Discurso durante a 223ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexões sobre o conceito de legalidade e sobre o impeachment da Presidente da República.

Autor
Lasier Martins (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RS)
Nome completo: Lasier Costa Martins
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Reflexões sobre o conceito de legalidade e sobre o impeachment da Presidente da República.
Publicação
Publicação no DSF de 11/12/2015 - Página 170
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • CRITICA, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, CRISE, POLITICA, ECONOMIA NACIONAL, SOLUÇÃO, RESPEITO, LEGALIDADE, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ENFASE, AUMENTO, DIVIDA, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), ENTRADA, RELAÇÃO, VOTAÇÃO, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, OCORRENCIA, CORRUPÇÃO, EMPRESA ESTATAL.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Eminente Presidente destes trabalhos, Senador Paulo Paim, telespectadores da TV Senado, ouvintes da Rádio Senado e ilustres visitantes que nos honram com suas presenças acompanhando o funcionamento de uma sessão ordinária do Senado Federal, primeiro, eu queria fazer uma observação muito agradável que tenho percebido, Senador Paulo Paim. Nós temos o orgulho de ser do Rio Grande do Sul e constatar, já agora no final do ano, uma rotina que acontece aqui no Senado: o trio de Senadores do Rio Grande do Sul sempre é o primeiro a chegar às sessões ordinárias do Senado. V. Exª já tinha percebido?

    O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Para falar a verdade, não, mas eu gostei do registro - e com a presença aqui do Senador Wellington.

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Inclusive V. Exª, Senador Paulo Paim, muitas vezes, tem aberto e presidido a sessão.

    Que os nossos conterrâneos eleitores saibam que estão sendo correspondidos ao menos na assiduidade, se não - o que também tem acontecido - no desenrolar dos trabalhos em que temos nos empenhado aqui no Senado.

    Sr. Presidente, eu queria começar dizendo que, diante da crise que assola o Brasil, econômica, política e moralmente, em que as saídas parecem cada vez mais difíceis e principalmente demoradas, é importante dizer que qualquer que seja a solução que vamos encontrar para esses dias de prolongada crise deverá passar pelo respeito às leis e à Constituição Federal, como convém e como deve ser. Por isso, Sr. Presidente, eu quero falar sobre alguns equívocos e confusões de conceitos que vêm sendo externados nesses dias de crises e no confronto com as leis.

    Por exemplo, o conceito de legalidade, uma palavra que vem sendo muito usada aqui no Congresso ultimamente, vem sendo um dos impasses, justamente por ser a legalidade ponto fundamental para a solução dessa crise. A solução está presente em nosso arcabouço jurídico, em nossa legislação e em nossas instituições republicanas. E, quando se fala tanto em legalidade, quero invocar desde logo o nome de um ou dois grandes políticos gaúchos que se identificaram muito com a doutrina e a prática da legalidade.

    O primeiro nome é o de Leonel Brizola que, precursor desse movimento, obteve ontem, aqui nesta Casa, por unanimidade, a aprovação de um projeto de lei proposto pelo Deputado Vieira da Cunha, que passou pela Câmara com a relatoria do Deputado Cherini e que passou aqui, no Senado, pela relatoria da Senadora Ana Amélia, aqui presente, para ter o seu nome incluído, Leonel Brizola, no Livro dos Heróis da Pátria, uma justa homenagem, que agora irá para a sanção da Presidente da República. E o trabalhismo, no conceito de Brizola, atualmente, é muito lembrado, assim como a legalidade, porque os dois andam de mãos dadas - trabalhismo e legalidade. As ideias que norteiam o nosso Partido são baseadas no respeito às leis como princípio fundamental norteador de nossas ações, proposições e posições legislativas e políticas. A coexistência da solidariedade com as liberdades individuais é a razão de existir do nosso Partido, do meu Partido, o PDT.

    O segundo nome que quero lembrar à respeito de legalidade neste momento tão crítico da vida nacional é o nome de Alberto Pasqualini, formulador da ideologia programática trabalhista. Gaúcho que também ocupou esta tribuna como Senador nos anos 50, ele tinha como base de suas ideias os princípios da democracia cristã. Segundo ele - e relembro algumas das tantas palavras escritas por Pasqualini -, "um partido deve ser um programa, uma orientação e uma ética. Para um partido, o governo deve ser um ônus e não um instrumento de vantagens e, portanto, deverá exercê-lo não em proveito próprio, mas em benefício da coletividade". Pasqualini defendia que a transformação social e progressista que conduziria a uma sociedade mais justa deveria iniciar-se pelo respeito aos princípios fundamentais de uma sociedade democrática, ou seja, o respeito à legalidade - movimento mais tarde liderado por Brizola, na qualidade de Governador do Rio Grande do Sul, no ano de 1961. Essa palavra, essa instituição não pode ser banalizada neste momento e muito menos confundida com a crise política que hoje o Governo Federal atravessa, quando se discute a instalação de um processo de impeachment da Presidente da República.

    Neste particular, erra parte da cúpula do meu Partido querendo lembrar a legalidade de Brizola ligando esse fato à investigação de hoje contra a Presidente da República. São coisas bem diferentes. E ninguém pode garantir que, se Brizola existisse no cenário recessivo de hoje, no cenário recessivo da economia que vivemos e de um Governo omisso no que diz respeito à bancarrota da Petrobras, criação trabalhista, fosse ele apoiar esse caos que aí está.

    Assim, repito, a solução para a crise passa pelo respeito às instituições e pelo respeito - sobretudo - à Constituição. Não tenho dúvida de que esta República conseguirá vencer, lá adiante, esse desafio, usando os remédios constitucionais apropriados, mantendo intacta a normalidade institucional.

    Em um país como o nosso, que está combatendo a corrupção, mediante golpes certeiros da Operação Lava Jato, desbaratando a organização criminosa que se desenvolveu, no seio do Estado, chegou o momento da depuração, momento tão esperado, ao ensejo das últimas décadas, em seu sentido amplo, na política, no empresariado e no meio financeiro. O Brasil, de fato, não podia mais continuar convivendo com os desvios e a corrupção, que vinham vicejando, progressivamente, na vida do País, há muito tempo. Os tentáculos dessa sofisticada organização criminosa, na expressão do Supremo Ministro Celso de Mello, espalharam-se.

    Indo, mais adiante, no caso muito particular da Petrobras, a mais importante empresa brasileira, símbolo de orgulho para todos nós. Alberto Pasqualini, que desempenhou relevante papel na criação da Petrobras, tendo sido o Relator do projeto de lei de criação da empresa, no Senado, disse, em 1950, quando da criação da Petrobras: "O sistema econômico brasileiro vigente funciona como uma escavadeira, que tira a terra de um lado e amontoa do outro. Sacrifica grandes camadas da população para enriquecer pequenos grupos. Eu não creio que aqueles mesmos que, bafejados pela sorte, conseguiram acumular riquezas, possam julgar-se felizes e tranquilos, tendo diante dos olhos o espetáculo cotidiano da miséria e da necessidade".

    Essa assertiva de Pasqualini, Sr. Presidente, cabe, perfeitamente, nos dias de hoje, de tantas desigualdades sociais e econômicas que o Brasil enfrenta. Portanto, nós, herdeiros do trabalhismo, devemos trabalhar, com afinco, para que a empresa seja recuperada, depois dos criminosos saques a que vinha sendo submetida.

    Agora falo da Petrobras, criada por lei relatada por Pasqualini.

    A Petrobras, que movimentava 10% da nossa economia, foi e continua sendo uma das maiores vítimas - seus acionistas minoritários em especial - da má digestão e dos excessos contidos na política econômica dos últimos anos. Desde que realizou seu aumento de capital em 2010, com os desvios acontecidos deixou de ser a 12ª empresa do mundo para se tornar a 416ª; isto é: de lugar 12º para o lugar 416º.

(Soa a campainha.)

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Segundo a revista norte-americana Forbes, seu valor de mercado saiu de US$270 bilhões para os atuais US$25 bilhões. Em reais, perda superior a 70%.

    O endividamento da estatal não para de crescer, e assim chegou ao posto de maior detentora de dívida no mundo, com uma marca que saiu de R$115 bilhões em 2010 para R$522 bilhões atuais.

    E hoje é interessante registrar, Sr. Presidente - veja que curiosidade lamentável, mas uma verdade: a ONG Transparência Internacional está abrindo uma votação para escolher o caso mais simbólico de corrupção no mundo. E imaginem quem está no meio? O caso...

(Interrupção do som.)

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - ... o caso Petrobras vai concorrer junto, por exemplo, com o caso do Banco Espírito Santo, de Portugal; com o caso de Zine al-Abidine Ben Ali, ex-Presidente da Tunísia; com o caso da FIFA; com o caso do ex-Presidente do Panamá, Ricardo Martinelli; com o caso do ex-líder do Egito, Mohamed Hosni Mubarak. E a Petrobras no meio, Sr. Presidente, entre os casos de maior corrupção no mundo. Esta, a nossa Petrobras!

    E, por reflexo, uma parceira que corre grandes riscos ou, pelo menos, cria novos riscos para o Brasil, que é a Sete Brasil. Essa empresa corre o risco de falência, Sr. Presidente. Ainda, anteontem à noite, na reunião dos Senadores com o ex-Ministro Maílson da Nóbrega, ele levantava esta hipótese: se a Sete Brasil falir, o prejuízo da Petrobras e do BNDES vai se ampliar ainda mais e poderá agravar profundamente a situação do BNDES, repito.

    Este projeto criado pela Petrobras, para construir 28 sondas para o pré-sal, numa só tacada, trará enormes prejuízos ao País. Segundo o jornal Valor, “a holding já consumiu bilhões no início da construção das sondas, mas não detém ainda operação e ativos geradores de receita. Por isso, houve praticamente a queima de R$8,4 bilhões investidos em capital pelos sócios e mais os US$3,6 bilhões do empréstimo que era para ser uma ponte até uma linha específica do BNDES". Esse fato é muito grave.

    A ameaça de falência da companhia, da empresa Sete, coloca o Banco do Brasil como o maior perdedor com o projeto. A instituição concedeu US$1,3 bilhão de crédito à Sete Brasil. No câmbio atual, nada menos do que R$5 bilhões, um risco para o Banco do Brasil. Portanto, esse risco de falência da Sete Brasil se constituiria numa ameaça assustadora, por suas consequências às finanças do País.

    Esse é apenas um episódio a mais da má gestão que assola o Brasil. Tudo somado ao desequilíbrio fiscal, pelo qual o Governo, depois de "pedalar" suas contas, pediu ao Congresso Nacional autorização para um cheque especial de R$119 bilhões.

    O Governo Dilma se funda em uma política econômica equivocada, que favorece os mais pobres apenas no discurso, porque agora se veem eles ameaçados de caírem da Classe C, voltando para a Classe D. É uma política intervencionista, que, além de prejudicar os pobres, que voltam a ter uma queda de padrão de vida, favoreceu também os grandes banqueiros, os megaempresários, sem oferecer oportunidade de crescimento para os pequenos. Da mesma maneira, os trabalhadores são ignorados. O resultado da política econômica desastrosa é a ruína do Brasil: o acúmulo da pobreza, o aumento do desemprego, a quebra das empresas, a inflação que ataca os mais pobres. Em suma, a antítese do trabalhismo.

    Devemos respeito às instituições, devemos seguir a verdadeira legalidade, como nos ensina o trabalhismo. A Presidente, a despeito dos equívocos colossais na Petrobras, precisa responder pelas graves acusações de ter realizado pedaladas fiscais com o dinheiro do povo.

(Soa a campainha.)

    O SR. LASIER MARTINS (Bloco Apoio Governo/PDT - RS) - Já estou me encaminhando para o encerramento, Sr. Presidente.

    Ela precisa explicar a busca de empréstimos em instituições financeiras do próprio Estado, para saldar compromissos sem autorização do Congresso Nacional, iniciativa que teve indevidamente.

    A Presidente gerava um superávit primário falso, que enganou o eleitorado. Isso é crime de responsabilidade. Responder por isso, faz parte dos rituais da legalidade exigida pelos brasileiros.

    Ninguém está acima da lei, como nos relembra o Juiz Sérgio Moro. Se a Presidente cometeu crime de responsabilidade, deve enfrentar o processo de impeachment. Defender esse rito constitucional é defender a legalidade, é honrar a memória dos fundadores do trabalhismo, como Leonel Brizola e Alberto Pasqualini.

    Não há que se falar em golpe nesta hora quando atendidos os ritos previstos na Constituição. Vivemos tempos de legalidade, democracia e liberdade. Chegou o momento de honrar a memória de nossos fundadores e lutar pela ética e pela transparência. Ninguém deve usar uma falsa legalidade - como se ouve por aí - e o trabalhismo para mascarar o adesismo de hoje, muito menos usar o sagrado Movimento da Legalidade de Brizola em 61, quando impediam Jango, Vice-Presidente da República, de assumir a Presidência diante da renúncia de Jânio Quadros.

    Legalidade, concluindo, Sr. Presidente, hoje é abrir as investigações para apurar responsabilidade pelo caos que vive o Brasil, suas finanças exauridas, a Petrobras aviltada e meio mundo que trabalhou para o atual Governo já nas prisões. Isso é a verdadeira legalidade.

    Era o que tinha a dizer.

    Muito obrigado, Sr. Presidente, pela tolerância com o tempo.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/12/2015 - Página 170