Discurso durante a 178ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Defesa da legalidade das contas do Governo Federal ante a rejeição proferida pelo TCU; e outros assuntos.

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Autor
Roberto Requião (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
Nome completo: Roberto Requião de Mello e Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA:
  • Defesa da legalidade das contas do Governo Federal ante a rejeição proferida pelo TCU; e outros assuntos.
ECONOMIA:
  • .
Aparteantes
Delcídio do Amaral, Edison Lobão, Telmário Mota.
Publicação
Publicação no DSF de 09/10/2015 - Página 207
Assuntos
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA
Outros > ECONOMIA
Indexação
  • CRITICA, TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU), REJEIÇÃO, CONTAS, GOVERNO FEDERAL, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DEFESA, PREFERENCIA, MANUTENÇÃO, PROGRAMA DE GOVERNO, BENEFICIO, SOCIEDADE, AUSENCIA, PAGAMENTO, CREDOR, DIVIDA PUBLICA.
  • REGISTRO, APRESENTAÇÃO, PROJETO DE LEI, ASSUNTO, PROIBIÇÃO, UNIÃO FEDERAL, COBRANÇA, TRIBUTOS, EMPRESA, POSSUIDOR, BENEFICIO FISCAL, MUNICIPIOS.

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco Maioria/PMDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Raimundo Lira, o Brasil anda impressionado com o avanço da corrupção em metástase nas instituições da República, mas nós vemos - não sem alegria - a Operação Lava Jato e a conclusão do caso dos mensaleiros. Todos nós brasileiros queremos ver esses ladrões na cadeia. No entanto, impressionou-me, hoje, o clima de pânico estabelecido pelo nosso amigo, Líder do PSDB, Senador Cássio Cunha Lima, quando se referiu ao parecer aprovado pelo Tribunal de Contas em relação às contas do governo anterior da nossa Presidenta Dilma.

    Eu gostaria de me pronunciar sobre esse parecer do Tribunal de Contas, que se refere à contabilidade das transferências sociais feitas pelo Governo através dos bancos públicos. É muito barulho, Presidente, para muito pouco. E eu não poderia me calar sobre isso.

    Sabemos que as relações financeiras entre órgãos da administração direta e indireta foram alvo de contabilidade criativa - era assim que se dizia no começo - no Governo Dilma. Estão chamando agora de "pedaladas", como forma de degradar um pouco o assunto, dando-lhe uma conotação diferente da sua real importância.

    Parte da imprensa e da oposição têm tratado essa questão como se fosse um erro gravíssimo. Sabemos que não é bem assim.

    O Governo brasileiro tem metas programáticas de inflação e metas programáticas fiscais. Essas metas fazem parte da política econômica que o nosso Governo adota.

    Fernando Henrique, Lula e Dilma, o famigerado tripé macroeconômico. Não são essas normas estabelecidas nesse tripé exigências legais, são opções políticas macroeconômicas. Equivocadas, na minha opinião, mas uma opção legítima decidida pelos governos e reconhecida por todos até pelo Congresso Nacional.

    Eu ouço falar nesse tripé macroeconômico a cada sessão da Câmara ou do Senado: os fundamentos da nossa economia. Eu acho que são os fundamentos da nossa desgraça econômica, em especial reconhecidas e cantadas em prosa e verso pela oposição e por quase todos os candidatos a Presidente nas eleições de 2014, que se ajoelharam e se penitenciaram no altar do tripé, o mesmo altar do deus mercado, o altar de oferendas ao Mamon bíblico, que significa, em hebraico, nada mais, nada menos do que dinheiro.

    Mas concentremo-nos no nosso assunto principal: a meta fiscal de superávit primário. Ela foi uma imposição dos credores da dívida brasileira, do capital financeiro nacional e internacional através de acordo com o Fundo Monetário Internacional, quando o Brasil quebrou em fins de 1988, governo, como sabemos, de Fernando Henrique Cardoso.

    A lei e a Constituição brasileira não possuem e não contêm nenhuma obrigação e muito menos nenhuma sanção específica que imponha qualquer meta de superávit primário. É uma simples opção de política econômica do Governo, uma opção com a qual eu não concordo, mas reconheço como legal, aceita por todos. O Governo pensa diferente, acha que, não atingindo a meta, os banqueiros não vão mais comprar títulos públicos, esse terrorismo econômico que ouvimos por aí. Não é verdade, Senador Raimundo Lira. Isso é uma pressão do capital financeiro internacional e nacional contra os interesses do País, do povo brasileiro.

    O que fizeram o Ministro Mantega e seu Secretário do Tesouro, Arno Augustin, em relação a essa pressão?

    Eles fizeram vários artifícios que, em uma empresa privada, seriam chamados, de forma glamourosa, de engenharia financeira - elogiados como a sabedoria das pessoas que conseguem evitar exageros do Fisco.

    Foi uma forma de driblar a meta de superávit primário. Isso é claro, é transparente, mas é uma meta que não decorre de exigência legal, era apenas uma exigência do capital financeiro.

    Podemos dizer que o Governo resolveu burlar o capital financeiro, mascarando o superávit primário, segundo os critérios tradicionais. Mas não havia sanção legal contra isso.

    O Governo poderia aprovar um novo orçamento, mostrando a dificuldade em atingir a meta - não fez isso. Acharam que gerariam terrorismo por parte do mercado. Eles queriam evitar as sanções no mercado internacional para obtenção de dinheiro pela economia brasileira.

    Poderiam ter feito diferente. Poderiam ter cortado gastos em educação, saúde, bolsas de assistência social, gastos em investimentos necessários ao Brasil. O mercado ficaria feliz e agradecido. O Governo receberia o aplauso de todos ligados ao mundo financeiro e receberia cumprimentos nas altas esferas.

    Mas iria faltar médico para curar a diarreia e a desidratação grave da filhinha de D. Maria do Socorro, lá em Catolé do Rocha, na Paraíba. Poderia ter sido mais uma morte evitável de uma criança, um ponto a mais na estatística da mortalidade infantil, uma mera estatística que os mercados financeiros manejam tão bem.

    Mantega e Arno queriam continuar mantendo as bolsas e os gastos sociais sem serem prejudicados pela pressão do capital internacional. Fizeram isso de diversas formas nos últimos anos, através de receitas não recorrentes ou extraordinárias, antecipação de receita, Senador Raimundo Lira, adiamento de receitas.

    Nada que seja grave, na minha opinião, mesmo porque, no ano seguinte, essas coisas seriam compensadas.

    No caso em questão, do processo que está no TCU, a Caixa Econômica Federal, cujo capital é cem por cento estatal, realizou, como de costume, transferências sociais que lhe cabe como órgão responsável pelos repasses desse tipo de despesa. Todavia, uma parte dessas despesas referentes ao final do ano foi contabilizada apenas no início do ano seguinte. Assim, a meta de superávit primário para mostrar para o mercado financeiro nacional e internacional foi alcançada. Uma engenharia financeira que não tem impacto nenhum na economia real e no espírito de nenhuma lei. Foi o atraso na contabilização de uma despesa por algum tempo; uma questão formal de contabilidade, uma engenharia financeira.

    Fernando Henrique fez isso; Lula fez isso e a própria Dilma já tinha feito isso antes, mas ninguém nunca havia considerado isso um erro grave, um crime, uma motivação para o impedimento de um governo.

    Eu vou tentar explicar isso de forma mais simples.

    Imagine, Senador Delcídio, uma família que tivesse uma filha. O casal Delcídio e Fernanda, por exemplo, tinha uma filha chamada Clara, e eles pagavam pontualmente os seus compromissos, pagavam as suas dívidas de forma pontual. A filha deles, chamada Clara - ou, não, chamada Fernanda -, um dia, quebrou a perna. O hospital coloca uma conta salgada para o Delcídio pagar. Eles percebem que o dinheiro que eles têm no banco não é suficiente para pagar a conta, mas se lembram que esse dinheiro é igual ao valor que é necessário para pagar uma dívida que ia vencer nos próximos dias. Então, o que eles fazem? Ora, eles sacam o dinheiro e pagam o médico e o hospital. Delcídio e sua senhora não teriam um comportamento diferente. Atrasam o pagamento da prestação para o mês seguinte, para quando puderem, e protegem o que é mais importante: a saúde de sua filha.

    O banco não concorda, reclama, não gosta. É assim que ocorrem as coisas.

    Em nível maior, vemos o mesmo. O capital financeiro internacional quer coagir países a deixarem de lado suas obrigações com o povo, obrigações de emprego, de saúde, de previdência e os programas sociais, as bolsas compensatórias, para que paguem as dívidas que têm com os financiamentos, guardem o seu dinheiro para satisfazer o capital financeiro, façam um superávit para pagar dívidas, ainda que com juros rigorosamente imorais.

    Resumindo, houve, sim, uma engenharia financeira, mas não houve crime. Ninguém se apropriou de recurso público, a economia não foi afetada, nem o interesse público foi afetado, muito pelo contrário. O interesse público, que se resume basicamente na prestação de educação, saúde, na garantia da previdência, foi respeitado.

    Podemos, sim, Senador Delcídio- usei o seu nome para esse exemplo agora -, podemos, sim, questionar o uso que essa engenharia financeira teve por parte do Governo.

    Na minha opinião, Senador Delcídio, faltou ao Brasil um projeto nacional, um projeto de desenvolvimento econômico, um projeto de industrialização, mas eles mantiveram políticas sociais, saúde, educação, previdência e bolsas compensatórias.

    Ótimo, eu apoio isso, mas eu questiono a ausência de um projeto nacional de desenvolvimento, ontem e hoje também. Agora, esse pessoal do dinheiro não pensa em emprego, educação, vidas, não pensa em desenvolvimento econômico e nem social; pensa nos juros e nos lucros, na ganância e na usura.

    Senador Lindbergh, no plenário, um projeto seu, colocando entre as obrigações do Banco Central não apenas a garantia e a valorização da moeda, mas também a obrigação em manter empregos e assegurar o desenvolvimento do País, está engavetado neste raio de Senado Federal há anos! Por que engavetado? Por que a Mesa segura e não abre o debate para o Plenário, mudando a competência do Banco Central, tirando o Banco Central dessa visão neoliberal do domínio do capital financeiro no Brasil e no mundo, e não agrega uma visão social própria ao Estado social, que surge depois da Segunda Guerra com a derrota do Nazismo?

    Esse é o meu relato do que aconteceu.

    O Tribunal de Contas está julgando e dando um parecer sobre o aspecto formal, uma mera formalidade. Tem gente querendo impedir que uma Presidenta eleita democraticamente seja afastada em razão dessa formalidade. É isso que estamos vendo, não mais e não menos.

    Eu penso ter explicado de uma forma correta essa estranha comoção em torno de uma formalidade contábil e administrativa da República, uma formalidade recorrente em diversos governos.

    Hoje eu lia que Delfim Netto dizia que não começou com Fernando Henrique. Vinha de muito antes essa contabilidade criativa, essa engenharia financeira na República, em benefício do povo, das políticas sociais e tentando iludir a pressão absurda do capital financeiro e dos juros fantásticos contra o País.

    Agora, isso tudo virou crime gravíssimo e nós, parece que não temos nada mais importante, Senador Lindbergh, para nos ocuparmos.

    Eu espero ter esclarecido esse aspecto. Não se confunde esse problema da engenharia financeira da República com os problemas de Mensalão, com os problemas de Lava Jato. São coisas de natureza completamente diferente.

    Concedo um aparte ao Senador Telmário.

    O Sr. Telmário Mota (Bloco Apoio Governo/PDT - RR) - Senador Requião, V. Exª ir à tribuna desta Casa, do alto da responsabilidade que V. Exª tem com este País, com este Parlamento, dos cargos públicos que V. Exª já ocupou, para V. Exª colocar o seu nome, o seu conhecimento, fazer uma explicação técnica, política e com muita responsabilidade, V. Exª está prestando um grande serviço à nação brasileira. Eu não podia esperar outra coisa do homem público que é o Senador Roberto Requião, um homem que orgulha o Paraná, orgulha esta Casa e orgulha o Brasil. Nós temos hoje poucos homens públicos neste País que servem de referência para o povo brasileiro. Sem nenhuma dúvida, a fala de V. Exª, somada à fala de tantos outros Senadores que já ocuparam esta tribuna, baliza o Brasil. Estão fazendo tempestade em copo d'água, tentando fazer de um limão uma limonada, ou tentando, mais do que isso, macular a Presidente Dilma para que as pessoas que não entendem tecnicamente que esse é um parecer, um parecer fundamentado em atos políticos, porque tecnicamente o próprio Tribunal de Contas da União já aprovou outras contas com esse mesmo procedimento. Então, não havia ali, naquela Casa, nenhum precedente nesse sentido. Ao contrário, abriram um novo procedimento. Então, quero parabenizar V. Exª pelo seu discurso nesta quinta-feira. Eu que sempre fui um grande admirador do Senador Requião, do Governador, do Parlamentar, do rebelde, do homem democrático termino a minha fala aplaudindo V. Exª.

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco Maioria/PMDB - PR) - É um prazer que eu tenho em receber os elogios e o aparte desse Senador, um verdadeiro black bloc aqui no plenário do Senado.

    Eu farei um comentário sobre esse clima que nós estamos vivendo. Eu colocaria esse comentário na boca da nossa Presidente da República com o seu recente bom humor.

(Soa a campainha.)

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco Maioria/PMDB - PR) - Estão tentando engarrafar o vento para posteriormente provocar uma tempestade.

    Senador Delcídio, com prazer lhe concedo um aparte.

    O Sr. Delcídio do Amaral (Bloco Apoio Governo/PT - MS) - Senador Requião, é muito pertinente o discurso de V. Exª, e um discurso didático, porque coloca essa questão no dia a dia de qualquer cidadão comum, o dia a dia de uma família. V. Exª até citou o meu nome, dando um exemplo de uma filha que precisaria de um atendimento médico e os procedimentos que qualquer pai, qualquer mãe normalmente adotaria numa situação como essa.

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco Maioria/PMDB - PR) - Renegociando a dívida, mas garantindo a saúde da filha.

    O Sr. Delcídio do Amaral (Bloco Apoio Governo/PT - MS) - Sem dúvida nenhuma. E importante, deixando muito claro que esse assunto não tem nada a ver com outros temas que fazem parte do dia a dia, do noticiário, da política brasileira e do Judiciário brasileiro também.

(Soa a campainha.)

    O Sr. Delcídio do Amaral (Bloco Apoio Governo/PT - MS) - Portanto, meu caro Senador Requião, eu queria só fazer um registro, até enfatizando a fala de V. Exª. Quando houve essa votação do TCU, Senador Lindbergh, a impressão que estavam querendo passar era a seguinte: o mundo acabou, acabou ontem, com 8 a zero. Na verdade, fazendo uma analogia, como V. Exª também fez, Senador Requião, em um discurso muito pertinente, aliás, o que não me surpreende pela experiência e pela qualidade intelectual que você V. Exª tem, o posicionamento do TCU, Senador Lindbergh, Senador Lobão, é igual à consultoria jurídica de uma empresa. Vai um projeto para os seus diretores aprovarem, a consultoria jurídica emite...

(Interrupção do som.)

    O Sr. Delcídio do Amaral (Bloco Apoio Governo/PT - MS) - ...a sua opinião. Os diretores vão deliberar sobre aquele projeto, vão receber esse posicionamento da consultoria jurídica da companhia, da empresa, mas não necessariamente vão seguir à risca o que a consultoria jurídica propôs sem cometer, meu caro Presidente, Senador Telmário, nenhuma ilegalidade. Esse caso do TCU é muito parecido com uma empresa. É claro que eu estou dando um exemplo bem mais simples, como o exemplo de uma família. O que o Senador Requião colocou aqui, é o seguinte: o TCU está oferecendo, como órgão de fiscalização e controle - o Senador Lobão, que já foi presidente de conselho de várias empresas, sabe o eu estou falando -, o TCU está oferecendo para o Congresso e para a Comissão de Orçamento, comandada brilhantemente pela Senadora Rose de Freitas, uma contribuição. Mas a decisão é da Comissão de Orçamento e é do Congresso. Então, tem que deixar bem claro isso, porque, na verdade, o Tribunal de Contas da União... O Senador Requião foi muito feliz naquilo que disse. Ele fez uma avaliação e colocou a sua posição. Agora, isso que o TCU aprovou vai ser utilizado como referência? Vai. Mas dentro da maior naturalidade, como já aconteceu com outras contas de governo que vieram para cá. Aliás, hoje o Deputado Ricardo Barros, que é do Paraná também, estava dizendo que... Eu vou dar um exemplo que a gente viveu aqui, minha querida Senadora Rose de Freitas: obras inacabadas. Vários pareceres do Tribunal de Contas da União simplesmente mandavam encerrar as obras. E o Congresso teve o discernimento, à luz da legalidade, de buscar soluções técnicas para essas questões e dar sequência a projetos que eram, ou que são e serão de extrema relevância para o nosso País. Então, a contribuição do TCU, importante, técnica, dentro de preceitos que pautam o posicionamento do TCU, vai servir de subsídio para o relator ou relatora que a Senadora Rose de Freitas vai indicar, que tem até 40 dias para apresentar o seu relatório, depois mais 15 dias para apresentação de emendas, mais 15 dias para o relator ou relatora apresentar o seu parecer. Portanto, nós temos que dar um tratamento sereno, entendendo claramente a posição do Congresso e esses vários exemplos que foram dados durante a tarde de hoje no Senado Federal. Queria só deixar esse registro, Senador Requião, e parabenizá-lo pelo competente discurso feito nesta tarde.

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco Maioria/PMDB - PR) - Senador Delcídio, nós estamos diante de uma contradição muito grande, de um embate entre o Estado social, Senador Lobão, que surgiu no pós-guerra, o Estado que respeita direitos, que garante direitos trabalhistas, direitos humanos, e a volta do domínio do capital, a precarização do Estado com a valorização dos bancos centrais - o Estado passa a ser um Estado gendármico, cuidando da segurança -, a precarização dos parlamentos, com o domínio do capital no financiamento de campanhas e de partidos - não há mais ideologia, são prepostos do capital que os elegeu - e a precarização do trabalho.

    Temos no Congresso Nacional, tramitando, a terceirização, e agora, na Câmara, um projeto que estabelece que acordos coletivos são mais importantes do que a legislação, isso num momento de desemprego.

    Mas vamos além disso. Dizem-me que agências de risco e o próprio Ministro Levy, com qual política eu não concordo de forma alguma, estão pedindo ao Congresso a aprovação da Lei Antiterror. Lei Antiterror, revogação da CLT e arrocho fiscal. Eles querem conter a indignação do povo, que está aumentando a cada dia com o caos causado na nossa economia, aumento do desemprego, 40% a menos de automóveis produzidos no último mês. Nós não vamos bem na condução da economia. Eu acho que nós precisamos mudar a orientação econômica, mas esse embate não é de agora.

    Informavam-me hoje antigos funcionários do Senado que, na época da Constituinte...

    A Constituinte, Senador Lobão, V. Exª, que tem experiência, porque nós dois somos os velhos aqui neste plenário. A nossa Constituição estabeleceu que tinham duas rubricas intocáveis na Constituição inicialmente: era o pagamento do pessoal e a transferência para os Estados.

    Então me disse essa funcionária que a visão dependentista, a visão que valoriza mais o capital do que a vida, o trabalho e o desenvolvimento em função das populações, esta visão, representada à época pelo Senador José Serra, introduziu na Constituição a inviolabilidade da rubrica destinada aos serviços da dívida. Passou a ser, junto com o pessoal e a transferência para os Estados, intocável. Posteriormente, Senador Lobão uma emenda constitucional incluiu a Previdência também nisso. Mas na época da Constituinte foi assim.

    Então é um debate entre duas ideias. E eu estou na linha do Papa Francisco: o capital é importantíssimo quando é investido, cria empregos, produz bens, viabiliza o avanço da tecnologia, mas o capital não pode dominar a sociedade humana. E isso vem da Bíblia, não apenas do Papa. Não se pode servir a Deus e a Mamom ao mesmo tempo. E Mamom em hebraico não é outro Deus. Mamom em hebraico é apenas a palavra que significa dinheiro. Nós estamos vendo uma tentativa progressiva de escravizar os governos à lógica do capital financeiro, do capital voraz, do capital à busca de lucros desesperados. É essa situação que nós estamos enfrentando.

    Presidente, eu quero, já que avancei tanto no tempo, pedir licença...

    O Sr. Edison Lobão (Bloco Maioria/PMDB - MA) - V. Exª permite uma ligeira intervenção?

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco Maioria/PMDB - PR) - Como não, Senador Lobão?

    Com prazer.

    O Sr. Edison Lobão (Bloco Maioria/PMDB - MA) - Em primeiro lugar, Senador Requião, para cumprimentá-lo pela coragem de não se omitir. Nessa hora e nesses assuntos, de um modo geral, as pessoas se omitem e cometem um pecado. O Padre Antônio Vieira, que esteve por muitos anos no Maranhão, lamentava o pecado da omissão. E V. Exª não comete esse pecado. Eu só posso, portanto, exaltar a sua coragem e os esclarecimentos que traz a esse assunto que tomou conta - temos que reconhecer - da opinião pública de maneira deformada. Ainda há pouco, Senador Requião, V. Exª dizia que outros governos procederam do mesmo modo. Eu quero só lembrar a V. Exª, interrompendo muito rapidamente seu belo discurso, que, há 60 anos, tentou-se o impeachment de Getúlio Vargas, citando-se como fundamento uma questão semelhante a essa em torno da qual se faz hoje tanta atoarda. Parabéns a V. Exª.

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco Maioria/PMDB - PR) - Sr. Presidente, eu encerro a discussão deste tema, mas peço licença a V. Exª, a tolerância que de vossa parte é proverbial, para rapidamente apresentar ao Plenário um projeto que estou trazendo à Mesa agora.

    Eu leio alguns parágrafos da justificativa.

(Soa a campainha.)

    O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco Maioria/PMDB - PR) - Diversos Estados, e o Distrito Federal também, concedem benefícios fiscais a pessoas jurídicas, em grande parte, às vezes mediante crédito presumido de ICMS, buscando atrair investimentos para os seus territórios. Ao fazê-lo, os Estados e o Distrito Federal abrem mão de parcela de sua arrecadação, arrecadação fiscal, pela captação de negócios, geração de empregos, fomento da indústria local e desenvolvimento regional.

    No entanto, a União - o Joaquim Levy, de novo, Senador Raimundo Lira; de novo, o Joaquim Levy, sempre recorrente -, interpretando os referidos incentivos fiscais como acréscimo patrimonial das empresas, entende que sobre eles incidem os seguintes tributos federais: IRPG, CSLL, contribuição ao PIS e COFINS, respectivamente, as alíquotas de 25%, 9%, 1,65% e 7,6%; ou seja, no total 43,25%.

    Eu estou apresentando um projeto singelo, simples, que veda à União tributar os ganhos decorrentes de renúncias fiscais dos Municípios.

    Está se estabelecendo um pânico com essa voracidade fiscal da política econômica do Governo Federal. Ao mesmo tempo em que mostramos ao Plenário que esse problema levantado pelo Tribunal de Contas é uma questão singela de engenharia financeira que não prejudica ninguém, ninguém se apropriou de recurso público, temos que assumir a nossa obrigação de proteger a nossa economia de base, a nossa indústria, da voracidade da fiscalização da política econômica do Governo Federal.

    Obrigado, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/10/2015 - Página 207