Discurso durante a 18ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Satisfação com os julgamentos de políticos e magistrados do Estado do Amapá, em decorrência das operações Mãos Limpas e Eclésia.

Autor
João Capiberibe (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AP)
Nome completo: João Alberto Rodrigues Capiberibe
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PODER JUDICIARIO:
  • Satisfação com os julgamentos de políticos e magistrados do Estado do Amapá, em decorrência das operações Mãos Limpas e Eclésia.
Publicação
Publicação no DSF de 01/03/2016 - Página 36
Assunto
Outros > PODER JUDICIARIO
Indexação
  • EXPECTATIVA, SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ), JULGAMENTO, AUTORIDADE, POLITICO, MAGISTRADO, ORIGEM, AMAPA (AP), MOTIVO, PARTICIPAÇÃO, CRIME CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, CORRUPÇÃO, IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.

    O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Elmano Férrer, Srs. Senadores, Senadoras, ouvintes da Rádio Senado, telespectadores da TV Senado, venho à tribuna hoje para destacar dois acontecimentos que considero históricos no meu Estado.

    Acontecimentos que atrasaram, levaram anos, mas esses acontecimentos que irei relatar estão começando a despertar o interesse da sociedade, do povo do Amapá e criando expectativa de um desfecho há muito esperado.

    O primeiro acontecimento, o primeiro fato que pode mudar o curso da história do nosso Estado deverá ocorrer a partir de amanhã. O STJ inicia, nesta terça-feira, as oitivas e interrogatórios com autoridades do Amapá acusadas de associação criminosa. Esse é o primeiro fato.

    O segundo fato é que, no dia 16 de março, o Tribunal de Justiça do Amapá julgará o primeiro processo da Operação Eclésia, operação deslanchada pelo Ministério Público em maio de 2012, que produziu pelo menos quatro dezenas de processos criminais de improbidade administrativa envolvendo deputados estaduais da Assembleia Legislativa do Amapá.

    Então, esses dois fatos estão criando uma enorme esperança de que finalmente se faça justiça.

    Vejam, no dia 1º de março, amanhã pela manhã, o Juiz Márcio Flávio Mafra Leal, que é o juiz instrutor designado pelo STJ, vai inquirir os Desembargadores Gilberto Pinheiro, Carmo Antônio e Agostinho Silvério. Três desembargadores do Tribunal de Justiça que estão sob suspeita do STJ de práticas ao arrepio da lei.

    Ainda amanhã, também deverá ser inquirido, interrogado, o Procurador de Justiça e Corregedor-Geral do Ministério Público Estadual, Jair Quintas. No dia seguinte, 2 de março, às 9h30, serão ouvidos e interrogados o ex-desembargador, hoje aposentado, Luiz Carlos Gomes dos Santos, o Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado José Júlio de Miranda, o Deputado Estadual Moisés Souza e os juízes Antônio Colares, Carlos Canesin e Marco Miranda.

    À tarde, a partir das 15h, será a vez do ex-Prefeito de Santana Antônio Nogueira, seguido da Srª Nelci Vasques, funcionária do Tribunal de Contas; e, por último, do Conselheiro Amiraldo Favacho.

    Então, essas autoridades estão sendo investigadas, segundo o Superior Tribunal de Justiça, por associação criminosa. Evidente que há muito pesa desconfiança sobre o comportamento de alguns magistrados, e essas desconfianças agora poderão ser esclarecidas pela ação do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que, no bojo da Operação Mãos Limpas, que aconteceu em 2010, também está investigando essas autoridades do Judiciário, do Ministério Público e do Tribunal de Contas.

    O segundo fato que enche a sociedade de esperança, que começa a despertar atenção é que, no dia 16 de março, começa o julgamento dos processos da chamada Operação Eclésia. Uma operação do Ministério Público Federal com a Polícia Civil do Estado que teve uma ordem de busca e apreensão concedida pelo Tribunal de Justiça, pela qual eles entraram na Assembleia Legislativa e recolheram provas robustas que sustentam esse processo que vai à julgamento no dia 16, no Tribunal de Justiça do Amapá.

    É um julgamento público, e a sociedade poderá acompanhar. Os réus são as seguintes autoridades: o Sr. Janiery Torres Everton; o ex-Deputado e Secretário da Mesa Jorge Evaldo Edinho Duarte; o Sr. Edmundo Ribeiro Tork Filho; a Srª Maria Orenilza de Jesus Oliveira; o Deputado e ex-presidente, por vários mandatos, da Assembleia Legislativa do Amapá Moisés Reategui de Souza; e o Coronel da Polícia Militar do Amapá Lindemberg Abel do Nascimento. Esses serão julgados no dia 16 de março.

    A expectativa, Srs. Senadores, é enorme. A expectativa é muito grande, porque é necessário que se esclareça isso definitivamente, estabelecendo a diferença entre quem age corretamente na política e quem usa os seus mandatos para praticar crimes, principalmente desviar recursos públicos.

    Ainda há pouco, Senador Elmano, eu comentei aqui num aparte a V. Exª que, no caso do Amapá, eu conheço bem o que aconteceu com os recursos, porque eu acompanho a contabilidade pública desde a época em que o dinheiro passou a ter memória, desde 1994. E os dados da contabilidade não mentem, a contabilidade conta a história da execução orçamentária. Eu, pessoalmente, fiz a pesquisa, no balanço geral do Estado, para acompanhar os gastos relativos aos Poderes de 1995 até os dias de hoje. E essa malversação envolvendo os Poderes, principalmente a Assembleia Legislativa e o Tribunal de Contas, o desvio de recursos que calculo estar na ordem, nos últimos 25 anos, de R$1,5 bilhão a R$2 bilhões, começa, efetivamente, a ocorrer a partir de 1994.

    Eu fui candidato à eleição, que foi para o segundo turno, e, no dia 15 de novembro, saímos vitoriosos. O Governador à época convocou os chefes dos Poderes e transferiu todos os recursos. No dia 15 de novembro, o orçamento já estava na Assembleia. Eles fizeram essa reunião e transferiram todos os recursos de investimento que estavam previstos para 1995 para os Poderes. Agora vejam que nós tínhamos apenas quatro anos de instalação do Estado. Eu sucedi o primeiro Governador eleito, eu era o segundo Governador eleito. O Amapá tinha gastos reduzidos, reduzidíssimos, com a folha de pagamento, porque a União manteve o custeio da folha. Então, nós tínhamos uma grande capacidade de investimento. E, nesse momento, no final de 1994, foram transferidos todos os valores de investimento para a Assembleia Legislativa, o Tribunal de Contas, o Ministério Público e o Tribunal de Justiça.

    Eu fiz uma comparação entre as transferências aos Poderes e os investimentos feitos pela Secretaria de Obras, que é a secretaria que constrói escolas, hospitais, rede de esgoto, que coloca água, que coloca energia. Em 1994, a Secretaria de Infraestrutura investiu R$40 milhões, e os Poderes gastaram R$34 milhões. Veja o que acontece em 1995. Em 1995, depois dessa transferência de recursos de investimentos para os Poderes, os Poderes foram para R$81 milhões, ou seja, saíram de R$34 milhões para R$81 milhões de um ano para o outro, e a Secretaria dos Investimentos, a Secretaria de Obras caiu de R$40 milhões para R$3,5 milhões. Levando em consideração a receita total do Estado, em 1994, a Secretaria de Infraestrutura investiu 14,4% do total da receita; em 1995, isso caiu para 1,1%, ou seja, desapareceram os recursos de investimento do Estado do Amapá. Quando se atualizam esses valores, isso se repetiu a cada ano. Eu tentei convencê-los mostrando o absurdo da situação, mostrando como as instituições de um Estado agiam contra o bem-estar do seu povo. Não consegui convencê-los, Srs. Senadores. Ao contrário, eles queriam aumentar a sua participação no orçamento a cada ano, mas nós conseguimos mantê-la no mesmo patamar de 1995 durante seis anos e aí recuperamos em parte a capacidade de investir do Governo do Amapá.

    Essa situação de desvio, de desmando, de corrupção começa naquele momento. Eles estabeleceram o que eles chamavam de harmonia entre os Poderes. E eu passei a ser estigmatizado como gerador de confusão, o criador de caso que não aceitava aquilo, mas eu não tinha compromisso com desvio de recurso, eu não tinha compromisso com a associação para o crime, eu tinha compromisso com os direitos da coletividade. Foram esses direitos que eu defendi até o fim.

    Eles chegaram a me afastar do governo, o que, na verdade, nunca conseguiram, mas votaram meu afastamento. O TRE cassou o meu registro de candidato à reeleição em 1998, o que nós revertemos aqui no TSE. Então, foi uma luta que continua até hoje: várias armações, acusações infundadas, denúncias vazias, denúncias sem sentido, denúncias caluniosas para tentar que nós recuássemos diante das nossas posições de defesa intransigente da necessidade coletiva.

    Vejam: este é o momento fundamental na vida da nossa sociedade, porque está sendo investigada gente do Tribunal de Justiça, do Ministério Público, do Tribunal de Contas, da Assembleia Legislativa, componentes dos Poderes do Estado que, lá atrás, se apropriaram desses valores fantásticos de que eles não necessitavam. Não havia a menor necessidade. Não se salta de R$34 milhões em um ano para R$81 milhões no outro, principalmente em um período em que não havia inflação - inclusive, houve uma deflação nesse período. No entanto, eles se apropriaram desses valores que ninguém sabe... Aliás, ninguém sabe, não; hoje já se sabe, pelas investigações que estão aí. Em 2010, vários foram presos de novo, inclusive o Governador na época, vários secretários, e vários Parlamentares respondem por ações criminais. Então, depois de 25 anos, começa-se a se esclarecer por que as nossas cidades todas não estão contempladas com água tratada e esgotamento sanitário: o dinheiro foi simplesmente desviado.

    Essa é a realidade do Amapá. Se essa realidade se reproduz em outros Estados, eu não conheço tanto quanto eu conheço a contabilidade pública do meu Estado ano após ano. Eu conheço os dados, como cresceu a receita, como era distribuída essa receita e como era aplicada.

    Eu tive tanto cuidado que foi do Amapá que surgiu a ideia da transparência dos gastos públicos. A situação era tão vexatória e era tão difícil governar com uma elite ambiciosa que eu terminei colocando todas as contas bancárias - não só as receitas e as despesas - à disposição de todos na internet. Daí, então, termos sido o primeiro Estado - nós somos pioneiros - na transparência dos gastos públicos, que mais tarde eu trouxe aqui para este Senado e virou lei, a Lei da Transparência, a Lei Complementar nº 131. E nós trabalhamos para que a sociedade se apodere dessa lei, porque ela obriga a criação dos portais de transparência, e a sociedade precisa acompanhar os gastos públicos.

    Por último, Sr. Presidente, preocupado com a gastança, eu mostrei aqui, um dia, para corroborar o que eu estou falando, que a Assembleia Legislativa do Amapá, em 2013, gastou em diárias 15 vezes mais do que o Senado da República. Nós aqui no Senado gastamos em diárias de viagens R$1,2 milhão. A Câmara dos Deputados, com 513 Deputados e Deputadas, gastou R$2,9 milhões em diárias de viagens em 2013. A Assembleia Legislativa do Amapá gastou R$17,5 milhões. Isso não pode continuar.

    Você não pode sacrificar gerações e gerações por viverem em condições de sanidades precárias, morrerem por ataque de verme, conviverem com a malária, a dengue, porque os recursos que poderiam ser aplicados no saneamento básico são desviados. Isso é só um exemplo. E esses crimes continuam sendo praticados até hoje.

    E por que esses dois fatos, os interrogatórios dessas autoridades do Judiciário e o julgamento desses Deputados no dia 16? Porque o povo clama por justiça, porque uma parte da sociedade sabe, uma vez que, além desse conluio entre as instituições do Estado, ainda havia o acordo com os meios de comunicação, que, para silenciarem, recebiam fortunas.

    Essa é uma situação em que realmente as pessoas duvidam - e eu tenho publicado no Facebook, eu tenho escrito sobre essa questão - que haverá justiça. Dessa vez, eu tenho certeza de que haverá justiça.

    O Brasil mudou muito nesses últimos anos. E esta Casa e a Câmara contribuíram para isso. Além da Lei da Transparência, que coloca todas as receitas e despesas públicas em tempo real - e ainda nós estamos brigando contra aqueles que resistem a cumprir a lei, e é papel nosso também fiscalizar, junto com o Ministério Público, o cumprimento daquilo que a lei determinar -, nós aqui nesta Casa aprovamos a lei que permitiu o sucesso da Lava Jato e que está permitindo os avanços da Justiça do meu Estado, que é a lei de combate à corrupção, a lei anticorrupção que criou...

(Soa a campainha.)

    O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) - ... a possibilidade da delação premiada. É só assim, pois não há outra maneira de desmontar o crime organizado que não seja através da delação premiada, porque o crime organizado não deixa rastro. Tanto é que a palavra está muito bem empregada: ele é tão organizado que a maior dificuldade dos investigadores é comprovar a prática desse tipo de crime. E o crime organizado está nos Poderes do Estado, ele está em toda parte, há dificuldades em localizá-lo. Com a aprovação da lei contra a corrupção, a delação premiada foi permitida, e é isso o que está fazendo total diferença. Por isso, eu, aqui, renovo as minhas esperanças, a minha confiança no Poder Judiciário do meu País e no Poder Judiciário do meu Estado.

    E eu queria destacar o papel fundamental da democratização das eleições para o Ministério Público.

(Soa a campainha.)

    O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco Socialismo e Democracia/PSB - AP) - Sr. Presidente, enquanto as eleições davam-se no âmbito no colegiado de Procuradores, como se dá ainda hoje nos Tribunais de Justiça, não havia mudança possível. Não se sabia qual era o papel do Ministério Público. Quando se abriu para os Promotores também disputarem as eleições, aí ganhou uma Promotora de Justiça que ocupou, realmente, a Procuradoria Geral e cumpriu o papel do Ministério Público, fiscalizando o cumprimento da lei, investigando e denunciando à Justiça. É o resultado desse trabalho que nós aguardamos e que deve começar a surgir no dia 16 de março.

    Era isso, Sr. Presidente.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/03/2016 - Página 36