Questão de Ordem durante a 20ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Apresentação de questão de ordem, com base nos arts. 48, incisos II e XI, 403 e 404 do Regimento Interno, acerca da necessidade de devolução da Medida Provisória nº 703, editada durante o recesso parlamentar, devido à inconstitucionalidade de alterações em acordos de leniência da Lei Anticorrupção.

Autor
Ricardo Ferraço (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/ES)
Nome completo: Ricardo de Rezende Ferraço
Casa
Senado Federal
Tipo
Questão de Ordem
Resumo por assunto
CONGRESSO NACIONAL:
  • Apresentação de questão de ordem, com base nos arts. 48, incisos II e XI, 403 e 404 do Regimento Interno, acerca da necessidade de devolução da Medida Provisória nº 703, editada durante o recesso parlamentar, devido à inconstitucionalidade de alterações em acordos de leniência da Lei Anticorrupção.
Publicação
Publicação no DSF de 03/03/2016 - Página 49
Assunto
Outros > CONGRESSO NACIONAL
Indexação
  • APRESENTAÇÃO, QUESTÃO DE ORDEM, REFERENCIA, NECESSIDADE, DEVOLUÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), ALTERAÇÃO, ACORDO, DELAÇÃO, LEI BRASILEIRA, COMBATE, CORRUPÇÃO, MOTIVO, INCONSTITUCIONALIDADE.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES. Para uma questão de ordem. Sem revisão do orador.) - Se V. Exª me conceder o microfone, eu vou tentar ser objetivo.

    Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na forma do disposto no art. 403 e seguinte do Regimento Interno do Senado e com base no que estabelecem os incisos II e XI do art. 48 do mesmo ato normativo, encaminho a V. Exª a presente questão de ordem para solicitação não apenas de esclarecimento, mas também de providência a ser tomada em relação à Medida Provisória nº 703, que foi editada durante o recesso parlamentar.

    Essa medida, editada nos estertores do ano passado, Sr. Presidente, altera a Lei Anticorrupção, que foi profundamente discutida por esta Casa, especialmente quanto aos requisitos de validade para a celebração de acordos de leniência. Ocorre que essa proposição, Sr. Presidente, está marcada, eivada por um conjunto de inconstitucionalidades, pois extrapola os seus limites constitucionais ao tratar de questões da esfera penal e processual, algo vedado para o instituto das medidas provisórias, nos termos da alínea "b" do inciso I, §1º do art. 62 da Constituição Federal. Senão, vejamos: a medida provisória alterou o art. 18 da Lei Anticorrupção, prevendo a possibilidade de exclusão da responsabilização judicial da pessoa jurídica que celebrar acordo de leniência, embora - permita-nos a expressão: de forma malandra - não se use o termo penal.

    Obviamente, essa previsão normativa trazida pela medida provisória permite a exclusão da responsabilidade judicial, cível ou penal. Incide, portanto, na vedação de tratar de temas penais, na forma já citada do art. 62 da Constituição Federal, assim como no caso do art. 25 da Lei, que altera prazos de prescrição em matéria penal.

    Há mais, Sr. Presidente. O §9º do art. 17 da lei também alterada pela medida provisória estabelece a interrupção e a suspensão de prescrição, tema afeto ao direito processual e, portanto, Sr. Presidente, impossível de ser abordado por meio de uma medida provisória.

    No mesmo vício incorre o §11 do art. 17, que veda o ajuizamento de ações de improbidade se houver sido celebrado acordo de leniência. Ora, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, restringir o ajuizamento de ações é nitidamente matéria processual.

    Com isso, percebe-se que a medida provisória possui diversas inconstitucionalidades formais. Não uma ou outra, mas simplesmente o núcleo, o cerne das alterações por ela trazidas esbarra em vedações materiais constantes novamente do art. 62 da Constituição Federal, o que é objetivamente inaceitável, Sr. Presidente, por parte do Senado da República.

    Como se não bastasse, é preciso registrar ainda que a medida provisória não atende evidentemente ao pressuposto constitucional da urgência exigido para sua edição. Note-se que tal medida tampouco atende ao critério de urgência, pois já foi aprovado aqui no Senado, Sr. Presidente, o Projeto de Lei nº 105, de 2015, em tramitação em Comissão Especial na Câmara dos Deputados, que regulamenta com muito mais precisão e com muito mais cuidado os ajustes necessários aos acordos de leniência.

    Esse projeto foi relatado aqui no Senado pelo Senador Randolfe Rodrigues, na Comissão de Constituição e Justiça. Não foram poucas as reuniões que este Senado fez com a Procuradoria-Geral da República e com a Controladoria-Geral da União, na direção de construirmos um texto que pudesse abrigar todas essas salvaguardas, que pudesse conceder a esse texto a necessária segurança jurídica, para que esses acordos de leniência fossem feitos preservando evidentemente as premissas constitucionais.

    Diante disso, Sr. Presidente, eu chamo atenção de V. Exª. Não resta a V. Exª, na condição de nosso Presidente do Senado Federal, outra atitude senão a devolução da Medida Provisória nº 703 ao Palácio do Planalto, ao Poder Executivo, com base nos incisos II e XI do art. 48 do Regimento Interno, segundo os quais cabe a V. Exª, Presidente do Senado da República e do Congresso Brasileiro:

II - velar pelo respeito às prerrogativas do Senado e às imunidades dos Senadores;

    ................................................................................................

XI - impugnar as proposições que lhe pareçam contrárias à Constituição, às leis, ou a este Regimento, ressalvado ao autor recurso para o Plenário, que decidirá após audiência da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania;

    Se não o fez, Sr. Presidente, eu quero solicitar que V. Exª tome essa providência na preservação das nossas prerrogativas.

    Eu chamo atenção, Sr. Presidente, que essa iniciativa não seria - ou não será - nada inédita. V. Exª mesmo, recentemente, tomou decisão dessa natureza quando devolveu ao Poder Executivo a Medida Provisória nº 703, pelo entendimento óbvio e claro - e o fez bem - de que a medida provisória violava a Constituição Federal.

    De outra vez, é importante também ressaltar que o então Presidente desta Casa, o Senador Garibaldi Alves, também fez o mesmo e adotou idêntico procedimento em relação à Medida Provisória nº 446, Sr. Presidente.

    Na condição de Presidente do Senado e do Congresso, Sr. Presidente, Sr. Presidente...

    O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco Maioria/PMDB - AL) - Senador Ricardo Ferraço.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Na condição de Presidente do Senado da República e do Congresso Brasileiro, nós estamos, portanto, requerendo a V. Exª essa questão de ordem, para que V. Exª possa observar que a Medida Provisória nº 703 trata de matéria processual penal. O art. 62 da Constituição Federal proíbe que tema de processo penal possa ser tratado por medida provisória. Na condição de guardião da Constituição Federal e do Regimento desta Casa, parece-me que V. Exª, assim como o fez anteriormente - e fez bem -, em uma mesma e idêntica medida provisória, por extrapolar das suas prerrogativas, devolveu ao Poder Executivo.

    (Soa a campainha.)

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - É a questão de ordem que encaminho a V. Exª, a bem da preservação das nossas prerrogativas, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/03/2016 - Página 49