Discurso durante a 214ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações acerca de relatório apresentado por S. Exª no âmbito da CPI destinada a investigar denúncias nos julgamentos realizados pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF).

Autor
Vanessa Grazziotin (PCdoB - Partido Comunista do Brasil/AM)
Nome completo: Vanessa Grazziotin
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO:
  • Considerações acerca de relatório apresentado por S. Exª no âmbito da CPI destinada a investigar denúncias nos julgamentos realizados pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF).
Publicação
Publicação no DSF de 27/11/2015 - Página 323
Assunto
Outros > SENADO
Indexação
  • COMENTARIO, APRESENTAÇÃO, RELATORIO, AUTORIA, ORADOR, REFERENCIA, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), OBJETO, INVESTIGAÇÃO, IRREGULARIDADE, ATUAÇÃO, CONSELHO ADMINISTRATIVO, RECEITA FEDERAL, REGISTRO, INDICAÇÃO, SUGESTÃO, OBJETIVO, MELHORIA, ARRECADAÇÃO, RECURSOS, ENFASE, INDICIAMENTO, SUSPEITO, AUTOR, CRIME, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO.

    A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Muito obrigada, Senadora Ana Amélia, Srs. Senadores, Senador Valdir Raupp.

    Primeiro, quero cumprimentá-la, Senadora Ana Amélia, por sua intervenção, por seu pronunciamento hoje na belíssima sessão que fizemos em homenagem à consciência negra, sessão dirigida, em boa parte, pelo Senador Paim. Cumprimento-a, Senadora Ana Amélia, que sempre está muito atenta a todos os assuntos aqui.

    A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP - RS) - Obrigada, Senadora Vanessa.

    A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Neste momento, Srª Presidente, venho à tribuna para falar um pouco do que têm sido os nossos trabalhos no Senado Federal em relação às investigações que envolvem atos criminosos acontecidos em torno do Carf.

    Hoje, eu, que relato essa CPI, tive a oportunidade de apresentar o relatório, de fazer a leitura do relatório. O relatório deverá ser votado na semana que vem, na próxima quinta-feira. Deixamos claro, tanto eu quanto o Presidente, Senador Ataídes, que a apresentação do relatório não significa que nós o confrontaremos - tampouco tenho esta intenção - com possíveis posições divergentes que qualquer Senador ou Senadora apresente na CPI.

    Tampouco estou fechada ao diálogo, pelo contrário. Apresentei hoje o relatório. Não é um relatório concluso ainda, porque estamos abrindo o prazo de uma semana para que todos os membros da CPI e até aqueles que dela não participam, mas que acompanham os nossos debates, a investigação em torno dessas questões, possam apresentar sugestões, Senadora Ana Amélia.

    É muito drástico o Regimento do Senado Federal no que diz respeito às CPIs. Quando há uma CPI e quando o relator ou a relatora apresenta um relatório, só há duas possibilidades: ou se vota contra, ou se vota a favor. E, para quem for contrário, só há uma saída: apresentar um voto em separado, para que fique registrado.

    Nesse caso, o relatório já está disponibilizado para quem no Brasil tiver interesse em conhecer. Está disponibilizado no site do Senado, da CPI do Carf, CPI do Senado Federal que investiga irregularidades e corrupção em torno do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais). Na quinta-feira, após ouvirmos todos os Senadores e Senadoras, deveremos votar o relatório.

    Então, aqui, neste momento, no dia de hoje, quero apresentar um resumo do que temos realizado no âmbito dessa CPI desde o mês de abril, quando instalamos a comissão de investigação que trata de assuntos vinculados ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Essa CPI foi criada por meio do Requerimento nº 407, do Senado Federal, cujo primeiro subscritor foi o Senador Ataídes, que é o Senador que preside a nossa CPI.

    O relatório é bem extenso. A sua primeira versão é composta, Srª Presidente, de 201 páginas, e, possivelmente, daqui até o final da semana, no início da semana que vem, devemos promover algumas inclusões e, quem sabe, até algumas modificações.

    O relatório que apresentei trata, sobretudo, numa linguagem simples e de fácil compreensão, de apresentar uma série de provas que conseguimos coletar durante o trabalho de investigação e que envolvem empresas, ex-conselheiros, escritórios de advocacia e as tais das empresas de consultoria.

    Além de recomendações, especialmente a recomendação de 28 indiciamentos que nós estamos apresentando, da recomendação de indiciamento de 28 pessoas, nós também apresentamos sugestões legislativas e sugestões encaminhadas ao Poder Executivo. Essas sugestões têm como objetivo garantir uma reformulação completa do sistema do contencioso administrativo fiscal brasileiro, para que possamos melhorar as possibilidades de o Estado brasileiro arrecadar recursos.

    A gente vive uma crise séria, uma crise que, para além da crise política, é uma crise econômica significativa. É uma crise que envolve a União, os Estados e também os Municípios. Diante dessa crise, quais as iniciativas que a gente vem acompanhando, Senadora Ana Amélia? Os Estados, como o seu Estado e o meu Estado, estão aumentando as alíquotas de ICMS. No Congresso, a gente está debatendo a necessidade de criar novas fontes de arrecadação para o Governo Federal, mas o Congresso brasileiro precisa se dedicar ao estudo da formatação legislativa e do que acontece no dia a dia, para sabermos como se desenvolvem as estruturas que trabalham para arrecadar os tributos, os impostos e as contribuições que vigoram em nosso País.

    É preciso melhorar o nível de arrecadação. Esse é um problema muito grave. Tenho certeza absoluta de que, se tivéssemos feito há um ano ou há dois anos as reformas na legislação brasileira que precisam ser feitas... Nós reformamos, recentemente, o Código de Processo Civil, mas o Código Tributário, o código da administração do contencioso tributário, que não é um código, mas, sim, leis, vem da década de 70, Senadora Ana Amélia. Ele vem da década de 70.

    Há um emaranhado de legislações conflitantes umas com as outras, o que dá espaço para que as empresas cada vez mais não paguem, não recolham os tributos e ainda judicializem tanto no âmbito administrativo quanto no âmbito judiciário, o que faz com que o Brasil deixe de arrecadar um percentual, uma quantidade significativa de recursos.

    Srª Presidente, quero aqui tomar a liberdade de falar sobre algumas das conclusões a que nós chegamos e que expresso no relatório apresentado e lido no dia de hoje.

    A partir de todos os elementos de prova colhidos e das audiências públicas realizadas, o que percebemos e descobrimos dando sequência à Operação Zelotes, que também está encarregada - aliás, foi quem começou tudo - de investigar denúncias gravíssimas? Hoje, há um conjunto de elementos probatórios significativo, sejam depoimentos, sejam documentações, sejam escutas da quebra de sigilos telefônicos, fiscais e bancários, seja a própria escuta telemática que foi desenvolvida. Então, hoje, há uma documentação muito farta que prova a existência de um esquema criminoso que contava com a participação de diversos atores, todos eles com condutas igualmente reprováveis.

    De um lado, estavam as empresas corruptoras, que se utilizavam de esquemas sabidamente criminosos para deixar de pagar tributos devidos, subtraindo bilhões - aqui quero frisar, Senador Raupp, que foram bilhões! - dos cofres públicos e da população brasileira necessitada. Na outra ponta, estavam os agentes corruptos, que, no geral, eram conselheiros e ex-conselheiros do Carf, conselheiros que representam a Secretaria da Receita Federal e, portanto, o Poder Público e, principalmente, os conselheiros que representam os contribuintes - hoje, o Carf é paritário, ou seja, metade de seus conselheiros vem do serviço público, e a outra metade representa os contribuintes -, os quais vendiam sua dignidade em troca de dinheiro, despindo-se da função de julgar para vestirem a toga da vileza, da veleidade e da corrupção. Finalmente, vêm os intermediários, as empresas de consultoria e os escritórios de advocacia, que eram, na verdade, sumidouros do dinheiro derivado da propina e agências de compra e venda de decisões no âmbito do Carf.

    Por meio desse esquema, Srª Presidente, Srs. Senadores, como nós demonstramos, todos ganhavam. Ganhava a empresa corruptora, que via os débitos tributários sendo reduzidos a pó.

    Um exemplo clássico, que puxa o rol dos exemplos apresentados no relatório, é o da MMC, a empresa Mitsubishi, que tinha um passivo de aproximadamente R$266 milhões e que recolheu ao Fisco somente R$900 mil. De R$266 milhões para R$900 mil! Somente com empresas de advocacia - apesar de uma empresa do porte da Mitsubishi ter, nos seus quadros, profissionais da área do Direito, em um setor jurídico, como todas as empresas têm -, ela gastou nesse processo, junto a empresas de advocacia contratadas, as tais consultorias, que são no geral empresas de fachada, mais de R$50 milhões. Ou seja, em um processo de mais de R$260 milhões, pagou a terceiros - e, certamente, boa parte desse dinheiro chegou aos conselheiros do Carf, além das empresas intermediárias - R$50 milhões e pagou ao Fisco brasileiro menos de R$1 milhão.

    Ou seja, por meio desse esquema, como nós procuramos demonstrar de forma clara, simples e objetiva, todos ganhavam: ganhava a empresa corruptora, que via os débitos tributários sendo reduzidos a pó, inclusive com danos inestimáveis contra as próprias concorrentes, que atuavam de forma lícita; ganhavam os conselheiros corruptos, que aumentavam o seu patrimônio com recursos que na verdade deveriam ser destinados aos cofres públicos; e ganhavam também os intermediários, cujas empresas de consultoria gerenciavam somas vultuosas. Só quem perdia em todo esse processo, e quem perde, é o Erário, ou seja, a população brasileira. Bilhões de reais, que deveriam ser pagos a título de tributos e que poderiam, inclusive, ajudar no equilíbrio das contas públicas brasileiras, nunca sequer foram recolhidos.

    Então, nós temos dois tipos de corrupção: aquela em que o recurso, a partir do momento em que entra no caixa do Poder Público, é desviado, através de atos de corrupção; e a outra corrupção que é essa que caracteriza as investigações do Carf, que é aquela que ocorre antes do recolhimento dos recursos. Os recursos deixam de entrar nos cofres públicos.

    Logicamente, Srª Presidente, pelo tempo que nós tivemos e pelas condições, que não são as condições ideais para o desenvolvimento de uma investigação profunda, como requer este caso, diante de toda essa caracterização, pensamos nós que caberá à Polícia Federal e ao Ministério Público aprofundar as investigações e dar prosseguimento aos detalhes descobertos ao longo da CPI, especialmente por intermédio de quebras de sigilo bancário e fiscal e da colheita de depoimentos que ajudarão a entender melhor o funcionamento das quadrilhas que vêm assaltando o Carf.

    Nós cremos que a Operação Zelotes pode até, no meio do caminho investigativo, encontrar outros problemas que requeiram também investigações por parte tanto da Polícia Federal quanto do Ministério Público. Entretanto, a investigação com relação ao Carf não pode ser comprometida por conta disso. Que tanto o Ministério Público quanto a Polícia Federal abram outras investigações, mas que essa operação denominada Zelotes, que investiga as empresas e as quadrilhas que existem em torno do Carf, continue, por parte, sobretudo, do Ministério Público e da Polícia Federal.

    O papel da nossa CPI não pode, assim entendemos, ser reduzido à parcela investigativa dos trabalhos. A investigação é uma parte importante, mas à qual a Comissão não se restringiu. Os debates, as discussões, as proposições legislativas e sugestões nascidas, na CPI, certamente servirão para aperfeiçoar - com a urgência necessária e exigida pela sociedade brasileira - o funcionamento do conselho.

    Além de uma PEC apresentada pelo Presidente da Comissão, o Senador Ataídes, eu apresentei três projetos de lei muito importantes, Srª Presidente. Além desses projetos, que já estão tramitando, nós estamos indicando a necessidade de que...

(Soa a campainha.)

    A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - ... no âmbito da Comissão de Juristas, composta pelo Presidente Renan Calheiros, uma comissão de alto nível, presidida pelo Ministro Mauro Campbell, à qual foram agregados três novos nomes de tributaristas, seja criada uma subcomissão, Senadora Ana Amélia, para tratar especificamente desse assunto.

    Nós temos o entendimento de que é preciso que essa comissão de alto nível possa apresentar, até o primeiro semestre do ano que vem, anteprojetos que tratem, principalmente, da construção de um código do processo administrativo e tributário, assim como de um novo Código Tributário brasileiro, Senadora. Repare, nós precisamos debater e aprovar um código do processo administrativo e tributário e um novo Código Tributário!

    Não conseguimos chegar a um consenso, somente em alguns pequenos pontos...

(Soa a campainha.)

    A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - ...entre eles, a necessidade de se acabar a paridade. Mas isso não resolve o problema. A legislação tem que ser inovada, como fizemos com o Código de Processo Civil e tantos outros.

    Essa parte é muito importante. E estamos fazendo sugestões ao Presidente do Senado, ao Presidente da Câmara, ao Poder Executivo - eu já caminho para as conclusões -, para que possamos também dar celeridade a outras matérias que aqui tramitam. Entre elas, eu quero, neste minuto que me resta, apenas citar a Mensagem nº 270. Essa mensagem dá caráter legal a um acordo assinado entre o Governo brasileiro e outras 128 nações, no que diz respeito à troca de informações e transparência internacional. Esse acordo foi assinado em 2011, mas a mensagem ainda está na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados, Senadora. É impossível!

(Soa a campainha.)

    A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - V. Exª, o Senador Paim e tantos outros estavam reclamando, todos os dias, que o Congresso Nacional não se reunia e, portanto, não votava o projeto do Aerus. A mesma coisa acontecia com o projeto do Carf. Ele estava lá parado, esperando passar essa crise para poder ser votado. O ano passou, o ano está acabando e o Carf passou praticamente o ano inteiro sem funcionar.

    Na semana que vem, nós votaremos o relatório, e espero contar com a colaboração dos meus companheiros, dos meus colegas de comissão, para que seja um relatório muito importante, tanto do ponto de vista de apontar as saídas no caminho legislativo como as saídas no caminho da investigação.

    Eu tive uma grande colaboração de todos os Senadores que lá estiveram, mas sobretudo do nosso Vice-Presidente, do nosso Presidente, Senador Pimentel, que, além de Líder do Governo no Congresso, era um assíduo frequentador e que, com os conhecimentos que tem, ajudou-nos muito. Eu espero, na semana que vem, voltar aqui, na mesma quinta-feira, no mesmo horário, para falar já sobre o relatório aprovado.

    Muito obrigada, Senadora.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/11/2015 - Página 323