Discurso durante a 224ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa de uma profunda rediscussão da questão indígena no País.

Autor
José Medeiros (PPS - CIDADANIA/MT)
Nome completo: José Antônio Medeiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS E MINORIAS:
  • Defesa de uma profunda rediscussão da questão indígena no País.
Publicação
Publicação no DSF de 15/12/2015 - Página 79
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS E MINORIAS
Indexação
  • REGISTRO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, MUNICIPIO, JUINA (MT), ESTADO DE MATO GROSSO (MT), MOTIVO, HOMICIDIO, VITIMA, ADOLESCENTE, AUTORIA, COMUNIDADE INDIGENA, REGIÃO, ENFASE, AUSENCIA, PAGAMENTO, PEDAGIO, PROPRIEDADE, GRUPO INDIGENA, DEFESA, ELABORAÇÃO, POLITICAS PUBLICAS, ASSUNTO, PROTEÇÃO, DIREITOS, INDIO.

    O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Jorge Viana, Srªs e Srs. Senadores, todos que nos acompanham pela Agência Senado aqui na Casa, hoje, o que me traz à tribuna é um assunto que eu jamais gostaria de trazer. Trata-se de uma tragédia que aconteceu no Estado de Mato Grosso, no Município de Juína, e que foi até noticiada agora no Jornal Hoje. O Município de Juína é praticamente tomado por aldeias indígenas. Há algum tempo, foi instalado lá um pedágio, os indígenas instalaram um pedágio. Nesse fim de semana, infelizmente, segundo os primeiros informes, dois rapazes acabaram se evadindo desse pedágio, não pagaram o pedágio. E eles foram barbaramente assassinados. Essa é uma situação a respeito da qual a gente precisa tomar providências.

    Existe praticamente um tabu ao falarmos sobre a questão indígena no Brasil. Alguns dogmas vão se formando. E parece que, quando falamos qualquer coisa sobre os índios, somos contra os índios. Eu, particularmente, não o sou, mas tenho defendido, nesta Casa, que o papel da Funai possa ser um papel diferente do que está sendo. Não sei se a Funai está sucateada, não sei qual é a realidade, mas o certo é que, ultimamente, uma questão que já parecia ser do passado tem sido constantemente pauta dos noticiários: os conflitos entre a população de índios e a de não índios.

    Recentemente, em Mato Grosso do Sul, foi um índio que morreu. Há pouco tempo, em Rondônia, não índios morreram. E, agora, morreram duas pessoas, dois jovens: Marciano e Genes. As famílias estão destroçadas. E o pior é que a comunidade do Município de Juína, formada por produtores que ali têm contato direto com os índios, por pessoas que a toda hora passam por esse pedágio, está revoltada, está em pé de guerra.

    É por isso que faço um apelo ao Ministro José Eduardo Cardozo. Em que pese eu ser de um Partido de oposição, tenho de louvar a postura do Ministro José Eduardo Cardozo, que é um democrata, um exímio constitucionalista, alguém que entende muito do que é o Estado e do que são as relações entre as pessoas. Agora, nós precisamos falar da Funai além da retórica, porque não é possível que assistamos constantemente a esses fatos, que, cada vez, são mais violentos. Daqui a pouco, temo que uma comunidade dessa se revolte, invada uma aldeia e aconteça uma tragédia maior.

    Quem ganha com isso? Essa tem sido a nossa preocupação, Senador Jorge Viana. V. Exª é de um Estado que também faz parte do Amazonas. São Estados onde há comunidades indígenas. Qual é o nosso papel como Parlamentares? O que podemos fazer? Não muito. O que podemos fazer é cobrar. Solicitei uma audiência na Comissão de Direitos Humanos para que possamos tratar desse tema, não pelo caso em si, mas que possamos fazer deste um estudo de caso para evitarmos novas tragédias.

    Penso que basta, que passou da hora de terminar com essa história de pedágio! Na BR-070, recentemente, em um espaço de 50 quilômetros, havia 14 praças de pedágio. Em uma mesma aldeia, eles se repartiram e começaram a cobrar pedágio. Quer dizer, isso é intolerável, não é possível acontecer.

    Agora, de outra forma, nós também precisamos saber que a comunidade indígena precisa viver. Essa história de dizer que os índios podem...

    O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Senador José Medeiros, primeiro, eu queria ser solidário com V. Exª, mas, talvez, convenha explicar para quem nos está ouvindo pela Rádio Senado e nos assistindo pela TV Senado: quando V. Exª fala de pedágio, todos entendem que se trata de um pedágio estabelecido pela concessionária ou mesmo pelo responsável pela rodovia, mas V. Exª está se referindo a uma cobrança não regulamentada do ponto de vista da lei. Não é para tomar partido, não! É só para mostrar que há ali uma cobrança, uma exigência de que quem passa naquela estrada pague algum dinheiro de maneira não formalizada, não legalizada. É isso? Talvez, isso explique esse conflito melhor. É só uma contribuição.

    O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Muito obrigado, Senador Jorge Viana. Eu me esqueci de colocar o pedágio entre aspas. Na verdade, no caso da BR-070, ele não é constante como é o de Juína.

    O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Nem é formal, nem é legalizado.

    O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Nem é formal. O de Juína está legalizado tacitamente, porque o Estado não o impediu. Está lá anos e anos esse pedágio. Já há uma praça instituída. No caso da BR-070, certo dia, eles disseram que a aldeia estava passando fome e montaram vários pedágios num espaço de 50km.

    Mas penso que essa ideia de que eles podem simplesmente agora viver da caça ou da pesca ou catando coquinho precisa ser revista. Nós precisamos partir do pressuposto de que, no caso dessas aldeias, Senador Jorge Viana, são 700 índios para 700 mil hectares, ou seja, são mil hectares para cada índio. Então, é preciso encontrar uma forma de eles poderem tirar o seu sustento. Podemos qualificá-los. A Embrapa ou algum órgão de extensão poderia capacitá-los a tirar o sustento da própria terra. O que não dá é ficar essa situação conflituosa, que agora culminou com essas duas mortes. Lá a população está em pé de guerra, e nós precisamos de uma saída.

    É por isso que eu dizia que nós temos um Ministro da Justiça preparadíssimo, uma pessoa que, com certeza, tem total capacidade de resolver essas questões, principalmente. Acho que não podemos passar dessa administração do Ministro José Eduardo Cardozo sem falar sobre a Funai. Tentei aqui abrir uma CPI sobre a Funai, não com o intuito de enxovalhar a Funai ou de trazer-lhe qualquer desgaste, mas para que a gente pudesse debater e ter uma Funai melhor. Isso não é possível! Ou a Funai muda, ou ela tem de desaparecer.

    Nesse caso, por exemplo, Senadora Ana Amélia, um dos funcionários da Funai, segundo os informes que obtive, presenciou a execução de um dos jovens. Ele esteve lá e disse que, no primeiro momento, chegou a evitar o ocorrido, aconselhando os indígenas a levarem esses dois jovens para a Polícia Civil. Mas penso que, em uma situação como essa, ele deveria ter ligado para o diretor da Funai e ter falado: "Olha, a questão é urgente." Deveria ter entrado em contato com Brasília, para que, imediatamente, descesse ali um helicóptero, para que se fizesse o que fosse, com a Polícia Federal junto.

    Lá ficou um jogo de empurra. A população e a família, por dias, ficaram agoniadas. Os indígenas diziam que não sabiam onde estavam esses jovens. E ficou aquele jogo de empurra. O Estado não podia intervir, porque era uma aldeia. A Polícia Federal não chegava ali. E a Funai, parece, estava com as mãos atadas. Nem vou dizer que não quiseram agir, mas o certo é que isso não aconteceu.

    De fato, agora, quando a Polícia Federal deu o ultimato e quando apareceram os corpos, a revolta foi imensa. Em Juína, neste momento, está um caldeirão, uma verdadeira ebulição, uma revolta contra os indígenas.

    Quero até fazer um pedido para a população de Juína. Com certeza, não são todos os indígenas que concordam com isso. A gente espera que o Ministério da Justiça possa, através da Polícia Federal, fazer com que os responsáveis por esse crime sejam entregues às autoridades policiais e sejam punidos, até para que a população saiba diferenciar quem cometeu o crime do restante da comunidade indígena, que está ali há anos e que convive com os demais. Ali nunca houve problema nenhum.

    Agora, a minha preocupação é a de que a praça de pedágio continue ali como se nada tivesse acontecido. Agora, imagine a situação conflituosa a cada momento que passa uma pessoa lá, porque a linha de acesso ao Município de Juína é através dessa rodovia. Cada momento em que essas pessoas são abordadas...

(Soa a campainha.)

    O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Já concluo, Sr. Presidente.

    Cada momento em que essas pessoas são abordadas pelos indígenas é um momento de conflito.

    Então, fica esse alerta. A gente espera que a direção da Funai, em Brasília, o Departamento de Polícia Federal e o Ministério da Justiça possam se debruçar sobre isso com muito cuidado, para que a gente não tenha de vir, amanhã ou depois, novamente, a chorar os mortos e a denunciar mais uma tragédia acontecida.

    Em Rondônia, houve um caso semelhante, mas a própria comunidade indígena pegou os responsáveis e os entregou à Polícia. Eu até sugiro, neste momento, que a comunidade de Juína, que, com certeza, também está nos assistindo, faça o mesmo, para que esse crime não fique sobre as costas de toda a comunidade indígena, para que uma comunidade não fique brigando com a outra.

    Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

    


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/12/2015 - Página 79