Discurso durante a 219ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa da convocação extraordinária do Congresso Nacional durante o recesso parlamentar a fim de se votar o pedido de impedimento contra a Presidente da República.

Autor
Ricardo Ferraço (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Ricardo de Rezende Ferraço
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CONGRESSO NACIONAL:
  • Defesa da convocação extraordinária do Congresso Nacional durante o recesso parlamentar a fim de se votar o pedido de impedimento contra a Presidente da República.
Aparteantes
José Medeiros, Waldemir Moka.
Publicação
Publicação no DSF de 04/12/2015 - Página 516
Assunto
Outros > CONGRESSO NACIONAL
Indexação
  • DEFESA, CONVOCAÇÃO EXTRAORDINARIA, CONGRESSO NACIONAL, PERIODO, RECESSO, PARLAMENTO, MOTIVO, NECESSIDADE, VOTAÇÃO, REQUERIMENTO, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, COMENTARIO, CRISE, ECONOMIA NACIONAL, PREJUIZO, FUNCIONAMENTO, GOVERNO FEDERAL.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (PMDB - ES. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, Srª Presidente, Senadora Ana Amélia.

    Srªs e Srs. Senadores, Srª Presidente, o pior cego é aquele que não quer enxergar a vida real, de carne e osso, como ela se apresenta, e não como gostaria que ela se apresentasse. Julgo a esse momento serem acessórias, sinceramente acessórias, as motivações que levaram o Presidente da Câmara dos Deputados ao deferimento deste pedido de impeachment em relação à Presidente Dilma. Isso se torna acessório diante do fato concreto e objetivo.

    Ora, como é que vamos questionar a legitimidade de quem indeferiu se nós não questionamos essa mesma legitimidade quando ele indeferiu as mais de duas dezenas de pedidos de impeachment que nas últimas semanas e nos últimos meses estiveram presentes na mesa e na agenda do Presidente da Câmara dos Deputados. Portanto, os motivos que o presidiram para chegar a essa conclusão a mim pouco importam. O que importam são os fatos.

    E, para além dos fatos, Presidente Senadora Ana Amélia, julgo necessário avaliar neste momento são as consequências desse processo para o ambiente econômico, o ambiente político, com a respectiva e evidente repercussão para a sociedade brasileira. Ora, nenhum de nós deve deixar de considerar essa conjuntura como uma conjuntura gravíssima, porque há uma combinação de variáveis que não se apresentam em qualquer conjuntura. Nós vivemos uma crise política que alimenta uma crise econômica; vivemos uma crise econômica que alimenta uma crise política; e vivemos uma crise moral que deteriora todos esses valores e essas combinações ao mesmo tempo. É como se nós estivéssemos diante de uma tempestade perfeita, ou de uma tormenta perfeita.

    Mas aí me parece que, diante dos últimos fatos, diante das decisões adotadas, diante da formalização do pedido de impeachment, qual é a consequência dessa decisão para o dia a dia das pessoas? O que vai acontecer com a economia brasileira se nós continuarmos assistindo a esse ambiente como se fôssemos, de certa forma, como aquele violonista que ficava lá no salão central do Titanic, vendo o barco afundar, como se isso não fosse com a gente?

    Não, Srª Presidente. Estou fazendo essa reflexão, porque me parece que nós estamos diante de fatos concretos.

    E, diante desses fatos concretos, eu quero chamar a atenção dos meus colegas Senadores, se não é o momento de nós começamos a refletir se faz sentido o Congresso brasileiro entrar de recesso. Qual é a impressão, qual é a mensagem que o Congresso brasileiro dará à população brasileira? Eu coloco fogo em Roma e, como se diz no dia a dia, vou vazar como se não fosse comigo?

    A comunicação do impeachment foi feita. Comunicação feita, abre-se prazo para que os partidos possam indicar os seus representantes. A comissão será constituída, será eleito um presidente, será eleito um relator. Há um devido processo legal, há um rito que será, naturalmente, obedecido para que essa comissão processante possa se instalar e os fatos possam ser apurados.

    O meu juízo de valor não é me antecipar aos fatos que levaram às denúncias do Prof. Miguel Reale. Não, até porque uma comissão como essa, você sabe como ela começa, e não sabe como ela termina, porque nenhum de nós é capaz de saber nem tem bola de cristal para imaginar quais são os fatos que vão se suceder num ambiente como esse. Nós temos uma Operação Lava Jato em aberto, temos fatos e denúncias sendo reveladas.

    Portanto, Srª Presidente, Senadora Ana Amélia, eu quero chamar atenção para esse fato. Não há alternativa, não há outro caminho para o Congresso brasileiro que não a sua autoconvocação. Não faz sentindo que o Congresso brasileiro de desmobilize numa conjuntura como esta. É como se nós virássemos as nossas costas para população, para a angústia, para a falta de confiança e para a incerteza no futuro.

    Estou trazendo essa reflexão ao juízo das Srªs Senadoras, dos Srs. Senadores, para que nós possamos pensar sobre isso. Nós temos ainda duas semanas de trabalho. Temos, portanto, quatro dias úteis para tratamos de uma pauta complexa. Se não houvesse o impeachment, talvez a deterioração da economia brasileira, com reflexos sociais, Srª Presidente...

    Nós vamos chegar ao final de 2015 com uma taxa de desemprego possivelmente muito próxima de 12%. Significa dizer que mais de 1 milhão de empregos desapareceram da vida dos brasileiros. Na faixa etária de 17 a 32 anos, a taxa de desemprego já está na ordem de 18% da população economicamente ativa. Diante desse ambiente extremamente complexo, desafiador, o que faz o Congresso brasileiro? Entra em recesso.

    Essa reflexão me parece que merece ser feita, Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não apenas por nós, mas também pela Câmara dos Deputados. O inverso disso irá representar uma espécie de desfaçatez. Constitui-se a comissão processante do impeachment, e 40, 50 dias depois essa mesma comissão começa a trabalhar.

    A economia brasileira não suporta ficar exposta a esse nível de incerteza e de ausência de confiança, Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores.

    Claro que não sou o dono da verdade, tampouco tenho essa pretensão, mas estou aqui a exercer o meu juízo de valor, estou aqui a declinar as minhas convicções e a minha compreensão para essa conjuntura que estamos enfrentando.

    Portanto, a despeito, Srª Presidente, de quaisquer valores ou juízos de valor, o que nós estamos trazendo para a reflexão do plenário, nesta tarde, é a necessidade de efetivamente avaliarmos.

    Da minha parte, entendo que não faz sentido o Congresso entrar de recesso. Pegará mal demais, será um escárnio, Srª Presidente. Essa é a verdade. Será um escárnio e um ato de egoísmo diante da angústia, do sofrimento e da baixa autoestima da população brasileira.

    Portanto, nós deveríamos refletir sobre isso e pensar nesse movimento. Tem sentido fazermos um breve período de recesso durante, quem sabe, o Natal, entre o dia 20 e o dia 30, 31, 2 ou 3 de janeiro. A partir daí, nós temos a obrigação de estar aqui, no Congresso brasileiro, para dar conta dessa agenda que se deteriora a olhos nus.

    Ouço com prazer o Senador Medeiros e, em seguida, com o mesmo prazer e alegria, o Senador Moka.

    O Sr. José Medeiros (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Muito bem colocado por V. Exª, porque o País está em ebulição. A população está vendo o seu poder de compra diminuir. Nós temos uma situação inusitada. Os mais velhos com quem tenho conversado não veem isso há muitos anos, há muitas décadas. E não faz sentido, como V. Exª bem colocou. É como se o navio estivesse afundando e o comandante fosse tirar férias. Simbolicamente, isso pega muito mal. Esta é a Casa de onde se espera que saiam soluções, é a Câmara alta do País, é o Legislativo. No momento em que o Executivo e outros poderes entram em colapso é daqui que a população brasileira espera que saia alguma coisa. E, de repente, vai se sentir órfã, porque vai ver a Casa fechada e as pessoas de férias. Concordo plenamente com V. Exª. Parabéns por essa manifestação.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (PMDB - ES) - Agradeço a V. Exª a contribuição e ouço, com igual prazer, o Senador Moka.

    O Sr. Waldemir Moka (PMDB - MS) - Senador Ricardo Ferraço, ouvi parte do pronunciamento de V. Exª, mas é importante - se eu estiver sendo repetitivo já peço desculpas - esclarecer a população que a chamada autoconvocação não tem custo nenhum para o contribuinte, quer dizer, é uma autoconvocação. Nós nos autoconvocamos para estar aqui no período de recesso. O pronunciamento que V. Exª faz é muito oportuno e necessário. Às vezes as pessoas falam assim em autoconvocação do Congresso, mas vale dizer que nós vamos ter sessões no plenário do Senado e os Deputados, no plenário da Câmara. É claro que em algum momento pode haver a sessão bicameral, mas é fundamental para possamos acompanhar de perto todos os desdobramentos da crise. E na crise em que o País vive é fundamental que o Senado da República esteja acompanhando de perto esse desdobramento. De perto e também, em havendo necessidade, intervindo para fazer com que o mais rápido possível a gente possa sair dessa crise econômica e política em que o País se encontra. Obrigado pelo aparte.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (PMDB - ES) - Senador Moka, sou eu que agradeço a manifestação de V. Exª. Ela é cirúrgica.

    O que significa autoconvocação? Significa que eu, V. Exª, o Senador Medeiros, a Senadora Ana Amélia, o Senador Requião e todos os Senadores, em lugar de recebermos em casa ou nas nossas bases parlamentares ou nos Estados, vamos receber para estarmos aqui. Como? Em alerta.

    Estarmos na nossa trincheira de trabalho.

    Existem circunstâncias na vida, e esta não é uma circunstância qualquer. Esta é uma circunstância que exige a mobilização do Congresso brasileiro.

    Srªs e Srs. Senadores, nós temos com um pedido de impeachment da Presidente da República em curso. Há uma comissão processante que terá que ser constituída nos próximos dias, para a apuração de fatos.

    Eu não quero entrar ainda nos valores desses fatos, não quero emitir juízo de valor ainda, como determina a Constituição Federal, como determina o Regimento Comum do Congresso brasileiro. E, em um momento como este, em que as pessoas estão a se perguntar qual é o horizonte, qual é o radar, qual é a direção do País, cadê o Congresso brasileiro? O Congresso brasileiro está desmobilizado? Não, Sr. Presidente. Não, Srªs e Srs. Senadores.

    Eu acho que é o momento de sinalizamos para a população que nós precisamos estar no nosso local de trabalho. Nós somos remunerados para isso. E, nestas circunstâncias, sobretudo é aqui que nós precisamos estar. Eu tinha esse entendimento antes mesmo do fato político que se deu ontem na Câmara, que não é um fato qualquer.

    Não adianta querermos transformar esse fato em um pseudoconflito da Presidência da República com o Presidente da Câmara, não. Isso virou acessório. Nós estamos diante de um fato objetivo. Esse fato objetivo, o impeachment, tem repercussão na vida do País, tem repercussão no planejamento dos Governos Estaduais e das prefeituras, na paralisação da pauta parlamentar. Ele tem repercussão no mundo, nas nações, nos mercados internacionais que estão observando o País.

    Escutar que uma Presidente sendo processada e o Congresso brasileiro está desmobilizado... Eu vou repetir o que eu disse: eu não tenho a pretensão da verdade. Estou trazendo uma preocupação, uma reflexão que nós precisamos fazer para adotarmos um posicionamento coletivo.

    Sinceramente, Senador Moka, Senador Medeiros e também Senador Requião, no calor do seu silêncio tenho certeza de que está me ouvindo quanto à necessidade de o Congresso brasileiro se manter vivo e presente, discutindo o dia a dia do Brasil, as perspectivas e as consequências dessa crise política que se acelera e impacta fortemente a crise econômica com reflexos sociais sobretudo para os mais pobres, para os mais desprotegidos, para todos aqueles que necessitam do funcionamento pleno de um governo.

    Muito obrigado, Srª Presidente. Muito obrigado, Srªs e Srs. Senadores.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/12/2015 - Página 516