Discurso durante a 201ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Insatisfação com a situação do sistema carcerário do País.

Autor
Lasier Martins (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RS)
Nome completo: Lasier Costa Martins
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA:
  • Insatisfação com a situação do sistema carcerário do País.
Aparteantes
Garibaldi Alves Filho, João Capiberibe.
Publicação
Publicação no DSF de 12/11/2015 - Página 314
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA
Indexação
  • COMENTARIO, PRECARIEDADE, SITUAÇÃO, SISTEMA PENITENCIARIO, MOTIVO, EXCESSO, QUANTIDADE, PRESO, REGISTRO, COMISSÃO, INFRAESTRUTURA, SENADO, REALIZAÇÃO, AUDIENCIA PUBLICA, OBJETIVO, DEBATE, MATERIA, DEFESA, IMPORTANCIA, GARANTIA, EDUCAÇÃO, TRABALHO, INSTRUMENTO, INTEGRAÇÃO SOCIAL.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado.

    Sr. Presidente Dário Berger, Senadores, Senadoras, telespectadores, ouvintes da Rádio Senado, nesta época de proliferação da criminalidade pelo Brasil, nas capitais e, em particular, no meu Estado do Rio Grande do Sul, venho à tribuna para falar sobre o problema carcerário.

    Há coisa de umas três semanas, pasmem todos, os Juízes da região metropolitana colocaram na rua cerca de 500 sentenciados que estavam em condições de acessar a progressão de regime. Isso aconteceu porque não há albergues, não há estabelecimentos, no Rio Grande do Sul, onde os condenados possam seguir a progressão de regime.

    Então, o que está acontecendo, Srs. Senadores, é que os sentenciados estão sendo colocados diretamente do fechado na rua porque há uma carência de vagas, em torno de duas mil vagas, para sentenciados em regime semiaberto no Rio Grande do Sul.

    Então, também por isso foi que propus, por meio de um requerimento, que levou o nº 49, uma audiência na Comissão de Infraestrutura para que viesse, como vieram, o Sr. Renato De Vitto, Diretor-Geral do Depen (Departamento Penitenciário Nacional), com o intuito de nos trazer informações a respeito das condições físicas dos presídios gaúchos, do Brasil e da infraestrutura no sistema prisional brasileiro.

    A audiência requerida e realizada aconteceu na última terça feira, dia 4 de novembro, e teve também a presença do Sr. Lourival Gomes, Secretário da Administração Penitenciária do Estado de São Paulo e Presidente do Fórum dos Secretários de Administração Penitenciária.

    Em sua apresentação, o Diretor-Geral do Depen, Renato De Vitto, trouxe informações muito importantes, que seriam oportunas para a atualização de todos.

    O dado primeiro é de junho do ano passado, informando que atualmente o Brasil possui 607 mil pessoas privadas de liberdade, possui 607 mil presos, sendo que 27 mil deles estão em carceragens de polícia. O sistema prisional tem, porém, apenas 376 mil vagas, ou seja, existe um déficit no País de 231 vagas para delinquentes. Isso resulta em uma taxa de ocupação dos presídios brasileiros de 161%. Além disso, no Brasil, a taxa de aprisionamento é de 300 presos por 100 mil habitantes, enquanto que, no mundo, essa taxa é de 144 por 100 mil habitantes. O Brasil, portanto, Srs. Senadores, tem delinquentes demais.

    Também é significativo o aumento da população carcerária. Passou de 90 mil presos, em 1990, para 607 mil, atualmente, com um aumento de 575%, em 24 anos.

    Em relação às mulheres, o aumento também foi expressivo. Eram 5 mil presas, no ano 2000; hoje são 37 mil mulheres encarceradas.

    Assim, temos a quarta maior população carcerária do mundo. O Brasil é hoje o quarto País em número de presos. Nos últimos 15 anos, foi a população que teve a segunda maior taxa de crescimento, atrás apenas da Indonésia.

    Os Estados Unidos são o país com mais presos no Planeta. Com 320 milhões de habitantes, têm 2,2 milhões de presos; enquanto que o Brasil tem 200 milhões de habitantes e 607 mil presos. Proporcionalmente, Sr. Presidente, o Brasil detém quatro vezes mais presos, em relação ao número de habitantes, na comparação com os Estados Unidos.

    É significativo observar que, nos últimos seis anos, o Brasil vai na contramão do que acontece com outros países. Aqui a taxa por 100 mil habitantes cresceu 33%; enquanto isso, ela se reduziu nos Estados Unidos, China e Rússia. Em outras palavras, Senador Reguffe, o Brasil, entre os principais países populacionais, aquele em que mais tem crescido o número de delinquentes presos.

    Segundo o Sr. Renato De Vitto, Diretor-Geral do Depen:

Os Estados Unidos vivem um momento de coalizão entre progressistas, conservadores, republicanos e democratas, que constataram que nem o maior PIB do mundo é capaz de dar conta de um ritmo de encarceramento tão veloz e com um custo social que envolve não só o custo do pagamento da alimentação e dos serviços ao pessoal que está preso, mas um custo indireto, seja para todo o sistema de justiça e de segurança pública, seja para a economia, imobilizando uma parcela significativa da população economicamente ativa do país.

    Além disso, é preciso observar o perfil dos presos no Brasil. São jovens, 56% com até 29 anos de idade. Repito: no Brasil, os presidiários são 56% até a idade de 29 anos; uma super-representação da população negra, o que já é bastante sabido; e uma população com baixo acesso ao estudo. Apenas 8% da população prisional tem o ensino médio, enquanto que, na população brasileira, esse dado é de 30%.

     Em relação aos crimes que levam as pessoas ao encarceramento, temos, em primeiro lugar, aquilo que todos os brasileiros sabem: o tráfico de drogas - 27%, em dados nacionais, mas, em alguns Estados, esse índice é ainda superior. Por exemplo: o secretário de Segurança de São Paulo informou que o índice de presos por tráfico de drogas no seu Estado é de 38%. Já o segundo dado nacional diz respeito aos presidiários por roubo, 21%; furto, 11%; e homicídio, responsável por 14%.

    Mas há uma diferença entre homens e mulheres: 68% das mulheres estão presas por tráfico. Isso dá a entender, Senador Capiberibe - é uma dedução possível -, que a crise econômica, o desemprego, está levando as mulheres a entrarem no tráfico de drogas...

(Soa a campainha.)

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - ... 68% das mulheres estão presas por tráfico

    O Sr. João Capiberibe (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) - Senador Lasier, V. Exª me permite um aparte?

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Pois não, Senador Capiberibe.

    O Sr. João Capiberibe (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) - Senador Lasier, esses dados são assustadores. Nós temos a quarta população carcerária do Planeta. E, quando há uma decomposição desses dados, vamos descobrir que 68% das mulheres estão presas por tráfico de drogas e 27% dos homens, e 56% são jovens até 29 anos. Não será a política, a legislação que nós fizemos, que está equivocada? Porque essa é a política do encarceramento. Há outras formas de punição que a gente poderia observar. Outra questão: eu tenho uma curiosidade, até porque lá meu Estado temos uma população carcerária grande também, resguardado o tamanho da nossa população.

(Soa a campainha.)

    O Sr. João Capiberibe (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) - E lá, por exemplo, não há nenhum preso por sonegação de imposto e nem por corrupto. Nenhum corrupto! Eu lhe pergunto: no Rio Grande do Sul, poder-se-ia citar algum caso, entre esses 606 mil detentos, de quantos estão lá presos por sonegação fiscal ou por corrupção? Tirando o Paraná!

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Sim, o Paraná, graças ao trabalho extraordinário de Sérgio Moro, está se distinguindo como um Estado diferenciado, por seu Judiciário diferenciado.

    Senador Capi, eu não tenho conhecimento de que algum sonegador esteja na cadeia no Rio Grande do Sul. Nem que algum corrupto esteja na cadeia. No Paraná, nós sabemos que há muitos.

    Agora, exatamente esses números, Senador Capi, nos sugerem um estudo sociológico...

(Soa a campainha.)

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - ... para saber por que acontecem esses índices tão exorbitantes a respeito do aprisionamento.

    Agora, as drogas são um dos fatores que têm piorado as condições do sistema carcerário. E o pior: a maioria dos traficantes não são os magnatas do tráfico; são os varejistas da droga, são os "mulas", como se chamam, os "vapozeiros".

    Inclusive, em razão dessa audiência pública que tivemos na semana passada na Comissão de Infraestrutura, tão bem presidida pelo nosso estimado Senador Garibaldi, telefonei para Porto Alegre, falei com o Juiz das execuções, um brilhante Juiz chamado Sidinei Brzuska.

(Soa a campainha.)

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Ele me disse que 60% dos presos por tráfico de drogas são exatamente os varejistas, os pequenos, aqueles que ficam na porta de bares, de colégios, vendendo aqui um crackzinho, uma maconhazinha, etc. - 60% dos presos são esses.

    O Sr. Garibaldi Alves Filho (PMDB - RN) - Senador Lasier, um aparte.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Senador Garibaldi, com muito prazer, quero ouvi-lo.

    O Sr. Garibaldi Alves Filho (PMDB - RN) - Bem, primeiro, eu quero dar o meu testemunho do empenho de V. Exª no sentido de que nós tivéssemos a realização dessa audiência pública, que contou, como disse V. Exª, com a presença de dois ilustres convidados: o Dr. Lourival, que representou os secretários de segurança penitenciária...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Garibaldi Alves Filho (PMDB - RN) -... do País, e também do Diretor do Depen. E chegamos a conclusões estarrecedoras, conforme o relato de V. Exª. E eu posso até, no meio desse estarrecimento todo, dizer que, infelizmente, a maior taxa de ocupação dessas penitenciárias inseguras está na nossa região nordestina, não na região de V. Exª, a despeito de os presídios lá também terem uma situação da maior insegurança. É que a taxa de ocupação de Pernambuco está em 265%, e, no meu Rio Grande do Norte...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Garibaldi Alves Filho (PMDB - RN) - ... chega a 157%. Obviamente que esse crescimento precisava ter sido acompanhando de investimentos, o que não aconteceu. Pelo contrário, no caso do Rio Grande do Norte, nós tivemos, na Penitenciária Estadual de Parnamirim, na Grande Natal, celas depredadas, colchões queimados. Tivemos diversas rebeliões. Houve destruição, por parte dos rebelados, de mil vagas divididas entre presídios como o de Alcaçuz, o de Parnamirim e o de Natal. Isso tudo fez com que o governo do Estado fosse levado a ...

(Interrupção do som.)

    O Sr. Garibaldi Alves Filho (PMDB - RN) - ... um estado de calamidade pública, que persiste no Rio Grande do Norte. Então, Senador Lasier, a nossa Comissão, graças a V. Exª, debruçou-se sobre essa situação, e não há como deixar de observar que medidas precisam ser tomadas urgentemente com relação às audiências de custódia. Será que não podem ganhar uma maior proporção? E isso está sendo proposto pelo Supremo Tribunal Federal, pelo próprio Presidente Lewandowski. E a monitoração eletrônica não será, também, uma alternativa viável?

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

    O Sr. Garibaldi Alves Filho (PMDB - RN) - Então, diante da advertência do nosso Presidente, eu vou me calar por hora, mas dizendo a V. Exª que esse assunto precisa ser realmente abordado insistentemente nesta Casa.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Muito obrigado, Senador Garibaldi, por sua contribuição, que ilustra bem o que é a grave crise do sistema carcerário e diante de um Brasil de tanta criminalidade. Foi oportuno que V. Exª mostrasse que no Rio Grande do Norte também essa deficiência prisional é muito grande.

    Então, imaginem todos o que existe entre esses nossos dois rio grandes: o do Sul e o do Norte, quando sabemos que, em capitais como a do Paraná, a do Rio, a de São Paulo, a criminalidade também é muito acentuada, e os presídios são deficientes e deficitários.

    E há ainda um item, se me permite, Presidente Dário, que diz respeito à educação, matéria relevante em qualquer discussão que se faça no Brasil.

    Apenas 10% dos presos do Brasil têm acesso à educação - apenas 10%! -, que é um dever do Estado, pela Lei de Execução Penal, pelo menos a educação primária; e 16% dos presos trabalham - a grande maioria ou quase todos - em trabalho interno: na faxina dos presídios e na cozinha dos presídios.

    Então, são muitos os problemas, são dados que demonstram que o brasileiro não tem conseguido investir em política de reintegração social dos presos, de uma parte porque não têm educação, de outra parte porque não há trabalho para eles.

(Soa a campainha.)

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Então, é importante entender que a educação e o trabalho como um instrumento importante de reinserção social, abrindo uma janela para que esse sujeito tenha alguma opção de não voltar à vida do crime, não reincida e não volte a alimentar esse ciclo do sistema penitenciário.

     O Sr. Renato De Vitto, que esteve na nossa Comissão, observou por fim, com muita propriedade, que o aumento do número de pessoas encarceradas não resultou na percepção de segurança que as pessoas têm. Ele advoga a ênfase na adoção de penas alternativas, como propôs há pouco aqui o Senador Capiberibe, haja vista que facções criminosas operam dentro dos presídios e recrutam jovens dentro do sistema carcerário.

    Já o Sr. Lourival Gomes, Secretário de Segurança de São Paulo, observou que são números assustadores...

(Soa a campainha.)

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - ... que temos de enfrentar e não podemos ignorá-los.

    É lógico que tem de haver programas de substituição da pena de encarceramento, mas - toda ênfase que merece a declaração do Secretário da Segurança de São Paulo - disse ele e devemos dizer o tempo todo: não podemos deixar de lado a construção de prisões, já que não há outro jeito, diante da criminalidade que se dissemina pelo País todo. Se faltar moradia, nós temos de construir casas; se faltar vagas nas prisões, nós temos de construir prisões, senão, o delinquente segue infernizando a vida das pessoas de bem em todo o Brasil.

    Destacou ele, também, o problema dos presos estrangeiros. O Estado de São Paulo, Senador Alvaro Dias, tem dois terços dos presos estrangeiros de todo o Brasil e, por isso, reivindicou que todos os presos condenados exclusivamente pela Justiça Federal estejam em prisões federais, porque a execução da pena é feita por juiz federal. Isso aliviaria um pouco os presídios estaduais.

    A partir das apresentações desses dois brilhantes expositores do sistema carcerário que estamos trazendo aqui, pela oportunidade de tantos crimes no País, cabem algumas perguntas. Por que será que, de 2008 até hoje, aumentou tanto o número de presos? Será que isso tem a ver com a questão social e econômica? É aquilo que também arguiu há pouco, aqui, o Senador Capiberibe. Isso merece estudo, Senador Aloysio. Está aumentando extraordinariamente a criminalidade do Brasil. Será que é a polícia que está trabalhando, quando sabemos das deficiências dos policiais? Ou será pelo declínio da condição econômica e social...

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

    O SR. PRESIDENTE (Dário Berger. PMDB - SC) - Senador Lasier...

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Outro item para concluir.

    O SR. PRESIDENTE (Dário Berger. PMDB - SC) - Se V. Exª puder...

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - É um item irônico.

    O SR. PRESIDENTE (Dário Berger. PMDB - SC) - ...porque há vários Senadores inscritos.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Perfeito. Estou concluindo. O tema é muito grande, mas estou concluindo.

    V. Exª sabe, Senador Dário Berger, que a primeira fonte que sustenta o sistema carcerário vem das loterias? Isso me permite concluir dizendo o seguinte: o sistema carcerário brasileiro é lotérico.

    Obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/11/2015 - Página 314