Discurso durante a 223ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a constitucionalidade do processo de impeachment contra a Presidente Dilma Rousseff e destaque para a necessidade de cautela na análise de qual decisão será melhor para o País.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Considerações sobre a constitucionalidade do processo de impeachment contra a Presidente Dilma Rousseff e destaque para a necessidade de cautela na análise de qual decisão será melhor para o País.
Aparteantes
Dário Berger.
Publicação
Publicação no DSF de 11/12/2015 - Página 203
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, DECADENCIA, ECONOMIA NACIONAL, DESCUMPRIMENTO, PROMESSA, CAMPANHA ELEITORAL, NECESSIDADE, ANALISE, EFEITO, IMPEACHMENT, SISTEMA DE GOVERNO, PRESIDENCIALISMO, RESPEITO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, DEFESA, PLEBISCITO, ASSUNTO, CONTINUAÇÃO, MANDATO, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Hélio José, Srªs e Srs. Senadores, volto aqui para este tema que tanto nos angustia, na verdade, há meses, mas especialmente nessa última semana, que é a situação periclitante, digamos, da Presidência da República, diante de um pedido de impeachment, que chegou aqui por dois juristas, Hélio Bicudo e Reale Júnior, e que o Presidente da Câmara, essa figura que todos hoje reconhecemos como nefasta ao Brasil, deu encaminhamento.

    É preciso lembrar, primeiro, que foram juristas que deram entrada. Um deles, fundador do PT, um senhor de respeito na idade e na formação. Depois disso, até por conta do Presidente que deu a entrada, deu encaminhamento, surgiu a ideia de golpe. Não é golpe, Senador. Não é golpe porque está na Constituição, está aqui. O artigo diz com a maior clareza que é possível, sim, em alguns momentos, que o mandato do Presidente seja interrompido. Isso já aconteceu com o Presidente Collor, e não foi golpe. Então, não é golpe. Agora, se não é golpe porque está previsto na Constituição, é preciso seguir o rito, de acordo com a Constituição.

    O que não vale - quer dizer, não é golpe, a Constituição prevê -, é dizer: vamos fazer já, sem levar em conta o que a Constituição determina. E a Constituição, que prevê o impeachment, e, portanto, não é golpe, diz em que condições é que isso pode acontecer. Não é de acordo com a vontade dos Parlamentares, não é de acordo com a raiva que a gente tem toda a razão de ter do Governo atual, não é de acordo com as frustrações que nós temos diante de uma Presidente que prometeu uma coisa e fez outra, diante de uma inflação de dois dígitos, diante de um desemprego altíssimo, sobretudo entre jovens, de uma economia em recessão.

    A Constituição não diz que o impeachment está vinculado à inflação, ao desemprego, nem mesmo às mentiras. Está vinculado a crimes de improbidade na Administração, na Lei Orçamentária, no cumprimento das leis e das decisões judiciais. Ou seja, não é golpe o impeachment, é constitucional. Agora, não é político: o impeachment tem que ser decidido de acordo com a Constituição que o prevê. Se eu respeito um artigo que diz que não é golpe, eu tenho que respeitar o artigo que diz como é que ele deve ser feito. Então, vamos analisar com cuidado se há ou não argumentos claros para votar o impeachment.

    E aí eu quero dizer, Senador, que eu vou esperar que chegue aqui, ou algum tempo antes, mas eu vou ter que estudar com muito detalhe os argumentos apresentados para justificar o impeachment. Eu até diria que, diante do quadro que está aí, a imensa maioria da população simpatiza com a substituição da Presidente. Eu creio que isso é quase geral, e nós somos membros da sociedade, nós fazemos parte da população, nós temos os mesmos sentimentos - mas não votamos com os sentimentos. O povo até tem direito de não se preocupar com isso aqui não. O povo tem direito de ir à rua e derrubar Presidente, derrubar Deputado, Senador. O povo tem direito de agir conforme a sua raiva. Nós, Parlamentares, temos que respirar fundo antes, pensar, raciocinar, porque sabemos das consequências dos atos.

    Por exemplo, o que acontece com um país que, para cada quatro presidentes eleitos, destitui dois? Nós tivemos quatro presidentes eleitos: o Collor, o Fernando Henrique, o Lula e a Dilma. De quatro, interromper dois, 50%? O próximo, o quinto, vai chegar sem nenhuma segurança. Ele vai se sentar na cadeira e se perguntar: quantos meses passarão antes que algum advogado dê entrada num pedido de impeachment? E até não precisa ser advogado, qualquer pessoa tem direito de fazer isso. E aí ele vai se perguntar: quantos meses demorarão para que um Presidente da Câmara, com raiva de mim, ou não, encaminhe o processo? Cria-se uma instabilidade muito grande. Ao mesmo tempo, a gente tem que racionar que, manter o atual Governo por mais três anos, não vai ser fácil para o Brasil.

    Eu tenho dito que nós, Senador Hélio, nem estamos mais em crise, já estamos em decadência. Nós estamos em um processo de decadência. Por exemplo, crise é a recessão; decadência é você saber que, mesmo sem recessão, o nosso produto não é baseado em alta tecnologia. Crise é a energia elétrica subir; decadência é a gente não fazer o que o senhor defende: a energia solar, fontes alternativas. É decadente um sistema de energia baseado no combustível fóssil - decadente no sentido de coisa velha, antiga.

    Nós não estamos apenas em recessão porque o PIB cai. É que nós temos um PIB feio, primário como se diz, como era no início da Colônia - agrícola, mineral -, como era nos anos 50 - indústria metalmecânica. Nós não temos um PIB como têm os países tipo Europa, Estados Unidos, Coreia, Formosa. São países que não são tão grandes, mas que já produzem bens de alta tecnologia. O nosso, não. Mesmo quando o nosso PIB não cai, ele é decadente, não tem cara boa, moderna, contemporânea, dos tempos de hoje. Ele tem a cara dos tempos do passado, logo, decadente.

     Então, nós temos um Governo que tem conduzido o Brasil na direção da decadência. O que tem acontecido com as nossas estatais? Até muito pouco tempo, o Correio brasileiro era um exemplo de orgulho para todos nós. Lembro que uma vez eu comecei um trabalho sobre o que orgulha o Brasil. A Petrobras e o Correio entravam, mas já não entram mais, já não orgulham o Brasil - decadência.

    Deixar continuar esse Governo leva a uma decadência. Cortar esse Governo sem argumentos muito sólidos levará a uma instabilidade política na democracia.

    Eu não estou pronto para dizer se vou votar a favor ou contra o impeachment. Quando eu sair daqui, tomar um táxi, o motorista vai querer saber, ele não vai querer esse raciocínio. Até porque nós entramos, nos últimos meses, no Brasil, na política, em um processo de Fla-Flu, a favor ou contra. Não existe mais ninguém querendo pensar, refletir, analisar. Isso se tornou coisa do passado.

    Reparou nisso? Ninguém quer analisar - "Lá vem você com a sua análise! Eu quero é saber: corta-se ou não a cabeça das pessoas?" Quando eu sair daqui o taxista vai me perguntar, e é capaz de ele, como a maioria dos brasileiros, querer o impeachment - diferentemente de alguns, que não o querem. De qualquer maneira é um Fla-Flu, com uma torcida maior ou menor.

    Gente, a política não pode ser feita como torcida de futebol, até porque, meu caro Hélio, no futebol, depois dos 90 minutos, ou com um pouquinho mais, acaba o jogo. Na política, não acaba o jogo, não acaba. Se a gente aqui fizer o impeachment, no outro dia continua com o novo presidente. E aí? Como é que vai ser com o novo presidente? Ele vai levar adiante ou não a Lava Jato? Ele vai dar independência ou não à Polícia Federal? Ele vai ou não tentar, embora eu ache que ninguém consiga fazer isso, interferir no Ministério Público? E o ajuste? Como é que ele vai fazê-lo? No outro dia ele vai ter que decidir isso.

    No futebol não há o dia seguinte, a não ser a comemoração ou o chororô, mas acaba o jogo. Na política, o jogo não acaba. E se não houver o impeachment? No outro dia vai continuar a Dilma? E se Dilma continuar, ela vai continuar dizendo: "Está vendo? Não houve impeachment. Logo, vamos soltar quem está preso por causa da Lava Jato. Logo, não houve nada de errado na Petrobras, está tudo ótimo. Vamos para a rua com as bandeiras vermelhas porque não houve impeachment". Ou será que ela vai chegar e dizer: "Gente, eu entendi o recado, eu quero mudar, vou fazer um governo de unidade nacional. Convido a oposição, convido todos. Eu quero acertar".

    O que ela vai fazer? Eu acho que vai acontecer a primeira coisa - depois de certa idade, é difícil mudar - mas vai haver o dia seguinte. Em política, há o dia seguinte. A política não termina depois que acontece o que a gente quer. Aliás, se acontecesse, se terminasse, na eleição de 2014 tinha terminado o jogo. Mas não, continuou o jogo, tanto que deu errado. Houve eleição, ganharam a eleição, e ninguém está contente.

    Houve traições muito fortes nas promessas, nas propostas; houve mentiras muito - desculpem-me a palavra - desavergonhadas, elaboradas por marqueteiros; houve não só pedaladas, mas trapalhadas muito grandes na economia. E isso o povo percebeu, e nós percebemos e temos de tomar uma decisão.

    Aí há quem diga: "Analisar é ficar em cima do muro." Nós entramos em um tempo em que analisar é ficar em cima do muro. Ficar em cima do muro é quando você não vota de um jeito nem do outro. Analisar é quando você pensa, pensa, pensa, até o dia do voto e, no dia do voto, você vota - e eu espero que o voto seja aberto; o meu, inclusive, vai ser aberto, eu não vou esconder o meu voto.

    Então, não está em cima do muro quem vota. Agora, até o dia de votar, você tem de pensar, de refletir, de saber as consequências do dia seguinte, as consequências terríveis de continuar o Governo da Presidente Dilma e as consequências muito preocupantes de interromper o mandato de Presidente no meio de um mandato em um regime presidencialista.

    Aliás, quero dizer que sempre fui claramente defensor do presidencialismo, mas eu começo a pensar que talvez a gente devesse entrar no parlamentarismo. Ao mesmo tempo, pensemos, sim, no parlamentarismo. Vocês já imaginaram quem seria o primeiro-ministro? Eu acho que o mais forte candidato seria o Sr. Cunha, que é um dos nomes mais fortes do Partido maior - tanto que conseguiu ser Presidente da Câmara. Quem consegue ser Presidente da Câmara é quase automaticamente primeiro-ministro. Então, também não é a saída.

    Ninguém quer ouvir, porque todo mundo tem pressa. A saída não é presidencialismo, não é parlamentarismo: é educação. A saída é um ano, dois anos, três anos, dez anos, vinte anos, trinta anos de educação. Aí dá certo o presidencialismo dos Estados Unidos; dá certo o parlamentarismo, com rainha, na Inglaterra; dá certo o parlamentarismo, com presidente, na Alemanha. É educação! Só que não vai dar tempo de fazer essa educação. Nos próximos meses, a gente vai ter de tomar essa decisão.

    Eu quero dizer aqui, primeiro, que não é golpe e, segundo, que acho positivo que o processo do impeachment esteja avançando, mesmo que tenha sido pelas mãos desse Sr. Cunha. Mesmo pelas mãos dele, com origem no Hélio Bicudo e no Reale Júnior, acho positivo.

    Deixem essa Comissão analisar o assunto. Dessa Comissão, alguém pode dizer: "Mas ela é parcial". Mas isso vai ser debatido no plenário e, no plenário, não é só a maioria: 2/3 têm que ser a favor. Se 2/3 da Câmara estiverem a favor, aí, gente, começa a ficar realmente claro que vale a pena correr esses riscos todos de interromper, pela segunda vez em quatro, o mandato de Presidente. E se forem obtidos todos esses votos, vem para cá, onde haverá um julgamento longo, lento, com posições a favor, com posições contra.

    Sobre isso que eu li - "probidade na administração, Lei Orçamentária, cumprimento das leis" - vai-se levar semanas ou meses discutindo para saber se houve ou não. Mas vai-se discutir legalmente. O voto para escolher um Presidente é político. O voto dos Parlamentares para tirar um Presidente não pode ser só político. Primeiro-ministro, a gente tira politicamente. Presidente, pensa-se mais de uma vez, como rei: ninguém destitui rei politicamente. É uma revolução, uma transformação radical do marco legal - que não é o caso, porque aí rompe a Constituição.

    A gente não quer romper a Constituição, deu trabalho demais para conquistá-la. Até porque romper a Constituição para tirar a Presidente sem argumentos dá ensejo ao desejo de quererem romper a Constituição para acabar a gratuidade da universidade; para acabar com a estabilidade do emprego do funcionário público; para acabar com o artigo que proíbe redução de salários; com a liberdade de imprensa. E, aí, você começa a acabar com coisinha, e coisinha, e coisinha, e, quando vê, isto aqui está acabado.

    Da Constituição você não consegue rasgar só uma página. Quando você rasga uma página, você já está começando a rasgar mais uma, e mais uma, e mais uma. Você reescreve, mas reescreve dentro da forma, do rito determinado aqui, que toda semana a gente vê aqui. Aliás, é lamentável: só se devia reformar a Constituição uma vez a cada tantos anos. Mas aqui passa por todos os rituais: debate, debate, debate, 27 assinaturas só para começar; depois, uma maioria qualificada, não só 50%; depois, outra votação. Eu mesmo tenho uma proposta de reforma da Constituição que foi votada em 1º turno faz uns três ou quatro anos e não voltou ainda para ser votada pela segunda vez.

    É preciso muito cuidado, muito rigor.

    Eu vou tratar com todo rigor. Aí recebo e-mails todos os dias, muitos, dizendo: "Perdeu meu voto, porque não disse que vai votar pelo impeachment já."

    Eu lamento, mas vou perder. Eu só espero que espere o dia da votação, eu só espero que espere o dia em que eu der o meu voto para, depois, poder perder o voto. Se eu perder, eu perdi. Não vou abrir mão dos meus princípios. Ainda hoje discuti muito com a pessoa próxima a mim. "Mas a maioria quer! Você tem que dizer "já". Quem foi eleito tem que seguir o que a maioria quer." Aí, como é que eu sei qual é a maioria? O Datafolha? A Rede Globo? Ou porque muita gente fala comigo? Aí, sim. Se é a maioria, aí teria uma forma, Hélio. Sabe qual é? Plebiscito.

    Estava faltando aqui. Aqui podia ter uma proposta de plebiscito para saber se Presidente continua ou não.

(Soa a campainha.)

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Eu estou circulando e vou trazer para você, agora, se tiver à mão, a minha proposta de reforma da Constituição que prevê a ideia do chamado recall, que é uma reeleição para todos aqueles que são eleitos majoritariamente: Senador, governador, prefeito e presidente.

    Com assinatura de um certo número de pessoas, aí a gente faz uma outra eleição, que é um plebiscito. Só não é eleição porque eleição é entre uma e outra pessoa. Essa seria com uma pessoa só, sim ou não. Talvez essa fosse a melhor maneira. Talvez o erro da Constituição foi não ter colocado aqui, em vez de impeachment, embora a palavra impeachment não apareça aqui, mas, em vez de impeachment, a palavra teria que ter sido "plebiscito" para decidir se o Presidente continua ou não; o governador continua ou não; o prefeito continua ou não; o Senador continua ou não.

    Aí você poderia dizer: "E os Deputados?". Deputado é diferente porque ele é eleito proporcionalmente. Então, ele é eleito sem os votos dele; ele é eleito com a soma dos votos.

    Aí não dá para a gente fazer o chamado recall, a não ser que a gente entre na chamado eleição distrital, que é um a um candidato em cada distrito. É outra discussão.

    Deveria ser plebiscito. É uma pena estarmos discutindo impeachment. Deveríamos estar discutindo um plebiscito para saber se a Senhora Dilma continua ou não como Presidente. Tiraríamos esse poder dos Deputados, tiraríamos esse poder dos Senadores e tiraríamos também essa responsabilidade de você ter que saber se houve ou não crime, que não é uma coisa tão nítida, preto e branco, que tem suas nuances que precisamos considerar. Vou olhar as nuances, eu vou olhar tudo.

    Mas, desde já, digo que fico satisfeito que haja um processo de impeachment, acho positivo que haja o processo, mas não vou dizer agora se já vejo ou não os argumentos, Senador, para votar o impeachment, não vou dizer. Posso até no meu foro íntimo ter o sentimento, mas vou julgar, e quem vai julgar não começa dizendo antes de o julgamento começar. Tem que esperar que cheguem aqui os autos do processo; tem que analisar com lupa os argumentos dos que pediram o impeachment, pessoas pelas quais tenho o maior respeito; tem que analisar; tem que ouvir outros juristas para aí decidir com responsabilidade as consequências da interrupção do mandato de um presidente no presidencialismo, que tem consequências sérias, queiram ou não. Cria um descrédito de que o mandato não é para valer.

    Estava falando aqui que, de quatro presidentes eleitos, se a Dilma sofrer o impeachment, são dois com impeachment, metade, ou seja, 50% de chance de não terminar o mandato. É desmoralizante isso.

    Nos Estados Unidos, pelo que eu saiba, não houve nenhuma interrupção de mandato por impeachment. Já mataram até presidente, e um foi obrigado a renunciar, para não ter o impeachment, o Nixon, que era capaz de ter tido. O Clinton sofreu, mas não teve; não deram o impeachment.

    Caramba, desde 1776, que há a independência, e pouco depois começou a eleição. Nunca houve! A gente tem há 30 anos! Mas, se for preciso, esta Casa tem que ter a dignidade de votar pelo impeachment. Constatou-se que houve crime, tem que votar.

    É mais perigoso para a democracia manter um presidente que cometeu um crime do que derrubar um presidente no meio do mandato. É mais perigoso manter depois de ter o crime reconhecido. Agora, tirar sem ter o crime comprovado, reconhecido, carimbado, aí é muito ruim, ainda que se saiba que a continuação deste Governo que aí está vai ser um desastre para o Brasil! Fico muito à vontade, porque não votei nela. Fico muito à vontade porque eu alertava para isso, nos últimos anos, de que isso iria acontecer.

(Soa a campainha.)

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Eu disse que isso iria acontecer. Tentei convencer muitos eleitores a não votarem porque isso iria acontecer, estava escrito.

    Mas 53 milhões votaram. E esses 53 milhões, mesmo arrependidos agora, têm de ser respeitados, ou então até, como diz um conhecido meu, têm de ter a chamada pedagogia do erro: "Olha, cara, na próxima eleição toma cuidado, não elege qualquer um." É melhor do que dizer: "Vota de qualquer jeito, porque, se não der certo, a gente tira." São duas alternativas. Uma que diz: "Vota de qualquer jeito, depois a gente tira."; e a outra que diz: "Cuidado, se você errar, vai aguentar quatro anos." Qual é a melhor para a democracia? Eu ainda acho que a melhor é esta: "Cuidado, vai ter de aguentar quatro anos." Agora, ...

(Interrupção do som.)

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - ... para isso há o impeachment. E impeachment não é golpe. O meu Partido está errado, quando diz que impeachment é golpe. Impeachment não é golpe, impeachment é previsto na Constituição. Mas, se eu defendo que não é golpe, porque está previsto na Constituição, eu tenho também de olhar o artigo que diz como se faz impeachment. Não posso olhar a Constituição para dizer que impeachment não é golpe e depois " agora eu vou votar no impeachment sem ligar para a Constituição". Tem-se de respeitar a Constituição, de que impeachment não é golpe e de como se chega ao impeachment, através de uma avaliação cuidadosa não dos erros, mas dos crimes, e não votando apenas, mas julgando.

    Quando o Senado se reúne para o impeachment, nós nos transformamos em juízes, ...

(Soa a campainha.)

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - ... não apenas em eleitores, não apenas em Parlamentares. E é como tal que eu vou votar, se chegar aqui. Eu, sinceramente, espero que chegue, eu gostaria que chegasse aqui. Não gostaria que esse processo fosse interrompido na Câmara ou pela Comissão, que já pode mandar arquivar, e o povo brasileiro não vai entender, porque vão arquivar sem fazer uma análise mais profunda, com um número maior de Parlamentares, que são poucos.

    Eu espero que chegue aqui e que a gente faça um debate sério, mas não votemos com raiva; não votemos porque não votamos na Presidente Dilma; não votemos pelo impeachment porque não votamos nela; não votemos pelo impeachment porque estamos com raiva; não votemos pelo impeachment porque ela está fazendo tudo errado; não votemos pelo impeachment nem mesmo pelas dificuldades que vamos enfrentar mais três anos. Se votarmos no impeachment é porque constatamos, porque até parece que há mesmo crimes. Mas votemos com a seriedade que a história exige.

    Eu estou satisfeito de estar na história sem a responsabilidade de ter votado na Dilma, neste mandato. Eu espero ficar bem na história dizendo que votei contra o impeachment e não derrubei Presidente, ou ficar bem na história dizendo: eu votei pelo impeachment, lamentando derrubar um presidente, mas porque não havia outro jeito, porque, com um crime, eu não sou conivente. Mas preciso de tempo para chegar a essa posição.

    Senador Hélio, agradeço. Mas o Senador pediu me um aparte com muito prazer.

    O Sr. Dário Berger (PMDB - SC) - Bem, Senador Cristovam, ...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Dário Berger (Bloco Maioria/PMDB - SC) - ... V. Exª, como todos nós sabemos - Presidente Hélio José, prezado amigo e vizinho, do mesmo corredor -, é proprietário, vamos dizer assim, de uma retórica privilegiada, de posições firmes e de uma consciência ilimitada, vamos dizer assim, principalmente em momentos de crise, como estamos vivendo. Invariavelmente, principalmente nós os mais novos, não pela idade, mas por ter chegado aqui depois de V. Exª, ...

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Pela idade também.

    O Sr. Dário Berger (PMDB - SC) - ... ficamos, eu, pelo menos, fico cada vez mais admirado com as posições de V. Exª, porque V. Exª tem posições, inclusive, flexíveis quando necessárias, e eu acho que o povo espera de nós exatamente esse tipo de posição. Não há nenhuma dúvida de que nós estamos vivendo uma crise. Eu mesmo já tive a oportunidade de abordar essa problemática, dessa mesma tribuna que V. Exª ocupa agora, e tive o privilégio de ser aparteado também por V. Exª, dando uma contribuição importante do momento em que nós estamos vivendo, da crise que avança e que destrói os orçamentos domésticos, aumenta nossa desesperança e contribui para um cenário quase imprevisível no futuro, se providências urgentes não forem tomadas. Bem, nós estamos diante de um momento histórico novamente do Brasil. Nós estamos aí discutindo, agora, que o processo foi instalado, mas sequer ele teve sequência e continuidade, o impeachment de um Presidente da República, de uma Presidenta da República. Isso não é coisa pequena, não. Isso precisa ser avaliado com muita serenidade, e é neste momento que esta Casa, que é uma Casa moderadora, uma Casa do equilíbrio, precisa ter a serenidade e o equilíbrio necessário para que a gente não seja um protagonista das injustiças. Essa é que é a verdade. E eu tenho certeza absoluta de que nós vamos acompanhar atentos a sequência desse episódio. E, se esse episódio vier ao Senado Federal, nós vamos ter que tomar uma atitude, e essa atitude, de minha parte, será sempre aquela preocupada com o futuro do Brasil e com o futuro da nossa Nação. Eu não vim aqui para votar impeachment. Nunca imaginei que eu pudesse deparar com uma situação dessa. A minha vida pública nunca foi para destruir, foi sempre para construir. Se V. Exª me permite me alongar um pouquinho, a minha vida pública foi destinada praticamente quase toda no Executivo. E um belo dia, em uma reunião com o Ministério Público, fui ordenado a tomar uma decisão de regularização fundiária: ou regularizava ou teria que colocar o trator em cima de comunidades inteiras. E eu me recusei a fazer aquilo porque aquelas obras e aquelas casas eram áreas consolidadas, como V. Exª sabe. O Brasil foi construído praticamente irregularmente, ainda mais com a nossa cultura açoriana, em que o pai era proprietário de uma gleba de terra, o filho casou, ele desmembrou um pedacinho e foi ocupando aquelas terras, etc. E, agora, o Ministério Público está a exigir, vamos dizer, uma solução para aquela questão: ou regulariza, ou derruba. E eu tive a oportunidade - me ocorre agora, eu acho que esse é um fato interessante - de dizer ao Ministério Público que eu não vim para destruir, eu vim para construir. Esse sempre foi meu propósito e esse continuará sendo meu propósito aqui. Por isso que...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Dário Berger (PMDB - SC) - ... eu admiro tanto V. Exª, porque eu tenho em V. Exª aqui uma inspiração, não só pelos princípios da educação, que V. Exª defende e que eu acho que é a grande revolução, e nós já temos exemplos de outros países. A Coreia do Sul é um dos países que é um exemplo de que, ao investir na educação, os resultados são objetivos, rápidos e eficientes. Nós temos, também, que nos voltar para a educação. Mas, voltando ao nosso processo aqui propriamente dito, eu quero parabenizar V. Exª, mais uma vez, pela serenidade, pelo equilíbrio, pela consciência firme e pela retórica privilegiada que V. Exª tem aqui e que só eleva a discussão nessa Casa Legislativa. Meus parabéns pelo pronunciamento e muito obrigado pelo aparte.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Eu que agradeço, profundamente, esse aparte tão simpático de sua parte, e é um prazer ter estado este ano, de 2015, com o senhor.

    O SR. PRESIDENTE (Hélio José. PMB - DF) - Nobre Senador.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - E eu espero continuarmos aqui, o tempo que for preciso, fazendo isso que o senhor trouxe aqui, pensar no Brasil.

    A pergunta não é se somos a favor ou contra o impeachment. A pergunta é o que é melhor para o Brasil: fazer um impeachment ou não fazer um impeachment. E não é tão simples qual é melhor para o Brasil não. Há vantagens e desvantagens num e noutro.

    Era isso, Sr. Presidente.

    O SR. PRESIDENTE (Hélio José. PMB - DF) - Nobre Senador Cristovam, eu gostaria de saudar V. Exª pela clareza do raciocínio, pela tranquilidade de fazer uma análise criteriosa sobre as questões constitucionais e legais.

    Não resta dúvida de que, no Brasil inteiro, discute-se esse assunto. Se fosse um plebiscito, seria uma atitude realmente muito mais interessante, porque poderíamos ter uma participação massiva de todo mundo numa decisão tão importante quanto essa, mas, como o processo indica essa questão lá, na Câmara, só esperamos nós, aqui, torcemos para que o processo tenha uma tranquilidade de encaminhar, que ele se encaminhe da forma adequada, da forma constitucional, e não da forma açodada e nem de uma forma errada.

    O STF debruçou-se sobre a questão para tentar realmente fazer o rito constitucional. Como temos plena clareza da posição que o STF pode tomar na próxima quarta-feira, estamos todos esperançosos de que o processo continue com o seu curso normal...

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Isso. Isso.

    O SR. PRESIDENTE (Hélio José. PMB - DF) - E que possamos todos ter o melhor julgamento possível em prol do nosso País, em prol do crescimento da economia deste País.

    Eu queria falar que o meu vizinho, nobre Senador Dário Berger, é um excelente vizinho, que eu adoro, é meu amigo, e para mim é com muito prazer que pude compartilhar com V. Exª e com o nosso professor, meu Reitor da UnB, Senador Cristovam, a possibilidade de estar aqui defendendo a educação, os direitos humanos, falando da política grande, esta política sem mesquinhez, como V. Exª falou dessa tribuna. Parabéns.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Muito obrigado, Senador.

    O senhor me provocou a que eu fizesse uma provocação a quem está nos assistindo. Veja bem, não tenho essa experiência, felizmente, pois nunca desfiz o meu casamento, só tenho um casamento. Mas, se para desfazer um casamento, para se fazer um divórcio, as pessoas pensam tanto, imagine fazer um impeachment apressado, porque é um casamento com 220 milhões, e tem a ver com o futuro de todos.

    Portanto, isso merece que haja uma reflexão no mínimo tão cuidadosa quanto para um divórcio entre um homem e uma mulher, entre um casal. Espero que a gente reflita muito bem. Que não façamos apressado, que não façamos apenas pela raiva, que não façamos por uma questão de erro, mas por uma questão de crime, como está previsto na Constituição, que diz também que impeachment não é golpe.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/12/2015 - Página 203