Discurso durante a 210ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações acerca das eleições presidenciais na Argentina; e outro assunto.

Autor
José Serra (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/SP)
Nome completo: José Serra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL:
  • Considerações acerca das eleições presidenciais na Argentina; e outro assunto.
POLITICA INTERNACIONAL:
Publicação
Publicação no DSF de 25/11/2015 - Página 46
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL
Indexação
  • COMENTARIO, RESULTADO, ELEIÇÕES, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA, ENFASE, POSSIBILIDADE, MELHORAMENTO, ECONOMIA, PAIS.
  • DEFESA, ALTERAÇÃO, MODELO, PARTICIPAÇÃO, BRASIL, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), ENFASE, NECESSIDADE, MELHORAMENTO, ACORDO, COMERCIO, AMBITO INTERNACIONAL.

    O SR. JOSÉ SERRA (Bloco Oposição/PSDB - SP. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, a propósito do resultado das eleições na Argentina, eu queria dizer que, em circunstâncias diferentes, conheci os dois candidatos. Um foi o governador de Buenos Aires, o Scioli; o outro, o prefeito de Buenos Aires. Na minha avaliação, qualquer dos dois que ganhasse iria liquidar com o modelo Kirchner da economia argentina. A herança deixada é pesadíssima; a herança deixada pela Cristina Kirchner para o seu sucessor eu diria que é tão ou mais desastrosa do que a deixada pelo Lula para o Governo Dilma. Todos sabem da minha análise de que toda a perdição econômica brasileira teve precisamente a sua origem, a sua raiz a partir das políticas adotadas no câmbio, nos juros, no plano fiscal, a partir de 2008, no contexto da crise internacional. Os dois iriam romper com esse modelo.

    A inflação lá, a efetiva, chega a 37%, 38%, enquanto, Senador Caiado, o índice oficial está em 11%, 12%. Isso há muito tempo! A energia elétrica é tão subsidiada que há residências com piscina aquecida que pagam US$10, US$20 de energia elétrica por mês, e o Fisco, o Tesouro argentino é que cobre a diferença.

    É uma economia hipersubsidiada, isolada da economia internacional, da mesma maneira que o Brasil... E, nesse sentido, o Lula e o Kirchner foram perfeitos: ambos jogaram o bilhete premiado da bonança externa no vaso sanitário e puxaram a descarga. O governo Lula aqui queimou 100 bilhões de ganhos por aumento dos preços das nossas importações, na farra do consumo. Não foi para investimento, foi para quebrar a indústria brasileira.

(Soa a campainha.)

    O SR. JOSÉ SERRA (Bloco Oposição/PSDB - SP) - Aliás, o PT vai ter essa conotação para a história: foi o Partido da desindustrialização; nessa matéria, a nossa vanguarda do atraso.

    Mas eu quero pegar um outro argumento que aqui foi levantado pelo Senador Lindbergh a respeito do Mercosul. O Mercosul tem um problema muito importante, Sr. Presidente, e o Governo nunca entendeu isso. Até hoje continua sem entender, e eu verifico que, mesmo aqui nesta Casa, há muitas dúvidas a esse respeito. O Mercosul, erradamente, além de uma zona de livre comércio, é uma zona de união alfandegária.

    Ou seja, o Brasil não pode fazer acordos de livre comércio com ninguém sem carregar, no passado, Uruguai, Paraguai e Argentina, e depois, gloriosamente, a Bolívia e a Venezuela, essas potências econômicas.

    Muito bem, o que aconteceu no mundo? Quatrocentos, quinhentos acordos bilaterais de comércio. Quantos acordos fez o Brasil? Um, com Israel, e, para que o Senador Lindbergh, que é contrário a Israel, não reclamasse, não parecer que é uma política pró-semita, fizemos também um acordo de livre comércio com a Palestina, que ainda não tem moeda, mas, certamente, vai ter um mercado muito grande para essas parcerias, e com a potência econômica do Egito.

    O Brasil se isolou e de maneira sofisticada, porque nós temos a Presidência da Organização Mundial do Comércio. Na Presidência da Organização Mundial do Comércio, o Brasil defende a posição de extrema direita, reacionária, cocoroca, carcomida, de que só valem acordos multilaterais. Os Estados Unidos fazem o pacífico, porque a teoria ortodoxa do comércio internacional abomina acordos regionais, porque não é o livre comércio. Mas, para o Brasil, livre comércio. Resultado, não fazemos acordos bilaterais, o mundo inteiro vai fazendo, e estamos lá pagando salário de diplomatas na delegação,

(Soa a campainha.)

    O SR. JOSÉ SERRA (Bloco Oposição/PSDB - SP) - ... etc., para nada.

    Essa é uma posição, Sr. Presidente, reacionária, de direita. É de vanguarda do atraso não perceber que o Brasil tem que ter uma política comercial de exportações soberana. Seria como se a China fosse fazer uma união alfandegária com o Camboja, com Laos, os países respeitáveis, como o Brasil está fazendo. Nós temos três ou quatro vezes a economia argentina, quarenta, cinquenta vezes a economia uruguaia ou paraguaia, outro tanto a Bolívia, outro tanto a Venezuela, e não podemos fazer acordo bilateral de comércio.

    Quando eu era Ministro da Saúde nós enfrentamos interesses. Aliás, há uma particularidade do PT, uma antilei, como eu sempre menciono. Uma dessas antileis do PT é: PT no governo não compra briga de interesse, não confronta interesse. Não há nenhuma vez que eu tenha visto o Governo confrontar interesse. Tudo é prioritário, tudo tem que agradar. Lembro-me de quanto o Lula se gabou, viu, Senador Lindbergh, quantas vezes se gabou para mim, para a imprensa de que, no governo dele, nunca o sistema financeiro ganhou tanto dinheiro.

    Pois bem, essa é uma posição contra o bilateralismo, os acordos, atrasada. E o Brasil é a vanguarda do atraso. E eu vejo com pasmo o pessoal defender que não se mexa no Mercosul. Tem que mexer, sim, para que nós possamos fazer políticas comerciais.

    Quando eu era Ministro da Saúde, eu fui à Índia, e dizia: enfrentando laboratórios pelo lado das patentes, pelo lado dos genéricos. Íamos abrir o mercado indiano para o Brasil. Tinha que abrir, pois a Índia produz matéria-prima com qualidade.

    No governo Collor, a indústria farmacêutica no Brasil foi destruída. Ela não existe até hoje, é uma indústria de montagem, não fazem as matérias-primas essenciais, e nós temos que comprar da Índia. Eu percebi isso, e partimos em frente. Muito bem, queria fazer um acordo bilateral com o governo indiano. Nessa época, a indústria ainda não tinha sido totalmente destruída pelo PT; ainda tinha possibilidade de exportar ônibus, caminhão, além de avião. Fui para a Índia com esse ânimo. Aí, chegando lá, o Itamaraty disse: "Não, não pode!" Eu sabia, mas imaginava vencer isso. "Não pode, porque o Paraguai, o Uruguai e a Argentina querem saber o que é que ganham desse acordo bilateral. Como eles não ganhavam nada, passamos a importar da Índia de graça, sem nenhuma barganha econômica.

    Estamos nessa situação, que eu até sugeri ao Presidente da CRE...

(Soa a campainha.)

    O SR. JOSÉ SERRA (Bloco Oposição/PSDB - SP) - ... o Senador Aloysio, que esse tema venha junto com outras questões hoje gravíssimas.

(Soa a campainha.)

    O SR. JOSÉ SERRA (Bloco Oposição/PSDB - SP) - Houve uma questão do Governo do PT que é uma vergonha, quando uma vez admitiram, em uma barganha até hoje obscura, contra... Qual foi o troca-troca nesse caso? Dizer, reconhecer que a economia chinesa é uma economia de mercado. Resultado: não podemos estar parte da indústria brasileira, que tem antidumping com a China, estar sob o risco de perder isso, e a China faz dumping de verdade. Graças ao PT - imagina, visão de longo prazo, com os estrategistas, etc. -, a China passou a ser vista como uma economia de mercado...

(Soa a campainha.)

    O SR. JOSÉ SERRA (Bloco Oposição/PSDB - SP) - ... o que diminui o nosso poder de enfrentá-los nas ações de dumping da China. Então, se vamos falar de defesa de interesses nacionais aqui, é outra praia, Sr. Presidente.

    Não pude deixar de fazer essa intervenção, porque realmente me parece inacreditável que a vanguarda do atraso queira se apresentar como progressista com essa palhaçada que o Brasil faz na Organização Mundial de Comércio...

(Soa a campainha.)

    O SR. JOSÉ SERRA (Bloco Oposição/PSDB - SP) - ... de ser o único país que defende o multilateralismo e se recusa a parcerias no mundo inteiro. O mundo fez quinhentas, nós fizemos três, e as três que eu mencionei aqui: Israel, Palestina e Egito. É uma brincadeira, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/11/2015 - Página 46