Pela Liderança durante a 27ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Cobrança à Anvisa de maior agilidade nos procedimentos de registro de medicamentos.

Comentário sobre a importância da criação do crime de feminicídio.

Autor
Marta Suplicy (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SP)
Nome completo: Marta Teresa Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Pela Liderança
Resumo por assunto
SAUDE:
  • Cobrança à Anvisa de maior agilidade nos procedimentos de registro de medicamentos.
DIREITOS HUMANOS E MINORIAS:
  • Comentário sobre a importância da criação do crime de feminicídio.
Publicação
Publicação no DSF de 11/03/2016 - Página 41
Assuntos
Outros > SAUDE
Outros > DIREITOS HUMANOS E MINORIAS
Indexação
  • COMENTARIO, REALIZAÇÃO, AUDIENCIA PUBLICA, OBJETIVO, DISCUSSÃO, PROJETO DE LEI, ASSUNTO, FIXAÇÃO, PRAZO MAXIMO, AGENCIA NACIONAL DE VIGILANCIA SANITARIA (ANVISA), CONCESSÃO, REGISTRO, MEDICAMENTOS, DEFESA, AUMENTO, GRUPO, SERVIDOR, AGENCIA REGULADORA, MELHORIA, EFICIENCIA, ORGÃO.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO PENAL, OBJETIVO, CRIAÇÃO, CRIME, HOMICIDIO QUALIFICADO, VITIMA, MULHER, REGISTRO, NECESSIDADE, ELABORAÇÃO, POLITICAS PUBLICAS, ENFASE, CONTINUAÇÃO, PRESERVAÇÃO, DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS, REDUÇÃO, INDICE, VIOLENCIA, CATEGORIA.

    A SRª MARTA SUPLICY (Bloco Maioria/PMDB - SP. Como Líder. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Senador Donizeti, em exercício na Presidência.

    Eu gostaria de começar a minha fala referindo-me a uma audiência pública que ocorreu ontem, em que se discutiu um tema extremamente importante, sobre a Anvisa, tema baseado em um projeto de lei do Senador José Serra.

    A Anvisa já tem 40 anos e há muita reclamação, como de tempo para dar um diagnóstico, de vários procedimentos de que as pessoas discordam e de suspeitas. É uma bela confusão. Isso afeta a vida de todos os brasileiros, porque ajuda, de certa forma, a que muita medicação importante não venha a público, não esteja disponível rapidamente.

    Essa audiência pública foi destinada a instruir o Projeto de Lei nº 727, de 2015, na minha avaliação, excelente. Claro, como todo projeto, ontem ele foi extremamente criticado, ali e aqui, mas no geral bastante aprovado.

    Atualmente, um remédio no Brasil chega a demorar quase três anos para obter o registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

    Entre os casos emblemáticos apresentados, um deles por Antônio Britto, que é Presidente Executivo da Associação da Industria Farmacêutica de Pesquisa, está o de um medicamento indicado para tratamento oncológico que aguarda há 58 meses seu pedido de registro na Anvisa. O mais grave é que desses quase 5 anos de espera, somente há 14 meses o medicamento efetivamente passou a ser analisado pela Agência. Nos demais 44 meses precedentes, ele ficou aguardando na fila para análise.

    O mínimo que se pode dizer é que há algo muito errado num procedimento em que um medicamento demora cinco anos. E provavelmente, a esta altura do campeonato, o medicamento já foi ultrapassado por outo. Além disso, ouvimos, na audiência, que medicamentos genéricos e similares, que seriam de análise muito mais simples que medicamentos biológicos novos, levam muito mais tempo também do que os mencionados. Sem abrir mão da rigidez no controle, falou-se que é necessária uma revisão muito séria.

    As consequências dessa demora são muitas. O paciente brasileiro tarda para ter acesso a medicamentos inovadores já disponíveis em outros países, alguns essenciais para doenças com poucas opções terapêuticas, principalmente na área de oncologia.

    A falta desses medicamentos no mercado pode ser munição para a judicialização, cada vez mais recorrente, porque os laboratórios ficam ensandecidos e as pessoas também, o que acaba obrigando o SUS a adquirir medicamentos e custear tratamentos a um alto custo. Por fim, a competitividade do setor acaba sendo comprometida, afetando o paciente pela demora da entrada de genéricos e similares no mercado.

    Então entramos, de forma continua, em um círculo vicioso sem fim: acesso tardio a medicamentos, judicialização e comprometimento do setor.

    Tudo isso nos leva a outra questão, que é questionar se interesses setoriais não estariam influenciando os processos de modo a atrasar o registro de novos medicamentos, garantindo ganhos privados, em prejuízo do SUS e do paciente brasileiro, que permaneceria obrigado a recorrer a remédios de maior custo.

    É muito séria essa suspeita, que foi ventilada na audiência pública. Se demora tanto, os que estão na praça continuam cobrando o que bem entendem, sendo que alguns medicamentos mais recentes podem ter a mesma eficácia e custar menos. Por que eles não são examinados e demora tanto tempo?

    Eu creio que esse é um assunto, Senadores e Senadoras, sobre o qual o Senado deve se debruçar e até mesmo instalar uma CPI com tal propósito, porque, realmente, isso custa vidas.

    Outro ponto levantado na audiência é a demora para estabelecer preço dos novos medicamentos após o registro na Anvisa. O medicamento conseguiu passar por várias etapas lá dentro, mas chega na hora do preço, não se resolve. Existe a Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED), órgão interministerial responsável para regular esse mercado e estabelecer critérios para definição, para ajuste de preços.

    Alguns remédios, acreditem, esperam dois anos para ter seu preço definido, e essa regulamentação de preço necessita obrigatoriamente do crivo de cinco ministérios, membros desse conselho: Ministério da Saúde, do MDIC, da Fazenda, da Casa Civil e da Justiça. Resultado: uma enorme burocracia, mais atraso na entrada do produto no mercado.

    Pensamos: por que ocorre isso? Em sua defesa, a Anvisa apresentou algumas recentes iniciativas que visam dar maior agilidade aos processos e procedimentos de registro e pós-registro, entre elas a Resolução da Diretoria Colegiada da Anvisa nº 37, de 2014, que estabeleceu uma série de critérios de priorização da análise técnica, de petições de registro, pós-registro e anuência prévia em pesquisa clínica de medicamentos e produtos biológicos.

    Além disso, na opinião do Diretor-Presidente da Anvisa, Jarbas Barbosa, parte da responsabilidade pelo prolongamento dos prazos por pedidos de registros recaem sobre requerentes que não encaminham à Agência toda a documentação necessária para a conclusão de análise. Em defesa da Anvisa, percebemos, no decorrer da audiência - isso eu achei muito sério -, que a Agência carece de melhor estrutura também para o desempenho de suas funções. A Anvisa tem 2,5 mil técnicos. Sabe quantos técnicos tem o FDA americano? São 14 mil. E eles fazem exatamente o que a Anvisa faz. Eles têm 14 mil e nos, 2,5 mil.

    O órgão americano é responsável pelo controle dos alimentos, suplementos alimentares, medicamentos, cosméticos, equipamento médico, material biológico e produtos derivados do sangue humano. Para vocês terem uma ideia mais precisa, para a análise de registro de medicamentos genéricos - genérico é o que mais chega na Anvisa -, a Anvisa tem 30 técnicos, o FDA possui 150.

    Enquanto isso era apresentado, pensei: "Estamos exigindo da Anvisa a solução de problemas para os quais ela não tem pernas para solucionar". Nós vamos ter, sim, de abrir a possibilidade para concurso público. A Anvisa tem técnicos de renome, ilibados, de projeção internacional. Nossos laudos são usados, às vezes, por países que deixam de fazer seus exames, seus procedimentos, e utilizam a opinião da Anvisa sobre determinado medicamento. Quer dizer, nós temos gente boa. Não temos é gente suficiente.

    Embora a iniciativa legislativa para a ampliação do quadro de servidores da Anvisa seja de competência exclusiva do Poder Executivo, defendi, com o apoio de vários Senadores, que nós iremos ao Ministro da Saúde para conversar sobre o tema.

    Sei que o momento é de crise, que o momento é difícil, mas nós não podemos deixar o coração da saúde, que é a Anvisa, sem condições de um funcionamento ideal. Nós aqui cobramos, a indústria farmacêutica cobra, o doente fica desesperado porque não consegue o medicamento que ele sabe que pode ser bom, e a Anvisa não tem condições de fazer.

    Não estou dizendo que não há problemas. A Agência tem que ser reestrutura. Daí a necessidade de um projeto importante, como o projeto que está agora em discussão e que vai ajudar na reestruturação da Anvisa, modificando alguns procedimentos, que, provavelmente, foram estabelecidos no decorrer de 40 anos, e não há pessoal suficiente e vai-se ajeitando.

    Quero dizer também, Sr. Presidente, que, de fato, temos de dar mais transparência ao processo de registro dos remédios. Penso que essa é uma bela de uma confusão. O remédio entra para o registro, mas a data que passa a ter, de entrada na Anvisa, não é a data do registro. Às vezes, passam-se dois anos até ele chegar em outra equipe para ser analisado de fato. Até diminui, às vezes, o tempo, que tem que mudar. Entrou na Anvisa, foi protocolado, pronto. Conta-se direito. É inadmissível um órgão da importância da Anvisa passar uma semana inteira sem condições de enviar ou receber e-mails, como foi denunciado pela indústria farmacêutica.

    Outra coisa que vi como um grande problema, Senador: a Agência controla desde medicamentos até produtos de limpeza e de beleza, cosméticos.

    Isso, nos Estados Unidos - nós vimos, pois acabei de mencionar -, são mais de dez departamentos. Só aqui, no Brasil, você vê um produto de oncologia competindo com um produto de beleza, uma máquina que vai emagrecer, um cosmético para pele. Não tem sentido! Deveriam ter entradas diferentes, prioridades diferentes. O que já tem qualidade e eficiência comprovada poderia ser muito mais rapidamente aprovado, não precisa ficar nessa fila.

    Lembro, por fim, que, no ano passado, mais de uma vez, eu cobrei, insistentemente, até um pouco alto no tom, do Ministro Chioro, sobre a questão das vacinas e sobre a questão do papel do Ministério da Saúde frente aos Municípios, porque a dengue já estava presente. A dengue está hoje nessa calamidade pública que nós vemos, e posso dizer que nada foi feito, porque ele disse várias vezes coisas que haviam sido feitas, mas a gente percebe que muito pouco foi feito.

    A dengue precisa da cooperação do Ministério, mas precisa da cooperação de prefeitos, porque está na rua, está na casa das pessoas. Agora, se os prefeitos estão mais devagar, cabe ao Ministério também ter uma posição mais ativa, e nós vimos que, em relação à vacina, não aconteceu nada, tanto é que está muito atrasada - agora já sabemos que vai para três anos.

    Então, o povo brasileiro ficou jogado à própria sorte em relação a essa questão da dengue. Um prefeito tem de fazer cata bagulho, tem de fumegar, tem de ter programa de saúde da família para que possa ir de casa em casa; tem de ter várias ações, e a maioria das prefeituras tem muita dificuldade em implantar, seja por negligência, porque não achou que era um problema, seja por falta de recurso.

    Bom, vou mudar de assunto, para encerrar. Este ano o Brasil deu um grande passo no fortalecimento das políticas para as mulheres, comprometendo-se politicamente a estabelecer tolerância zero à violência de gênero. Sancionou a lei que criou a tipificação do feminicídio. Com a sanção, o feminicídio foi introduzido na modalidade de homicídio qualificado, passando ao patamar de crime hediondo. O Brasil precisava dessa lei e as mulheres brasileiras também.

    O que é o feminicídio? Ele ocorre quando o crime é motivado por razões da condição de sexo feminino. Parece estranho, mas ocorrem muitos crimes assim, porque eles têm, inegavelmente, origem na condição de gênero, porque a pessoa é mulher. O feminicídio, em sua maioria, é um crime praticado com requintes de crueldade, deflagrado quando mulheres decidem dar um basta e um não em uma relação afetiva.

    Quer dizer, um crime que é cometido nessa circunstância é um crime que agora tem uma qualificação muito mais grave.

    Infelizmente, esta é a realidade: as mulheres são punidas por tomarem uma decisão sobre suas vidas, sobre com quem vão se relacionar e sobre a maneira como a relação afetiva vai terminar. Essa lei é um forte instrumento para efetivamente colocar um fim a essa situação.

    Os dados, contudo, ainda são assustadores. De acordo com o último balanço oficial feito pela Secretaria de Política para as Mulheres, que foi divulgado esses dias, o Disque 180 - um dos instrumentos de proteção às mulheres - recebeu 76.651 registros de violência contra a mulher em 2015 - gente, 76 mil casos, que são os declarados, imagine quantos não são.

    O documento completo destaca que 50,1% - a maior parte dos registros de agressão de 2015 - diz respeito a casos de violência física. Quer dizer, a violência psicológica, muitas vezes, não é nem considerada, e isso pode destruir uma mulher, tanto quanto uma agressão.

    Em segundo lugar, aparece a violência psicológica, com 30,33% das denúncias, que eu desconfio muito, porque a mulher tem muito mais dificuldade de levar a uma delegacia essa queixa da violência psicológica. Em algumas partes do Brasil, a violência psicológica - o que está sendo feito com ela - Senadora Regina, não nem é percebida pela mulher. Essa conscientização cresce no Brasil, mas há muito ainda para que as mulheres possam introjetar a sua dignidade, o seu direito a não serem desrespeitadas.

    Em terceiro lugar, vem a violência moral, com 7,25%, o que, também, as pessoas têm uma dificuldade de entender o que significa.

    Todas as mulheres têm de saber que qualquer vítima de violência - essa parte é muito boa, é muito importante - pode, sim, pedir que seu agressor seja legalmente impedido de se aproximar dela. Também pode, sim, solicitar abrigo e alimentação temporários. A decisão é sempre do juiz.

    No Estado do Rio, segundo o TJRJ, foram deferidas 21.668 medidas protetivas de urgência no ano passado. Nos dois primeiros meses de 2016, agora, o total já chega a 3.311.

    Não é pouca coisa, é muita coisa. Quer dizer, uma mulher está tão apavorada e com medo de levar uma surra ou ser morta que ela tem de pedir que aquela pessoa não chegue perto dela.

    Já no Estado de São Paulo, desde 2013, os números apresentam um aumento gradativo. Foram 9.712 medidas protetivas deferidas há 3 anos. Esse total subiu para 12.325, em 2014, e para 14.825, em 2015. Sei que existe sim esta relação: quanto mais dificuldade econômica, quanto mais stress no casal, quanto mais penúria, desespero, mais aumenta a violência doméstica. Quem acaba sofrendo mais, pagando mais o pato, é a mulher, não tenho nenhuma dúvida. Sabemos que isso, infelizmente, não tende a melhorar no Brasil no sentido de que a crise econômica não está com nenhuma luz no fim do túnel tão rápido, porque a outra acho que está.

    Somente na cidade de São Paulo, a aplicação de medidas, quando a Justiça impõe um limite de aproximação entre o agressor e a mulher, cresceu 26% entre 2013 e 2015. O aumento dessas medidas protetivas, em ambos os Estados, se deve não somente à lei que tipifica o feminicídio, mas também à Lei Maria da Penha.

    Ao mesmo tempo em que fazemos essa constatação que nos dói, temos de parabenizar os avanços que nós temos. A Lei Maria da Penha, promulgada no Governo Lula, é um grande avanço para as brasileiras e serve hoje como farol em vários países do mundo.

    Certamente nós temos de comemorar o fato de mais mulheres estarem procurando ajuda, mas isso não implica que a violência tenha, concretamente, diminuído. Temos de nos conscientizar ainda mais que o reconhecimento institucional e social do feminicídio, o fim da impunidade e a visibilidade pública dos assassinatos violentos de mulheres não podem passar despercebidos. Essas condutas não podem ser mais toleradas pela sociedade, e suas vítimas devem receber a reparação devida. Somente dessa forma conseguiremos prevenir o avanço do feminicídio no Brasil.

    Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/03/2016 - Página 41