grosso um verdadeiro tesouro. Essa usina foi construída e existe um lago com uma lâmina d'água de quase 42km, com 180m de profundidade em alguns pontos, que virou um ponto turístico maravilhoso, fez o controle de cheias e ainda gera energia. Mas, na época, dizia-se que Mato Grosso praticamente ia acabar, que a Bacia do Pantanal ia ser destruída e por aí vai.

    Mas, de lá para cá, apenas a Usina de Manso conseguiu escapar. Daí por diante, começou-se a falar só em usinas de fio d'água. Essas usinas têm sido construídas sem reservatórios capazes de guardar água para o período seco, por causa dessas pressões, como eu disse. São pequenos reservatórios, chamados usinas a fio d'água. O resultado é que a capacidade de reservação de água das usinas hidrelétricas brasileiras para o período seco vem caindo em face do aumento da demanda.

    Essa capacidade, que já foi plurianual, no passado, e era de 5,6 meses, em 2012, cairá para 5 meses, em 2016, e para 3,24 meses, em 2022, de acordo com o Plano Decenal do Ministério de Minas e Energia até aquele ano.

    Com isso, além da maior exposição do País à falta de energia, o seu custo da energia aumenta muito, como estamos vendo neste momento. É que, sem reservatórios, as hidrelétricas geram energia barata por menos tempo. Pela mesma razão, a economia proporcionada pela geração eólica, mais barata e menos poluente que a térmica, não pode ser aproveitada. Só se tivermos reservatórios, poderemos guardar a água economizada pela geração de energia pelos parques eólicos.

    O grande argumento contra a construção de hidrelétricas com reservatórios tem sido o desmatamento da Amazônia. Também isso precisa ser examinado à luz de fatos concretos.

    A Empresa de Pesquisa Energética, vinculada ao Ministério de Minas e Energia, divulgou dado segundo o qual, somadas as áreas dos reservatórios das usinas construídas e a construir na Amazônia, seriam alagados 10.500 quilômetros quadrados, ou seja, apenas 0,16% de todo o bioma amazônico. Eu repito: apenas 0,16% de todo o bioma amazônico.

    A título de comparação, foram desmatados 6.418 quilômetros quadrados na Amazônia brasileira, somente em 2011, ano em que menos se destruiu a floresta desde 1988, quando o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais iniciou esse levantamento. Repito: O ano que menos se desmatou foi 2011, e, mesmo assim, foram desmatados 6.418 quilômetros quadrados.

    Cedo ou tarde teremos que nos debruçar sobre esse assunto, Sr. Presidente, porque ele é de importância vital para o Brasil. A compatibilização do aproveitamento ótimo de todo o potencial hidrelétrico do País com a preservação de terras indígenas e de reservas florestais terá que ser seriamente discutida, e o fórum para isso será, necessariamente, o Congresso Nacional.

    Eu não sou adepto de teorias de conspiração, mas me faz pensar que todas as grandes reservas indígenas estejam sobre as nossas jazidas de minérios mais raros, que quando falamos na nossa matriz energética, a fonte mais barata é a que é mais atacada. Está provado aqui, são dados do próprio Ministério. Só em 2011, desmatou-se quase o tanto que precisaríamos de área para alagar ali, para termos energia de sobra. Mas, quando se fala nisso, é a mesma coisa que jogar pedra na cruz.

    Mas, enquanto esse momento não chega, enquanto esse grande debate não chega, Senador Elmano, devemos olhar para as experiências dos outros e nos debruçar sobre os fatos concretos, para nos prepararmos para não cair em equívocos e para não nos deixarmos levar por opções irreais e distantes de nós, que ainda não servem nem mesmo aos países mais ricos, porque são caras e não são tão vantajosas assim.

    Aproveito o ensejo para registrar que ouvi, com bastante atenção, o pronunciamento da Presidente Dilma na Cúpula de Desenvolvimento da ONU. Isso, ontem, em Nova York. De início, devo reconhecer a importância da sua fala, ao garantir que o Brasil irá "ocupar o potencial que ele tem para ocupar" em tema de energia hidrelétrica, sem que possa dela abrir mão. Essa fala da Presidente foi muito importante.

    Num momento de profunda ideologização do debate energético, é louvável qualquer reafirmação da vocação brasileira para a energia de matriz hídrica. Na verdade, Senador Elmano, acho isso importantíssimo, porque, enquanto Cazuza dizia "Ideologia! Eu quero uma para viver", vou dizer uma coisa aqui: está sobrando ideologia no Brasil. Na verdade, o Brasil está precisando justamente disto: desideologizar a coisa, porque boa parte da nossa economia está travada por causa de muita ideologia e pouca prática.

    Todavia, não posso deixar de registrar a falta de menção, no discurso da Presidente, ao incremento - sustentável, é claro - da capacidade de reservação de nossas usinas hidrelétricas. A impressão que dá é a de que, quanto a esse tema em específico, permanece uma espécie de tabu nos debates a respeito de desenvolvimento e sustentabilidade.

    Isso é muito importante, Senador Elmano, porque, no momento, o Brasil inteiro está passando por uma crise hídrica. No momento em que falamos de preço de energia, no momento em que, no Nordeste - aqui está presente o Senador José Agripino, que pode falar com mais propriedade e que, aliás, tem sido uma voz aqui constante, falando sobre isso -, Currais Novos, Acari e mais de dez cidades estão passando por uma crise hídrica, boa parte do Sudeste também já começa a sofrer.

    E temos de pensar. Temos de pensar, sem esta de colocar a ideologia na frente.

    Hoje é o Nordeste, que já há muito tempo está, o Sudeste, mas, Mato Grosso, se não cuidar, muito em breve, verá a água faltar em Municípios que a têm em abundância.

    E o momento - voltando ao que estava falando, Senador Elmano - era mesmo propício para se tocar neste assunto, uma vez que ela também verbalizou, no discurso de ontem, o compromisso de atacar ferrenhamente o desmatamento ilegal, inclusive anunciando uma meta de completa erradicação dessa prática tão nociva. Desmatamento, ele sim, que se coloca como o grande fator de degradação de nossas florestas, conforme expusemos há pouco.

    Nesse sentido, é extremamente importante identificarmos os reais pontos de fragilidade em nosso ecossistema, de um lado, e as nossas concretas potencialidades em matéria de geração energética e desenvolvimento, de outro, até para podermos travar o mais honesto e fecundo debate possível.

    Aliás, nesse campo, o que se precisa é de honestidade, honestidade de propósito e honestidade nos debates, porque se torcem números, se maquiam números, às vezes, para deixar Estados no ostracismo e até mesmo a economia brasileira. 

    Muitas vezes, o menino está lá na faculdade, sendo doutrinado por professores, e esse menino não conheceu o interior do Nordeste, o interior do Mato Grosso; não sabe como proceder e vai tomar decisões que vão nortear o futuro do País, a economia do País.

    E repiso - está o Lago Manso lá que não me deixa mentir: diziam que o Lago Manso, caso se fizesse aquela usina, ia acabar com o Estado, ia acabar com o Pantanal. Hoje temos uma lâmina de água de 42 quilômetros, sendo um paraíso e uma riqueza para o Estado. Mas se criou essa ideologia. Em Mato Grosso agora só se faz usininha, Senador, com laguinho pequenininho, sendo que podíamos ter vários reservatórios de água. E tudo com base, na maioria das vezes, não em argumentos técnicos, Senador José Agripino, mas numa ideologia nascida não sei onde. E eu fico, às vezes, me perguntando, chego a pensar se existe mesmo isso, se não são interesses maiores em ter um Brasil capenga e necessitando aí de energia para sempre. Porque potencial nós temos, mas estamos fazendo a lição de casa diferentemente do que deveria ser feito.

    Portanto, o que devemos fazer, Senador Elmano, é enfrentar, com total prioridade, as mais perniciosas causas...

(Soa a campainha.)

    O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - ... de abalo ecológico - já termino - e esgotar, sem esquecer de desenvolver, com a maior eficiência, as melhores e mais baratas opções energéticas, concretamente postas ao nosso dispor. Só depois, então, passamos a considerar outras alternativas viáveis, que garantam efetivamente o abastecimento nacional ao menor custo possível. Devemos isso à população e ao empresariado brasileiro, para que possamos produzir mais por menos e viver com conforto.

    Eu tenho ouvido falar muito em energia solar e gostaria muito que isso desse certo, mas, se gastaram 100 bilhões na Alemanha com a energia solar, e mesmo assim ela é quatro vezes mais cara do que as do nosso potencial energético gerado pelas hidrelétricas, por que não explorar o nosso potencial?

    E eu vejo que, na verdade, cada dia mais, o nosso modelo é combatido, e eu fico pensando: "é combatido tecnicamente? Os argumentos são honestos? Ou é, simplesmente, fruto de alguns interesses ou, simplesmente, de ideologias que não se sustentam?"

    Esse é o debate que temos que travar. E pensemos que um país desse tamanho não tem como se desenvolver, não tem como crescer se não tiver energia.

    Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/09/2015 - Página 207