Discurso durante a 37ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Defesa da constitucionalidade do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff.

Autor
Cássio Cunha Lima (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PB)
Nome completo: Cássio Rodrigues da Cunha Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL:
  • Defesa da constitucionalidade do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff.
Publicação
Publicação no DSF de 24/03/2016 - Página 19
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL
Indexação
  • DEFESA, IMPEACHMENT, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PREVISÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, DIFERENÇA, CRIME, CRIME DE RESPONSABILIDADE, CRIME MILITAR.

    O SR. CÁSSIO CUNHA LIMA (Bloco Oposição/PSDB - PB. Sem revisão do orador.) - Do contrário, nós vamos perder o resto de respeito que ainda nos sobra da sociedade brasileira. Há só um tiquinho de respeito do povo brasileiro em relação a todos nós. Se, em nome de um desespero político, tentar ganhar no grito, nós deixaremos no ralo o que nos sobra de respeito da sociedade.

    Vamos ao cerne da questão. O que se está discutindo é a possibilidade de impeachment, que está previsto na Constituição. Portanto, de cara, o que foi previsto pela Constituinte de 1988 não pode ser considerado golpe. Essa consideração é proselitismo político, que faz parte, é legítimo. Ninguém está questionando o direito e a faculdade de cada um em usar do seu poder de argumentação para o proselitismo.

    E, de forma muito didática, já que estamos esperando a chegada de outros Senadores, vamos ver a dicção do art. 85 da Constituição Federal, que trata especificamente da responsabilidade do Presidente da República.

Art. 85. São crimes de responsabilidade...

    E quero, com a máxima vênia, Sr. Presidente, fazer uma observação em relação à declaração de V. Exª, publicada pela imprensa, atribuindo ao crime de responsabilidade aspectos penais. Não! O crime de responsabilidade não tem aspecto penal. A nossa Constituição distingue muito bem a tipificação dos crimes com características penais, dos crimes militares e do crime de responsabilidade. São bem distintos. Portanto, não há como tentar encontrar qualquer aspecto penal no crime de responsabilidade.

    E prossigo a leitura da nossa Constituição:

São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra:

I - a existência da União [não se discute isso; ninguém está discutindo isso];

II - o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da Federação [eu vou debater esse tema já, já];

III - o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais [não se trata disso];

IV - a segurança interna do País [já começa a preocupar];

V - a probidade na administração [já há ponto de discussão aqui]; [e o principal]

VI - a lei orçamentária.

    O Orçamento público, Sr. Presidente, diferentemente do orçamento de uma empresa privada - que é mero termo contábil -, é uma lei. Não é uma peça de contabilidade pura e simplesmente, como acontece no setor privado.

    O orçamento do setor público, pelo que determina a nossa Constituição, é uma lei. E não precisa ser nem acadêmico de Direito, muito menos advogado para entender que não se modifica uma lei a não ser que seja por outra lei.

    Portanto, quando a Presidente Dilma Rousseff - e o seu Governo - editou decretos de suplementação orçamentária, modificando a Lei do Orçamento, ela comete um crime de responsabilidade. É isso que nós estamos sustentando. Há quem diga que não há crime de responsabilidade porque outros já o fizeram. Só que a prática continuada do crime não exime a existência dele. Se, no passado, isso era tolerado pela sociedade e pelo Congresso Nacional, é outro aspecto do debate.

    Então, achar que não há margem para se discutir o crime de responsabilidade com decretos de suplementação orçamentária sem a indispensável autorização legislativa, é reduzir o papel do Congresso Nacional e rasgar a Constituição.

    E o que faz a norma democrática? Quando há um conflito, quando há opiniões distintas, procura-se o Poder Judiciário. Eu tenho uma opinião, o Senador Lindbergh, para citar apenas um exemplo, tem outra; temos um conflito; procuramos, então, um poder mediador, que, nas relações da sociedade civil, é o Poder Judiciário.

    No caso do crime de responsabilidade, sabiamente, o Constituinte tirou do Poder Judiciário essa prerrogativa e entregou-a nas mãos do Congresso Nacional, para que, em caso de dúvida... E há, no mínimo, uma dúvida: eu estou convicto de que o crime de responsabilidade foi praticado, porque não se pode suplementar o Orçamento sem autorização legislativa. Nós temos inúmeras decisões em primeiro grau das prefeituras, até mesmo de governos estaduais, de prefeitos que foram condenados por suplementar os seus orçamentos sem autorização das câmaras municipais. Desculpe-me a expressão: isso é bê-á-bá de Direito Administrativo. Isso é bê-á-bá de Direito Administrativo. E vou insistir, para ser didático: não se pode modificar o Orçamento, que é uma lei, através de decretos que não tenham autorização legislativa.

    "Não, mas há uma dúvida." Eu vou dar o benefício da dúvida. Vamos dar o benefício da dúvida. E o que se faz na regra democrática? Instalada a dúvida, vamos para o tribunal, vamos para o juiz. E quem é o juiz? A Câmara, que funciona, mutatis mutandis, como se fosse o Ministério Público, que vai admitir ou não o processo; e nós, Senado da República, que somos o juiz natural da causa.

    Então, esse discurso de golpe é proselitismo político puro, verborragia, para talvez manter uma militância política viva. O que é legítimo. Absolutamente legítimo!

    Agora, não querer nem sequer discutir se o crime foi ou não praticado, aí, sim, é golpe; é golpe quando se tem, no inciso II do referido artigo... E a Presidente Dilma Rousseff começa a elevar o tom. Nas últimas 24 horas, a Presidente Dilma Rousseff vem elevando o tom de suas falas, transformando o Palácio do Planalto num palanque político! Ontem e hoje, a Presidente ataca instituições, ataca a OAB, ataca a imprensa livre do Brasil. Aí, sim, já se pode começar a ver um movimento golpista quando a Presidente da República, no exercício de suas funções, ataca instituições que estão querendo apenas funcionar.

    Vamos usar a linguagem popular: "Deixem o Moro trabalhar! Deixem o juiz Moro trabalhar!" Se ele cometeu algum excesso, nós temos instâncias de recurso. O Poder Judiciário brasileiro é organizado dessa forma. Vamos deixar os assuntos de polícia para a polícia! Vamos tratar os assuntos da política de uma economia que está indo para o ralo, aos frangalhos, com milhões de brasileiros penalizados! A taxa de desemprego, no final do ano, vai chegar a 12%. Serão mais 2 milhões de desempregados neste ano, sem falar no 1,7 milhão de brasileiros que perderam seus empregos no ano passado. Um Estado que se está decompondo por completo!

    Então, é preciso ter muita responsabilidade para, por exemplo, trazer referências de apoio internacional.

    Ora, o Presidente da Bolívia disse que vai invadir o Brasil para apoiar a Presidência da República. A Bolívia não tem uma baladeira para invadir país nenhum. Para quem não conhece, baladeira, no Nordeste, é estilingue. A Bolívia não tem um estilingue para invadir país nenhum. Bravata! A Bolívia não tem condições de invadir país algum!

    Aí vem Maduro, da Venezuela, dizendo que os venezuelanos virão invadir o Brasil, para evitar o golpe contra a Presidente Dilma. Menos! A Venezuela mal cuida dos seus problemas internos! A Venezuela mal consegue responder aos seus desafios próprios, para querer intrometer-se na nossa seara!

    Que o Congresso Nacional funcione! E vai funcionar, porque não vai haver golpe, vai haver impeachment. Não vai haver golpe, vai haver impeachment, que é previsto na Constituição. Aí, vão dizer: "Mas não cometeu crime de responsabilidade". E o Congresso vai dizer: "Cometeu". Cometeu porque não se pode suplementar o Orçamento sem autorização desta Casa. Funciona assim em todas as instâncias do Poder Executivo e Legislativo do Brasil, em todos os Municípios, em todos os Estados. Por que com a Presidente Dilma não pode?

(Soa a campainha.)

    O SR. CÁSSIO CUNHA LIMA (Bloco Oposição/PSDB - PB) - Por que a Presidente Dilma... E concluo, Sr. Presidente, com sua generosidade.

    Por que a Presidente Dilma pode transformar o Palácio do Planalto num palanque eleitoral? Por que agora a Globo passa a ser inimiga, e a imprensa livre, de forma geral, passa a ser adversária? Porque é conveniente. Quando ela foi eleita e reeleita, a Globo não era inimiga pública. Quando o ex-Presidente Lula foi eleito e reeleito, a imprensa do Brasil não era inimiga pública. É preciso construir o inimigo para sustentar essa militância, que já não tem mais o que fazer, que não tem mais o que dizer, porque chegaram ao poder com o discurso da ética, e infelizmente essa ética não se efetivou. E é isso que se está discutindo.

    Vamos sair deste momento como um País melhor, tenho certeza.

    É legítimo que se tenha a retórica, a sustentação de um discurso para manter uma militância que sempre foi aguerrida, ativa, mas esse discurso de golpe não cola, tanto que qualquer pesquisa de opinião pública que se faz tem a esmagadora maioria do povo brasileiro.

    E, mais do que isso, Sr. Presidente - e concluo definitivamente -, há instituições sérias no Brasil, que vão agir contra qualquer deslize em relação a essa Constituição.

    Posso até admitir, dando o benefício da dúvida, se existe ou não a caracterização do crime de responsabilidade. Até aí é possível. Agora, dizer que analisar se o crime foi cometido ou não é um golpe? Feche o Congresso! Rasgue a Constituição! Existe uma dúvida, sim. E este Senado Federal vai julgar, dentro das prerrogativas constitucionais, se houve ou não o crime de responsabilidade.

    Antecipo meu ponto de vista: houve, porque o prefeito de qualquer cidade do interior do Brasil - seja da Paraíba, seja do Amazonas, do Rio de Janeiro, de Alagoas, de qualquer parte -, se suplementar o seu orçamento sem autorização da Câmara Municipal, terá cometido crime de responsabilidade. Se vale para o prefeito, vale para a Presidência da República. É essa a realidade. Se não conseguirem se defender dessa acusação... Observem que nem falei, nem uma vez sequer, das pedaladas. Eu nunca usei como argumento principal as pedaladas, que também caracterizam crime de responsabilidade. Deixei de lado as pedaladas. Estou me sustentando apenas nos decretos de suplementação orçamentária. Já ouvimos alguma resposta para isso? Já ouvimos alguma defesa, alguma explicação convincente? Não! No máximo, o que dizem é que outros presidentes fizeram. Ora, se fizeram, cometeram crimes também. Um erro não justifica o outro.

    É de se acabar com esta história: "Não. Sempre foi assim e vai continuar sendo". Não! Estamos em um momento em que a sociedade brasileira exige mudanças e transformações profundas. E é, portanto, isto o que queremos fazer: cumprir o nosso papel de julgar como determina a Constituição.

(Soa a campainha.)

    O SR. CÁSSIO CUNHA LIMA (Bloco Oposição/PSDB - PB) - Não haverá golpe, Sr. Presidente. Provavelmente, haverá impeachment!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/03/2016 - Página 19