Discurso durante a 36ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Rejeição do impeachment de S. Exª Dilma Rousseff, Presidente da República.

Autor
Lindbergh Farias (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Luiz Lindbergh Farias Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Rejeição do impeachment de S. Exª Dilma Rousseff, Presidente da República.
Publicação
Publicação no DSF de 23/03/2016 - Página 34
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • DEFESA, REJEIÇÃO, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ENFASE, TENTATIVA, GOLPE DE ESTADO.

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, já falei hoje sobre as manifestações de sexta-feira. A Senadora acaba de sair da tribuna, falando do caráter massivo das manifestações. Na Paulista, havia mais de 500 mil pessoas; em Pernambuco, mais de cem mil; no meu Estado, 70 mil pessoas! O que foi importante nessas manifestações é que elas foram amplas. Não foram só manifestações de militantes do PT e do PCdoB. Havia muita gente, muita juventude! Advogados e professores estavam ali para defender a democracia. Muita gente, mesmo crítica ao Governo, estava participando, por entender que o que está acontecendo hoje no Brasil é um golpe à democracia.

    Nessas manifestações, Sr. Presidente, ninguém fez discurso de ódio, ninguém pediu a volta da ditadura, ninguém questionou a presença dos pobres na política, ninguém questionou direitos sociais e econômicos da população em geral ou a afirmação dos direitos das minorias. Todo mundo pediu respeito à democracia, ao Estado democrático de direito e aos direitos e garantias que protegem todos. Ninguém pediu a destruição de ninguém, a redução de direitos ou retrocessos políticos e sociais. Ao contrário, a grande palavra de ordem foi a inclusão de todos na democracia. O grande sentimento foi o da tolerância.

    Falo disso, Sr. Presidente, porque cresce - tenho discutido isto muito no Senado - a participação de grupos fascistas em algumas manifestações. Não por acaso, naquela manifestação de domingo na Avenida Paulista, fizeram a pergunta "em quem você votaria para Presidente da República?", e 16% disseram: "Jair Bolsonaro".

    Eu cobrei do PSDB aqui, porque acho que o PSDB é, em parte, responsável, porque não demarcou o campo com esse pessoal. Conviveram pacificamente, nos mesmos protestos, com gente que defende, em pleno século XXI, a volta da ditadura militar.

    Eu falo isso porque, na sexta-feira, em Belo Horizonte, na apresentação de um musical sobre Chico Buarque - todo o Brasil acompanhou -, o diretor e ator desse musical, Cláudio Botelho, no meio de sua peça, faz um ataque à Presidenta Dilma e ao Presidente Lula. Metade da plateia se levanta, indignada com a postura daquele diretor e ator. Aquilo aconteceu no sábado, Sr. Presidente; só que, na quinta-feira - eu queria chamar a atenção de V. Exª - esse mesmo ator e diretor, Cláudio Botelho, colocou em seu Facebook dele e o seguinte - olha o grau de intolerância em que estamos entrando:

Notícia de suma importância: Lindbergh Farias e Jandira Feghali morreram. Não morreram de fato, porque para morrer é necessário estar vivo. E vermes não vivem; vicejam. Vou dormir mais feliz hoje, porque sei que essa dupla vai pelo ralo junto com a Máfia geral e que, no máximo, serão síndicos dos seus prédios. Portanto... morreram! Viva a morte de Lindinho e Fegalona, a mulher que nunca comprou um pente.

    Pelo amor de Deus, Sr. Presidente, para onde estamos indo? Um sujeito com uma prática fascista, autoritária, desrespeitosa com um Senador da República e uma Deputada Federal! É esse clima de intolerância que cresce, hoje, no nosso País.

    Sr. Presidente, saio dessas manifestações de sexta-feira muito animado, porque acho que vamos derrotar esse golpe. Não tem outro nome para chamar isso que está acontecendo no País, senão golpe! Golpe! Golpe! E tenho certeza de que vários atores que não estavam envolvidos nessa disputa política, que não são próximos do PT, que não defendem o Governo, começam a perceber isso.

    Nós, Sr. Presidente, somos favoráveis a todas as investigações. E quero entrar nisso depois. Mas, primeiro, quero falar deste impeachment que está sendo conduzido por Eduardo Cunha na Câmara dos Deputados. Um impeachment sem base jurídica. O que eles argumentam? Pedaladas fiscais, abertura de créditos suplementares.

    Aqui nós temos argumento para cada um desses pontos. Não se sustenta! É um absurdo!

    Tentaram agora anexar a delação do Senador Delcídio. Ora, depois da delação tem de haver uma investigação. Acho muito engraçada a oposição! Eles querem pegar a parte da delação que ataca o Governo. Essa é verdadeira. A parte da delação que ataca gente da oposição é falsa.

    O Senador Aécio Neves, na semana passada, fez aqui um pronunciamento. Eu só cobrei coerência. Eu não acho que se a pessoa é delatada cometeu um crime. Há que se investigar. O que não pode é a oposição dizer o seguinte: "a delação contra o Governo vale; contra a gente, é mentira. São bandidos." Não pode! Eles tiveram de recuar.

    Então, Srs. Parlamentares, Srs. Senadores, ouvintes da TV Senado, é uma irresponsabilidade continuar com esse processo de impeachment. Tenho certeza de que nós vamos vencer, mas a continuidade desse processo pode aprofundar muito o racha na democracia brasileira, o trauma na nossa democracia. E aí, quando eu falo das investigações, é preciso que se diga: nós queremos que as investigações alcancem todos. Não pode haver investigação seletiva; tem de ser aprofundada. O que nós dizemos sempre é que elas têm de ser pautadas pela legalidade, pelo respeito à nossa Constituição.

    O que nós condenamos, Senador Randolfe, é o caráter sempre seletivo das denúncias; os sistemáticos vazamentos ilegais de informações sob segredo de justiça; a "espetacularização" do processo, em conluio com a mídia partidarizada; o uso abusivo das prisões provisórias, como forma de forçar as delações premiadas; a escandalosa prática de grampear advogados, comprometendo o direito à defesa; as conduções coercitivas, sem intimação prévia, em flagrante ilegalidade; o uso desavergonhado de dois pesos e duas medidas; e até mesmo escutas ilegais contra a Presidente da República, emulando o que havia sido feito pela NSA norte-americana.

    Tudo isso configura um quadro muito perigoso, de atropelamento dos direitos e garantias individuais, com procuradores e juízes que se colocam acima da lei, em nome de uma óbvia agenda política.

    Sr. Presidente, o que fizeram com o Presidente Lula foi um grande absurdo, uma caçada contra o Presidente. Primeiro, a condução coercitiva, sem ser intimado. A pessoa só pode ser levada coercitivamente se for intimada e se negar.

(Soa a campainha.)

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Depois, os promotores de São Paulo com aquele pedido de prisão provisória, com o qual até os Líderes da oposição discordaram, porque eram muito frágeis os argumentos.

    Depois, esses grampos. Grampos ilegais, Sr. Presidente! Porque o que eu falo aqui é da legislação. A Lei das Interceptações Telefônicas, em seu art. 8º, diz o seguinte: "A interceptação de comunicação telefônica [e continua] [...], preservando-se o sigilo das diligências, gravações e transcrições respectivas."

    O art. 9º diz o seguinte: "A gravação que não interessar à prova será inutilizada [...]." Eu ouvi gravação até de D. Marisa com seu filho; gravações de todo tipo, com o advogado do Presidente Lula, Roberto Teixeira. Foram interceptadas não só as conversas dele com o Presidente. O Senador Jorge Viana ligou para...

(Interrupção do som.)

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - ... o advogado do Presidente Lula e teve a conversa interceptada. (Fora do microfone.)

    Vazamentos ilegais. No caso da Presidente Dilma, tinham que ser mandados, imediatamente, para o Supremo Tribunal Federal.

    Falo de todos esses atropelos, mas queria chegar ao último.

    Peço a V. Exª um pouco mais de tolerância para eu concluir nesse momento. Não vou me alongar muito, Senador Medeiros, mas esse barulho, de um em um minuto, atrapalha muito. Então, eu queria pedir a V. Exª, como é praxe aqui, que colocasse cinco minutos, e eu vou tentar concluir o meu pronunciamento sem essa pressão da campainha em cima de nós. V. Exª está sendo mais rigoroso do que qualquer um aqui.

    O SR. PRESIDENTE (José Medeiros. S/Partido - MT) - É porque eu tenho duas pressões: o Senador Moka e a Senadora Ana Amélia estão ávidos. Mas, vamos lá!

    O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco Apoio Governo/PT - RJ) - Eu sei, mas é que nunca houve tanta campainha em um pronunciamento. Eu pediria um pouquinho mais de tempo para concluir.

    Falo do último atropelo: como é que o Ministro Gilmar Mendes toma uma decisão como essa, em uma liminar, em cima de uma decisão de uma Presidente da República, que nomeou um Ministro, Lula, como Ministro da Casa Civil?

    Aqui o que me impressiona é que estamos entrando num debate sobre separação dos Poderes, um dos princípios da República. Se um Presidente da República, se um Chefe do Poder Executivo, não puder indicar os seus principais auxiliares, aonde a gente está chegando?

    O Ministro Marco Aurélio Mello disse, há 15 dias, que a pior ditadura é a ditadura do Poder Judiciário. Esta frase, na verdade, é de Rui Barbosa, que diz: "A pior ditadura é a ditadura do Poder Judiciário, porque contra ela nós não temos a quem recorrer."

    Aí eu pergunto aos senhores: o Lula é condenado? Não é condenado. O Lula é processado? Não é processado. A denúncia não foi nem aceita. É um simples inquérito. A Lei da Ficha Limpa diz o seguinte: se você for condenado em segunda instância. É uma forma, inclusive, que está sendo usada na Administração Pública. Mas, só por haver um inquérito, o Ministro Gilmar Mendes impede que a Presidenta Dilma nomeie o Ministro da Casa Civil.

    Aqui, quero entrar no segundo ponto, que é fundamental: a imparcialidade dos juízes. Essa é uma regra universal. O juiz tem que ter essa característica e essa postura. Não pode ser chefe de partido, chefe de facção. Nós não podemos aceitar como normal a partidarização do sistema judiciário brasileiro. Isso é gravíssimo! Inclusive, a Constituição impede que promotor e que juiz tenham filiações partidárias. Hoje, falou muito bem o Governador do Maranhão, Flávio Dino: "se quiser fazer política, rasga a toga. Vá ser candidato. Vá fazer passeatas."

    Agora, encerro, Sr. Presidente, falando do terceiro ponto. São decisões do Poder Judiciário interferindo na conjuntura política.

    Na semana passada, na quarta-feira, a Presidenta nomeou o Lula Ministro da Casa Civil. Aquilo teve um efeito aqui no Parlamento, porque o Presidente Lula tem relações aqui neste Parlamento com Deputados e Senadores dos mais diversos partidos. O que aconteceu? Agiram de forma política em cima de um fato da conjuntura. O juiz Sérgio Moro coloca diretamente para a Rede Globo, para a Globo News todas aquelas gravações, gravações que não tinham nada a ver com a questão das investigações, inclusive. E faz aquele vazamento. Convulsionou as ruas, criou um fato político.

    Na sexta-feira, o Ministro Gilmar Mendes, depois de se encontrar com o Senador José Serra e com o ex-Presidente do Banco Central Armínio Fraga, depois das nossas manifestações, também interfere politicamente, porque, ali, o objetivo está muito claro, a meu ver, Presidente Dário Berger: impedir que o Lula vire Ministro da Presidenta Dilma, porque o Lula como Ministro aumenta a chance de superarmos essa crise e de sairmos desse quadro, que é de uma grande encruzilhada histórica. Então agiu, sim, politicamente.

    E me preocupa muito essa decisão no Pleno do STF, porque, nesta semana, não há reunião do STF e, na próxima semana, segundo dizem, o Ministro Gilmar Mendes vai estar em viagem para Portugal. Então, parece-me claro que foi uma atitude política por parte do Ministro com o claro objetivo de interferir na conjuntura, para tentar impedir que o Presidente Lula, hoje nomeado Ministro pela Presidenta Dilma, assuma a Casa Civil antes da votação do impeachment. É isso o que está acontecendo aqui, no nosso País.

    Senadora Simone, falei a V. Exª que acho que temos que defender todas as investigações. Agora, com defesa da lei, da legalidade, da Constituição. Nenhum juiz pode estar acima da Constituição, nem o juiz Sérgio Moro. Ele tem que continuar as investigações dele, mas tem que fazer isso baseado na lei. Isso não é um mero detalhe.

    Eu concluo, senhores. Eu queria falar aqui sobre o apoio internacional que a Presidenta Dilma, o Presidente Lula e o Brasil têm recebido, nesse momento, de diversos atores.

    Agora chamo a atenção de Senadores e Deputados: uns querem decidir só com a pressão do seu Estado, das mobilizações de um lado ou de outro lado. Esse é o momento de olharmos para a história. Do jeito que estão fazendo, com esses atropelos, eu não tenho dúvida de que os historiadores de amanhã escreverão as páginas dos livros de História falando de um golpe contra a democracia brasileira. É isso que nós estamos vendo acontecer, sob a liderança de Eduardo Cunha, associado ao PSDB, à oposição, junto com a mídia dirigida, em especial pela Rede Globo, e o setor ligado a esse aparato do Estado. Nós vamos continuar a resistência.

    Eu volto à tribuna, em outra ocasião, para mostrar a repercussão internacional do que está acontecendo. Lideranças políticas do mundo inteiro estão falando e observando o que está acontecendo aqui no Brasil.

    Nós não vamos aceitar. Aceitamos resultados de eleições. Não vamos aceitar um golpe parlamentar conduzido por essa aliança e por um bocado de político que, na verdade, quer parar as investigações. Eles querem criar um novo governo, com um programa anti-povo - e eu vou me pronunciar mais à frente sobre isso -, para retirar direitos dos trabalhadores, para voltar com a política de privatização, para restaurar o neoliberalismo no nosso País.

    Nós vamos resistir. No próximo dia 31, novamente, grandes manifestações nas ruas brasileira.

    Nesta próxima quinta-feira, dia 24, em São Paulo, a Frente Povo Sem Medo também vai fazer um grande ato no Estado de São Paulo.

    Não vai ter golpe! Esse movimento golpista não prosperará! Nós vamos organizar a resistência nas ruas e no Parlamento brasileiro!

    Muito obrigado, Sr. Presidente.

(Soa a campainha.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/03/2016 - Página 34