Discurso durante a 16ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Explicação dos motivos de abstenção de S. Exª na votação do projeto de lei que altera a obrigatoriedade de participação da Petrobras em exploração de áreas do pré-sal.

Autor
Cristovam Buarque (PPS - CIDADANIA/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MINAS E ENERGIA:
  • Explicação dos motivos de abstenção de S. Exª na votação do projeto de lei que altera a obrigatoriedade de participação da Petrobras em exploração de áreas do pré-sal.
Aparteantes
Raimundo Lira, Regina Sousa.
Publicação
Publicação no DSF de 26/02/2016 - Página 23
Assunto
Outros > MINAS E ENERGIA
Indexação
  • EXPOSIÇÃO, MOTIVO, ABSTENÇÃO, ORADOR, VOTAÇÃO, PROJETO DE LEI DO SENADO (PLS), AUTOR, JOSE SERRA, SENADOR, OBJETO, ALTERAÇÃO, REGULAMENTAÇÃO, EXPLORAÇÃO, PRE-SAL, RETIRADA, OBRIGATORIEDADE, PARTICIPAÇÃO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS).

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Presidente, Renan Calheiros, houve um consenso aqui de que, ontem, o senhor presidiu uma sessão histórica. E eu concordo. Mas uma sessão que não me deixou satisfeito, porque acho que ela deveria ter sido prolongada.

    Vim aqui manifestar, Senador Raimundo, que, ontem, eu assumi uma dívida; assumi uma dívida ao votar com abstenção. Abstenção é dúvida. Por que eu assumi o voto de abstenção? Porque pensei: "eu preciso de mais tempo para tomar uma decisão tão importante." Então, eu vou ter que trazer aqui, de alguma maneira, uma posição sobre aquele assunto de ontem. Mas não tenho tempo ainda hoje; não deu tempo de, realmente, analisar o que é melhor para fazermos diante dos problemas que temos.

    Por exemplo, existe uma reserva de petróleo, que, ao que tudo indica, é maravilhosa, a sete mil metros de profundidade, tendo uma empresa com a competência da nossa Petrobras, mas com dificuldades financeiras.

    Diante de nós, estão alguns problemas que, a meu ver, exigem um cuidado especial na análise. Primeiro, como é que não deixamos esse petróleo enterrado ali debaixo? Não é riqueza petróleo debaixo do chão! Riqueza é petróleo depois de extraído, transportado, refinado, inclusive com os usos seguintes ao refinamento. Isso é riqueza. Hoje, o petróleo está debaixo do chão; pelo menos, descoberto. Sabe-se que há petróleo ali. Hoje, a Geologia permite um cálculo muito aproximado da dimensão desse petróleo, e parece que é bastante. Como tirar esse petróleo dali, numa velocidade ótima? Velocidade ótima significa o seguinte: nem tão depressa, que o preço caia, e nem tão devagar, que deixe de ter valor, porque o petróleo será substituído por outras fontes energéticas. Com essa velocidade ótima, qual é a quantidade ideal de petróleo que devemos tirar do pré-sal a cada ano?

    E aí vem outro problema: a nossa Petrobras está em condições de cumprir com esse tempo ótimo? Se o tempo fosse de 30 anos, para explorar razoavelmente, eu diria que sim, mas a gente não pode esperar 30 anos. Tem de ser antes. Sendo antes, eu não tenho certeza, não tenho convicção de que a Petrobras é capaz de fazer aquela exploração.

    Por isso, a ideia do projeto do Senador Serra carrega coisas positivas, desde que, ao tirar da Petrobras a responsabilidade de colocar 30% em cada poço - o que ela não tem condições de fazer -, nós não sacrifiquemos o futuro da empresa, que é um patrimônio nacional.

    Então, este é o problema: qual é a velocidade ótima de exploração do petróleo e qual é a capacidade da Petrobras de cumprir esse tempo, essa velocidade, esse tempo ótimo? É preciso tempo. De qualquer maneira, nunca teremos certeza, mas podemos tomar precipitadamente a decisão, ou tomá-la cuidadosamente. Podemos até errar, mas fomos cuidadosos, responsáveis.

    Segundo, eu acho que, na hora de saber como aproveitar o pré-sal - esta é a pergunta -, como aproveitar, da melhor maneira possível para o Brasil, o pré-sal?

    A segunda é como recuperar a Petrobras. O Senador Blairo, ontem, falou uma coisa aqui que não tenho o menor preconceito de que se possa debater. É melhor para o Brasil ter uma empresa estatal ou uma empresa privada? Discutamos. A gente não pode ter preconceito hoje no mundo de absolutamente nada. Mas discutamos com cuidado, sem precipitação e sem preconceito, duas coisas que ontem atrapalharam o debate.

    O debate ontem, aqui, Senador Raimundo, estava dividido entre muitas outras facções - chamando assim -, entre as precipitações e os preconceitos. Eu não tenho preconceito e não sou precipitado. Se fosse necessário eu tomar uma decisão já, eu tomaria. Mas não tem nenhuma razão de ser já. Não era uma questão de vida ou morte. O petróleo não vai evaporar se a gente não decidir.

    Pois bem, como recuperar a Petrobras a serviço do Brasil e não o Brasil a serviço da Petrobras? Há pessoas que se encarnam tanto com o segmento do Brasil, que passam a defender segmento como se fosse o Brasil. A gente vê isso muitas vezes em líderes sindicais, que se apropriam tanto do interesse da sua categoria - corretamente - mas, que esquecem o resto do Brasil e pensam que só existe a sua categoria.

    Tem gente que é tão defensora da Petrobras que esquece que a Petrobras existe para servir o Brasil, e não o Brasil para servir a Petrobras. Mas a Petrobras é um patrimônio. Como salvá-lo? Não estamos discutindo isso aqui. Como desaparelhá-la do Estado? Aparelhada ao Estado, ela não serve ao Brasil, mas serve ao partido que estiver no governo. Como prestigiar seus funcionários, que estão desprestigiados hoje? Como definir um programa da Petrobras para os próximos vinte ou trinta anos? Esse é o segundo ponto.

    O terceiro é como criar emprego. O petróleo, escondido no fundo do mar, não cria emprego, a não ser dos geólogos que procuram por ele, que são poucos. O petróleo precisa ser retirado do fundo do mar para criar emprego. Hoje a quantidade de desempregados naquela região, por falta de investimentos no setor, é muito grande.

    Uma vez conversei com o Senador Lindbergh, que é representante do Rio de Janeiro e que tem uma posição muito firme em defesa da Petrobras, e perguntei se ele conversava com os desempregados em Campos, por exemplo, com os desempregados em outras cidades do Rio de Janeiro, que estão desempregados por falta de investimento, por falta de capacidade da Petrobras para fazer esses investimentos. Esse é outro ponto, Senador Berger.

    E há um outro: a substituição do petróleo. A gente está discutindo como aproveitar o petróleo/ o mundo está discutindo como substituir o petróleo. Lançaram o automóvel elétrico recentemente, e tudo indica que isso vai em pouco tempo tomar conta do mercado. Quem já era adulto no começo dos anos 80 ficou surpreso com como o computador tomou conta de tudo. A gente usava umas maquininhas de calcular manuais. Em cinco anos, saímos daquilo para o computador. Pode ser que em cinco anos a gente saia do combustível petróleo para outros combustíveis. Não vai acabar com o petróleo ainda porque o petróleo serve para fazer isso, o petróleo serve para fazer aquilo, o petróleo está na construção aqui, tem outras finalidades. Mas, como combustível, pode ser de repente, e nós não estamos trabalhando a sociedade brasileira pós combustível fóssil. Se não fizermos isso, é capaz de o petróleo ficar fóssil mesmo, no sentido econômico, não só no sentido geológico, e a Petrobras também pode ficar. Aliás, a Petrobras já deveria ter se transformado em uma empresa de energia, e não de petróleo.

    O Sr. Raimundo Lira (Bloco Maioria/PMDB - PB) - Senador Cristovam, quando for oportuno para V. Exª, gostaria de um aparte.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Imediatamente, antes mesmo que eu termine, e aí eu peço que o Presidente dê um pouco de tempo ao senhor.

    Nós temos que discutir - e eu fiquei devendo ontem aqui uma proposta sobre isso - o voto de abstenção, que não pode ser para sempre.

(Soa a campainha.)

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Daquele debate passou, mas pela minha responsabilidade com os que assistem aqui eu assumo um compromisso, Senador Blairo, de trazer minha posição. Eu votaria "sim" ou "não" se tivesse mais informações, e eu tenho a obrigação de buscá-las usando assessorias, conversando com pessoas, com especialistas. Eu vou trazer ou o meu voto "sim" ou "não" ou o meu substitutivo. O que deveríamos fazer com o petróleo que o Brasil tem para aproveitá-lo da melhor maneira possível, salvar a Petrobras, criar empregos e preparar-se para o mundo pós petróleo? Eu vou cumprir essa dívida que eu assumi ontem ao votar abstenção, mas eu passo agora, no exato momento em que termina o meu tempo, para o Senador Raimundo.

    O Sr. Raimundo Lira (Bloco Maioria/PMDB - PB) - Senador Cristovam Buarque, o voto de V. Exª é perfeitamente justificável, até porque as considerações feitas são perfeitamente compreensíveis e era minha posição até 24 horas antes da votação. Mas, no momento em que consultei o Ministério das Minas e Energia e foi confirmado que tinha havido um acordo para melhorar o projeto, para aperfeiçoar o projeto, e considerando que nós já tínhamos aqui na Casa mais de 100 dias que esse projeto vinha sendo debatido nas bancadas, debatido nos partidos, e precisamos fazer alguma coisa de diferente, alguma iniciativa nova, alguma coisa que vá em direção do que o mundo chama de modernidade da economia, então, eu votei a favor do projeto. O meu companheiro, Senador José Maranhão, Presidente do PMDB da Paraíba, que é um homem muito experiente, que foi três vezes Governador da Paraíba votou também a favor, assim como o meu companheiro, Senador Cássio Cunha Lima, de grande experiência política, que foi Governador duas vezes da Paraíba, Senador, Deputado, constituinte. Então, nós criamos essa convicção de que nós precisamos fazer alguma coisa sem a certeza, naturalmente, de que o acerto seria de 100%. Mas nós precisávamos fazer alguma coisa. E outra informação que eu gostaria de dizer é que a Petrobras é uma empresa perfeitamente viável e não vai acontecer o que aconteceu com muitas petroleiras mundiais, a exemplo do que disse aqui o Senador Roberto Requião, que perderam valor, que algumas quebraram. Por quê? Porque a Petrobras tem um grande financiador, que é o consumidor brasileiro. Enquanto no mercado internacional o preço do combustível, na bomba, varia de acordo com o preço do combustível da matéria-prima no mercado internacional - se o barril sobe, a gasolina na bomba sobe, se o barril baixa, o preço da gasolina na bomba baixa -, nós aqui não baixamos esse preço. É uma colaboração que o povo brasileiro está dando à Petrobras para recapitalizá-la, para dar condições de ela sair desse grande endividamento. Tanto é que no Brasil, apesar da insatisfação e de estarmos pagando um combustível na bomba muito caro, não há um movimento contra. Por quê? Porque nós, brasileiros, temos a mesma visão da Petrobras que V. Exª tem, que a Petrobras é um patrimônio nacional e, portanto, nós todos não contribuímos para o que aconteceu com a Petrobras, mas estamos dando a nossa contribuição para que ela volte a ser uma grande empresa e seja sempre um símbolo que representa o nosso País, o Brasil. Muito obrigado, Senador. 

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Eu que agradeço, Senador, e volto a insistir: a Petrobras é um patrimônio do Brasil, mas a serviço do Brasil, não o Brasil a serviço dela ou das outras estatais. Elas existem para servir ao Brasil. E nós temos que ajudar para que sirvam ao Brasil enquanto servirem ao Brasil.

    Eu não vou me alongar mais, Senador Renan, mas há algo que merecia um debate sobre o debate de ontem. Creio que ninguém entendeu como foi e como vai ficar a relação do PT com o Governo depois daquela votação de ontem. A sensação é de que ontem se misturou de uma maneira tão esquisita, que o projeto do PSDB terminou sendo aprovado com apoio do Governo, e uma boa parte do PT terminou ficando contra o projeto que o Governo queria.

(Soa a campainha.)

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Eu tenho a impressão de que ontem houve um ponto - não diria de ruptura - muito importante na ameaça da relação do PT com o Governo da Presidente Dilma.

    A nossa querida Senadora Regina pediu a palavra, deve ser por causa da minha provocação.

    Senador Renan, o senhor é o Presidente, e o meu tempo acabou, mas eu gostaria muito de ouvir a Senadora Regina.

    A Srª Regina Sousa (Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Pode ser, Presidente?

(Soa a campainha.)

    A Srª Regina Sousa (Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Sou a única do PT aqui, não poderia deixar passar essa sua provação. É a primeira vez que a gente votou em bloco, todo mundo, contra. Não é um rompimento com o Governo. Já aconteceu em outros momentos aqui, mas também há o viés ideológico. O senhor foi do PT, conhece a gente, e de vez em quando a gente discorda muito. Mas ontem foi mais também a questão... A gente é Governo. Tudo aqui é culpa do PT, o Governo do PT, não sei o quê o PT. E aí o Governo negociou com uma pessoa que tem só se portado como oposição aqui e não nos comunicou essa negociação. Então, nós não nos sentimos obrigados a votar, porque não fomos comunicados. Até meio-dia, até uma hora da tarde, o que nós tínhamos era que o Governo estava com a nossa posição. Foi isso.

    O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - DF) - Eu agradeço muito, Senadora. E eu a parabenizo, porque o partido não pode ser o mesmo que o governo - nem o partido ser o mesmo que o governo e nem o governo ser o mesmo que o partido. Acho isso até positivo, desde que não seja permanente e por muitas vezes, senão inviabiliza pelo menos o governo - o partido, não. O partido continua, porque partido é uma instância que não depende daquele momento.

    Mas muito obrigado, Senadora Regina, por sua colocação. Creio que o Brasil inteiro gostou de ouvi-la.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/02/2016 - Página 23