Discurso durante a 174ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa da importância da doação de medula óssea como forma de salvar a vida de milhões de pessoas; e outro assunto.

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Autor
José Medeiros (PPS - CIDADANIA/MT)
Nome completo: José Antônio Medeiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE:
  • Defesa da importância da doação de medula óssea como forma de salvar a vida de milhões de pessoas; e outro assunto.
SEGURANÇA PUBLICA:
  • .
Aparteantes
Cristovam Buarque.
Publicação
Publicação no DSF de 03/10/2015 - Página 182
Assuntos
Outros > SAUDE
Outros > SEGURANÇA PUBLICA
Indexação
  • HOMENAGEM, MULHER, NATURALIDADE, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), VITIMA, CANCER, MOBILIZAÇÃO, CAMPANHA, DOAÇÃO, ORGÃO HUMANO, ENFASE, LUTA, VIDA, MILITAR, PORTADOR, DOENÇA.
  • REGISTRO, DEMORA, CASA CIVIL, REGULAMENTAÇÃO, LEGISLAÇÃO, ASSUNTO, INDENIZAÇÃO, FUNCIONARIOS, TRABALHO, LOCAL, FRONTEIRA, ENFASE, AUSENCIA, PROTEÇÃO, FAIXA DE FRONTEIRA, PAIS, FACILITAÇÃO, ENTRADA, DROGA.

            O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, todos que nos assistem aqui no plenário do Senado, nas galerias, e que nos acompanham pela Agência Senado, através dos canais de comunicação, a Senadora Ana Amélia, agora há pouco, falou sobre as nossas fronteiras. E ela, como sempre, eu já disse isso, é uma estudiosa do Brasil, conhece como ninguém as dificuldades deste País, as soluções e a saída, até pela forma como sempre se posicionou, quando ainda era uma profissional de imprensa.

            Mas esse assunto da indenização de fronteira, Sr. Presidente, vem se arrastando há algum tempo. E o problema a cada dia se agrava mais porque nossas fronteiras estão totalmente abertas, essa é a grande verdade.

            Eu tenho repetido sempre aqui que São Paulo não produz um pé de folha de coca, um pé de coca, não produz maconha, o Rio de Janeiro também não, os grandes centros não. Essas drogas entram pelas nossas fronteiras. São os nossos vizinhos que produzem, com o que o nosso Governo tem uma complacência, uma condescendência tamanha, que temos cobrado aqui.

            Mas o certo é que o próprio Governo começou a ver a necessidade dessas fronteiras, de que elas precisavam de certa proteção, e começou-se um trabalho na Câmara dos Deputados para criar uma lei a fim de fixar os servidores nessas fronteiras. Porque a grande verdade é que os concursados passam no concurso, saem do Centro-Sul e vão para a fronteira lá no Amazonas, lá no Mato Grosso, mas não ficam lá. A grande verdade é que, passado o estágio probatório, não há quem faça esses servidores ficarem por ali, pelas mais diversas dificuldades: por questão de educação, de saúde, das condições mesmo estruturais para que se fixem ali.

            Foi, então, gestada aqui uma lei muito interessante, que foi aprovada, que é a da indenização de fronteira e para locais também de difícil acesso, de difícil fixação de pessoal. Essa lei já vai completar quase dois anos, e ela dormita na Casa Civil para ser regulamentada. Mas ela é uma necessidade. Espero que não fique letra morta porque - a Senadora Ana Amélia disse muito bem aqui - são categorias necessárias para que o Brasil possa ter um cinturão de proteção. E esperamos que, dentro em breve, essa lei possa estar regulamentada e em vigor.

            Sr. Presidente, hoje vou falar aqui de um tema que não é muito tratado, não é um tema, vamos dizer assim, espetacular, que seja pauta constante dos jornais, dos sites e dos noticiários de TV, mas que não é de menor importância.

            Vou falar aqui sobre a doação de medula óssea e o faço em homenagem à D. Rose Sachetti, uma cidadã do Estado de Mato Grosso, uma cidadã de Rondonópolis, ex-Primeira Dama e secretária no Município de Rondonópolis, também esposa do Deputado Adilton Sachetti, um combativo deputado também do Estado de Mato Grosso. A D. Rose está numa luta contra a leucemia e a enfrenta de peito aberto, com muita coragem. E, aproveitando este momento, nós temos nos unido a ela numa campanha pela doação de medula óssea.

            É um teste. Para as pessoas se engajarem na campanha basta fazer um simples exame de sangue. E, neste momento de luta, em que a D. Rose Sachetti luta pela vida, nós aproveitamos para nos engajar na campanha de luta pela vida de muitos brasileiros.

            Então, Sr. Presidente, recentemente, a mídia e as redes sociais divulgaram um caso que despertou o interesse de muita gente, uma narrativa envolvendo tragédia e superação, um exemplo edificante, um lampejo de inspiração para os dias turbulentos que vivemos. Trata-se da história de um jovem oficial do Exército Brasileiro, um indivíduo de trinta e poucos anos, um militar que já serviu na Polícia do Exército, em Brasília, e na Minustah, a Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti, que recebeu, em março do ano passado, o diagnóstico de leucemia.

            Aproveito para dar o bom-dia e dizer que são muito bem-vindos aqui todos os que estão nos visitando, neste momento, na galeria do Senado.

(Manifestação da galeria.)

            O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Voltando ao caso de que falávamos, Senador, o quadro era grave, e a quimioterapia teve que ser iniciada imediatamente. Apesar dos resultados iniciais positivos, os médicos acabaram concluindo que a quimioterapia, por si só, não daria conta do recado e que a única chance de sobrevivência seria um transplante de medula óssea.

            O transplante de medula óssea, também chamado de Transplante de Células-Tronco Hematopoiéticas - aqui me deparei com um nome do tamanho do mundo -, é a única esperança de vida para milhões de pessoas no mundo todo.

            Eu imagino a pessoa recebendo a notícia de que vai ter que fazer, Senador Cristovam, o transplante de medula óssea, e o médico falando esta palavra aqui para ele, “hematopoiéticas”. Você vai ter que fazer um transplante de células-tronco e dizer este nome aqui, desse tamanho. É assustador.

            Essas milagrosas células-tronco, capazes de salvar tantas vidas, são abundantes na medula óssea de todas as pessoas saudáveis - na minha, Sr. Presidente, na de V. Exª e na de cada um dos nobres colegas Senadores e Senadoras - e estão continuamente, agora e a todo momento, produzindo o sangue que circula em nossas veias.

            Em junho do ano passado, nosso jovem oficial começou a percorrer os caminhos que percorrem os que precisam de um transplante de medula óssea. Inicialmente, os irmãos e os parentes mais próximos se ofereceram para doar, mas nenhum era geneticamente compatível, e sem compatibilidade não há transplante. Aqui eu estou falando do caso desse soldado, mas essa também é a via-crúcis que a D. Rose Sachetti está enfrentando.

            Os irmãos são geneticamente compatíveis em 25% das vezes; entre primos, essa frequência cai para 6%; e, entre pessoas não aparentadas, essa chance é de uma em cem mil. Essa é a dificuldade. Você imagine: a pessoa, após passar por todos os parentes e receber a notícia de que nenhum deles é compatível para doação, passa a ter uma chance em cem mil.

            Como não tinha parentes compatíveis, o soldado foi inscrito no Registro Nacional de Receptores de Medula Óssea, e seus dados genéticos foram cruzados com os dados de doadores brasileiros, armazenados no Registro Nacional de Doadores de Medula Óssea (Redome). Esse banco de dados foi criado em 1993 e, até o mês passado, já tinha cadastrado 3,723 milhões de doadores em potencial. É o terceiro maior banco de doadores do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos, com 7 milhões, e da Alemanha, com 5 milhões.

            Em 2003, a probabilidade de se encontrar um doador brasileiro compatível era de cerca de 10%. Hoje, com o aumento do número de registros no Redome, a chance é de 70%. Vejam que maravilha! Mesmo assim, 30% ainda é muito para quem está procurando um doador, e isso ficou claro quando nosso personagem descobriu que não havia, no Brasil inteiro, um doador sequer que fosse compatível com ele.

            Nesse caso, o passo seguinte é buscar um doador na rede mundial de doadores, a BMDW (Bone Marrow Donors Worldwide), um sistema que reúne mais de 26 milhões de registros de potenciais doadores no mundo inteiro.

            Infelizmente, por causa das diferenças genéticas que existem entre as diversas etnias que povoam nosso Planeta e da miscigenação que caracteriza o povo brasileiro, a probabilidade de encontrar um doador em bancos de doadores do exterior é 30 vezes menor do que no Brasil e, mais uma vez, a pesquisa de doadores foi negativa.

            Agora, sim, a situação era de crise. Michel - é esse o seu nome - precisava do transplante, mas não havia doador compatível em lugar nenhum do mundo.

            As crises, por mais indesejadas que sejam - e é interessante notar que vivemos hoje, em nosso País, uma miríade de crises de todos os tamanhos e de todos os formatos -, são uma ótima oportunidade para separar os indivíduos que desistem, que se entregam, daqueles que insistem e se superam.

            Acredito que a experiência militar, os treinamentos de combate e a participação em missões complexas, como a missão de paz no Haiti, moldaram seu caráter, porque, naquele momento, Michel resolveu deixar de ser apenas paciente e se tornar um agente de mudança.

            Com o inestimável apoio de sua família e de seus amigos, ele lançou uma campanha que buscava chamar atenção para as dificuldades de quem precisa de um transplante de medula e sensibilizar as pessoas para a necessidade de aumentar o número de doadores no Redome.

            E aqui também faço justiça: apesar de não ser militar, apesar de não ter tido a disciplina militar, este tem sido o dia a dia da D. Rose Sachetti, que se empenhou na busca do aumento do número de doadores para o Redome (Registro Nacional de Doadores de Medula Óssea).

            A campanha foi um sucesso: eles levaram essa questão ao conhecimento de milhões de pessoas e obtiveram 11 mil novos doadores. Até o Exército Brasileiro lançou sua própria campanha, incentivando a doação voluntária entre suas fileiras.

            O processo de cadastro como doador de medula óssea é extremamente simples: basta gozar de boa saúde, ter idade entre 18 e 55 anos e comparecer a um hemocentro. Lá, eles colhem 5 mililitros de sangue -- muito menos do que uma doação de sangue regular, que retira cerca de 500 mililitros -- e enviam o sangue para análise do perfil genético de compatibilidade.

            Eu repito: para fazer o exame para ver se é compatível, retiram-se apenas 5 mililitros de sangue. Quando fazemos um exame normal, um exame de sangue desses corriqueiros, retiram-se 500 mililitros, ou seja, 100 vezes mais. Neste caso, retiram-se apenas 5 mililitros.

            Os resultados da análise ficarão armazenados no Redome (Registro Nacional de Doadores de Medula Óssea), associados aos dados do doador. Se o perfil for compatível com alguém que necessite de um transplante de medula óssea, o potencial doador será informado e poderá tornar-se um doador de verdade.

            O processo de doação é relativamente simples e consiste em retirar, por meio de um procedimento sem riscos significativos, um pouco de medula óssea dos ossos da bacia.

            Apesar de todo o esforço e dos 11 mil novos registros no Redome, Michel ainda não tinha encontrado um doador compatível. A campanha prosseguiu, semana após semana, mês após mês, até que, finalmente, em 1º de abril deste ano, surgiu o tão esperado doador.

            Esse indivíduo, curiosamente, cadastrou-se nos Estados Unidos, mas, àquela altura do campeonato, não fazia muita diferença se as células-tronco falavam inglês ou português.

            O transplante foi feito no dia 9 de abril, e a última informação que tenho é de que, até recentemente, 160 dias após o transplante, estava tudo bem. Sem dúvida, um final feliz, mas a história não terminou aí.

            Apesar dos objetivos pessoais já terem sido alcançados, a campanha nas redes sociais continua ativa até hoje, rendendo frutos, trabalhando em prol das pessoas que ainda dependem do gesto altruísta de quem, voluntária e anonimamente, dispõe-se a doar uma pequena parte de si para salvar a vida dos outros.

            Antes de terminar, gostaria de abordar duas breves questões. A primeira questão diz respeito à ampliação do número de doadores cadastrados no Redome.

            As pesquisas da Rede Brasil de Imunogenética, um grupo de pesquisadores que estudou os perfis genéticos do Redome, concluíram que essa ampliação deve se pautar pela representatividade de grupos étnicos ainda sub-representados, como indígenas, afrodescendentes e asiáticos.

            Não seria viável, por exemplo, que toda a população brasileira se oferecesse para ser doadora. Considerando apenas o custo de exames genéticos, em 200 milhões de amostras de sangue, teríamos gastos que ultrapassariam os R$70 bilhões. Daí a importância de uma ação coordenada, estimulando o cadastro de doadores em regiões com populações de características étnicas específicas.

            A segunda questão diz respeito a uma nova esperança que surgiu no horizonte na última década.

            Até há bem pouco tempo, a medula óssea era a única fonte viável de células-tronco hematopoiéticas. A partir da década de 90, os cientistas descobriram que essas células também estão presentes no sangue do cordão umbilical e da placenta dos recém-nascidos.

            Antigamente, quando nascia um bebê, o procedimento padrão era entregar o bebê para a mãe e jogar o conjunto cordão-placenta no lixo. Hoje em dia, em alguns hospitais selecionados, as gestantes passaram a ter a opção de doar, voluntariamente, o cordão umbilical e a placenta para a extração de células-tronco.

            No Brasil, essas células ficam armazenadas em uma rede de bancos públicos de sangue de cordão umbilical, chamada BrasilCord, e estão disponíveis para serem transplantadas para qualquer pessoa que delas precisar. Já são quase 16 mil bolsas de sangue de cordão umbilical armazenadas em nosso País e quase 700 mil no resto do mundo. As perspectivas são promissoras.

            O segredo do sucesso, como já disseram, é a união. Se tivermos capacidade de unir os avanços da ciência à gestão eficiente e técnica dos recursos e se, a essa dupla, formos capazes de adicionar uma boa dose de generosidade, de desprendimento e de amor ao próximo... Se tivermos essa capacidade - e tenho certeza de que temos -, casos de sucessos, como este do Michel, serão regra em nosso País.

            E aqui já faço um apelo. Quero me juntar ao Oscar Schmidt, ao Romário, ao Senador Blairo Maggi e à D. Rose Sachetti, que estão imbuídos neste momento, junto com todos os mato-grossenses, numa campanha semelhante a essa do Michel para que possamos aumentar o número de doadores de medula óssea.

            D. Rose Sachetti, pode ter certeza de que, assim como Michel teve sucesso nessa sua luta, a senhora também vai vencer essa luta particular, porque da outra luta a senhora já é uma vencedora. A campanha é um sucesso e todos os mato-grossenses, com certeza, vão ombrear essa luta, juntamente com a senhora, para que possamos ter, em breve, um número muito maior do que já temos hoje no cadastro nacional de medula óssea.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/10/2015 - Página 182