Discurso durante a 207ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Cobrança de um maior empenho do Governo Federal para tratar o problema da escassez de água na Região Nordeste.

Autor
Benedito de Lira (PP - Progressistas/AL)
Nome completo: Benedito de Lira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MEIO AMBIENTE:
  • Cobrança de um maior empenho do Governo Federal para tratar o problema da escassez de água na Região Nordeste.
Aparteantes
Cristovam Buarque.
Publicação
Publicação no DSF de 20/11/2015 - Página 62
Assunto
Outros > MEIO AMBIENTE
Indexação
  • REGISTRO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, REGIÃO NORDESTE, MOTIVO, VOLUME, RECURSOS HIDRICOS, AUSENCIA, CHUVA, ENFASE, IMPACTO AMBIENTAL, SITUAÇÃO ECONOMICA, REGIÃO, CRITICA, FORMA, RESOLUÇÃO, PROBLEMA, REGIÃO SUDESTE, COMPARAÇÃO, REGIÃO SEMI ARIDA, SOLICITAÇÃO, APOIO, GOVERNO FEDERAL, OBJETIVO, MELHORIA, CRISE, SECA, ECONOMIA, AGRICULTURA, LOCAL.

    O SR. BENEDITO DE LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidenta Gleisi Hoffmann, meus caros Senadores e Senadoras, eu estou ocupando a tribuna, na tarde de hoje, para dar continuidade às manifestações que tenho feito aqui, ao longo deste meu mandato, no que diz respeito ao que está acontecendo na minha Região Nordeste do Brasil.

    Este País pode até imaginar que não deve nada ao Nordeste, mas deve muito. Pela migração, ajudamos a construir os grandes centros desenvolvidos no nosso País.

    Sr. Presidente, quero falar sobre a história das secas no Nordeste, as intervenções humanas para enfrentar esse fenômeno da natureza e a maneira como hoje nos preparamos para alcançar a tão sonhada sustentabilidade perante as estiagens.

    Dois pontos de vista sobre o Brasil têm imperado ao longo dos séculos, duas abordagens de natureza econômica têm norteado as ações dos governantes para o desenvolvimento econômico e social do País: uma, para o Nordeste, e, outra, para o Sul e Sudeste. Com escassas semelhanças com a abordagem feita para o Norte e o Centro-Oeste, a região nordestina tem sido vítima de cíclicas improvisações.

    Eu peço a atenção das Srªs e dos Srs. Senadores para o fato de que, se não resolvidos os problemas de desenvolvimento social e humano daquela região, estamos condenados a perpetuar desigualdades. E, sendo o Senado Federal a Casa que, por excelência, tem olhos para a Federação, é daqui que devem partir as críticas mais consolidadas contra a geração de desigualdades regionais; é daqui que devem ser desenhadas as estratégias mais adequadas para o verdadeiro desenvolvimento sustentável de nossa Nação.

    Eu gostaria, Sr. Presidente, de poupar-lhes da lenda das joias da coroa de D. Pedro II, mas não é possível, porque esse paradigma - não obstante o senso de caridade de nosso Monarca - balizou as ações do governo central brasileiro por séculos e não tem mudado nas últimas décadas. Tem sido sempre assim: para outras regiões do País, maciços investimentos para infraestrutura, industrialização, serviços, educação, tecnologia; para o Nordeste, a caridade de algumas obras contra as secas, para socorro imediato.

    Em primeiro lugar, vamos olhar para o Brasil como um todo, para poder traçar distinções entre o modo de resolver as questões. Do ponto de vista da disponibilidade de água, sabemos que, em nosso País, nobre Senador Elmano, que é da mesma Região, concentram-se 12% de toda a água doce do Planeta e que nossas três grandes bacias hidrográficas - as dos Rios São Francisco, já em situação de precariedade, Paraná e Amazonas - são as grandes depositárias dessa riqueza. Entretanto, além do descompasso na natural distribuição dessas águas, há outro pior: o da falta de planejamento governamental a longo prazo.

    A Região Norte, que abriga menos gente, é o berço da maior bacia hidrográfica do Planeta; já o Semiárido nordestino sempre esteve associado à estiagem; por sua vez, o Sudeste, ainda que rico em águas, sofre com a má gestão de seus recursos hídricos. Para além das questões geográficas - das quais não podemos nos abstrair - e da virtual aleatoriedade da providência divina, há elementos de ponderação sobre as desigualdades.

    A diferença, mais uma vez brutal e excludente, é a maneira como o Governo Federal se debruçou sobre a resolução da crise hídrica do Sudeste e o modo como secularmente deixa nordestinos à míngua.

    Por outro lado, para o Nordeste, sempre são atribuídos problemas ao clima, ou a resolução da seca a Padre Cícero. O mesmo não ocorre com São Paulo, com o Rio de Janeiro e com Minas Gerais, abundantes em chuva. Entretanto, na hora de reconhecer a responsabilidade do Governo Federal para socorrer cariocas e paulistas, a resposta foi bem mais rápida. Não é que o Palácio do Planalto não tenha atribuições para garantir a segurança hídrica do Sudeste. Ele as tem, sim, mas as tem também para o Nordeste. Ocorre que, enquanto vimos meios de comunicação cujas bases estão no Sudeste olharem com fatalismo para a estiagem nordestina, eles reclamam urgência e recursos para resolver a carência de água ou a falta d'água em São Paulo.

    Em determinado momento da história deste País e do Nordeste, na estiagem, nobres Senadores, meu caro Elmano, sempre fomos tratados como se houvesse uma indústria da seca no Nordeste. Infelizmente, não é o nordestino que programa as ações. É o Governo que estabelece as ações para atendimento da estiagem em regime de urgência. Isso se dá em regime de urgência, meu amigo. A urgência acontece todos os anos, e, infelizmente, nós sempre fomos tratados dessa forma.

    Aconteceu um fato em São Paulo: a escassez de água. Houve uma revolução da imprensa nacional cobrando urgentes providências do Governo para minorar a dificuldade da falta d'água no Estado de São Paulo.

    Enquanto vemos Parlamentares e outros segmentos da sociedade não muito preocupados com o que acontece no Nordeste brasileiro ao longo de séculos - estão, realmente, preocupadíssimos com o que acontece nas Regiões Sul e Sudeste -, as águas do Rio São Francisco, o Rio da Unidade Nacional, fazem pena a quem o conheceu, como nós, nordestinos do Piauí, e a quem o conhece hoje, meu querido Senador gaúcho.

    Apesar das dificuldades do seu Estado, apesar das dificuldades econômicas que o seu Estado atravessa, o Estado de V. Exª é um Estado rico e poderoso, é um Estado que ainda vai ter maior tempo para sair da crise, tenho certeza disso, até porque o gaúcho, na verdade, desenvolve aquele Estado também com a força do seu trabalho, com a sua capacidade, com a determinação que cada um tem.

    Pois bem, Sr. Presidente, também sou favorável a que os Governos Estaduais de São Paulo, do Rio de Janeiro e de Minas Gerais recebam recursos federais para resolver os problemas de abastecimento de suas grandes metrópoles, não apenas pela questão humana, mas também pelo fato de ali estarem situadas poderosas indústrias que produzem boa parte de nosso Produto Interno Bruto. Não, não somos contra quaisquer medidas técnicas ou financeiras da Agência Nacional de Águas para superar a crise hídrica. O que reclamamos é uma proporcionalidade de empenho, para resolver a escassez de água no Nordeste. Mas não só isso. Reclamamos a adoção de medidas para o desenvolvimento sustentável, de tal maneira que as secas não sejam a causa de tantos transtornos.

    Já vamos para o quinto ano de seca, se, infelizmente, não chover nos primeiros meses de 2016. E, com o fenômeno El Niño, é possível que essa escassez se prolongue por algum tempo. Então, nada mais urgente do que prover os Estados nordestinos, onde se localiza o Semiárido, pois a quase totalidade deste está nos territórios da Bahia, de Sergipe, de Alagoas, de Pernambuco, da Paraíba, do Rio Grande do Norte, do Ceará e do Piauí. Mas também chega ao território mineiro, onde está localizada parte do Semiárido.

    A questão hídrica no Brasil é tão séria, que, segundo levantamentos da ANA, 55% dos Municípios brasileiros podem sofrer déficit de abastecimento neste ano de 2015. Urge, pois, que as providências necessárias sejam adotadas para, ao menos, minorar o sofrimento dos brasileiros nordestinos.

    Entretanto, Srªs e Srs. Senadores, não podemos deixar de trazer à baila o fato de que não é apenas a estiagem que reduz a qualidade de vida dos brasileiros, estejam eles onde estiverem. É algo mais profundo, é o Índice de Desenvolvimento Humano, é a renda per capita, são as taxas de escolarização, são os anos de escolaridade média das pessoas com 15 anos ou mais, é a quantidade de vias terrestres para locomoção, é a quantidade de indústrias situadas nas distintas regiões do País. Essas são as grandes diferenças.

    Farei um próximo pronunciamento em que trarei mais detalhes. Continuarei a falar das estiagens seculares e do heroísmo com que os nordestinos as enfrentam. Particularmente, quero demonstrar que a precariedade econômica, a falta de preparo técnico e a ausência de estruturas é que causam o sofrimento dos que vivem no Semiárido.

    Por fim, Sr. Presidente, para encerrar, eu queria dizer que o Senado Federal está despertando, que as pessoas estão já conversando a respeito disso, porque isso não deve ser um fato isolado apenas para os que fazem a representação dos Estados nordestinos nesta Casa. Essa deve ser, nobre Senador Elmano, uma ação conjunta do Congresso Nacional.

    Essa é uma região que tem a segunda maior população do País, população que sofre, que enfrenta dificuldades. É a região também onde há o menor índice de escolaridade, o maior índice de fome, o maior índice de pobreza, mas também é uma região que contribui efetivamente com o desenvolvimento nacional. É uma região que tem, repito, a segunda maior população do País. Perdemos apenas para o Sudeste, que tem aproximadamente 80 milhões de brasileiros. O Nordeste, apesar de todas as dificuldades que lhe são apresentadas e que são enfrentadas por nós nordestinos, tem 53 milhões de brasileiros. Esses 53 milhões de brasileiros precisam, sem dúvida alguma, não de uma ação de emergência. Se fôssemos fazer uma avaliação, nobre Senador Donizeti, do dinheiro que este País já jogou nas emergências do Nordeste, veríamos que ele daria para reconstruir um novo Brasil.

    Infelizmente, nós não temos um planejamento, não fizemos um planejamento para essas regiões. No mundo inteiro, temos a consciência de que ninguém acaba com a seca, que é um fenômeno da natureza. Mas, hoje, muito mais do que ontem, temos condições de encontrar os caminhos, por meio da tecnologia, por meio de ações efetivas, por meio de investimentos maciços e de projetos tratados com seriedade, para uma convivência com a seca. A convivência com a seca é absolutamente normal e natural. Outros países que têm desertos, geleiras e ambientes como os do Nordeste brasileiro convivem com isso.

    Vou dar um exemplo, para encerrar. Fiz uma viagem a Israel.

 

    O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Antes de encerrar, o senhor me concede um apartezinho?

    O SR. BENEDITO DE LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - AL) - Com muito prazer.

    Na minha viagem a Israel, cheguei lá e encontrei um território inóspito, mas fiquei encantado com o que vi. Eu disse: "Aqui, na cidade, eu não quero ver mais isso." Lá não vi uma criança na rua, não vi um velho na rua. E, apesar de dizerem que lá há uma guerra permanente, não vi um policial na rua. Eu vi uma cidade organizada. Fui à zona rural. Ah, Donizeti, foi lá que fiquei boquiaberto com a capacidade daquele povo de Israel de praticar a agricultura, buscando água no mar para fazer agricultura, para alimentar a sua população.

    O que mais me chamou a atenção, nobre Senador Cristovam Buarque, foi que, além de eles produzirem no território israelense a agricultura para alimentar seu povo, eles têm ainda uma pauta de exportação da ordem de mais de US$5 bilhões. Ah, meu amigo, então o Brasil, que tem água, que tem sol, que tem um território extraordinário... É aquilo que diz Pero Vaz de Caminha: é um território em que tudo que se planta dá.

    Então, nobre Senador Donizeti, como já está chegando o final do meu tempo, vou conceder um aparte a V. Exª, porque não tenho dúvida de que seu aparte melhorará as minhas manifestações e meu pronunciamento. V. Exª tem o aparte, nobre Senador Donizeti.

    O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Senador Benedito de Lira, parabéns pelo seu pronunciamento! Tenho a visão de que quem não planeja não faz o importante, faz o urgente. As emergências, do meu ponto de vista, servem para duas coisas: primeiro, para que os oportunistas continuem explorando aqueles que deveriam ser beneficiados; segundo, para que aqueles continuem dependentes desses oportunistas. Então, a ausência de planejamento é algo que deixa a gente sem condição de fazer o importante, e a gente está sempre fazendo apenas o que é urgente.

    Penso que o constituinte brasileiro, quando instituiu o planejamento de quatro anos, através do PPA, talvez não tivesse essa dimensão naquele momento. Mas nós precisamos rever isso no Brasil, precisamos inserir na Constituição a questão do planejamento estratégico para longo prazo.

    Temos uma emenda no art. 165, uma PEC, para poder instituir a obrigatoriedade de planejamento com um horizonte de 30 anos. Acredito que assim poderemos ter uma visão mais ampla e poderemos constituir projetos de Estado, porque o que temos hoje são projetos de governo, o que não é bom para o País.

    O SR. BENEDITO DE LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - AL. Como Líder.) - Muito obrigado, nobre Senador Donizeti. V. Exª está na mesma estrada que eu. Tenho dito aqui, em outras oportunidades, que as emergências acontecerão, vão continuar acontecendo, porque não temos, realmente, um projeto de Estado. Se já tivéssemos instituído isso há algumas décadas, a situação hídrica do Nordeste brasileiro e a situação do seu povo não seriam o que são hoje.

    Por isso, Sr. Presidente...

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Permita-me um aparte, Senador?

    O SR. BENEDITO DE LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - AL) - Com muito prazer, nobre Senador Cristovam Buarque. É uma alegria muito grande ouvir V. Exª.

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Eu falo como nordestino, como o senhor. Creio que um dos nossos erros, nestes 50 anos de luta pelo desenvolvimento nordestino, foi o de termos considerado a possibilidade, Senador Elmano, que também é nordestino, de que era possível o desenvolvimento do Nordeste sem levar em conta o desenvolvimento geral do Brasil. E o desenvolvimento brasileiro que usamos nessas décadas é um desenvolvimento excludente, porque, mesmo quando inclui, inclui uma minoria de nordestinos, não a nação inteira nordestina. Nós esquecemos que o problema nordestino é um problema nacional. Eu acho que isso é fundamental. O Celso Furtado, quando trouxe a ideia do desenvolvimento nordestino, junto com Juscelino e depois junto com Jango, ele o fez porque, naquela época, a gente achava que o desenvolvimento brasileiro, se fosse seguido no Nordeste, chegaria lá. Esquecemos que o desenvolvimento brasileiro que escolhemos é para poucos, excludente. Por exemplo, em todos os planos de desenvolvimento do Nordeste, a educação recebeu pouco apoio. Está aqui um representante de Santa Catarina. Em Santa Catarina a educação sempre teve um papel fundamental até pela influência da imigração europeia. Nós precisamos colocar o problema nordestino como um problema da Nação brasileira, como um problema brasileiro, e não separado, como uma região à parte. Nós temos que buscar e liderar isso, os nordestinos, porque os sulistas, desculpem-me a expressão genérica de sulistas, consideram que já estão num projeto de desenvolvimento satisfatório.

(Soa a campainha.)

    O Sr. Cristovam Buarque (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Nós que temos que liderar, do ponto de vista de buscar solução. A solução virá do Brasil, e não isoladamente da nossa região. Por isso a sua última frase provocou a minha fala, quando o senhor falou da questão nacional, o Nordeste como questão nacional. É disso que a gente precisa.

    O SR. BENEDITO DE LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - AL) - Muito bem, Senador Cristovam. V. Exª tem realmente destino nordestino, sangue nordestino e ações nordestinas, porque, na verdade, é isto que temos dito sempre: o Brasil precisa se fazer harmonicamente, e não isoladamente. E só podemos ter desenvolvimento daquela região, que já sofreu demais, se tivermos um projeto de Estado.

    Muito obrigado, Sr. Presidente. Muito obrigado pela tolerância.

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/11/2015 - Página 62