Discurso durante a 23ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários sobre as supostas mudanças ideológicas do PT, e defesa do instituto do “recall” – revogação popular de mandato – como forma de solucionar o impasse governamental atual.

Defesa da livre atuação do Ministério Público e outras instituições democráticas, e defesa da continuação da Operação Lava Jato.

Autor
Randolfe Rodrigues (REDE - Rede Sustentabilidade/AP)
Nome completo: Randolph Frederich Rodrigues Alves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Comentários sobre as supostas mudanças ideológicas do PT, e defesa do instituto do “recall” – revogação popular de mandato – como forma de solucionar o impasse governamental atual.
GOVERNO FEDERAL:
  • Defesa da livre atuação do Ministério Público e outras instituições democráticas, e defesa da continuação da Operação Lava Jato.
Publicação
Publicação no DSF de 08/03/2016 - Página 73
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • COMENTARIO, ALTERAÇÃO, IDEOLOGIA, ATUAÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), DEFESA, CONVOCAÇÃO, PLEBISCITO, UTILIZAÇÃO, VOTO, POPULAÇÃO, OBJETIVO, DECISÃO, CONTINUAÇÃO, SUBSTITUIÇÃO, GOVERNO.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, LIBERDADE, ATUAÇÃO, INSTITUIÇÃO DEMOCRATICA, ENFASE, MINISTERIO PUBLICO, DEFESA, CONTINUAÇÃO, INVESTIGAÇÃO, REFERENCIA, OPERAÇÃO, POLICIA FEDERAL, CORRUPÇÃO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS).

    O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco Socialismo e Democracia/REDE - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Paulo Paim, agradeço a V. Exª. Quanto aos equívocos na relação da chamada, não houve nenhuma responsabilidade de V. Exª, quero aqui fazer esse registro. V. Exª sempre tem sido um ótimo companheiro e um bom condutor de Mesa, quando assume esta Presidência.

    Senador Paim, durante esta tarde toda, vários se alternaram nesta tribuna, relatando a gravidade da crise que vivemos. É uma crise de todos os precedentes, e não é possível, não é aceitável ignorá-la, tratá-la como se não existisse.

    Eu também não venho aqui à tribuna para fazer parte do Fla-Flu que eu vi nesta tarde. Esse Fla-Flu de alternância das forças políticas que governaram este País nos últimos 24 anos está fazendo mal ao País.

    Eu queria, Senador Paulo Paim, iniciar este pronunciamento fazendo uma citação de um conterrâneo seu, um inspirador seu, um companheiro seu, um companheiro meu de outrora, de quando estava na militância, que tenho muito orgulho de ter tido no Partido dos Trabalhadores, que é o ex-Governador Olívio Dutra. Olívio deu uma entrevista, nesse final de semana, ao jornal O Estado de S. Paulo. Nunca é demais ressaltar aqui da tribuna o que o Governador Olívio Dutra disse na sua entrevista. Ele disse o seguinte:

A visão que marcou a criação do PT foi essa de que a coisa pública não é propriedade do governante, dos seus amigos, dos seus familiares, dos seus partidários. Essa visão não pode mudar assim, no bojo das situações e das circunstâncias. Isso é um ideário básico, está nas razões da fundação do PT. São questões permanentes.

    Mais adiante, o Governador Olívio Dutra acrescenta:

Um partido que nasceu para ser um contestador da política tradicional e fazer da política a construção do bem comum de repente está não sendo diferente de nada das tantas coisas que criticava, contra as quais nos colocávamos diametralmente opostos. O Estado não é propriedade privada ou pessoal de ninguém, nem do governante, nem dos grupos econômicos, nem da mídia.

    Ele disse ainda o seguinte, quando responde à pergunta de pagamento de palestra, de financiamento empreiteiras:

É natural na política tradicional, vem de séculos até. Então, aí [...] o partido [o Partido dos Trabalhadores] não inovou. [não fez as mudanças, as rupturas].

    Isso aqui é um depoimento de um petista honrado e lúcido, como tantos outros que eu acredito haver no ambiente do Partido dos Trabalhadores, como é V. Exª, Senador Paulo Paim. Isso é um depoimento daquilo que nós construímos no passado, quando eu estava no Partido dos Trabalhadores. Quando eu estava no Partido dos Trabalhadores, a luta contra a corrupção não era bandeira udenista, não; era uma luta central. O que nós dizíamos em relação à luta contra corrupção era uma declaração parecida com o que o Presidente da Transparência Internacional fez hoje em entrevista: "Corrupção é imposto pago pelos mais pobres". E o é, de fato.

    Ora, não vamos vir agora tentar trazer cenários de vitimização e tentar dizer que há uma conspiração das elites contra. Quais são as elites? As elites que votaram aqui a favor do fim da participação da Petrobras no pré-sal? A orientação veio do Palácio do Planalto. Quais são as elites, Senador Paim? As elites que vão mandar para cá a reforma da Previdência? Não são as elites, não; é o Governo que vai mandar a reforma da Previdência, reduzindo o direito dos trabalhadores, como, no ano passado, o seguro-defeso e o seguro-desemprego foram alterados aqui por iniciativa do Governo. Então, não posso ser sujeito ao momento em que as elites melhor agradam. Quando é para se aliançar com as elites coronelescas mais atrasadas no Nordeste do País ou, como é o caso do Maluf, em São Paulo, para ganhar eleições, valem as elites. No momento seguinte, quando se é atacado, aí é um ataque das elites.

    Estão ocorrendo, neste País, agressões dos dois lados. E me deixe dizer aqui que os rumos do País não podem ser decididos pelas brigas de rua, seja da onda conservadora e reacionária que está aí, seja da onda conservadora e reacionária que nós enfrentamos e que tenho enfrentado também aqui, no plenário do Senado, com muito honra, ao seu lado, Senador Paim, visto que têm ocorrido agressões por parte dessa onda, mas também tem havido conclamações à agressão, com foi feito recentemente por lideranças políticas ligadas ao Governo, que têm conclamado agressão. Acho que chamar para briga de rua é a pior solução para o Brasil neste momento.

    Eu também não acho que a melhor solução para o Brasil, neste momento, seja o impeachment, capitaneado pelo Eduardo Cunha, um impeachment que vai resultar no PMDB no Governo. Ora, o que tem sido investigado até agora é que, no consórcio dos dois, pode ter havido captação ilícita de sufrágio, mas, embora seja uma posição que até tenha sido debatida pelo meu Partido, eu também não sei se resolver esse impasse no TSE é a melhor solução.

    Senador Paim, o que eu acho que a Presidente da República - a Presidente da República! - deveria fazer? E, se a Presidente da República não o fizer, o Congresso Nacional tinha que pensar em fazer. Eu estou - eu o farei - preparando e debatendo uma proposta nesse sentido, seja no âmbito do plebiscito, que existe na Constituição, seja no âmbito de uma proposta de emenda à Constituição, mas acho que o ideal seria a Presidente da República fazer isto: remeter esse impasse para solução através do sufrágio popular, convocando um plebiscito ou um referendo revocatório. E que o povo decida nas urnas se o Governo tem que continuar ou não; que seja decidido pelo povo nas urnas.

    Eu estou falando de uma experiência inédita no mundo? Não. Na Califórnia, há o instituto do recall, da revogação popular de mandato. Na história, nós tivemos alternativas desse tipo durante os impasses constitucionais. Em 1961, Jânio Quadros renuncia à Presidência da República; os militares vetam a posse de João Goulart. O Parlamento encontra uma alternativa, que era o parlamentarismo, para evitar a conflagração naquele momento. Um ano depois, o Presidente da República chama o povo - o Presidente da República! - para decidir se mantinha o sistema de governo parlamentarista, que reduzia os poderes do Presidente da República, ou se retornava o presidencialismo. Foi vitorioso o presidencialismo, com 90% dos votos. Foi o Presidente da República que chamou, naquele momento, para se resolver o impasse. Em 1973, o dia do golpe contra o Presidente Salvador Allende, no Chile, foi 11 de setembro; naquele dia, o Presidente Allende ia chamar o povo chileno para um plebiscito, para decidir sobre a continuidade ou não do governo.

    O ideal é resolver esse impasse. Nós estamos diante de um impasse institucional, político, econômico. O ideal seria remeter isso para o sufrágio popular. Convoque-se um referendo revocatório para os próximos três meses, quatro meses. E o povo decide na urna a continuidade ou não do Governo. Eu estou convicto de que, neste momento, seria essa a melhor solução para os impasses do próprio Governo. Seria essa a melhor posição até para o Partido dos Trabalhadores, para os partidos que estão no Governo.

    Anuncio, Sr. Presidente, que vou apresentar iniciativa legislativa dessa natureza nos próximos dias.

    Nós não podemos esconder, destacar a gravidade da situação. Eu não quero entrar no mérito do acontecimento de sexta. Eu repito aqui o que já disse em aparte nesta sessão de hoje do Senado: em um Estado democrático de direito, ninguém está acima nem abaixo da lei; em um Estado democrático de direito, todos estão submetidos ao império da lei, inclusive os magistrados não estão acima do cumprimento da lei. Então, não quero entrar no mérito dos acontecimentos de sexta-feira. Se houve abusos, que sejam apurados os abusos.

    Eu só quero entrar em um mérito aqui, que é o mérito da conduta do agente público, do homem público, daquele que não está na mesma condição do cidadão, porque tem responsabilidades com a República. Esse é o conceito de homem público; é o conceito em relação a mim, em relação ao senhor, Senador Paulo Paim, em relação às figuras públicas que já estiveram em postos e que estão sujeitas à aprovação ou rejeição por parte da opinião pública. A pessoa pública não pode se achar acima da lei e de tudo. Se houver uma acusação sobre a pessoa pública, a primeira medida dela deve ser explicar se a acusação procede ou não. Não resolve nada atacar o acusador, não resolve nada atacar as instituições que apuram. E eu falo isso desta tribuna como alguém que já sofreu acusação, e a primeira medida minha foi responder à acusação e, depois, provar que não tinha nada a ver com a acusação. Não sou sal da terra, não sou palmatória do mundo, todos nós somos passíveis de acertos ou de erros, mas a conduta principal de um agente público, no meu entender - o que eu aprendi na minha formação e militância política, Senador Paim -, deve ser assim.

    O que consta na matéria da IstoÉ da última quinta-feira não é um fato à toa e não pode ser tratado como uma articulação da imprensa. Não é. Há pesadas e graves acusações aqui relatadas pelo Senador Delcídio do Amaral, Senador que está sendo objeto de investigação e de julgamento aqui, do Conselho de Ética.

    Senador Paim, eu quero informar que vou encaminhar, no dia de hoje, ofício ao Sr. Presidente do Conselho de Ética desta Casa, para que esse provoque o Ministro Teori Zavascki para ser informado - assim que esta for homologada e for quebrado o seu sigilo - do teor da delação premiada do Senador Delcídio do Amaral. Que bom que essa delação veio a público, porque nós estaríamos submetidos a mais uma fraude. Sem essa delação, se ela viesse a público só daqui a seis meses, nós faríamos um julgamento aqui do Senador Delcídio sem os elementos dessa delação, que são fundamentais para o julgamento que será proferido aqui.

    Por fim, meu caríssimo Senador Paulo Paim, em nome do espírito que me formou e que formou V. Exª como militantes de esquerda, eu quero destacar que o combate à corrupção e compreendê-la como o cupim que corrói a sociedade não é golpismo. Defender a atuação do Ministério Público independente - nós deveríamos nos orgulhar disso. Foi V. Exª, Senador Paulo Paim, que colocou isso na Constituição de 1988, foi a Bancada progressista que colocou lá os poderes do Ministério Público, e isso tem que ser razão de orgulho. Tenho orgulho de tê-lo tido, em 1988, como Deputado Federal, mesmo não pelo meu Estado, mas representando os meus interesses e o que eu entendia naquele momento. Isso foi uma conquista da nossa democracia. Atacar o Ministério Público e as instituições na sua atuação não ajuda.

    A Operação Lava Jato deveria ser proclamada como um momento único da história do País, que tem que ser parabenizado. Ora, não é investigação só contra um lado não! Já houve citação de políticos de todos os partidos - de todos os partidos! -, durante essa operação.

    Não são à toa os números da própria operação: veja, R$14,5 bilhões já foram ressarcidos aos cofres públicos. Esse dinheiro saiu de algum lugar para beneficiar alguns e, devido à atuação do Ministério Público, devido à Operação Lava Jato, retornaram. Os crimes já denunciados envolvem R$6,4 bilhões. Não é um número a menos. Isso tem de ser destacado. Esses números deveriam ser consagrados em altar como conquista republicana, da nossa democracia.

    Mas não. Abro hoje um informativo e qual é a palavra de ordem? Acabar com a Lava Jato. Ora, desculpem-me alguns companheiros que me antecederam na tribuna, mas não foi assim que aprendi a ser de esquerda, que aprendi a ser progressista. Aprendi que ser progressista é defender o funcionamento das instituições em um Estado democrático de direito. Aprendi que ser progressista, que ser de esquerda, é cumprir a máxima que Ulysses proclamou aqui no plenário do Congresso Nacional, no dia da promulgação da Constituição de 1988: não roubar, não deixar roubar e por na cadeia quem rouba. É o que está, inclusive, na Constituição, no art. 37 e em vários outros dispositivos.

    Ora, Sr. Presidente, ao invés de atacar, deveríamos comemorar esses avanços. As pessoas públicas, ao invés de procederam atacando as instituições, deveriam se colocar cada vez mais à disposição da investigação. Não ajuda esse clima de Fla-Flu que querem instalar. Não quero aqui falar nem na manifestação do dia 13 nem na do dia 18. Esse clima de Fla-Flu, essa conclamação à agressão, de um lado e do outro, não vão ajudar o País a resolver o impasse em que está.

    A compreensão de que as instituições estão funcionando e que devem funcionar como em um Estado de direito, que foi para isso que lutamos e que essa é a conquista maior da democracia... Não é tentar colocar máscaras de golpe em cima disso. Não vamos vir com as máscaras de golpe. Os fascistas, que existem, que estão aí, não têm força política para golpe nenhum. Não existe força nem possibilidade para golpe nenhum. Não vamos utilizar isso como desculpa para os erros que foram cometidos. Ao contrário, temos de virar essa página difícil da história do País. E nós temos que resolver essa página difícil da história do País, primeiro, respeitando o funcionamento democrático das instituições, permitindo a liberdade e permitindo, garantindo e se vangloriando por assegurar a liberdade do funcionamento do Ministério Público e do Judiciário, independentes, como têm que ser.

    Nós vamos resolver essa crise política - e aí era a melhor medida por parte da Presidência da República -, repito, levando o impasse sobre a continuação ou não do Governo ao sufrágio popular.

    É com serenidade neste momento, com respeito ao funcionamento democrático das instituições, não se colocando acima nem abaixo de nenhuma dessas instituições, defendendo a democracia como ela tem que ser, e sem criar sofismas ou subterfúgios, que eu acredito que nós poderemos, de verdade, Sr. Presidente, superar esta crise. Esta crise não é maior do que o Brasil, e as soluções dela se dão principalmente pela superação deste ambiente, propositadamente criado, de conflito.

    Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/03/2016 - Página 73