Discurso durante a 35ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa da invalidade da nomeação do ex-presidente Lula para o cargo de Ministro-Chefe da Casa Civil e elogio à maturidade das instituições democráticas brasileiras, bem como à atuação do Juiz Sérgio Moro à frente da Operação Lava Jato.

Autor
Ricardo Ferraço (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/ES)
Nome completo: Ricardo de Rezende Ferraço
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Defesa da invalidade da nomeação do ex-presidente Lula para o cargo de Ministro-Chefe da Casa Civil e elogio à maturidade das instituições democráticas brasileiras, bem como à atuação do Juiz Sérgio Moro à frente da Operação Lava Jato.
Aparteantes
Gleisi Hoffmann, Vanessa Grazziotin.
Publicação
Publicação no DSF de 22/03/2016 - Página 36
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • LEITURA, DECLARAÇÃO, IVES GANDRA DA SILVA MARTINS, JURISTA, ASSUNTO, ILEGALIDADE, NOMEAÇÃO, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, CARGO PUBLICO, MINISTRO DE ESTADO, CASA CIVIL, COMENTARIO, DELAÇÃO, DELCIDIO DO AMARAL, SENADOR, DEFESA, ATUAÇÃO, SERGIO MORO, JUIZ FEDERAL, REFERENCIA, OPERAÇÃO, POLICIA FEDERAL, INVESTIGAÇÃO, CORRUPÇÃO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), ELOGIO, ESTABILIDADE, INSTITUIÇÃO DEMOCRATICA, ENFASE, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL, JUSTIÇA FEDERAL.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Raimundo Lira; Srªs e Srs. Senadores, brasileiros que nos acompanham pela TV Senado, capixabas que nos acompanham pela TV Senado,

Há dias circulavam rumores de que o alto escalão do Governo Federal e a cúpula do Partido dos Trabalhadores estudavam a nomeação [e o convite] do ex-Presidente Lula, acusado de envolvimento em casos de corrupção, para o cargo de ministro de Estado. Tais boatos se concretizaram na última quarta-feira,16 [ e o que se viu, ato contínuo, foi muita controvérsia, muita polêmica, sobretudo em razão da divulgação das conversas e dos diálogos entre a Presidente da República e o ex-Presidente Lula].

O objetivo da manobra, ao que tudo indica, [Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Senador Magno Malta, de levar o ex-Presidente Lula para o Governo] é [seguramente] garantir ao ex-Presidente a prerrogativa de 'foro privilegiado'. Como consequência, as denúncias contra ele dirigidas deixariam de ser examinadas pela Justiça Federal comum, evitando que o caso chegue às mãos do Juiz Sergio Moro. O Supremo Tribunal Federal é que decidiria essa questão.

A Constituição confere à Presidente [da República, Senadora Vanessa Grazziotin, Senador Magno Malta, Senador Raimundo Lira] o poder de escolher seus ministros. Trata-se, porém, de uma faculdade apenas aparente, pois sujeita a limitações rígidas, decorrentes primordialmente do fato de que a atuação da administração deve ser pautada por fins e interesses públicos, nunca particulares.

De fato, os poderes constitucionalmente conferidos ao governante são garantidos a ele na qualidade de integrante do Estado. Existem apenas para que se possa cumprir seu dever de atender aos interesses da coletividade.

São estes, nunca é demais recordar, que justificam a existência do próprio aparelho estatal e, naturalmente, da posição ocupada.

Justamente por isso é que o art. 37 da Constituição determina que as autoridades conduzam seus atos com impessoalidade e moralidade. Simpatias pessoais e/ou interesses de facções e grupos ligados aos governantes não podem interferir na gestão da coisa pública.

Diante desse quadro, não há dúvidas de que a nomeação do ex-Presidente esbarra nas limitações referidas [como afirmado aqui]. Isso porque realizada com o objetivo preponderante de protegê-lo ou de amenizar a sua complicada situação na qualidade de pessoa próxima à Presidente. Como tal, [esta] é [uma nomeação] completamente inválida [pelo desvio objetivo de função].

O Supremo Tribunal Federal é firme em reconhecer que o tratamento privilegiado, que não decorra de 'causa razoavelmente justificada', implica inadmissível quebra de moralidade.

A Corte Suprema, a propósito, já analisou questão idêntica, decidindo que a nomeação para o cargo de assessor é ato formalmente lícito. Contudo, no momento em que é apurada a finalidade contrária ao interesse público, qual seja, uma troca de favores, o ato deve ser invalidado por violação ao princípio da moralidade administrativa e por estar caracterizada a sua ilegalidade por desvio de finalidade.

A propósito [Sr. Presidente], não se diga que a presença do ex-Presidente no corpo ministerial pode contribuir para amenizar a grave crise de legitimidade do atual Governo. Nem que pode, de alguma forma, auxiliar na reversão da cambaleante situação econômica do País.

Afinal, se assim fosse, a nomeação teria ocorrido muito antes, já que esse quadro se arrasta há meses. A situação foi agravada pela divulgação do diálogo entre os dois protagonistas, no qual, nitidamente, fica evidenciado que o intuito da nomeação foi proteger [o ex-Presidente] do pedido de prisão preventiva que seria examinado pelo Juiz Sergio Moro.

Tal gravação comprova que foram feridos quatro princípios fundamentais da Administração Pública elencados pela Constituição Federal.

São eles [Sr. Presidente]: o princípio da moralidade (nomeação para ministro de Estado de um investigado; da impessoalidade (nomeação no interesse pessoal do amigo, e não do interesse público)...

    A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - V. Exª me concede um aparte?

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Com muita honra e com muito prazer.

Da eficiência (nomeação exclusivamente para blindá-lo, não em virtude dos atributos para o exercício do cargo) e da legalidade (devido desvio de finalidade da nomeação).

O Juiz Moro, por sua vez, atendeu ao princípio da publicidade ao retirar o sigilo da gravação, já que o interesse público justifica a divulgação da conversa.

A nomeação [do ex-Presidente Lula] ao cargo de ministro, portanto, com evidente desvio de finalidade, conduz a uma questão da mais alta relevância [para o interesse da República brasileira]: não constitui ela própria ato de improbidade administrativa capaz de motivar o próprio impeachment [da Presidente] Dilma?

    Srªs e Srs. Senadores, esse pronunciamento que acabo de fazer é fruto de um artigo publicado por dois dos mais eméritos advogados do mundo do Direito em nosso País. Quem revela toda essa visão técnica, equilibrada e pontuada são dois dos mais brilhantes advogados, professores eméritos: o Professor Ives Gandra da Silva Martins e o Professor Hamilton Dias de Souza. Portanto, não se trata de uma manifestação ou de uma fala de alguém que é da situação ou que é da oposição - no caso, eu, evidentemente, da oposição -, mas eu trago para o Plenário este pensamento ipsis litteris como foi escrito pelo Professor Ives Gandra e como foi escrito pelo Professor Hamilton Dias de Souza, que coloca luz, que dá evidência, que dá transparência, que dá clareza na necessidade de este ato ser anulado para o bem dos princípios que são consagrados em nossa Constituição Federal.

    Ouço, com enorme prazer, a Senadora Vanessa Grazziotin.

    A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Agradecendo antecipadamente a V. Exª, Senador Ricardo Ferraço, primeiro, eu quero dizer que V. Exª cita dois juristas; eu poderia citar aqui vários deles: Fábio Konder Comparato, Pedro Leiva Alves Pinto Serrano, Rafael Valim, Celso Antônio Bandeira de Mello - inúmeros, inúmeros -, que pensam exatamente o inverso. E creio que falamos, falamos, mas é bom, às vezes, mudar um pouco o disco: falar do mesmo assunto, usando outros argumentos, mas sustentando a mesma posição. Então, agora, se V. Exª me permite, quero aqui ler uma parte do artigo que foi publicado - não sei, creio que hoje ou ontem - de Janio de Freitas, que ultimamente tem sido bastante crítico ao Governo da Presidente Dilma.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Não apenas ele: ele e a torcida inteira do Flamengo e do Corinthians.

    A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - Exatamente, então um artigo dele. Até por isso, Senador, eu acho que é um artigo muito insuspeito. Ele diz o seguinte:

Apesar desse risco, mais do que admiti-las ou apoiá-las, estão sendo até louvadas ilegalidades, arbitrariedades e atos de abuso, inclusive em meios de comunicação, crescentes em número e gravidade.

    Concordo plenamente, aliás, passamos o dia falando exatamente isso aqui. Agora, por que estão sendo apoiados atos de ilegalidades? Para aumentar a confusão. V. Exª fala do conteúdo das gravações do Presidente Lula. Primeiro, o próprio Juiz Moro, assim como reconheceu que não havia base legal para determinar a condução coercitiva, agora reconheceu no 133, naquele Ato 133, que ele escreveu, dizendo que, de fato, há uma fala que está fora de horário, mas ele não achou isso muito relevante e deixou lá. Cometeu uma ilegalidade. A outra ilegalidade: publicou, publicizou todos os conteúdos das conversas. E, aí, o que é que diz Janio de Freitas sobre isso? O que é que diz?

A ilegalidade foi ampliada com a divulgação, em meio às gravações, dos telefones particulares e das conversas meramente pessoais, que Moro ouviu/leu e, por lei, devia manter em reserva, como intimidades protegidas pela Constituição.

    Mas ele preferiu divulgar. Subiu para o Supremo, mas, antes de subir para o Supremo, o que é que ele fez? Imprensa. Para criar confusão, colocar o ex-Presidente Lula, a Presidente Dilma contra o Poder Judiciário, contra as Cortes máximas deste País. Então, o objetivo era político. Obstruir Justiça, não. Essa tese, não, sabe por quê? Obstrui-se ou tenta-se obstruir a Justiça, quando se quer fugir de investigação. Não é o caso do Presidente Lula, que apenas mudou de foro: em vez de ser investigado na primeira instância da mesma Operação Lava Jato, ele seria julgado pela instância superior do mesmo grupo da Operação Lava Jato. Quem coordena a Operação Lava Jato? Pelo Poder Judiciário, o Ministro Teori Zavascki; pelo Ministério Público, o Procurador-Geral da República, mas sobre isso também eu vou recorrer - para não usar só os meus argumentos, porque eu já estou cansada - à leitura deste artigo, que é uma pérola de Janio de Freitas, em que ele diz o seguinte:

Muitos sustentam, como o advogado Ives Gandra [que V. Exª acabou de falar que é meu amigo e por que tenho uma profunda admiração], que “a gravação [a ilegal] torna evidente que o intuito da nomeação [como ministro] foi proteger Lula” [...].

Foi o mesmo intuito da medida provisória de FHC que deu ao advogado-geral da União título de ministro para proteger Mendes [Mendes, que ele fala, é o Gilmar Mendes, atual Ministro do Supremo], com foro especial, contra ações judiciais em primeira instância.

    Então, veja V. Exª: eu não tenho dúvida de que, mais cedo ou mais tarde, isso tem que se definir, porque, além da decisão do Ministro Gilmar Mendes, há 50. Senador, eu esperava de V. Exª, com todo o cuidado que V. Exª tem com a lei, o cuidado que V. Exª tem com o conteúdo, que V. Exª fizesse no mínimo uma crítica, pequena que fosse, àquele Juiz Catta Preta, que foi o primeiro a conceder uma liminar sustando a nomeação pela Presidente Dilma do Presidente Lula. Uma pessoa que, no dia anterior, estava no ato; uma pessoa que tem militância político-partidária; uma pessoa, um magistrado do Brasil que faz campanha nacional, para que os portadores do cartão Bolsa Família não tenham direito ao voto. Então, nobre Senador, nós estamos discutindo não meras decisões políticas, não; nós estamos discutindo decisões que têm complicado muito, ajudado muito a complicar um quadro, que é extremamente delicado, do nosso País. Eu acho que o com que nós temos que nos preocupar, Senador, são os conflitos que não virão, já estão vindo das ruas, porque ninguém faz um golpe impunemente. Eu sou daquelas que sempre acreditei que, para toda ação, há uma reação, e a reação está vindo, Senador Ricardo.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Eu divirjo de V. Exª, Senadora Vanessa Grazziotin, em quase tudo, mas considero que esse juiz a que V. Exª fez referência deveria ter feito como o Dr. Fachin acaba de fazer no Supremo Tribunal Federal. O Dr. Fachin, cuja indicação eu pessoalmente questionei muito nas sabatinas que fizemos na Comissão de Constituição e Justiça, acaba de se julgar impedido. Esse juiz a que V. Exª...

    A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco Socialismo e Democracia/PCdoB - AM) - O Ministro Gilmar Mendes também deveria ter se considerado impedido - principalmente ele, o Ministro Gilmar Mendes.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Esse juiz a que V. Exª fez referência deveria, sim, ter-se julgado impedido. Eu acho que essa seria, sim, uma posição muito mais adequada e muito mais competível com a sua função.

    Agora, a todos aqueles e àquelas que acham que, de uma forma ou de outra, existe algum tipo de excesso por parte não apenas, Sr. Presidente, do Juiz Sérgio Moro... Não é o meu caso, porque não consigo ver excesso. Muito pelo contrário: consigo ver, por parte do Juiz Sérgio Moro, um exercício preciso, cirurgicamente preciso, nas suas decisões, aliás, não apenas eu, mas também o Supremo Tribunal Federal, que tem ratificado todas as suas decisões. Para não dizer que o Supremo tem ratificado 100% das suas decisões, num dia desses, um importante jornal do nosso País divulgou a informação precisa de que o Supremo Tribunal Federal tem ratificado 97% das decisões do Dr. Sérgio Moro. Portanto, não é a minha palavra: é a palavra da mais Alta Corte do País, confirmando as decisões que o Juiz Sérgio Moro tem adotado no âmbito da coordenação da Operação Lava Jato.

    Agora, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Senadora Gleisi Hoffmann, Senadora Vanessa Grazziotin, a todos aqueles que acham que existe algum tipo de excesso por parte de algum magistrado o caminho natural é o Conselho Nacional de Justiça, no caso de qualquer magistrado, seja ele de primeiro grau, seja ele de tribunal superior, identicamente no caso de promotor, de procurador da República estadual ou federal. O caminho natural é o caminho da Corregedoria, é o caminho do Conselho Nacional de Justiça, é o caminho do Conselho Nacional do Ministério Público, cujos membros, inclusive, nós, Senadores, sabatinamos nesta Casa, na Comissão de Justiça.

    Portanto, Sr. Presidente, a meu juízo, diferentemente daquilo que pensa a Senadora Vanessa Grazziotin, eu vejo, sinceramente, nessa nomeação, uma coisa absolutamente estapafúrdia, que não encontra precedentes na civilização e nos manuais da política.

    Por favor! Não queiram me convencer de que é normal uma Presidente da República, no primeiro ano do seu Governo praticamente, jogar a toalha, dobrar a bandeira, transferir todo o seu poder para um ex-Presidente e se transformar numa figura coadjuvante, à medida que não consegue orientar a política, muito menos a orientação econômica para a reversão da mais complexa crise que nós estamos vivendo em nosso País, com impactos sociais os mais dramáticos...

(Soa a campainha.)

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - ... em todo o Brasil, subtraindo e retirando a honra, a dignidade e a autoestima do povo brasileiro. Senadora Gleisi Hoffmann, nós já estamos contabilizando aproximadamente 10 milhões de brasileiros desempregados.

    Portanto, para além das questões formais e materiais que eu apresento, há questões de ordem política. Quanto a essa questão, sinceramente, de a Presidente Dilma jogar a toalha no princípio do seu mandato, porque ela tem ainda, em tese pelo menos - espero que não, mas em tese -, 2016, 2017, 2018, não apenas a Câmara como também o Senado não têm outro caminho que não responsabilizar a Presidente pelos seus atos, pelos seus crimes de responsabilidade.

    Ouço V. Exª, Senadora Gleisi Hoffmann, nossa Presidente da Comissão de Assuntos Econômicos, com muita alegria.

    Aliás, amanhã, vamos ter um importante debate, lá na Comissão de Assuntos Econômicos, com a presença do presidente do Banco Central, o Dr. Tombini, oportunidade em que nós estaremos refletindo e questionando a política monetária do nosso País.

    Ouço V. Exª com muito prazer.

    A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Obrigada, Senador Ferraço. Em relação ao impeachment, eu queria recolocar esse assunto aqui - já falei anteriormente sobre ele. Nós não temos uma motivação jurídica para fazer o impeachment. Podemos até ter vontade política, pode parte da população querer que realmente a Presidenta saia, pode haver críticas a ela, mas nós não temos base jurídica e constitucional. Vamos analisar as pedaladas: o processo tem que se referir às pedaladas de 2015, porque as de 2014, o Presidente da Câmara já disse, porque é ele que está fazendo a condução do processo - aliás, mesmo sob suspeição, é ele o grande condutor -, pertencem ao último ano do primeiro mandato dela. Quanto às de 2015, nós nem sequer tivemos a entrada do julgamento das contas nesta Casa, que ainda vão ser analisadas pelo Tribunal de Contas e depois serão remetidas ao Congresso Nacional. Então, quem é que está atestando que houve pedaladas? Os juristas que estão dando entrada na petição para haver o impeachment da Presidenta Dilma? A questão dos decretos, a mesma coisa. Quantas vezes foram abertos decretos, até sem dotação orçamentária, para casos emergenciais, para casos, por exemplo, de chuvas, enxurradas, como aconteceu no Espírito Santo, ou da seca no Nordeste? Agora a Presidenta Dilma tem que pagar por isso? E ninguém julgou. Esta Casa, Congresso Nacional: Câmara e Senado da República não julgaram as contas de 2015. Não há base material para esse impeachment. Há uma forçação de barra política, há uma discussão política, que é legítima na política, mas ela não pode ser legítima do ponto de vista constitucional, porque, se a Constituição e a legalidade não forem boas para defender o mandato da Presidenta Dilma, não vão ser boas para defender mandato de ninguém, e nós colocamos em risco a democracia. Então, isso é importante deixar claro, porque não há base para se fazer um impeachment. O outro ponto que é importante colocar é a questão do Judiciário. Aqui ninguém está questionando o Judiciário, aqui ninguém está brigando com juiz, aqui ninguém está minimizando operação - eu considero a Operação Lava Jato uma grande operação, acho que ela é importante para a democracia brasileira, ela é importante para as instituições brasileiras -, mas o que não pode é entrar na ilegalidade. De novo, vou repetir: nós não combatemos ilegalidade e crime com práticas ilegais ou criminosas. Não podemos.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Qual a ilegalidade que V. Exª diz?

    A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - A do grampo, por exemplo. Vamos analisar: o grampo era com o Presidente Lula. Bom, alcançou a...

(Soa a campainha.)

    A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - ... Presidenta Dilma. Na hora em que alcançou a Presidenta Dilma, eram mais de 13h da tarde, o Juiz Sérgio Moro já tinha suspendido a oitiva do grampo. Não quero mais dizer grampo, porque o Senador Cássio me corrigiu: não é grampo, é escuta telefônica autorizada pela Justiça.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Interceptação telefônica.

    A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Receptação telefônica.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Interceptação.

    A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Interceptação. A interceptação já tinha sido levantada. O que acontece? O Juiz não poderia sequer divulgar, porque a lei de 1996, que regulamenta a Constituição Federal, é muito clara em dizer o seguinte: que as interceptações vão ser à parte, vão ser colhidas num processo à parte, vão ser usadas naquilo que é importante para a produção de provas, e o resto descartado. Isso não foi observado. O que se fez? Mandaram para a imprensa, alegando a publicidade, que todo mundo tem que saber. Mandaram para a imprensa, mesmo ferindo direitos individuais que a Constituição consagra no seu art. 5º. Mandaram para a imprensa, está tudo bem. E, aí, o juiz vem e diz assim: "Nossa, nem observei que tinha a Presidência da República". Isso é um disparate com o Direito e com a Justiça, porque isso, como disse o Renato Janine Ribeiro, não afeta só a Presidenta, é contra qualquer um, contra V. Exª, contra as pessoas que estão lá. Já pensou? Não, eu vou ouvir um empresário, porque supõe-se que os empresários sonegam, então eu vou começar a ouvir empresário e começar a divulgar. Não tem lógica isso. É isso o que questionamos. Então, acho que tem que ter muita cautela nessa situação porque algo que pode se mostrar bom agora - Ah, que legal, isso vai ferrar o Presidente Lula, a Presidenta Dilma - pode, amanhã, não dar condições para que a democracia, o Estado de direito se sustente. E, por último, eu queria ler um parágrafo só, se V. Exª me permite, de um artigo publicado hoje pelo Gregorio Duvivier, que é ator e escritor, na Folha de S.Paulo, que achei muito interessante e que diz como as palavras são usadas e sequestradas. Ele começa assim:

Nem todos aceitam que as palavras sejam sequestrada ao bel-prazer do usuário. A política é o campo de guerra onde se disputa a posse das palavras. A 'ética', filha do caráter com a moral, transita de um lado para o outro dos conflitos, assim como a Alsácia-Lorena, e não sem guerras sanguinárias. Com um revólver na cabeça, a ética é obrigada a endossar os seres mais amorais e sem caráter. A palavra mudança, que sempre andou com as esquerdas, foi sequestrada pelos setores mais conservadores da sociedade - que fingem querer mudar, quando o que querem é trocar (para que não se mude mais). A Justiça, coitada, foi cooptada por quem atropela direitos e desconhece a igualdade, confundindo-a o tempo todo com seu primo, o justiçamento, que é filho do preconceito com o ódio.

    Nós temos que cuidar muito para que não demos razão a esse texto, porque, se há coisas que são importantes na nossa vida, temos que lutar por elas. E não tenho dúvidas de que a democracia, o Estado de direito e os preceitos constitucionais o são.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Senadora Gleisi Hoffmann, agradecendo a contribuição de V. Exª, divirjo plenamente, porque, sinceramente, eu acho... Eu acho não, tenho convicção de que a nossa democracia vai muito bem, está mostrando toda a sua vitalidade, todo o seu dinamismo, toda a sua face orgânica. Não há defeito na democracia brasileira. Nós estamos é diante de um Governo frágil, fraco.

(Soa a campainha.)

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Diferentemente de V. Exª, eu vejo, sim, fatos materiais e formais de envolvimento da Presidente da República.

    Eu não posso deixar de considerar o fato de a Presidente da República estar, como esteve no passado, na Presidência do Conselho de Administração da Petrobras e participar, autorizar a aquisição da refinaria de Pasadena, que causou prejuízos da ordem de mais de US$700 milhões à Petrobras.

    Um dia desses, seu ex-colega de Partido Senador Delcídio do Amaral, que deve estar aqui no Senado na próxima quarta-feira, pelo menos é o que está programado, fez denúncias em torno de uma colaboração ou delação premiada que foi homologada pelo Supremo Tribunal Federal. Se o Supremo Tribunal Federal, obviamente, Sr. Presidente, homologou essa delação ou colaboração premiada é porque viu evidentes indícios de materialidade dessas denúncias. Denúncias que vão na direção de revelar estratégias de obstrução da Justiça. Não se trata aqui de uma denúncia feita ao vento, como ensinava o grande mestre da Igreja Católica, o Padre Vieira, um dos maiores teólogos da Igreja Católica: Quem fala com palavras fala ao vento; quem fala com obras toca o coração. Não foram palavras ao vento, uma vez que o Supremo Tribunal Federal homologou as denúncias feitas pelo Senador Delcídio do Amaral, que até outro dia era o Líder do Governo da Presidente Dilma nesta Casa.

    A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Todas essas homologações terão de ser provadas, Senador, senão elas não valem. É muito importante que o Senador Delcídio venha aqui quarta-feira, porque ele também fez uma revelação interessante à Veja. Ele disse que um tucano de alta plumagem o tinha procurado, também, para interceder a fim de não haver delação. E que ele não ia dizer naquele momento, mas ia dizer agora. Eu acho importante, porque senão fica parecendo que só o Governo do PT ou o PT faz essas coisas. E o Senador Delcídio falou muitas palavras ao vento lá naquela delação, sim, senhor.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Mas qual a diferença das nossas posições e opiniões? É que nós não desqualificamos o denunciante, como temos assistido nos últimos meses. Se o denunciante denunciou, ele terá que provar, e a outra parte terá que se defender. Tampouco nós transformamos, na nossa militância política, eventuais desvios em personalidades que queiram se transformar em herói nacional.

    Agora, são curiosas essas afirmações de que existem excessos por parte de juízes ou de promotores ou de quem quer que seja. No caso específico do Juiz Sérgio Moro, que controla e coordena a Operação Lava Jato, ele não o faz sozinho, tem ao seu lado juízes federais, procuradores da República, a Polícia Federal.

    Ora, 97% das suas decisões estão sendo ratificadas pelo Supremo Tribunal Federal. A Operação Lava Jato está lavando a alma do povo brasileiro. Essa é que é a verdade. Eu acho que a nossa democracia vai bem, vai muito bem, está mostrando vitalidade.

(Soa a campainha.)

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - As nossas instituições, sobretudo a Polícia Federal e a Procuradoria da República, estão funcionando muito bem, estão mostrando ao povo brasileiro que é possível e necessário nós varrermos da nossa vida a impunidade que grassava em todo o País.

    A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - São as leis e a Constituição que estão proporcionando isso. Agora, se elas não forem respeitadas, isso não vai acabar bem. Se nós chegamos aqui até agora, é porque nós temos instrumentos legais que estão proporcionado isso, por exemplo, a delação premiada. Não sei se V. Exª sabe, mas foi um projeto do Presidente Lula, que o enviou a esta Casa. Nós o votamos em 2013. Chama-se Lei das Organizações Criminosas, que prevê a delação premiada como ela está regulamentada agora e que foi sancionada pela Presidenta Dilma. Assim como a Lei do Crime de Colarinho Branco também foi uma iniciativa do Presidente Lula. Assim como o Portal da Transparência...

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - A Lei Anticorrupção.

    A Srª Gleisi Hoffmann (Bloco Apoio Governo/PT - PR) - Assim como a Lei Anticorrupção. Assim como a Lei de Acesso à Informação. É essa legislação que está dando base. Agora, toda essa legislação não prescinde do direito de defesa, não prescinde das garantias individuais, não prescinde do Estado democrático de direito. Então, nós estamos indo muito bem, sim, senhor! Mas se nós não procurarmos atender aos preceitos constitucionais da democracia, nós vamos acabar muito mal. É para isto que nós estamos alertando: nós temos que cuidar, porque os fins não podem justificar os meios.

    O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco Oposição/PSDB - ES) - Nunca! Mas é evidente que, se há evidências desses excessos, V. Exª há de concordar comigo que prevarica todo aquele que considera esse excesso e não o denuncia. Não há um processo sequer, uma reclamação sequer, no Conselho Nacional de Justiça, em relação a nenhum desses magistrados.

    Muito pelo contrário, eu vou repetir aqui o que já falei anteriormente: o Supremo Tribunal Federal tem confirmado, quase que plenamente, as decisões do Juiz Sérgio Moro.

    Portanto, eu agradeço a V. Exª a participação, mas é meu juízo. Eu, sinceramente, estou convencido de que nós não estamos caminhando para uma ditadura da toga. Não! Não é disso que se trata. O que nós estamos vendo, pela primeira vez na história da República brasileira, é a impunidade sendo golpeada fortemente. Golpeada graças às revelações que fazem parte do produto e do trabalho da Operação Lava Jato.

    Muito obrigado, Sr. Presidente. Muito obrigado, Srªs e Srs. Senadores.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/03/2016 - Página 36